sexta-feira, 12 de dezembro de 2025

Venezuela ensina que o imperialismo não morreu - e implica em violência

Donald Trump resolveu reeditar a Doutrina Monroe em mais um gesto de falastronice. Ao seu modo, ele agora aposta em reeditar a figura de Ted Roosevelt, depois de acenar com o protecionista William McKinley no seu discurso de posse – e na sua política, hoje bastante impopular e ineficaz de tarifaço. Como dizíamos, a Venezuela é uma mistura de rapina, cortina de fumaça para os problemas internos com uma tensão contra a Rússia.

Em tempos em que uma certa marxologia metafísica vê imperialismo em toda parte, inclusive na resistência ao dito cujo, o caricatural cerco naval à Venezuela – com direito ao bombardeio de barcos de pesca e assassinatos que são, a bem da verdade, crimes de guerra além de violação óbvia do direito internacional – ensina que imperialismo é sobre guerra e demanda violência e coerção.

Não houvesse o elemento militarista, num contexto de trocas desiguais que conduzem à existência entre países exploradores e explorados, não haveria que se falar em imperialismo. Assim, temos um mundo unipolar, hegemonizado pelos Estados Unidos pela força de economia, mas pela garantia de suas armas, que está em xeque e, por conseguinte, resolveu lutar para manter sua posição contra aquilo que lhe desafia.

Durante anos silenciando sobre os efeitos das sanções econômicas contra a Venezuela, a maior causa da miséria e do fluxo de milhões de refugiados saindo de lá nos últimos anos, hoje, partes caudalosas da esquerda brasileira precisam calibrar o discurso na antessala de uma agressão militar contra o país latino-americano. Isso consiste em um problema imenso para o Brasil, além de um risco assustador para o continente.

<><> O que é imperialismo?

Pelo menos desde a dinastia dos aquemênidas, sob a liderança de Ciro, o Grande, ainda no século VI a. C., a humanidade conheceu o que é um império propriamente dito – e não as ligas de cidades e suas propriedades rurais e extrativistas. A partir dali, o reino da Pérsia dominou os demais reinos iranianos, unificando-os, para depois conquistar vastidões que iam do oeste do subcontinente indiano ao mundo helênico.

Mas é apenas sob o capitalismo que os impérios podem e precisam se projetar para obter novos recursos naturais e humanos, além de mercados. Aí, podemos falar sobre imperialismo, sobretudo a partir dos anos 1880, com o consórcio de impérios capitalistas sentando-se à mesa para partilhar o resto do mundo. Foi o revolucionário russo Vladimir Lênin, em seu Imperialismo: fase superior do capitalismo, que deu a grande contribuição sobre o tema.

Mas apesar da base econômica, é impossível falar em “imperialismo” sem discutir sua forma superestrutural – o que implica no aspecto extraeconômico que é de ordem militar. O próprio Lênin escreve sobre isso no contexto da Primeira Guerra Mundial, a qual foi antevista por Friedrich Engels décadas antes. Impossível falar de imperialismo sem falar da questão militar e do militarismo.

A característica principal das trocas desiguais que caracterizam o fenômeno imperialista, por sua natureza, demandam coerção militar do explorador sobre o explorado – sem a qual não é possível perpetuar o sistema. Imperialismo não é apenas sobre “exportação de capitais”, mas uma determinada forma dessas trocas, garantida pela força das armas – senão posta, pressuposta nas infinitas “cúpulas diplomáticas”. 

Convenientemente, partes das esquerdas globais, ainda remanescentes, insistem em apagar o elemento militar para discutir o imperialismo sob uma ótica economicista – ou, por conveniência, consideram apenas o elemento militar. Dessa forma desconjuntada, Rússia e China se tornam “imperialistas”, na melhor das hipóteses, iguais aos Estados Unidos, quando a questão é totalmente outra – e a Venezuela é uma prova viva disso.

<><> O elemento militar como características central

“Extra-econômico”, como diria Lênin, o elemento militar é a garantia e, ao mesmo tempo, um certo elemento indeterminado que pode mudar o curso dos efeitos econômicos – é evidente que sem uma economia forte, é impossível se ter forças armadas adequadas, mas capacidade de organização política e apuro estratégico podem compensar desníveis econômicos e mudar os rumos da História.

Foi dentro de um contexto de profunda assimetria material, mas compensada por profunda organização política, social e militar que o presidente Mao tirou a China do fundo do poço. O empate estratégico na Coreia, que perdura até hoje, mais de 70 anos após o início do conflito, ensinou ao mudo que uma Nova China havia nascido. Só isso pôde permitir e garantir o desenvolvimento material das décadas seguintes.

O caso venezuelano certamente é muito clássico em termos imperialistas: um país economicamente asfixiado que agora se vê vítima de um cerco naval, sob ameaças de bombardeio e invasão. Produtora de petróleo, ninguém acusará Caracas de ser uma terrível “exportadora de capitais”, mas aí surge o elemento “democrático” e os questionamentos contra uma liderança política que navegou nos últimos anos em mar bravio.

Trump pode se dar ao luxo de usar uma ameaça dessas não apenas pelo seu poderio econômico, ou a natureza de sua relação econômica com a Venezuela, mas porque possui um aparato militar pesadíssimo – inclusive para sua base econômica nada desprezível. Hoje, viveremos a hora da verdade, e em termos bélicos, sabemos como as coisas podem começar, mas nunca como vão terminar.

Depois de anos de cerco econômico, o maior temor dos críticos do cerco naval de Trump é que a missão possa transformar a Venezuela numa “nova Líbia” – um exemplo cruelmente irônico de Hillary Clinton, levando em consideração que ela foi a maior responsável pela destruição do país africano, até ali, em 2011, o mais desenvolvido do seu continente. Mas se superestima os riscos da invasão e, pior ainda, da ocupação.

<><> Horizontes complexos 

Não se considera a possibilidade de uma guerra assimétrica venezuelana funcionar, transformando a ocupação num inferno – o que poderia desgraçar o governo Trump, com risco de desmoralização total. O presidente americano, contudo, hesita no que fazer, porque estava certo que só bastaria o cerco naval para forçar a uma renúncia de Maduro. Então, é preciso avaliar porque esse blefe não foi suficiente.

A Venezuela foi um exemplo bem-sucedido de cerco econômico, muito embora esse tipo de prática tenha se mostrado falida quando aplicada a países grandes como a Rússia. O mercado global simplesmente se adapta nesses casos. O problema é como russos e chineses, chutados por ocidentais do sistema global,  podem ou querem defender seus aliados mundo adentro; essa é uma questão.

O vaticínio de Henry Kissinger para o presidente americano Richard Nixon sobre o risco de ser amigo dos Estados Unidos – não era uma análise factual, mas uma advertência, ao contrário da forma como isso ficou para a posteridade – poderia servir para o presidente russo Vladimir Putin e Caracas – e isso não seria bom para Moscou, muito embora a situação da Ucrânia possa levar a um “empate” mórbido, a depender do que ocorra.

A crítica de não proteger os seus é uma crítica válida ao Brics, mas apontar essa integração entre os periféricos como expressão de um neo-imperialismo é, certamente, uma narrativa falsificadora que varia entre um desvio teoricista ao colaboracionismo com os podres poderes ocidentais  – encabeçados por um presidente americano que mesmo americanistas exaltados têm dificuldades em defender.

Essa tragédia é uma lição importante para aqueles que supõem que o mundo virou o capítulo dos anos 1880, mesmo com duas guerras mundiais, a guerra fria e a globalização no período. O central ainda é feito da mesma forma, ainda que com arranjos diferentes. O fortalecimento militar estará na ordem do dia de qualquer país que deseje se fortalecer, sobretudo se ele é maior que uma ilha ou uma cidade-Estado. 

¨      Após êxito na Venezuela, Maduro sugere aliança internacional de combate ao crime organizado

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, durante a inauguração da Academia de Serviços de Polícia da Polícia Nacional Bolivariana (PNB), na última sexta-feira (5), ofereceu aos países vizinhos estabelecer programas de cooperação policial e de combate ao crime organizado. Assegurou que a Venezuela construiu um sistema policial profissional, “científico e exemplar”, que está à disposição de outras nações para intercâmbio de informações e operações conjuntas.

O líder chavista destacou ainda que os organismos de segurança da Venezuela venceram todos os grandes grupos criminosos, citando os casos do Tren de Aragua — desarticulado e desaparecido no país —, do Tren del Llano, do bando de Wuilexis, em Petare, e do grupo Koki na Cota 905, em Caracas. Todas essas organizações conformavam o que se passou a chamar de “megabandos”, pois chegaram a acumular, em alguns casos, até 200 integrantes dedicados ao sequestro, à extorsão e ao tráfico de armas e entorpecentes.

Essas declarações se inserem em um contexto no qual os Estados Unidos reiteraram suas ameaças à Venezuela, acusando-a de “enviar criminosos e esvaziar suas prisões”, segundo palavras do presidente Donald Trump.

Da mesma forma, os mais de 20 ataques cinéticos contra lanchas no Caribe, executados por militares estadunidenses do Comando Sul, foram justificados pela Casa Branca como combate ao crime organizado. A Venezuela demonstra, assim, que as pretensões dos EUA de intervir no hemisfério sob o pretexto do combate à delinquência apenas mascaram sua intenção de estabelecer controle geopolítico na região por meio da velha estratégia de mudanças de regime.

<><> A Venezuela vencerá

No último sábado (6), o secretário-geral do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) e ministro de Relações Interiores, Diosdado Cabello, assegurou que, diante da ameaça do governo dos Estados Unidos de atacar militarmente a república bolivariana, ao povo venezuelano “não lhe espera outra coisa senão uma grande vitória”.

“Estamos há quatro meses intensos sob ameaças de terrorismo psicológico contra o povo, e ainda assim este povo se levantou em cada situação, em cada momento, sem temor, sem pessimismo. Pelo contrário, o fez com total convicção de que estamos no caminho correto”, afirmou Cabello durante o ato de juramentação dos Comandos de Comunidade Bolivarianos Integrais (CCBI), estruturas que conformam as novas bases do partido da revolução.

Aos que planejam agredir a Venezuela para provocar uma mudança de regime, Cabello advertiu que a liderança política encabeçada pelo presidente Nicolás Maduro tem se preparado para a transição da luta não armada para a luta armada, de modo que não encontrarão um país desprevenido. Também assegurou que, caso se atrevam a uma intervenção militar, devem estar plenamente cientes de que “não durará apenas 48 horas ou três dias ou um mês”. E concluiu: “Se não se meterem conosco, perfeito. Se se meterem conosco, pois aqui estaremos.”

<><> Forças de segurança reforçadas

Também no sábado (6), no Forte Tiuna, principal complexo militar de Caracas, foi realizado o ato de juramentação e condecoração do “Contingente Setembro 2025” do pessoal da Guarda de Honra Presidencial (GHP) e da Direção Geral de Contrainteligência Militar (DGCIM).

Durante a atividade, o comandante do Batalhão de Custódia nº 3, Gabriel Alejandro Rendón Vilches, informou que 5.600 combatentes foram treinados pelo método tático de resistência revolucionária, “em perfeita fusão policial-militar-popular de homens e mulheres que demonstrarão ao mundo inteiro que a Venezuela deve ser respeitada”. Além disso, afirmou que, sob nenhuma circunstância, permitirão “a invasão de império algum” no território venezuelano.

A GHP é a escolta oficial do presidente da República, e a DGCIM se encarrega de operações especiais de resposta a ameaças externas e internas relacionadas ao terrorismo e à espionagem inimiga.

<><> Morre opositor detido por corrupção

Ainda no sábado (6), foi divulgada a notícia da morte de Alfredo Díaz, ex-governador do estado de Nueva Esparta e dirigente do Ação Democrática, que se encontrava detido na sede do Serviço Bolivariano de Inteligência (Sebin), em Caracas, sob investigação por corrupção e financiamento ilícito.

Segundo informaram seus familiares nas redes sociais, Díaz sofria de uma condição cardíaca, que teria levado ao seu falecimento. Dirigentes da oposição mais extremista, como Leopoldo López e Antonio Ledezma, começaram a instrumentalizar politicamente a morte de Díaz ao afirmar que foi causada pelo “regime de Nicolás Maduro”, embora tudo aponte para um falecimento natural. À noite, o governo da Venezuela confirmou que ele morreu de infarto.

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<><> Machado diz que irá a Oslo

A dirigente opositora María Corina Machado, que afirmou em diversas ocasiões estar “na clandestinidade”, teria confirmado que viajará a Oslo, capital da Noruega, para receber o Nobel da Paz. O prêmio foi conferido a ela há poucos meses em meio a críticas por se tratar de uma pessoa que, durante anos, promoveu sistematicamente a guerra e a intervenção militar contra seu próprio país.

 

Fonte: Por Hugo Albuquerque, em Opera Mundi

 

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