sábado, 21 de maio de 2016

O obscurantismo como política de Estado. Por Maria do Rosário

A lista de retrocessos promovida em uma semana do ilegítimo governo Temer é quilométrica e finamente articulada com o que há de mais retrógrado no Parlamento brasileiro. Aqueles e aquelas que ofereceram grotesco espetáculo no dia da votação da admissibilidade do processo de impeachment na Câmara dos Deputados cobram o preço do voto que depositaram em favor do golpe e atuam firmemente para impor, por meio do Legislativo, e agora do Executivo, sua pauta obscurantista.
Este governo que ataca a Constituição de 1988 em tantos aspectos – transitando do questionamento à universalidade dos serviços do Sistema Único de Saúde até o desmantelamento da Previdência Social, que é composto exclusivamente por homens brancos, que extinguiu o Ministério da Cultura e colocou as mulheres, os negros e os direitos humanos em condição de subalternidade – tem como base de apoio, como bem afirmou o professor e ex-titular da pasta de Direitos Humanos no governo Fernando Henrique Cardoso, Paulo Sérgio Pinheiro, a bancada do Boi, da Bala, da Bíblia, e provavelmente dos Bancos, que por sua vez encontra neste governo sua imagem e semelhança.
De maneira distinta das práticas presentes, a presidenta Dilma Rousseff, atendendo a reivindicação do movimento LGBT, assinou o Decreto que institui o nome social para travestis e transexuais na administração pública federal. Desde então, passou a ser possível requerer a qualquer momento a inclusão do nome social em documentos oficiais e registros dos sistemas de informações da administração pública federal.
O nome social é uma importante bandeira dos movimentos sociais em prol da garantia e ampliação dos direitos humanos. Ele assegura a identidade de gênero, além de combater a discriminação e auxiliar na construção de uma cultura de respeito, diversidade, inclusão social e democracia. Significa oportunidade para que travestis e transexuais superem o processo de exclusão que hoje vivenciam no Brasil. Medida importante por significar o reconhecimento da cidadania dos travestis e transexuais por parte do governo federal, foi comemorada por aqueles e aquelas que por ela lutaram, tratada corretamente como força motriz para novas vitórias.
Todavia, tal conquista nem sequer completou um mês e já é atacada. Esta semana um conjunto de parlamentares protocolou o Projeto de Decreto Legislativo de Sustação de Atos Normativos do Poder Executivo nº 395/2016, com o objetivo de sustar o Decreto nº 8.727, de 28 de abril de 2016, que “Dispõe sobre o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional.”
Apresentado sob justificativa formalista, referindo-se ao escopo do decreto, não esconde seu objetivo real: mais uma vez perseguir a população LGBT, mais uma vez buscar transformar o Estado laico no predomínio de visões religiosas que jamais deveriam reger as relações republicanas.
Diariamente travestis e transexuais são discriminados, impedidos de assumir postos de trabalhos por causa do preconceito. As estatísticas de assassinatos desta população apenas crescem, mas ainda assim, ao invés destes parlamentares concentrarem suas energias para empreender esforços humanistas, no sentido da promoção dos direitos e do enfrentamento à violência, optam por vilipendiar ainda mais pessoas que nem sequer conquistaram a plenitude em direitos.
Diante de um cenário de avanço do conservadorismo de face golpista, precisamos resistir, sem abandonar nossas bandeiras mais caras. O movimento LGBT, irmanado com a Frente Brasil Popular e a Frente Povo Sem Medo – compostas por movimentos e partidos de esquerda -, precisa enfrentar o fundamentalismo e contará conosco dentro da Câmara para isso, nesta e em todas as batalhas que nos forem apresentadas.
A defesa dos direitos dos setores historicamente marginalizados da população, a luta libertária, é hoje parte de uma luta pelo respeito à diversidade humana, e ao mesmo tempo uma batalha civilizatória. É hora de barrarmos os dois golpes em curso: o contra a democracia e o outro, contra o povo deste país.


* Maria do Rosário é deputada federal (PT/RS).

A primeira semana de horrores de Temer

A demissão do garçom José Catalão, que servia cafezinho no Palácio do Planalto, sob a acusação de ser “petista”, dá a medida da mesquinharia do governo ilegítimo que ocupa, desde a quinta-feira (12) a presidência da República. A lista de horrores contra o país e o povo parece não acabar. Este curto espaço de tempo foi marcado por uma combinação estapafúrdia de autoritarismo, opção pelos ricos e abandono de políticas públicas e programas voltados para os mais pobres.
O mais visível desses atos antidemocráticos foi o desmonte do Ministério da Cultura, transformado em uma secretaria para a qual um conjunto de mulheres notáveis – Bruna Lombardi, Cláudia Leitão, Daniela Mercury, Eliane Costa e Marília Gabriela – disse sucessivos nãos às tentativas de nomeá-las. Na mesma linha, demitiu o presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), Ricardo Melo, para possibilitar aos golpistas o controle completo da comunicação pública.
Provocou, por assim dizer, desconforto entre os industriais ao nomear Marcos Pereira para o ministério da Indústria e Comércio, que é estranho aos assuntos da pasta. Para os trabalhadores, as notícias iniciais foram ruins - e a pior delas, a projetada reforma da Previdência, provocou reações imediatas no próprio campo golpista. Foi também contra o povo a revogação da medida da presidenta Dilma Rousseff que autorizou a construção de 11.250 unidades do Minha Casa Minha Vida.
Outro fiasco ameaçador, para o povo, foi a investida contra o Sistema Único de Saúde (SUS) feita pelo ocupante do ministério da Saúde, o privatista Ricardo Barros, sob a costumeira alegação conservadora de que o brasileiro não tem dinheiro para aplicar na universalização do atendimento de saúde – embora tenha para pagar juros escorchantes aos rentistas e especuladores!
Prevendo a reação que enfrentará, o ilegítimo Michel Temer nomeou para ocupar o ministério da Justiça, Alexandre de Moraes, que chamou os protestos contra o golpe de “atos de guerrilha”. A orientação adotada na política externa, como o notório golpista José Serra à frente, reflete a vexatória “lei Chico Buarque”: rosnar contra os fracos e pequenos, como os vizinhos da Américas do Sul, e afinar a voz o imperialismo, o norte-americano sobretudo.
Na área decisiva da economia e das finanças, a mudança de rumo abandona os interesses populares e nacionais para atender os interesses dos rentistas e especuladores. Revela assim a natureza e a face verdadeira deste governo ilegítimo – o poder dos banqueiros e daqueles que vivem de abocanhar as finanças públicas. Henrique Meireles se cercou de sócios e propagandistas da especulação rentista, entre eles Ilan Goldfajn, escalado para ser o presidente do Banco Central. É um neoliberal extremamente conservador, ligado ao Itaú Unibanco, que quer mais desemprego para baixar o salário mínimo e, dessa forma conservadora, combater a inflação!
A ação de Michel Temer tem a desenvoltura de um novo governo, mas a fonte de seus problemas é a flagrante ilegitimidade de sua presença na presidência da República. Ilegitimidade cujo reconhecimento cresce no Brasil no exterior - como ocorreu com a manifestação feita durante o festival de Cannes, onde a equipe do filme brasileiro “Aquarius” demonstrou ao mundo sua indignação frente ao golpe ocorrido no Brasil.



Editorial do site Vermelho