Martelo
de Trump selou o destino de dois Messias
As duas
últimas semanas que terminaram neste sábado, 22 de novembro, com a prisão
preventiva, na Polícia Federal, em Brasília, do ex-presidente Jair Messias
Bolsonaro, candidato 22 pelo PL nas eleições de 2022 que tentou melar,
confirmaram a velha máxima do mineiro José de Magalhães Pinto, fundador do
Banco Nacional. O discreto banqueiro e sagaz político dizia que “política é
como nuvem; cada hora que se olha, está de um jeito”. A mudança das nuvens da
opinião pública, após a matança de 121 suspeitos de narcotráfico no Complexo de
Alemão-Penha, no Rio de Janeiro, animou a oposição direitista, que se apressou
a votar na Câmara dos Deputados um Projeto de Lei Antifacção, indicando a
relatoria ao deputado federal Guilherme Derrite (PP-SP). Ele fora eleito pelo
PL, mas trocou de partido de olho nas eleições de 2026: se o governador de São
Paulo, Tarcísio de Freitas, tentar a presidência, Derrite concorre ao governo
de SP.
Derritte
se licenciou do cargo de secretário de segurança do governo Tarcísio de Freitas
(Republicanos -SP). Ao desembarcar na Câmara, apoiado pelo presidente Hugo
Motta (Republicanos-PB), veio com o Projeto de Lei pronto, tentando escantear a
ideia do governo Lula que estava na Câmara desde maio. A principal novidade era
criar restrições à atuação da Polícia Federal (a PF só poderia atuar nos 26
estados e no DF com autorização dos respectivos governadores), o que gerou
forte reação do governo. A liberdade de ação à PF foi mantida, mas ao fim e ao
cabo de seis mudanças no texto, a Câmara aprovou na noite de quarta-feira o PL
Antifacção por 370 votos contra 110, em grande derrota do governo.
Mas o
governo Lula contava aparar as arestas e tirar jabutis encastelados na
forquilha quando o projeto fosse submetido ao Senado, onde o presidente David
Alcolumbre conferiu a relatoria ao senador Alessandro Vieira (MDB-SE), que
também é relator da CPI do Crime Organizado no Senado. O governo espera que
Vieira, de perfil independente, mude o que chamou de “mostrengo jurídico
inconsistente” elaborado por Derrite, que dificultaria a ação da Polícia
Federal no combate ao crime organizado. Para a oposição, o projeto dará mais
instrumentos ao Estado brasileiro para endurecer a luta contra as facções
criminosas. O PL final não equipara narcotraficantes a terroristas, menos mal.
Por
ironia do destino, na manhã do mesmo dia 18, o Banco Central decretou a
intervenção no Banco Master, depois que, na noite anterior, o presidente do
banco, Daniel Vorcaro, fora preso pela Polícia Federal no aeroporto de
Guarulhos (SP) ao tentar embarcar para o exterior em um de seus jatos. O
destino da rota informada à torre de controle era ilha de Malta, paraíso fiscal
no Mediterrâneo, ao sul da Itália. Mas o banqueiro e seus advogados de defesa
alegaram que o banqueiro estava indo a Dubai fechar a venda do Master para a
gestora Fictor (que patrocina o Palmeiras) e um fundo de investimento dos
Emirados Árabes Unidos, como chegou a anunciar o Master na mesma tarde.
A
prisão de Vorcaro, que costumava ostentar, contrariando a discrição dos
banqueiros brasileiros do século passado – Amador Aguiar, fundador do Bradesco,
Aloysio Faria, do Banco Real, Avelino Vieira, do Bamerindus, e o próprio
Magalhães Pinto (não cito Olavo Setúbal, do Itaú, porque o Banco Federal de
Crédito, que se fundiu com o Banco Itaú, em 1964, foi fundado por seu tio,
Alfredo Egydio de Sousa Aranha, em 1943, e convidou o sobrinho engenheiro para
gerir o banco no ano seguinte) eram austeros -, caiu como uma bomba na esfera
dos Três Poderes da República, entre os quais Vorcaro cultivara relações para
garantir a sobrevivência do banco, com problemas desde 2021. Mas é bom lembrar
que a discrição da vida dos poderosos era anterior ao surgimento das redes
sociais. Como eram grandes anunciantes ou financiadores dos jornais e redes de
rádio e TV, os banqueiros e milionários conseguiam evitar que sua intimidade
fosse exposta no século passado.
A
encruzilhada da política com o Master
O
presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), patrocinador da indicação do
ex-presidente da casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para sucessor do ministro Luís
Roberto Barroso, que antecipou a aposentadoria no Supremo Tribunal Federal,
advertiu (com base nos 45 votos, apenas quatro acima do quórum mínimo de 41, na
recondução do procurador-geral da República, Paulo Gonet) para os riscos de o
governo insistir na indicação do advogado-geral da União, Jorge Messias,
auxiliar de confiança do presidente. Lula deseja que Pacheco concorra ao
governo de Minas Gerais em 2026, atuando como um possível palanque aliado à sua
campanha. Tanto Alcolumbre, quanto a suposta maioria do Senado e,
discretamente, o trio de ministros mais influentes no Supremo, Gilmar Mendes, Alexandre
de Moraes e Flávio Dino, faziam campanha a favor da indicação de Rodrigo
Pacheco.
Lula,
provavelmente, foi informado com antecedência da decisão do governo Trump de
praticamente retirar o tarifaço extra de 40% instituído em 6 de agosto para
tentar barrar o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro no STF (restam só
22% das exportações a terem discussões para baixa de tarifas). Por isso, no
feriado da Consciência Negra (o movimento negro pedia a indicação de uma
advogada negra ao STF), com o Congresso e o mercado financeiro em recesso,
adiantou, quinta-feira, 20, à tarde, a escolha do advogado, Jorge Messias,
pastor Batista, com trânsito entre os evangélicos, para o Supremo.
O
destino dos dois Messias
Foi,
sem dúvida, uma decisão pensada e pesada. No dia em que o pragmático presidente
americano jogou a toalha do tarifaço insuflado pelo filho 03, o deputado
licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), e deu mais um adeus a Jair Messias
Bolsonaro – que pode ir à Papuda num primeiro momento, quando começar a cumprir
a pena -, baixando as taxas para combater a inflação que ajudou os democratas
nas eleições regionais, se rendendo ao fato de que o poder no Brasil, pelo
menos até 31 de dezembro de 2026, é de Luís Inácio (e ante a perda de força dos
bolsonaristas e partidos atingidos pelo caso Master), Lula ficou com o seu
Messias de estimação.
Não por
acaso, o filho 01, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) convocou para esse sábado à
noite uma vigília à porta do condomínio onde o ex-presidente estava em prisão
preventiva domiciliar, em Brasília. Só não contava com a astúcia do ministro
Alexandre de Moraes. Já em alerta pela fuga para os EUA do deputado Alexandre
Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Abin, condenado a 16 anos pela trama golpista, o
ministro-relator da Primeira Turma do STF foi informado pela polícia do DF da
violação da tornozeleira eletrônica de Bolsonaro, às 00h08 deste sábado, e
determinou à PF a prisão preventiva, às 6h, do ex-presidente. Temia que
aproveitasse o tumulto à noite, com a vigília, para se evadir. Bingo 22.
Recolhido a uma sala especial na sede da Polícia Federal, em Brasília, a
vigília perdeu o sentido, se era parte de um plano de fuga...
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Os respingos do caso Master
No
Brasil, não é de hoje que os grandes escritórios de advocacia que defendem os
interesses de grandes empresas – que, em última instância, acabam sendo
julgadas pelo Supremo Tribunal Federal – recorrem a figuras exponenciais do
direito que passaram pelo STF, ou têm relações diretas com seus ministros. O
BTG-Pactual contratou o ex-ministro Nelson Jobim para o seu conselho; a banca
do recém-falecido advogado Sérgio Bermudes, que defendeu o Econômico e o
Nacional, tinha como diretora em Brasília a advogada Guiomar Mendes, esposa do
ministro Gilmar Mendes. Os filhos do ministro Luiz Fux já estão operando, há
dois anos, na rua Barão da Torre, em Ipanema, em frente à praça Nossa Senhora
da Paz, a banca de advocacia na qual o pai deve atuar quando se aposentar do
STF, em 2028.
Com
dificuldades desde o governo Bolsonaro, quando tentou vender parte da
problemática carteira de crédito à CEF, o Master chegou a contratar,
sucessivamente, no governo Lula, o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega para
tentar abrir trânsito junto à Fazenda e ao Banco Central (seus pepinos, com um
excesso de posição em títulos precatórios, eram motivo de pressões da Fazenda e
do BC, até porque havia operações com empresas sonegadoras contumazes de
impostos). Depois foi a vez do ex-ministro Ricardo Lewandowski, que, quando
assumiu o ministério da Justiça em 1º de fevereiro de 2024, largou a assessoria
jurídica. Esta foi assumida pelo escritório Barci e Moraes, que tem como um dos
sócios Viviane de Moraes, esposa do ministro Alexandre de Moraes, que também foi
sancionada pela lei Magnitsky. Mais recentemente, quando o Master tentou
associação com o BRB (o banco do Distrito Federal, governado pelo expoente do
Centrão, o advogado piauiense Ibaneis Rocha, eleito pelo MDB), o Master buscou
os serviços de advocacia do ex-presidente Michel Temer, de grande influência no
MDB e no Centrão.
O
inquérito da Polícia Federal, que levou à prisão de Vorcaro e do presidente do
BRB, Paulo Henrique Rocha, identificou mais de R$ 12 bilhões em transferências
de créditos problemáticos (inadimplentes) para o BRB. Ao que se sabe, o diretor
de Organização do Banco Central, Renato Brito Dias Gomes, que examinava a
proposta de fusão entre o Master e o BRB desde maio, exigiu que a operação
fosse desfeita. Isso levou a uma articulação do Centrão, à frente os seus
principais partidos (o União Brasil, de Antônio Rueda, e o PP, comandado pelo
senador Ciro Nogueira, do Piauí). Em setembro, o PP apresentou projeto que
permitia ao Senado aprovar a demissão de diretores do BC e reduzir sua
autonomia financeira perante o Executivo. A manobra caiu, junto com a reação popular
à PEC da bandidagem para blindar os mandatos dos deputados e senadores acusados
de crimes. Mantido no cargo, Brito Dias avançou no dossiê contra o Master e
decretou sua liquidação quando a PF prendeu Daniel Vorcaro, controlador do
banco, e outros sete diretores do Master, incluindo o ex-diretor presidente e
sócio Augusto Ferreira Lima.
O
Master era malvisto no mercado. Sobretudo pelos grandes bancos (Itaú, Banco do
Brasil, Bradesco, Santander, Caixa e BTG-Pactual), que são os principais
contribuidores do Fundo Garantidor de Crédito. O FGC garante aplicações em
CDBs, RDBs, Letras de câmbio e Letras de Crédito Imobiliário ou de Letras de
Crédito do Agronegócio até R$ 250 mil. Quem aceitava aplicar além destes
limites (incluindo os juros) devia saber que corria risco de calote parcial.
Mas o Master, que pagava juros de 40% acima da média do mercado (CDI+40%), já
tinha estourado todos os limites em CDBs, e procurava “fintechs” e bancos de
investimento, a quem oferecia gordas comissões, para vender letras financeiras
a fundos de pesão e outros fundos de investimento.
Entre
os que cumpriam esse papel estavam a XP Investimento, o Nubank (uma instituição
de pagamento que usa indevidamente o nome fantasia de “bank”) e o BTG-Pactual.
Por isso e por negociar comissões com gestores de fundos de pensão, estão sendo
investigados pela PF por receber propinas gestores de 18 fundos de pensão de
governos e prefeituras no Brasil. Entre os mais atolados estão o Rio
Previdência do governo do Estado do Rio de Janeiro, de Cláudio Castro, que
aplicou mais de R$ 1,8 bilhão em papéis do Master; com R$ 400 milhões, o fundo
de pensão do Amapá, cujo diretor, Jocildo Lemos, foi apadrinhado por Davi
Alcolumbre, e o fundo de pensão de Maceió (AL), onde influi Arthur Lira
(PP-AL), com R$ 97 milhões. A investigação no Master, que poderia ter sido barrada
se a onda da blindagem da bandidagem passasse, ainda vai dar dor de cabeça a
muito gestor financeiro e político. Agora se entende por que os partidos do
Centrão são contra taxar as LCIs e LCAs.
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BC podia fazer limpeza nas ’fintechs’
Na
semana anterior à intervenção no Master, o Banco Central indicou, no Relatório
de Estabilidade Financeira, que a proliferação de “fintechs” que acessam as
transferências de recursos por meio do Pix, desde fins de 2020, ampliou a
inclusão financeira no país. Mas “o processo de transformação digital no
Sistema Financeiro Nacional implica em maior exposição das instituições
financeiras e de pagamento aos riscos tecnológicos e cibernéticos”. O BC vem
desenvolvendo ações para aprimorar a resiliência operacional e cibernética das
entidades supervisionadas. “Contudo, incidentes recentes tiveram como
característica a atuação coordenada e planejada de grupos criminosos com o
objetivo de subtrair recursos financeiros de Ifs/Ips, culminando em perdas
financeiras e em impactos operacionais relevantes”.
Os
incidentes mais impactantes, segundo o Banco Central, foram caracterizados pelo
ataque a Provedores de Serviços de Tecnologia da Informação (PSTI), empresas de
prestação de serviços de processamento de dados e de conectividade para Ifs/Ips
que não possuem infraestrutura própria para operacionalizar o acesso à Rede do
Sistema Financeira Nacional (RSFN).
Ainda
segundo o REF, “os incidentes revelaram que algumas Ifs não possuíam controles
adequados para a gestão do risco de serviços providos por terceiros”. Há 930
instituições financeiras, instituições de pagamento (Ips) e cooperativas de
crédito autorizadas a operar o Pix e mais 37 pedindo adesão. O BC identificou
que, entre 606 instituições pesquisadas, 453 informaram dispor de procedimentos
para a gestão do relacionamento com terceiros; 317 reportaram que o processo é
avaliado pela segunda linha; e 319 informaram que o tema é escopo dos trabalhos
de sua auditoria interna. Sem 100% de segurança.
Está na
hora de o Banco Central apertar o cerco e fazer limpeza nas “fintechs”. Uma boa
providência seria apressar a proibição do uso do nome banco ou as corruptelas
em inglês de Ips, que só facilitam golpes e lavagem de dinheiro.
Fonte:
Por Gilberto Menezes Côrtes, no JB

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