Escândalo
Credcesta na BA: conluios expõe mistura de assédio, consignado não autorizado e
contratos fictícios
O golpe
não está somente no telefonema anônimo nem na mensagem de WhatsApp. Ele também
pode ter CNPJ, balcão, publicidade em horário nobre e autorização para operar.
Na Bahia e no Brasil, financeiras e bancos que prometem “crédito fácil” estão
empurrando juros abusivos, refinanciamentos disfarçados, empréstimos
consignados não autorizados e ofertas enganosas que transformam aposentados,
servidores e trabalhadores endividados em presas perfeitas.
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Consignado sem consentimento
O
Credcesta, consignado vinculado ao Banco Master, virou símbolo desse sistema de
crédito. E mais: tornou-se sinônimo de abuso financeiro contra servidores
públicos da Bahia. Com autorização exclusiva concedida por decretos estaduais
em 2018 e 2022, o cartão monopolizou os contratos de empréstimos consignados da
categoria, transformando o que deveria ser uma opção em uma armadilha
institucionalizada. Desde então, servidores têm sido alvo de uma avalanche de
ligações invasivas e propostas agressivas de crédito, muitas vezes seguidas de
descontos em folha sem qualquer autorização formal.
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Credcesta na mira
A
situação é tão grave que a Associação dos Funcionários Públicos do Estado da
Bahia (Afpeb) levou o caso ao Tribunal de Justiça, denunciando fraudes
documentadas, taxas de juros que chegam a 100% ao ano e um esquema que mais
parece uma máquina de moer salário do que um serviço financeiro. O Credcesta,
longe de ser um benefício, virou um pesadelo travestido de conveniência.
“Essas
condutas abusivas, incluindo cobranças por compras no cartão que não foram de
fato efetuadas pelo beneficiário, endividaram severamente inúmeros funcionários
públicos, que viram grande parte de seus vencimentos ser consumida pelo
pagamento de dívidas do Credcesta”, disse o advogado da associação, Jorge
Falcão Rios, à coluna Metropolítica.
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Créditos à força
Marcelo
Bastos, ouvinte da Metropole, denunciou o Credcesta: “Recebi indevidamente uma
cobrança de quase R$50 referente a seguro proteção do cartão que nunca
solicitei e nunca tive. Essa cobrança perdurou por meses e, a cada novo mês, eu
entrava em contato com a instituição para retirar a cobrança do meu
contracheque, fato que nunca ocorreu. Depois de mais de R$400 pagos e sem
resolução, entrei com uma ação judicial, eles não ofereceram proposta de
acordo, bem como recorreram de todas as decisões. Finalmente foram
sentenciados, onde não cabe mais recurso, porém até agora não recebi o repasse
dos valores devidos”.
Marcelo
não é o único. Outro ouvinte reclama de ligações abusivas. Diego Bastos relata
que a mãe, aposentada, recebe ligações do banco mais de 20 vezes ao dia. “Chato
e invasivo”, classificou ele.
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Exclusividade que virou armadilha
O Banco
Master, dono do Credcesta, assumiu em 2019 o controle dos consignados do estado
como uma espécie de herança da privatização da Ebal (Empresa Baiana de
Alimentos ou simplesmente Cesta do Povo), que centralizava dados e benefícios
de trabalhadores do Estado. Essa carteira foi passada para o Master e o modelo
de cartão consignado foi posteriormente fortalecido por decretos estaduais que
lhe garantiram exclusividade (o que, na prática, significa que o servidor só
podia contratar esse consignado, mesmo que preferisse outro banco). Depois
divulgação o Credcesta expandiu por meio de associações conveniadas e
prefeituras (incluindo a de Salvador), que funcionam como intermediárias
obrigatórias para muitos servidores. Esse arranjo reduziu a concorrência e facilitou
práticas denunciadas pelos trabalhadores, como assédio comercial, descontos não
autorizados em folha, compras e saques desconhecidos e operações de crédito
registradas sem consentimento. Foi assim que o Credcesta tornou-se um dos casos
mais graves de endividamento compulsório envolvendo servidores públicos na
Bahia.
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Quando o banco decide por você
Apesar
das vantagens do Credcesta, ele não é o único no modelo que empurra ao
consumidor juros abusivos, empréstimos não autorizados e ofertas enganosas. Uma
aposentada de 67 anos, por exemplo, contou que, ao conferir o extrato do
benefício, percebeu a cobrança de parcelas de um empréstimo consignado que
afirma nunca ter contratado com o C6 Bank. Segundo ela, o desconto começou sem
aviso e sem ligação prévia. A cada mês, o valor era debitado automaticamente.
“Eu nunca solicitei esse empréstimo. Só quero que devolvam o que tiraram do meu
benefício”, disse. De acordo com ela, que pediu anonimato, o débito inesperado
comprometeu parte da renda usada para comprar remédios e pagar contas básicas.
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Ranking do tormento
Não é
exatamente surpresa que clientes reclamem do C6 Bank. A aposentada que
descobriu um consignado não solicitado no extrato não está sozinha; ela
simplesmente caiu nas mãos do segundo banco mais reclamado do país, segundo o
próprio Banco Central. Afinal, conquistar o vice-campeonato nacional em queixas
exige dedicação: são reclamações que vão de descontos indevidos a contratos que
ninguém lembra de ter assinado. No currículo do banco, há ainda investigações
do Ministério Público sobre operações feitas sem autorização do beneficiário. E
a ironia é que o C6 nem corre sozinho nessa pista. Ele divide o pódio com um
pelotão inteiro de instituições que se especializaram em transformar
aposentados e servidores em alvo preferencial: Crefisa, Credcesta, BMG, Pan,
Help, Zema Crédito, Olé, Safra Financeira, Facta, Agibank, Banco Daycoval;
todos eles colecionam queixas. Um mercado onde o crédito é fácil.
Um
banco que cresceu rapidamente no setor de consignados é o Agibank, chegando a
1,57 milhão de empréstimos na carteira atualmente e a R$ 14,8 bilhões
repassados pelo INSS desde 2020. Mas o que também cresce rapidamente é a dívida
dos que contratam algum serviço com a financeira. A técnica de enfermagem Diana
Sena conta que precisou de um empréstimo e que até hoje sofre com os juros
“absurdos”. “Hoje eu me arrependo de ter escolhido esse banco, mas ele foi o
único que no momento me ofereceu uma boa oferta, infelizmente nem tudo é o que
parece”. E não é à toa: no ranking de reclamações do BC, do 3º trimestre deste
ano, o Agibank aparece em 8º lugar.
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Terreno fértil para abusos
Para
Ione Amorim, economista do Idec (Instituto de Defesa de Consumidores), o
consignado cresceu apoiado na falsa sensação de segurança. Apesar de ser
vendido como crédito de “baixo risco” por causa do desconto direto em folha, o
modelo abriu espaço para uma série de distorções. Ela lembra que o produto foi
incorporado ao sistema financeiro em 2003 e, desde então, tornou-se uma das
maiores linhas de crédito do país, ampliada pela entrada zada de crédito, que
já não passa mais por agências físicas, mas por aplicativos, de fintechs,
bancos digitais e uma vasta rede de intermediários. “O crédito consignado tem
acessibilidade por ter o desconto em folha. E, logicamente, com esse movimento
vieram muitas ações abusivas de concessão de crédito sem solicitação”, afirma.
Ione
também aponta que o principal gargalo está na incapacidade de fiscalização. O
BC, responsável por supervisionar o sistema financeiro, não consegue acompanhar
o ritmo da oferta digitalidivulgação ligações, redes sociais e até mensagens
automatizadas. Nesse cenário, criminosos e correspondentes mal-intencionados
usam engenharia social para simular consentimento, inclusive com o uso indevido
de biometria. A vítima, principalmente idosos e moradores de regiões sem
Procon, agências ou acesso fácil à informação, muitas vezes nem percebe que
está sendo enganada.
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INSS na lupa
Diante
do aumento das denúncias de empréstimos consignados feitos sem autorização, o
INSS afirma, em nota ao Jornal Metropole, ter apertado as regras para impedir
novas fraudes. Segundo a autarquia, a atual gestão passou a revisar todos os
acordos firmados com instituições financeiras e adotou medidas mais rígidas
para coibir abusos.
Como
parte desse pente-fino, 19 Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) foram
rescindidos por descumprimento de normas, outros 4 estão suspensos, e 4
instituições pediram a saída voluntária do sistema. O INSS informa ainda que 3
acordos expiraram e não foram renovados. A autarquia também firmou novos termos
de compromisso, incluindo um que determinou a restituição de mais de R$ 7
milhões cobrados indevidamente de cerca de 100 mil beneficiários.
De
acordo com o órgão, qualquer convênio com bancos e financeiras só será mantido
caso as regras sejam seguidas à risca, principalmente no que diz respeito à
transparência e à proteção dos segurados.O INSS ressalta que “não há tolerância
para omissões ou manutenção de acordos diante de suspeitas de irregularidade” e
que o objetivo é “assegurar um ambiente de respeito aos direitos do segurado”.
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O caso Agibank
O INSS
suspendeu por tempo indeterminado as novas averbações de crédito consignado do
Agibank após uma auditoria da CGU revelar irregularidades graves, incluindo
milhares de contratos feitos sem consentimento dos beneficiários, 1.192
assinados após a morte dos titulares, alguns até com benefícios já cessados, e
um caso de refinanciamento fraudulento que adicionou mais de R$ 17 mil a uma
dívida sem que o valor fosse repassado ao segurado. A CGU também identificou um
padrão suspeito de operações com juros muito abaixo do mercado, possivelmente
para burlar mecanismos de controle. O caso foi enviado à Polícia Federal e à
Corregedoria do INSS, e a suspensão vale até a conclusão do processo
administrativo.
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Credcesta ao deus dará
Enquanto
isso, o Credcesta segue solto. Apenas o governo do Paraná bloqueou o lançamento
de descontos em folha por meio dos cartões de benefícios Credcesta e Mettacard,
ligados ao Banco Master, liquidado pelo Banco Central (BC) em 18 de novembro
após a identificação de violações de normas do sistema financeiro. Diante da
repercussão do caso e do histórico de operação do Banco Master na Bahia,
questionamos o Governo do Estado e a Prefeitura de Salvador sobre eventuais
posicionamentos ou medidas locais relacionadas ao episódio. Até o fechamento
desta reportagem, nenhuma das gestões enviou resposta.
• Caso Master mostra força do lobby e de
articulações políticas e expõe a podridão que vigora em Brasília
O caso
Master extrapolou os limites do sistema financeiro, provocou um rebuliço
político e institucional e reacendeu o debate sobre os limites da defesa de
interesses privados junto ao poder público.
A
prisão cinematográfica do controlador Daniel Vorcaro e a operação da Polícia
Federal (PF) — que embasou a liquidação extrajudicial da instituição pelo Banco
Central (BC) — expuseram as relações pouco republicanas que o empresário
cultivou nos últimos anos com figuras influentes do cenário nacional,
evidenciando o uso de lobby e de articulações políticas para a expansão
vertiginosa do banco.
O
Master já dava sinais de práticas nebulosas muito antes da intervenção que
desnudou a fraude bilionária. Desde 2022, o crescimento acelerado e atípico no
volume de captação via CDBs de alto rendimento e a expansão do crédito
consignado chamaram a atenção de reguladores e do próprio mercado.
A
desconfiança se cristalizou no início de 2024, quando as primeiras informações
internas sobre desequilíbrios contábeis se alastraram em Brasília e no mercado
financeiro.
No
início de 2025, a tentativa de compra do Master pelo Banco de Brasília (BRB) —
inicialmente suspensa por ação do Ministério Público e, depois, definitivamente
travada pelo próprio BC — reforçou a percepção de que a instituição estava sob
forte risco.
O BRB é
controlado pelo governo do Distrito Federal, o que evidenciou os contornos
políticos que atingiriam articuladores no Congresso e figuras próximas aos
governos estaduais e federal.
Para o
cientista político João Lucas Moreira Pires, o episódio afeta diretamente a
confiança nas instituições. "Produz a sensação de que existe uma elite
circulando entre gabinetes, ministérios, fundos públicos e órgãos reguladores
com uma liberdade que não está ao alcance do cidadão comum”, diz.
Vinícius
Rodrigues Vieira, professor de Economia e Relações Internacionais da Faap,
destaca a mentalidade por trás das manobras. “Tudo indica que, no caso do Banco
Master, tudo ocorreu por conta daquilo que a gente chama no Brasil de ‘costas
quentes’”, afirma.
"[Vorcaro]
estava claramente confiando que o banco seria salvo de alguma forma — fosse
pela venda iminente ou por algum aceno regulatório", diz Vieira. "E é
importante destacar: estamos diante de operações que envolvem bancos e órgãos
públicos, ou seja, decisões que necessariamente passam pelo Estado brasileiro.
Fica evidente que há conexões que precisam ser investigadas.”
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Lobby de Vorcaro não tem fronteiras
A rede
de influência de Vorcaro atravessa todo o espectro político — de líderes do
Centrão a figuras de destaque do PT — e alcança representantes dos três
Poderes, revelando a capilaridade dessas conexões e alimentando ataques e
disputas narrativas por todos os lados.
Aliados
do governo Lula destacam a participação de Ciro Nogueira (PP-PI), considerado o
principal articulador da inclusão da “emenda Master”. A proposta elevaria de R$
250 mil para R$ 1 milhão a cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC), o
que permitiria ao banco aumentar a alavancagem via emissão de CDBs com
rendimentos acima dos de mercado.
Também
citam Antônio Rueda, presidente do União Brasil, por ter atuado para viabilizar
a compra do Master pelo BRB, enquanto Izalci Lucas (PL-DF) é apontado por ter
recuado repentinamente do pedido de CPI que investigaria a instituição.
“As
manobras para impedir uma CPMI, as tentativas de pressionar o Banco Central, a
articulação para ampliar a cobertura do FGC mostram como o lobby, quando
praticado de forma informal e sem transparência, pode produzir distorções
profundas na ordem democrática”, diz Pires.
Na
outra ponta, a oposição aponta os vínculos do Master com o governo do PT da
Bahia, sobretudo a proximidade entre o senador Jaques Wagner e Augusto Lima —
ex-sócio de Vorcaro e figura central nos contratos de empréstimo consignado no
estado.
As
suspeitas se concentram na estrutura dessas operações para servidores públicos
baianos — concedidas ao Master/Credcesta por decretos estaduais contestados
judicialmente — e em denúncias de descontos indevidos em folha, além de
empréstimos não autorizados, juros abusivos e contratos firmados sem licitação.
A
oposição cita ainda convênios mantidos pelo Tribunal de Justiça da Bahia,
válidos até 2027, mesmo após a escalada do escândalo.
Em
vídeo nas redes sociais, a ex-deputada federal Cristiane Brasil (PL) comparou a
relação do Master com o PT da Bahia como um "Mensalão 2.0". Ela
afirmou que “o Augusto Lima era embaixador do PT dentro do Banco Master”,
sugerindo que a articulação envolvendo consignados para servidores públicos
baianos reproduzia padrões já vistos em escândalos anteriores.
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Relações incluem ministros do STF
Fechando
o círculo de influências, o caso ainda respinga no Supremo Tribunal Federal. O
ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, integrou o comitê consultivo
estratégico do Master. Ele foi contratado pelo banco assim que se aposentou do
STF e, em seguida, deixou o cargo para assumir posição no governo.
O
Master também contratou o escritório de advocacia de Viviane Barci de Moraes —
esposa do ministro Alexandre de Moraes — para representá-lo judicialmente.
Embora não haja evidências de irregularidades no contrato, a repercussão foi
grande porque ocorreu num momento em que o banco já enfrentava críticas pela
expansão acelerada e por suas conexões com o mundo político.
Além
disso, reforçou a percepção de que o Master buscava algum tipo de proteção
institucional e levantou questionamentos sobre um possível conflito de
interesse.
“Pode
ter aí um conflito de interesse”, diz Vieira. “Aí tem que ver se há ações
julgadas, enfim, fica tudo muito nebuloso. O fato me pareceu o mais, não vou
dizer escandaloso, mas o mais surpreendente. Porque eu pensei: por que vão
contratar a esposa de um ministro do Supremo? Tem algo que pode beirar o
tráfico de influência.”
Também
colocam os ministros em foco a participação em uma série de eventos e fóruns
nacionais e internacionais patrocinados pelo Master. Esses encontros incluíram
jantares institucionais, seminários e conferências em Nova York, Londres,
Paris, Roma e no Rio de Janeiro, bancados por Vorcaro mesmo quando o nome da
instituição não aparecia oficialmente na lista de patrocinadores.
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Toffoli decidirá sobre processo de investigados do Master
Serão
esses mesmos ministros que agora julgarão os envolvidos na operação da PF. Na
noite da última sexta-feira (28), a desembargadora Solange Salgado, do TRF-1,
revogou a prisão preventiva de Vorcaro e de outros quatro executivos
investigados.
O que
aconteceu com os banqueiros que foram presos ou condenados no Brasil
A
decisão — tomada após o quarto pedido de habeas corpus da defesa — ocorreu no
mesmo dia em que os advogados conseguiram deslocar o caso da Justiça Federal
para o STF, alegando que a investigação cita um parlamentar federal com foro
privilegiado.
No
sorteio, o processo principal ficou sob a relatoria do ministro Dias Toffoli,
apesar de Nunes Marques já ser o relator de um processo relacionado ao
parlamentar mencionado nos autos.
Para o
constitucionalista André Marsiglia, a manobra jurídica já era esperada. “A
gente dizia que o caso Banco Master iria parar no STF”, lembrou em comentário
nas redes sociais, ironizando o encaminhamento a Toffoli.
“E aí,
por sorteio, caiu justamente com o ministro Dias Toffoli, aquele que acabou com
a Lava Jato”, afirma. “A gente teme muito que, como aconteceu no passado, o
processo do Banco Master seja simplesmente enterrado.”
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Regulamentação do lobby é insuficiente
Na
prática, o caso deve reacender a necessidade de regulamentação das relações do
setor privado com o poder público na defesa de interesses. “[A situação do
Master] se sustentou graças à existência de uma rede de proteção política que
atuava justamente na zona cinzenta entre o lobby legítimo e a captura
institucional”, diz Pires.
Para
Vieira, o país ainda carece de mecanismos básicos de transparência e
rastreabilidade das interações entre Estado e iniciativa privada. “É o que se
chama accountability, uma prática que não temos no país”, afirma.
“O
lobby poderia ser regulamentado de forma a garantir transparência total sobre
quem deputados, senadores e ministros do Supremo recebem em seus gabinetes — e
é importante enfatizar isso, porque costumamos criticar Legislativo e
Executivo, mas o Judiciário, em todas as instâncias, permanece blindado desse
escrutínio. Isso possibilitaria mapear melhor quem está defedendo quais
interesses e em nome de quem”, defende o professor da Faap.
Hoje há
pelo menos dois projetos de lei sobre o tema nas gavetas do Congresso,
delimitando regras relacionadas à transparência e à prestação de contas aos
pagadores de impostos. Ainda assim, os analistas concordam que a medida está
longe de resolver o problema, já que boa parte da intermediação política se dá
em espaços que escapam a qualquer mecanismo de fiscalização.
“Mesmo
com uma lei rigorosa, os elementos centrais que tornaram possível a rede de
proteção articulada em torno do Master dificilmente desapareceriam”, diz o
professor da Faap.
“Quando
um banco consegue recolher bilhões de fundos públicos com base em ativos
fictícios e postergar sua queda por meio de articulações políticas, estamos
diante não apenas de um fracasso regulatório, mas de uma forma de captura do
Estado que se torna estrutural, enraizada em práticas históricas de
personalismo e patrimonialismo”, acrescenta Pires.
Esse
quadro, salienta Vieira, tem implicações diretas para a saúde democrática. A
ideia de grupos privados tentarem moldar o Estado conforme seus interesses
depende também do aperfeiçoamento dos órgãos de controle e da pressão social.
“Se a
população não pressionar os políticos, não tiver noção de que são eles que nos
devem, no Legislativo, Executivo ou até no Judiciário — que não é eleito, mas é
pago com nosso dinheiro —, não haverá mudança”, afirma.
Para
ele, o problema não é exclusividade brasileira. “Mesmo países desenvolvidos,
com democracias consolidadas como os EUA, são criticados por estarem sob
influência de grandes interesses, e de acordos questionáveis”, diz. “Esse é o
dilema das democracias modernas. E isso é importante porque é daí que prolifera
uma mentalidade ‘antissistema’, que vem crescendo no Brasil e no mundo.”
• Justiça do Rio suspende repasses ao
Banco Master para proteger recursos do Rioprevidência
A
Justiça do Rio de Janeiro autorizou o governo estadual a interromper o repasse
de valores de empréstimos consignados ao Banco Master, que está em liquidação
extrajudicial. A medida busca resguardar cerca de R$ 970 milhões investidos
pelo Rioprevidência em títulos ligados à instituição financeira.
A
decisão, assinada pela juíza Georgia Vasconcellos, da 2ª Vara de Fazenda
Pública, determinou que os valores destinados ao banco e à empresa PKL One
Participações S.A. fiquem retidos em uma conta exclusiva do Rioprevidência até
o desfecho do processo.
Segundo
o entendimento judicial, os recursos previdenciários não podem ser incluídos na
fila de credores por terem destinação específica ao pagamento de aposentados e
pensionistas.
Além da
retenção dos repasses, o banco e a empresa ficaram proibidos de negativar
servidores ou cobrar parcelas enquanto durar a disputa judicial. A ação aponta
indícios de atuação integrada entre as duas empresas na administração de
carteiras de consignados, o que levantou suspeitas de vínculo com o produto
CredCesta.
O caso
ocorre em meio à crise do Banco Master, que entrou em regime especial após
intervenção do Banco Central. O Tribunal de Contas do Estado já havia apontado
irregularidades nos aportes do Rioprevidência, e a Justiça avaliou que havia
risco concreto de perda dos recursos diante da incapacidade do banco de honrar
compromissos recentes.
Fonte:
Metro 1/Gazeta do Povo

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