quinta-feira, 11 de dezembro de 2025

Molécula do intestino pode ajudar no controle da diabetes, diz estudo

A diabetes tipo 2 é uma das doenças que mais crescem no mundo e está profundamente ligada à resistência à insulina — uma condição em que o corpo deixa de responder adequadamente ao hormônio responsável por controlar a glicose no sangue. Essa resistência costuma vir acompanhada de um estado de inflamação crônica, que agrava o quadro metabólico. Por isso, entender como o organismo regula a inflamação se tornou uma das principais frentes de pesquisa na ciência do metabolismo.

O novo estudo publicado nesta segunta-feira (8/12) na revista Nature Metabolism revela um elemento inesperado nessa equação: uma molécula produzida pela própria microbiota intestinal chamada trimetilamina (TMA), que consegue interferir diretamente na forma como o sistema imunológico reage a estímulos inflamatórios, ajudando a proteger o metabolismo. Para chegar a essa conclusão, a equipe de cientistas estudou camundongos que foram alimentados com uma dieta gordurosa, modelo clássico utilizado para induzir a obesidade e piora da tolerância à glicose.

Ao analisar a urina desses animais, os cientistas notaram que a TMA aumentava de forma constante nos animais expostos a esse tipo de alimentação. Isso motivou a investigação mais profunda sobre o real papel da molécula. A partir daí, os pesquisadores utilizaram métodos avançados de triagem para avaliar se a TMA poderia interagir com proteínas específicas do sistema imunológico. Eles identificaram que a molécula é capaz de inibir a IRAK4, uma enzima que funciona como ponto central da via inflamatória ativada pelo receptor TLR4, responsável por identificar sinais de “perigo” no corpo. Quando essa enzima é bloqueada, a resposta inflamatória diminui de maneira significativa.

Esse efeito foi observado tanto em células humanas isoladas quanto em modelos animais. Nos camundongos, além de reduzir marcadores inflamatórios, a ação da TMA também melhorou a tolerância à glicose, mesmo que os animais continuassem com sobrepeso induzido pela dieta. Ou seja: a molécula não impediu o ganho de peso, mas conseguiu proteger o organismo dos efeitos metabólicos negativos da inflamação, um fator-chave para o desenvolvimento da diabetes tipo 2.

<><> Diabetes tipo 2

•        A diabetes tipo 2 é uma doença crônica marcada pela resistência à insulina e pelo aumento dos níveis de glicose no sangue.

•        Mais comum em adultos, a condição está frequentemente relacionada à obesidade e ao envelhecimento.

•        Entre os principais sintomas estão sede excessiva, urina frequente, fadiga, visão embaçada, feridas de cicatrização lenta, fome constante e perda de peso sem causa aparente.

•        O tratamento envolve medicamentos para controlar a glicemia e, em alguns casos, aplicação de insulina.

•        Mudanças no estilo de vida, como perda de peso, alimentação equilibrada e prática regular de exercícios, são essenciais para o controle da doença.

<><> Diabetes como alvo terapêutico

Outro ponto importante é que os cientistas confirmaram esse efeito por diferentes vias. Eles testaram tanto a inibição química quanto a eliminação genética de IRAK4, e ambas reproduziram os benefícios observados com a TMA. Isso reforça que o alvo terapêutico da molécula está bem definido e abre possibilidades para o desenvolvimento de medicamentos que atuem exatamente nesse ponto da via inflamatória.

Apesar da empolgação, os autores do estudo ressaltam que os experimentos foram realizados principalmente em camundongos e células humanas, o que significa que ainda não é possível afirmar como a molécula se comporta em pessoas. Também existe a necessidade de compreender melhor a relação entre TMA e TMAO — outra substância derivada dela e já associada a riscos cardiovasculares. A ação cada vez mais detalhada dessas moléculas no organismo humano ainda exige estudos futuros, especialmente em relação à segurança. Se esses achados forem confirmados em humanos, eles podem dar origem a novas estratégias — que vão desde intervenções nutricionais até terapias inovadoras — para prevenir ou tratar a diabetes tipo 2.

•        Diabetes tipo 2: quais são os principais sintomas e como se manifestam

A diabetes tipo 2 é uma doença silenciosa, mas que costuma dar diversos sinais antes do diagnóstico — muitos deles confundidos com rotina cansativa, estresse ou pequenas indisposições do dia a dia. De acordo com o Ministério da Saúde, a condição surge quando o corpo se torna resistente à insulina ou quando o pâncreas passa a produzir menos desse hormônio, elevando os níveis de glicose no sangue de forma persistente. Embora seja comum, o problema pode avançar sem que a pessoa perceba, tornando essencial entender seus sintomas.

O endocrinologista Fernando Valente reforça que o desafio começa justamente porque os sinais nem sempre são claros. “Os sintomas da diabetes são inespecíficos e muita gente só descobre a doença quando já está com complicações”, ensina. Essa falta de especificidade contribui para o atraso no diagnóstico, segundo o especialista.

A endocrinologista Valdirene Jácomo, da Clínica Vivace, lembra que a diabetes tipo 2 é uma doença sistêmica, capaz de afetar diferentes partes do corpo. Por isso, os sintomas podem aparecer na visão, na pele, na circulação, no metabolismo e até na sensibilidade dos pés e das mãos. A seguir, confira os sinais mais comuns da diabetes tipo 2.

<><> Sede intensa e urina frequente

Um dos primeiros sintomas percebidos é o aumento da sede e da vontade de urinar. Quando o açúcar no sangue está alto, os rins tentam eliminar o excesso, produzindo mais urina. Isso provoca desidratação e reforça ainda mais a sensação de sede. Segundo o Ministério da Saúde, esse ciclo é um dos principais indicadores da diabetes tipo 2, especialmente se ocorrer de forma contínua.

<><> Fome exagerada mesmo após comer

Como a glicose não consegue entrar corretamente nas células, o corpo passa a interpretar que falta energia — mesmo quando a pessoa está se alimentando normalmente. O resultado é uma sensação de fome constante. Valente explica que essa oscilação de energia contribui para o cansaço e para mudanças de apetite. “O corpo tenta compensar o açúcar que não está sendo utilizado da forma correta”, conta.

<><> Cansaço e sensação de falta de energia

A pouca eficiência na utilização da glicose também causa exaustão. Atividades simples parecem demandar mais esforço, e o corpo sente falta de energia. O cansaço persistente é comum em quem já está com níveis elevados de glicose sem perceber.

<><> Visão embaçada

O aumento da glicose pode alterar o foco dos olhos temporariamente. Por isso, muitas pessoas associam o sintoma ao cansaço visual, quando na verdade pode ser um sinal precoce da diabetes. Valdirene reforça que alterações na visão não devem ser ignoradas. “A diabetes pode provocar mudanças nos vasos sanguíneos dos olhos desde cedo, mesmo antes do diagnóstico formal”, alerta a médica.

<><> Feridas que demoram a cicatrizar

O açúcar elevado interfere na circulação e no sistema imunológico, dificultando a cicatrização. Cortes, arranhões e até pequenos machucados passam a demorar mais tempo para fechar. Essa lentidão é um indicativo de que o corpo não está conseguindo se recuperar como deveria.

<><> Infecções insistentes

Infecções urinárias, candidíase, problemas de pele e inflamações recorrentes são comuns em pessoas com glicose elevada. Como o excesso de açúcar favorece a proliferação de microrganismos e reduz a resposta imune, episódios repetidos podem ser um sinal de alerta. Valdirene lembra que a doença afeta várias áreas do organismo, e isso acaba abrindo portas para infecções frequentes.

<><> Dormência, formigamento e sensação de “agulhadas”

A persistência da glicose alta pode danificar nervos periféricos — especialmente nos pés e mãos — causando formigamento, dormência ou sensação de choques leves.

Valente alerta que esse sintoma aparece quando a diabetes já está mais avançada: “A neuropatia pode surgir silenciosamente e evoluir sem dor no início”, ensina o endocrinologista.

Mesmo com esses sinais, apenas exames confirmam o diagnóstico. O Ministério da Saúde recomenda avaliação com glicemia de jejum, hemoglobina glicada (HbA1c) e, quando necessário, o teste de tolerância à glicose. Detectar cedo evita complicações como problemas renais, cardiovasculares, perda de visão e neuropatia — todas associadas à diabetes não controlada. A combinação de atenção aos sintomas, exames regulares e acompanhamento profissional permite identificar a diabetes tipo 2 antes que ela cause danos mais sérios. Saber reconhecer os sinais é, muitas vezes, o primeiro passo para um tratamento eficaz e prevenção.

•        Por que agora é indicado rastrear diabetes tipo 2 a partir dos 35?

A Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) atualizou as diretrizes para o rastreamento e diagnóstico do diabetes tipo 2 no Brasil. Entre as principais mudanças estão a redução da idade para início da triagem em adultos assintomáticos, a inclusão de alerta para rastreio em crianças e adolescentes e a alteração em alguns critérios nos exames usados para diagnóstico. O documento foi publicado em março na revista científica Diabetology & Metabolic Syndrome.

A atualização ganha relevância diante do crescente aumento de casos de diabetes tipo 2,¬ em grande parte, devido às altas taxas de sobrepeso e obesidade na população global. Segundo a 11ª edição do Atlas da Federação Internacional de Diabetes (IDF), cerca de 589 milhões de adultos entre 20 e 79 anos vivem com a doença no mundo. No Brasil, a estimativa da SBD é de que cerca de 20 milhões de pessoas convivam atualmente com diabetes, o que representa aproximadamente 10,2% da população.

Uma das principais mudanças nas novas diretrizes para o rastreamento da diabetes tipo 2 é a ampliação da faixa etária e dos critérios para início da triagem. A nova recomendação é de que todos os adultos a partir dos 35 anos sejam submetidos ao rastreio, mesmo que não apresentem sintomas ou fatores de risco conhecidos. Antes, essa indicação era a partir dos 45.

Já para pessoas com menos de 35 anos, o rastreamento também é indicado caso tenham sobrepeso ou obesidade, desde que associado a pelo menos um fator de risco adicional. Entre esses fatores estão: histórico familiar de diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares, hipertensão arterial, níveis baixos de HDL (inferiores a 35 mg/dl), triglicerídeos elevados (acima de 250 mg/dl), síndrome dos ovários policísticos, presença de acantose nigricans (pequenas manchas escuras em tons de marrom na pele) e sedentarismo. Também devem ser considerados antecedentes como pré-diabetes detectado em exames anteriores ou histórico de diabetes gestacional.

<><> Saiba sinais que podem indicar que você tem diabetes

•        Sensação de cansaço e irritabilidade.

•        Visão turva

•        Sede excessiva.

•        Fome frequente.

•        Boca seca.

•        Doença periodontal.

•        Feridas que demoram para cicatrizar.

•        Formigamento nos pés e mãos.

•        Perda de peso.

•        Coceira ao redor do pênis ou vagina, ou episódios recorrentes de candidíase.

•        Vontade excessiva de urinar.

•        Coceira na pele.

•        Manchas escuras na pele.

•        Infecções frequentes.

O endocrinologista Paulo Rosenbaum, do Hospital Israelita Albert Einstein, destaca a importância da atualização. “Cada vez mais vemos pessoas jovens com alterações na glicemia associadas a fatores como obesidade e sedentarismo. A diabetes é uma doença silenciosa e, quando a glicemia começa a subir, o risco de complicações cardiovasculares já está presente. Diagnosticar cedo é essencial para prevenir problemas futuros”, afirma. No caso de crianças e adolescentes assintomáticos, a recomendação da diretriz é iniciar o rastreamento após os 10 de idade ou depois do início da puberdade (o que vier primeiro) naqueles com sobrepeso ou obesidade e com pelo menos um fator de risco adicional – entre eles, a mãe ter tido diabetes gestacional.

<><> Exames diagnósticos para diabetes

As novas diretrizes para o rastreamento da diabetes tipo 2 mantêm os exames de glicemia de jejum e hemoglobina glicada (A1c) como padrão inicial de triagem. A recomendação é que ambos os exames sejam realizados em conjunto para confirmação diagnóstica. “Se a hemoglobina glicada estiver igual ou acima de 6,5% e a glicemia de jejum for igual ou superior a 126 mg/dl, não há necessidade de exames adicionais — esses níveis já são compatíveis com o diagnóstico de diabetes. Mas, se apenas um deles estiver alterado, é preciso repetir os testes para confirmar”, explica a endocrinologista Melanie Rodacki, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), membro do Departamento de Diretrizes da SBD e uma das autoras da atualização.

Rodacki ressalta ainda que, em casos sintomáticos – como sede excessiva, urina frequente, fome aumentada e perda de peso não intencional –, a presença de glicemia igual ou superior a 200 mg/dl (mesmo sem jejum) já é suficiente para fechar o diagnóstico, sem a necessidade de novo exame. Para situações em que os níveis de glicose em jejum e da hemoglobina glicada estejam fora da faixa considerada normal, mas ainda não configurem diabetes, a diretriz recomenda o teste de tolerância à glicose oral (TTGO).

E é justamente nesse exame que surge uma das principais novidades: antes realizado com uma segunda coleta duas horas após a ingestão de glicose, o TTGO agora passa a ter essa etapa feita após apenas uma hora. O objetivo é identificar precocemente casos de pré-diabetes, seguindo orientações da Federação Internacional de Diabetes. O teste continua exigindo jejum prévio e uma primeira coleta de sangue. Depois, o paciente ingere uma solução com 75 g de glicose diluída em água, e a nova coleta é feita uma hora depois. “Não estamos dizendo que o teste de duas horas não é válido, ele também é um critério para diagnóstico. A diferença é que o exame de uma hora é mais simples, rápido e menos custoso, o que facilita sua realização em centros de diagnóstico e amplia o acesso. Ele consegue prever o risco de diabetes de forma mais precoce em pessoas de alto risco. Por isso, optamos por incluí-lo nas diretrizes brasileiras”, afirma a especialista da SBD.

Sobre a mudança no TTGO, Rosenbaum reforça que o novo protocolo tem potencial de aumentar em até 40% a detecção de casos de pré-diabetes. “Mesmo antes do diagnóstico de diabetes em si, quando a glicemia está apenas discretamente elevada, já existe um processo inflamatório em curso que favorece a aterosclerose. Isso aumenta o risco de infarto, acidente vascular cerebral (AVC) e outras complicações. Detectar alterações discretas nos níveis de glicose permite iniciar precocemente intervenções preventivas, sobretudo não farmacológicas, como dieta e atividade física, medidas simples que podem evitar a progressão da doença e suas consequências a longo prazo”, destaca.

Outra inovação importante é a criação de um fluxograma clínico que orienta profissionais de saúde sobre quais exames solicitar, em que momento e para quais perfis de pacientes. “Sempre houve dúvidas sobre como conduzir o rastreamento, então desenvolvemos um material baseado em evidências científicas, para ajudar médicos de todo o país a agir com segurança, no tempo certo, e de forma prática, facilitando o diagnóstico precoce em diferentes contextos do sistema de saúde”, conclui Rodacki.

 

Fonte: Metrópoles/Agencia Einstein

 

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