Venezuela
ensina que o imperialismo não morreu - e implica em violência
Donald
Trump resolveu reeditar a Doutrina Monroe em mais um gesto de falastronice. Ao
seu modo, ele agora aposta em reeditar a figura de Ted Roosevelt, depois de
acenar com o protecionista William McKinley no seu discurso de posse – e na sua
política, hoje bastante impopular e ineficaz de tarifaço. Como dizíamos, a
Venezuela é uma mistura de rapina, cortina de fumaça para os problemas internos
com uma tensão contra a Rússia.
Em
tempos em que uma certa marxologia metafísica vê imperialismo
em toda parte, inclusive na resistência ao dito cujo, o caricatural cerco naval
à Venezuela – com direito ao bombardeio de barcos de pesca e assassinatos que
são, a bem da verdade, crimes de guerra além de violação óbvia do direito internacional
– ensina que imperialismo é sobre guerra e demanda violência e coerção.
Não
houvesse o elemento militarista, num contexto de trocas desiguais que conduzem
à existência entre países exploradores e explorados, não haveria que se falar
em imperialismo. Assim, temos um mundo unipolar, hegemonizado pelos Estados
Unidos pela força de economia, mas pela garantia de suas armas, que está em
xeque e, por conseguinte, resolveu lutar para manter sua posição contra aquilo
que lhe desafia.
Durante
anos silenciando sobre os efeitos das sanções econômicas contra a Venezuela, a
maior causa da miséria e do fluxo de milhões de refugiados saindo de lá nos
últimos anos, hoje, partes caudalosas da esquerda brasileira precisam calibrar
o discurso na antessala de uma agressão militar contra o país latino-americano.
Isso consiste em um problema imenso para o Brasil, além de um risco assustador
para o continente.
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O que é imperialismo?
Pelo
menos desde a dinastia dos aquemênidas, sob a liderança de Ciro, o
Grande, ainda no século VI a. C., a humanidade conheceu o que é um império
propriamente dito – e não as ligas de cidades e suas propriedades
rurais e extrativistas. A partir dali, o reino da Pérsia dominou os demais
reinos iranianos, unificando-os, para depois conquistar vastidões que iam do
oeste do subcontinente indiano ao mundo helênico.
Mas é
apenas sob o capitalismo que os impérios podem e precisam se projetar para
obter novos recursos naturais e humanos, além de mercados. Aí, podemos falar
sobre imperialismo, sobretudo a partir dos anos 1880, com o consórcio de
impérios capitalistas sentando-se à mesa para partilhar o resto do
mundo. Foi o revolucionário russo Vladimir Lênin, em seu Imperialismo:
fase superior do capitalismo, que deu a grande contribuição sobre o tema.
Mas
apesar da base econômica, é impossível falar em “imperialismo” sem discutir sua
forma superestrutural – o que implica no aspecto extraeconômico que é de ordem
militar. O próprio Lênin escreve sobre isso no contexto da Primeira Guerra
Mundial, a qual foi antevista por Friedrich Engels décadas antes. Impossível
falar de imperialismo sem falar da questão militar e do militarismo.
A
característica principal das trocas desiguais que caracterizam o fenômeno
imperialista, por sua natureza, demandam coerção militar do explorador sobre o
explorado – sem a qual não é possível perpetuar o sistema. Imperialismo não é
apenas sobre “exportação de capitais”, mas uma determinada forma dessas trocas,
garantida pela força das armas – senão posta, pressuposta nas infinitas
“cúpulas diplomáticas”.
Convenientemente,
partes das esquerdas globais, ainda remanescentes, insistem em apagar o
elemento militar para discutir o imperialismo sob uma ótica economicista – ou,
por conveniência, consideram apenas o elemento militar. Dessa forma
desconjuntada, Rússia e China se tornam “imperialistas”, na melhor das
hipóteses, iguais aos Estados Unidos, quando a questão é totalmente outra – e a
Venezuela é uma prova viva disso.
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O elemento militar como características central
“Extra-econômico”,
como diria Lênin, o elemento militar é a garantia e, ao mesmo tempo, um certo
elemento indeterminado que pode mudar o curso dos efeitos econômicos – é
evidente que sem uma economia forte, é impossível se ter forças armadas
adequadas, mas capacidade de organização política e apuro estratégico podem
compensar desníveis econômicos e mudar os rumos da História.
Foi
dentro de um contexto de profunda assimetria material, mas compensada por
profunda organização política, social e militar que o presidente Mao tirou a
China do fundo do poço. O empate estratégico na Coreia, que perdura até hoje,
mais de 70 anos após o início do conflito, ensinou ao mudo que uma Nova China
havia nascido. Só isso pôde permitir e garantir o desenvolvimento material das
décadas seguintes.
O caso
venezuelano certamente é muito clássico em termos imperialistas: um país
economicamente asfixiado que agora se vê vítima de um cerco naval, sob ameaças
de bombardeio e invasão. Produtora de petróleo, ninguém acusará Caracas de ser
uma terrível “exportadora de capitais”, mas aí surge o elemento “democrático” e
os questionamentos contra uma liderança política que navegou nos últimos anos
em mar bravio.
Trump
pode se dar ao luxo de usar uma ameaça dessas não apenas pelo seu poderio
econômico, ou a natureza de sua relação econômica com a Venezuela, mas porque
possui um aparato militar pesadíssimo – inclusive para sua base econômica nada
desprezível. Hoje, viveremos a hora da verdade, e em termos bélicos, sabemos
como as coisas podem começar, mas nunca como vão terminar.
Depois
de anos de cerco econômico, o maior temor dos críticos do cerco naval de Trump
é que a missão possa transformar a Venezuela numa “nova Líbia” – um exemplo
cruelmente irônico de Hillary Clinton, levando em consideração que ela foi a
maior responsável pela destruição do país africano, até ali, em 2011, o mais
desenvolvido do seu continente. Mas se superestima os riscos da invasão e, pior
ainda, da ocupação.
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Horizontes complexos
Não se
considera a possibilidade de uma guerra assimétrica venezuelana funcionar,
transformando a ocupação num inferno – o que poderia desgraçar o governo Trump,
com risco de desmoralização total. O presidente americano, contudo, hesita no
que fazer, porque estava certo que só bastaria o cerco naval para forçar a uma
renúncia de Maduro. Então, é preciso avaliar porque esse blefe não foi
suficiente.
A
Venezuela foi um exemplo bem-sucedido de cerco econômico, muito embora esse
tipo de prática tenha se mostrado falida quando aplicada a países grandes como
a Rússia. O mercado global simplesmente se adapta nesses casos. O problema é
como russos e chineses, chutados por ocidentais do sistema global, podem
ou querem defender seus aliados mundo adentro; essa é uma questão.
O
vaticínio de Henry Kissinger para o presidente americano Richard Nixon sobre o
risco de ser amigo dos Estados Unidos – não era uma análise factual, mas uma
advertência, ao contrário da forma como isso ficou para a posteridade – poderia
servir para o presidente russo Vladimir Putin e Caracas – e isso não seria bom
para Moscou, muito embora a situação da Ucrânia possa levar a um “empate”
mórbido, a depender do que ocorra.
A
crítica de não proteger os seus é uma crítica válida ao Brics, mas apontar essa
integração entre os periféricos como expressão de um neo-imperialismo é,
certamente, uma narrativa falsificadora que varia entre um desvio teoricista ao
colaboracionismo com os podres poderes ocidentais –
encabeçados por um presidente americano que mesmo americanistas exaltados têm
dificuldades em defender.
Essa
tragédia é uma lição importante para aqueles que supõem que o mundo virou o
capítulo dos anos 1880, mesmo com duas guerras mundiais, a guerra fria e a
globalização no período. O central ainda é feito da mesma forma, ainda que com
arranjos diferentes. O fortalecimento militar estará na ordem do dia de
qualquer país que deseje se fortalecer, sobretudo se ele é maior que uma ilha
ou uma cidade-Estado.
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Após êxito na Venezuela, Maduro sugere aliança
internacional de combate ao crime organizado
O
presidente da Venezuela, Nicolás Maduro,
durante a inauguração da Academia de Serviços de Polícia da Polícia Nacional
Bolivariana (PNB), na última sexta-feira (5), ofereceu aos países vizinhos
estabelecer programas de cooperação policial e de combate ao crime organizado.
Assegurou que a Venezuela construiu um sistema policial profissional,
“científico e exemplar”, que está à disposição de outras nações para
intercâmbio de informações e operações conjuntas.
O líder
chavista destacou ainda que os organismos de segurança da Venezuela venceram
todos os grandes grupos criminosos, citando os casos do Tren de Aragua —
desarticulado e desaparecido no país —, do Tren del Llano, do bando de
Wuilexis, em Petare, e do grupo Koki na Cota 905, em Caracas. Todas essas
organizações conformavam o que se passou a chamar de “megabandos”, pois
chegaram a acumular, em alguns casos, até 200 integrantes dedicados ao
sequestro, à extorsão e ao tráfico de armas e entorpecentes.
Essas
declarações se inserem em um contexto no qual os Estados Unidos reiteraram suas
ameaças à Venezuela, acusando-a de “enviar criminosos e esvaziar suas prisões”,
segundo palavras do presidente Donald Trump.
Da
mesma forma, os mais de 20 ataques cinéticos contra lanchas no Caribe,
executados por militares estadunidenses do Comando Sul, foram justificados pela
Casa Branca como combate ao crime organizado. A Venezuela demonstra, assim, que
as pretensões dos EUA de intervir no hemisfério sob o pretexto do combate à
delinquência apenas mascaram sua intenção de estabelecer controle geopolítico
na região por meio da velha estratégia de mudanças de regime.
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A Venezuela vencerá
No
último sábado (6), o secretário-geral do Partido Socialista Unido da Venezuela
(PSUV) e
ministro de Relações Interiores, Diosdado Cabello, assegurou que, diante da
ameaça do governo dos Estados Unidos de atacar militarmente a república
bolivariana, ao povo venezuelano “não lhe espera outra coisa senão uma grande
vitória”.
“Estamos
há quatro meses intensos sob ameaças de terrorismo psicológico contra o povo, e
ainda assim este povo se levantou em cada situação, em cada momento, sem temor,
sem pessimismo. Pelo contrário, o fez com total convicção de que estamos no
caminho correto”, afirmou Cabello durante o ato de juramentação dos Comandos de
Comunidade Bolivarianos Integrais (CCBI), estruturas que conformam as novas
bases do partido da revolução.
Aos que
planejam agredir a Venezuela para provocar uma mudança de regime, Cabello
advertiu que a liderança política encabeçada pelo presidente Nicolás Maduro tem
se preparado para a transição da luta não armada para a luta armada, de modo
que não encontrarão um país desprevenido. Também assegurou que, caso se
atrevam a uma intervenção militar, devem estar plenamente cientes de que “não
durará apenas 48 horas ou três dias ou um mês”. E concluiu: “Se não se meterem
conosco, perfeito. Se se meterem conosco, pois aqui estaremos.”
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Forças de segurança reforçadas
Também
no sábado (6), no Forte Tiuna, principal complexo militar de Caracas, foi
realizado o ato de juramentação e condecoração do “Contingente Setembro 2025”
do pessoal da Guarda de Honra Presidencial (GHP) e da Direção Geral de
Contrainteligência Militar (DGCIM).
Durante
a atividade, o comandante do Batalhão de Custódia nº 3, Gabriel Alejandro
Rendón Vilches, informou que 5.600 combatentes foram treinados pelo método
tático de resistência revolucionária, “em perfeita fusão
policial-militar-popular de homens e mulheres que demonstrarão ao mundo inteiro
que a Venezuela deve ser respeitada”. Além disso, afirmou que, sob nenhuma
circunstância, permitirão “a invasão de império algum” no território
venezuelano.
A GHP é
a escolta oficial do presidente da República, e a DGCIM se encarrega de
operações especiais de resposta a ameaças externas e internas relacionadas ao
terrorismo e à espionagem inimiga.
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Morre opositor detido por corrupção
Ainda
no sábado (6), foi divulgada a notícia da morte de Alfredo Díaz, ex-governador
do estado de Nueva Esparta e dirigente do Ação Democrática, que se encontrava
detido na sede do Serviço Bolivariano de Inteligência (Sebin), em Caracas, sob
investigação por corrupção e financiamento ilícito.
Segundo
informaram seus familiares nas redes sociais, Díaz sofria de uma condição
cardíaca, que teria levado ao seu falecimento. Dirigentes da oposição mais
extremista, como Leopoldo López e Antonio Ledezma, começaram a instrumentalizar
politicamente a morte de Díaz ao afirmar que foi causada pelo “regime de
Nicolás Maduro”, embora tudo aponte para um falecimento natural. À noite, o
governo da Venezuela confirmou que ele morreu de infarto.
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Machado diz que irá a Oslo
A
dirigente opositora María Corina Machado, que afirmou em diversas ocasiões
estar “na clandestinidade”, teria confirmado que viajará a Oslo, capital da
Noruega, para receber o Nobel da Paz. O prêmio foi
conferido a ela há poucos meses em meio a críticas por se tratar de uma pessoa
que, durante anos, promoveu sistematicamente a guerra e a intervenção militar
contra seu próprio país.
Fonte:
Por Hugo Albuquerque, em Opera Mundi

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