A
lista de retrocessos promovida em uma semana do ilegítimo governo Temer é
quilométrica e finamente articulada com o que há de mais retrógrado no
Parlamento brasileiro. Aqueles e aquelas que ofereceram grotesco espetáculo no
dia da votação da admissibilidade do processo de impeachment na Câmara dos
Deputados cobram o preço do voto que depositaram em favor do golpe e atuam
firmemente para impor, por meio do Legislativo, e agora do Executivo, sua pauta
obscurantista.
Este
governo que ataca a Constituição de 1988 em tantos aspectos – transitando do
questionamento à universalidade dos serviços do Sistema Único de Saúde até o
desmantelamento da Previdência Social, que é composto exclusivamente por homens
brancos, que extinguiu o Ministério da Cultura e colocou as mulheres, os negros
e os direitos humanos em condição de subalternidade – tem como base de apoio,
como bem afirmou o professor e ex-titular da pasta de Direitos Humanos no
governo Fernando Henrique Cardoso, Paulo Sérgio Pinheiro, a bancada do Boi, da
Bala, da Bíblia, e provavelmente dos Bancos, que por sua vez encontra neste
governo sua imagem e semelhança.
De
maneira distinta das práticas presentes, a presidenta Dilma Rousseff, atendendo
a reivindicação do movimento LGBT, assinou o Decreto que institui o nome social
para travestis e transexuais na administração pública federal. Desde então,
passou a ser possível requerer a qualquer momento a inclusão do nome social em
documentos oficiais e registros dos sistemas de informações da administração
pública federal.
O
nome social é uma importante bandeira dos movimentos sociais em prol da
garantia e ampliação dos direitos humanos. Ele assegura a identidade de gênero,
além de combater a discriminação e auxiliar na construção de uma cultura de
respeito, diversidade, inclusão social e democracia. Significa oportunidade
para que travestis e transexuais superem o processo de exclusão que hoje
vivenciam no Brasil. Medida importante por significar o reconhecimento da
cidadania dos travestis e transexuais por parte do governo federal, foi
comemorada por aqueles e aquelas que por ela lutaram, tratada corretamente como
força motriz para novas vitórias.
Todavia,
tal conquista nem sequer completou um mês e já é atacada. Esta semana um
conjunto de parlamentares protocolou o Projeto de Decreto Legislativo de
Sustação de Atos Normativos do Poder Executivo nº 395/2016, com o objetivo de
sustar o Decreto nº 8.727, de 28 de abril de 2016, que “Dispõe sobre o uso do
nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e
transexuais no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e
fundacional.”
Apresentado
sob justificativa formalista, referindo-se ao escopo do decreto, não esconde
seu objetivo real: mais uma vez perseguir a população LGBT, mais uma vez buscar
transformar o Estado laico no predomínio de visões religiosas que jamais
deveriam reger as relações republicanas.
Diariamente
travestis e transexuais são discriminados, impedidos de assumir postos de
trabalhos por causa do preconceito. As estatísticas de assassinatos desta
população apenas crescem, mas ainda assim, ao invés destes parlamentares
concentrarem suas energias para empreender esforços humanistas, no sentido da
promoção dos direitos e do enfrentamento à violência, optam por vilipendiar
ainda mais pessoas que nem sequer conquistaram a plenitude em direitos.
Diante
de um cenário de avanço do conservadorismo de face golpista, precisamos
resistir, sem abandonar nossas bandeiras mais caras. O movimento LGBT, irmanado
com a Frente Brasil Popular e a Frente Povo Sem Medo – compostas por movimentos
e partidos de esquerda -, precisa enfrentar o fundamentalismo e contará conosco
dentro da Câmara para isso, nesta e em todas as batalhas que nos forem apresentadas.
A
defesa dos direitos dos setores historicamente marginalizados da população, a
luta libertária, é hoje parte de uma luta pelo respeito à diversidade humana, e
ao mesmo tempo uma batalha civilizatória. É hora de barrarmos os dois golpes em
curso: o contra a democracia e o outro, contra o povo deste país.
* Maria do Rosário é deputada federal (PT/RS).
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