Como
aprender qualquer coisa do zero
O
fascínio de Tom Vanderbilt pelo processo de aprendizagem ao longo da vida
começou com os hobbies da filha: piano, futebol, taekwondo. Ele queria
encorajá-la em suas novas atividades e a acompanhava nas aulas e torneios.
Enquanto
ela exercitava a mente, ele respondia e-mails, se divertia no celular ou olhava
para o nada até a filha terminar. E logo reconheceu a hipocrisia da situação.
"Eu
estava incutindo nela a importância de aprender todas essas diferentes
habilidades", afirma. "Mas ela poderia facilmente ter me perguntado:
'Por que você não faz todas essas coisas, então?'"
A
começar com aulas de xadrez, ele decidiu passar um ano desenvolvendo uma série
de novas habilidades. Aprendeu a cantar, desenhar, fazer malabarismos e surfar.
Em
nenhum momento, ele esperava dominar totalmente essas habilidades ou mostrar
suas proezas com um feito extraordinário, como ganhar uma competição. Em vez
disso, ele queria desfrutar do prazer do processo.
"Como
adultos, nós imediatamente colocamos pressão sobre nós mesmos com objetivos.
Sentimos que não podemos nos dar ao luxo de aprender só pelo aprendizado."
Vanderbilt
detalhou sua jornada no livro Beginners ("Principiantes", em tradução
livre), em que combina suas experiências pessoais com a ciência de ponta por
trás da aquisição de habilidades.
A BBC
conversou com ele para entender os mitos da aprendizagem de adultos e os
benefícios substanciais que a "mentalidade de principiante" pode
trazer para nossas vidas.
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Como aprender bem
Começando
o projeto com quase 40 anos, Vanderbilt sabia que teria dificuldade de
corresponder às habilidades de aprendizagem de crianças, como sua filha.
As
crianças são especialmente boas em captar padrões implicitamente — entendendo
que certas ações levarão a determinados tipos de eventos, sem qualquer
explicação ou descrição do que estão fazendo.
Depois
dos 12 anos, no entanto, perdemos parte dessa capacidade de absorver novas
informações.
Mas não
devemos ser muito pessimistas em relação às nossas próprias habilidades.
Embora
os adultos possam não absorver novas habilidades tão facilmente quanto uma
criança, ainda temos "neuroplasticidade" — capacidade do cérebro de
se reprogramar em resposta a novos desafios.
Em seu
ano de aprendizado, Vanderbilt conheceu muitas pessoas que já passaram da
meia-idade e ainda exerciam esse "superpoder".
Além
disso, a pesquisa de Vanderbilt revelou alguns princípios básicos de um bom
aprendizado que qualquer pessoa pode usar para tornar o aprendizado mais
eficaz.
O
primeiro pode parecer óbvio, mas esquecemos facilmente: precisamos aprender com
nossos erros.
Portanto,
em vez de apenas repetir as mesmas ações sem pensar, precisamos ser mais
focados e analíticos, refletindo sobre o que fizemos certo e o que fizemos de
errado — os psicólogos chamam isso de "prática deliberada".
Vanderbilt
notou isso ao jogar xadrez.
Você
pode passar horas jogando online, mas isso não seria tão eficaz quanto estudar
as estratégias de profissionais ou discutir os motivos de suas derrotas com um
professor de xadrez.
O
segundo princípio é mais contraintuitivo: precisamos nos certificar de que
nossa prática seja variada.
No
malabarismo, por exemplo, trocar os objetos, ou mudar a altura em que você os
lança, foi útil para ele, que tentou sentado e enquanto caminhava.
Como um
cientista disse a Vanderbilt, isso é "repetição sem repetição" e
força os padrões aprendidos do cérebro a se tornarem mais flexíveis, permitindo
que você lide com dificuldades imprevisíveis — como um erro em um de seus
movimentos anteriores que pode fazer com que você perca o controle.
Mais
intrigante ainda, Vanderbilt descobriu que muitas vezes aprendemos melhor
quando sabemos que teremos de ensinar a mesma habilidade a outros.
Não
está claro por que isso acontece, mas essa expectativa parece aumentar o
interesse e a curiosidade das pessoas, o que estimula a atenção do cérebro e
ajuda a garantir que ele estabeleça traços de memória mais fortes.
Vanderbilt
teve muitas oportunidades de ensinar o que havia aprendido, já que
frequentemente incluía sua filha em seus projetos.
Portanto,
seja o que for que você esteja tentando dominar a nível pessoal, considere
compartilhar essa habilidade com alguém que você conhece.
E
embora você possa achar proveitoso observar verdadeiros especialistas
executando uma habilidade, Vanderbilt descobriu que também pode ser útil
acompanhar outros novatos, uma vez que você pode analisar mais facilmente o que
eles estão fazendo certo e o que estão fazendo de errado.
Com
esse conhecimento, Vanderbilt progrediu bastante em cada uma das habilidades
que se propôs a aprender. Cantar, diz ele, era um dos maiores obstáculos,
emocionalmente.
"Esse
processo de se abrir para um estranho da forma mais crua", explica.
Quando
ele superou esse nervosismo, no entanto, cantar também se revelou a atividade
mais gratificante.
"É
a coisa a que eu provavelmente me doei ao máximo, porque tem um prazer inerente
e faz você se sentir tão bem."
Ele
acabou se tornando membro do coral de Britpop de Nova York.
Se você
está inspirado a começar uma nova atividade sozinho, Vanderbilt aconselha
começar com algo que seja fácil de integrar ao seu atual estilo de vida. Você
pode se surpreender com a velocidade do seu progresso, diz ele.
"Muitas
pessoas ficam presas à ideia de que isso é apenas um grande investimento de
tempo — que é um caminho sem fim —, e isso é muito assustador para elas."
Ele
descobriu que os traços dos seus desenhos, por exemplo, haviam melhorado
significativamente no tempo que normalmente levaria para maratonar uma série de
TV.
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O fator 'por quê'
Você
ainda pode se perguntar por que deveria fazer esse esforço, quando poderia
estar à toa no sofá.
Mas
Vanderbilt destaca que há muitos benefícios em abraçar qualquer nova habilidade
— incluindo algumas mudanças cerebrais de longo prazo que poderiam compensar
parte do declínio mental que geralmente vem com o envelhecimento.
Ele
cita um estudo com adultos — de 58 a 86 anos — que fizeram vários cursos em
áreas como espanhol, música, composição e pintura.
Depois
de alguns meses, eles não apenas haviam feito um bom progresso nas respectivas
habilidades individuais, como também apresentaram uma melhora pronunciada em
testes cognitivos mais amplos — que correspondia ao desempenho de adultos 30
anos mais jovens.
Curiosamente,
esses benefícios pareciam ser provenientes da experimentação de várias
habilidades, em vez de terem focado exclusivamente em uma em particular.
Como
Vanderbilt escreve em seu livro, "em vez de correr uma maratona, você está
submetendo seu cérebro a uma variedade de exercícios intervalados de alta
intensidade. Cada vez que você começa a aprender essa nova habilidade, você
está reconfigurando. Está treinando seu cérebro novamente para ser mais
eficiente."
Temos a
tendência de ver o 'diletante' como alguém superficial e sem dedicação. Mas
parece que aqueles que são 'pau para toda obra' — o eterno principiante — podem
ter um cérebro mais aguçado do que os mestres em uma única habilidade.
A busca
de vários interesses diferentes ao longo da vida pode até aumentar sua
criatividade.
Como
David Epstein observou no livro David Robson, os ganhadores do Prêmio Nobel
eram muito mais propensos a desfrutar de atividades artísticas como música,
dança, artes visuais ou escrita criativa do que outros cientistas.
Conforme
você começa a aprender uma nova habilidade, haverá momentos de frustração e de
fracasso — mas essas podem ser, na verdade, as experiências mais importantes de
todo o processo.
Depois
de anos de experiência no jornalismo, Vanderbilt diz que os novos desafios
foram uma mudança bem-vinda em seu "comodismo profissional".
"Meio
que abriu minha mente e me trouxe de volta essa sensação de não saber",
diz ele.
Isso se
aplicou especialmente a habilidades que já pareciam de alguma forma familiares
— como desenhar.
"O
aprendizado da coisa em si era, muitas vezes, diferente do que eu imaginava.
Minhas expectativas eram constantemente contrariadas."
Várias
pesquisas têm mostrado que a humildade intelectual — a capacidade de reconhecer
os limites do nosso conhecimento — pode melhorar fortemente nosso pensamento e
a tomada de decisão.
E essa
capacidade de reconsiderar nossas ideias preconcebidas e abrir nossas mentes
para novas formas de pensar pode ser cada vez mais importante no mundo em
rápida mudança de hoje.
Quer
estejamos aprendendo por prazer ou tentando aperfeiçoar nossas habilidades
profissionais, todos nós podemos ser bem-sucedidos ao cultivar essa
"mentalidade de principiante", em que não há certezas, e há tudo para
aprender.
Fonte:
BBC News

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