Quem
regula a América Latina?
Uma
fileira de canhões de última geração, por ar, mar e terra, com mísseis de alto
poder de destruição, de longo e rápido alcance, está instalada no mar do Caribe
nesse momento, e apontados para o continente latino americano. A Venezuela é a
primeira da fila, mas os objetivos estratégicos norte-americanos envolvem a
disputa geopolítica de todo continente. Isso significa que a soberania de todos
os países latinos está ameaçada neste momento pelos EUA. A história já nos deu
provas suficientes das barbaridades e horrores que um império é capaz de impor
aos povos do mundo para não perder o seu trono. Nossa geração nunca esteve tão
próxima de conviver com a tragédia que assistimos em Gaza, e fico a me
perguntar: as próximas flotilhas da liberdade serão no Mar do Caribe? A
ofensiva militar não é a única, existe um plano recolonizador para retomar o
controle da região, como parte da disputa geopolítica para defender as posições
do imperialismo ocidental e conter o avanço das forças do sul global,
especialmente do BRICS, e consequentemente da China.
Todos
os sinais apontam para um refluxo da “onda rosa” que surgiu na América Latina
no arco histórico – 2018/2022 – abrindo as condições para uma ascensão da
extrema direita como tendência predominante. A “onda rosa” que estamos nos
referindo, foi a ascensão de governos ligados ao espectro de esquerda, que
passou a dirigir quatro, das cinco maiores economias do continente. Lula no
Brasil, Cláudia no México, Petro na Colômbia e Boric no Chile. E ainda,
polêmicas à parte, considerando a relevância política de outras nações, podemos
somar Maduro na Venezuela, Yamandú no Uruguai, Cuba e Nicarágua na região do
Caribe. Nesses últimos anos que o campo de esquerda esteve no poder, pouco foi
feito no terreno da integração em bloco organizado, e essa desorganização geopolítica,
abriu flanco em várias dimensões para o avanço da extrema direita imperialista.
Principalmente após a volta de Trump à presidência dos EUA em 2025, com amplos
poderes no congresso e forte influência na suprema corte.
Aliás,
esse ano está se confirmando como um ponto de virada. Em 2025, a vitória de
Noboa no Equador, a desagregação do MAS e a volta da direita na Bolívia, após
20 anos da esquerda no poder. O belo desempenho de Milei – com apoio explícito
de Trump – nas eleições legislativas argentinas e a possível vitória da extrema
direita no Chile ( provavelmente no segundo turno), são sinais que a correlação
de forças continental está desequilibrando a favor das forças reacionárias e
conservadoras. Em 2026, a eleição no Brasil e na Colômbia prometem ser
duríssimas, e em ambos os países, a extrema direita tem amplas condições de
obter um excelente desempenho, incluindo voltar ao poder com a bandeira da
segurança pública na mão.
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A ofensiva imperialista nos terrenos militar, político e econômico
O plano
estratégico de Trump para o continente obedece três eixos principais – a
ofensiva militar contra um suposto “narco-terrorismo” via operação “Lança do
Sul”, a política tarifária como instrumento de coerção/chantagem e a
intervenção nos assuntos internos dos vizinhos via BigTechs para alcançar
interesses específicos. Dependendo da situação de cada país, será aplicado
algum desses ferramentais golpistas ou até mesmo tudo de uma vez… O governo de
Claudia Sheinbaum no México é um exemplo do que estamos alertando, sofreu a
ação de tarifas, ameaças e pressão de intervenção militar envolvendo o tema do
“narco terrorismo” e agora enfrenta manifestações convocadas pela extrema
direita trumpista através das redes sociais, envolvendo operações que utilizam
a simbologia da “geração Z” para mobilizar jovens e promover ações violentas
com agentes infiltrados na multidão, arrastando o governo para um espiral de
desgaste. Já escrevemos sobre o fenômeno envolvendo o tema da geração Z e como
as legitimas reivindicações da juventude estão sendo disputadas por projetos
estratégicos reacionários no sul global.
Por
qualquer ângulo que se olhe, há uma tentativa de agredir a soberania latino
americana para impor uma hegemonia geopolítica, acessar recursos naturais
estratégicos e conter o avanço de nações e blocos independentes do domínio
ocidental. Há um cerco imperialista se formando no continente, com avanços de
posições importantes, a vitória de Milei na Argentina em 2023 foi o primeiro
sinal de um novo curso em desenvolvimento na América Latina, depois a derrota
do MAS na Bolívia em 2025 confirmou, e a provável derrota da candidata
comunista no Chile, será possivelmente o ponto alto dessa vaga reacionária que
se abriu. Dependendo dos desdobramentos em 2026, podemos ainda ter como epílogo
deste ciclo, derrotas da esquerda no Brasil e/ou na Colômbia.
A
primeira onda de vitórias eleitorais da esquerda no continente latino americano
se deu no início dos anos 2000, impulsionada pela crise dos planos neoliberais
implementados na década de 90 e pelo boom das commodities. Esse primeiro ciclo
entrou em refluxo entre 2014-2016, e uma segunda onda de ascensão da esquerda
foi retomada após as graves consequências da pandemia que aprofundou
desigualdades, gerou inflação e deteriorou o custo de vida. Aumentando a
demanda por políticas públicas estatais para mitigar a agonia social e o
desespero de multidões traumatizadas pelo horror dos números de mortes e
sequelados pela Covid-19.
Precisamos
examinar com mais cuidado o refluxo da segunda “onda rosa” latino americana,
mas já podemos identificar os seguintes elementos principais:
1.
Fragmentação e desorganização geopolítica entre governos de esquerda no
continente, não há iniciativas estratégicas unitárias com potencial de impor
uma agenda soberana no terreno político e econômico;
2. As
sociedades latino americanas continuam vulneráveis com graves desigualdades
sociais, desindustrialização e economia baseada em commodities, com forte dependência da tecnologia e
inovação estrangeira;
3. A
agonia social abre espaço para o desenvolvimento do crime organizado, gerando
sensação generalizada de insegurança pública, se transformando na pauta
privilegiada da extrema direita, na medida que os governos de esquerda não
conseguem dar respostas de curto prazo para o problema.
Todos
esses elementos facilitam o serviço das forças reacionárias dentro e fora dos
países latino americanos, que atuam em parceria para implementar um projeto,
cujo resultado final é a recolonização, controle geopolítico e saque das
riquezas em benefícios da estratégia imperialista.
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Segurança Pública/Narcoterrorismo: A agenda dominante da extrema direita
No
início do segundo semestre deste ano o governo Lula, além de se beneficiar da
condenação e prisão de Bolsonaro e generais golpistas, começou a superar uma
crise de popularidade quando passou a controlar a inflação, ganhou apoio social
no combate às tarifas de Trump e aproveitou oportunidades em relação aos erros
da oposição na ocasião da tentativa de aprovação da “PEC da Blindagem”. Mas após o impacto da
operação das forças policiais no Complexo do Alemão e da Penha na cidade do Rio
de Janeiro, gerando repercussão internacional pelo alto índice de letalidade e
violência, a extrema direita conseguiu recolocar no centro do debate nacional o
tema da segurança. Figuras públicas ligadas a essa operação contra o
“narco-terrorismo” organizada pelo governo do Rio de Janeiro, e governadores da
oposição ganharam ampla visibilidade e apoio popular, ao mesmo tempo em que
todas as pesquisas apontam que o crescimento da avaliação positiva de Lula foi
interrompido, oscilando negativamente na margem de erro.
Chama a
atenção a gravidade das movimentações, tanto do governo do estado de São Paulo,
como do Rio de Janeiro, que estiveram no último período em contato direto com o
governo Trump. Trocaram informações, relatórios e estão trabalhando juntos na
tentativa de classificar organizações ligadas ao trafico de drogas, como grupos
terroristas – A doutrina do Narco Terrorismo.
Esse
esforço explícito em fortalecer a narrativa do soft power americano, como
também abrir caminho para possíveis intervenções e vantagens para o
imperialismo estadunidense é a expressão de como o império conta com forte
apoio de forças políticas da extrema direita no Brasil e no continente. Mesmo
fantasiados de patriotas, estão na linha de frente da submissão covarde e
entreguista, esse papel também vem sendo cumprindo por Maria Corina Machado na
Venezuela que está prometendo privatizar e entregar todo o sistema petrolífero
do país para empresas americanas se Maduro deixar o poder. Daniel Noboa,
presidente do Equador, um dos principais aliados de Trump na região, está à
frente de um referendo para mudanças constitucionais visando a instalação de
bases militares estrangeiras no país, os equatorianos foram às urnas neste
domingo dia 16/11. No Chile, o primeiro turno da eleição presidencial, que
também acontece neste domingo, indica que Jeannete Jara – candidata do partido
comunista – deve vencer a primeira volta, mas dificilmente terá chances de
repetir esse resultado no segundo turno, que está marcado para 14 de dezembro.
Atrás dela estão três candidaturas de extrema direita, com apoio expressivo nas
pesquisas eleitorais, e todos esses candidatos de oposição tem como pauta
principal o tema da segurança pública, associando a esse tema, a questão da
imigração de venezuelanos e colombianos.
Podemos
citar vários exemplos, mas no último período, El Salvador, um pequeno país do
Caribe, vem chamando a atenção de todo continente em relação a sua política de
segurança pública, liderada pelo presidente Nayib Bukele. Trata-se de uma
figura em ascensão da extrema direita latino americana, aliado próximo de
Trump, promovendo parcerias para encarcerar prisioneiros expulsos dos EUA e um
simbolo que reforça a política de combate ao suposto “ narco-terrorismo” na
região. Várias lideranças da extrema direita brasileira estão agendando viagens
para El Salvador com o objetivo de realizar capacitação e construir cooperação
em relação ao tema da segurança pública.
A
estratégia do imperialismo de combater ao “narco-terrorismo” como politica
geral para retomar o controle do continente, em parceria com forças políticas
da extrema direita pelos países latino americanos, colocando o tema da
segurança publica no centro da disputa politica e ideológica, está conseguindo
avançar posições no tabuleiro da região. Transformar os povos latino americanos
em caricaturas e alegorias da simbologia “narco” tem o objetivo de fortalecer o
complexo industrial militar americano, coagir, ameaçar e derrubar governos não
alinhados, ganhar acesso vantajoso aos recursos estratégicos de todo continente
e impedir qualquer margem de articulação independente e soberana.
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Por um bloco em defesa da soberania latino americana!
O
espectro de direita detém o “momentum ideológico”, especialmente através da
pauta da segurança pública, que parece ser o tema mais urgente para o
eleitorado de massas em vários países na América Latina. As pautas mais
importantes da esquerda, em vários aspectos, necessita de intervalos de tempo
mais longos e continuidade de governos para ter alcance concreto na vida das
pessoas, como o combate a desigualdade social, o tema da crise ambiental e as
questões que envolvem a soberania nacional. Mas isso não significa que tudo
está perdido e que a ascensão da extrema direita é um caminho que
inevitavelmente será consolidado em 2025/2026. O resultado da luta de classes,
do papel das mobilizações sociais, como também da eleição no Chile em 2025,
Colômbia e Brasil em 2026 vão determinar os rumos do continente.
Precisamos
lembrar que os partidos de maior penetração social da América Latina são
ligados à esquerda, o PSUV venezuelano, o peronismo argentino, o Morena no
México e o PT no Brasil. Além disso, a esquerda ainda governa os maiores PIBs
do continente, Brasil, México, Colômbia e Chile. Isso demonstra que as forças
progressistas possuem alcance de massas que permite desenvolver um bom combate
político e interromper essa ascensão do espectro de direita. Será necessário
reenquadrar o debate para além do tema da segurança, ou aprimorar um programa
para prover soluções críveis para a questão da violência urbana e o combate ao
crime.
Mas do
ponto de vista macropolítico, que é o mais decisivo e importante, o que urge
neste momento é a construção de um bloco regional em defesa da soberania latino
americana, com iniciativas que fortaleça o sentimento anti-imperialista no
continente e que elabore parcerias e sistemas de cooperação econômicos que
permita erguer pontes para a pesquisa, inovação, industrialização,
produtividade, desenvolvimento e melhoria da qualidade de vida das amplas
massas. O Brasil tem sido pioneiro em iniciativas de blocos como o BRICS, que
tem sua contribuição para diminuir a dependência em relação ao mercado
americano, mas é necessário agora avançar regionalmente.
Donald
Trump ainda está no seu primeiro ano de gestão, já conseguiu operar um estrago
significativo contra as forças de esquerda latino americanas, mas isso não se
dá sem desgastes, os republicanos não estão passando incólumes. As últimas
eleições estaduais e de prefeituras nos EUA, revelou ao mundo que existe um
descontentamento das massas estadunidenses com a forma trumpista de governar. O
ponto alto mais importante dessa resistência até agora, foi a eleição de Zohran
Mamdani para a prefeitura de Nova York, expressando sinais que o jogo está
sendo jogado, e que ninguém regula a América!
• Cresce a inquietação em Washington,
inclusive entre republicanos, à crescente presença militar do governo Trump no
Caribe
Parlamentares
democratas de alto escalão e pelo menos um republicano condenaram a apreensão
de um petroleiro venezuelano na costa do país na quarta-feira, com um deles
afirmando que Donald Trump está "nos conduzindo sonâmbulos a uma guerra
com a Venezuela".
Em
Washington, cresce em Washington um desconforto, pelo menos em parte
bipartidário, com a escalada da presença militar do governo na região. Trump
acusou a Venezuela de facilitar o tráfico de drogas e aumentou a presença
militar dos EUA no Caribe a um nível sem precedentes em décadas. O governo
também realizou uma campanha de bombardeios contra supostos barcos de
narcotráfico, que já matou mais de 80 pessoas.
Trump
confirmou a apreensão do petroleiro logo após o ocorrido, dizendo aos
repórteres: "Acabamos de apreender um petroleiro na costa da Venezuela –
um petroleiro grande, muito grande, o maior já apreendido, na verdade."
Quando questionado sobre o que aconteceria com o petróleo, Trump respondeu:
"Ficamos com o petróleo, eu acho!"
O
senador Chris Van Hollen, de Maryland, que integra a comissão de relações
exteriores do Senado, afirmou que a apreensão do petroleiro indica que o
governo está sendo desonesto em relação às suas operações militares na região.
“Isso
demonstra que toda a história que eles contam – de que se trata de interceptar
drogas – é uma grande mentira”, disse Van Hollen. “Esta é apenas mais uma prova
de que, na verdade, o objetivo é uma mudança de regime – pela força.”
Rand
Paul, senador republicano pelo Kentucky, disse à NewsNation que "apreender
um petroleiro é o início de uma guerra" e questionou se "é função do
governo americano sair em busca de monstros pelo mundo, procurando adversários
e iniciando guerras".
Chris
Coons, senador democrata, disse também estar alarmado com as ações do governo,
declarando à emissora: "Não tenho ideia de por que o presidente está
apreendendo um petroleiro e estou bastante preocupado que ele esteja nos
conduzindo, sem percebermos, a uma guerra com a Venezuela."
Mark
Warner, também senador democrata, destacou o que caracterizou como prioridades
inconsistentes, publicando nas redes sociais: "Então eles podem apreender
um petroleiro, mas não um barco de narcotráfico?"
Quando
questionado pela CNN se se opunha ao objetivo de Trump de promover uma mudança
de regime na Venezuela, Chuck Schumer recusou-se a responder, afirmando que a
mensagem errática de Trump tornava impossível conhecer suas verdadeiras
intenções.
“A
questão é que o presidente Trump fala tantas coisas diferentes de tantas
maneiras diferentes que você nem sabe do que diabos ele está falando”, disse o
líder da minoria no Senado.
“Obviamente,
se Maduro simplesmente fugisse por conta própria, todos gostariam disso”, disse
ele, acrescentando, porém, que a falta de clareza tornava impossível endossar
políticas específicas.
A
procuradora-geral, Pam Bondi, afirmou que o FBI, a Divisão de Investigações de
Segurança Interna e a Guarda Costeira cumpriram um mandado de apreensão da
embarcação, que, segundo ela, transportava petróleo sancionado da Venezuela e
do Irã há anos, como parte de uma rede de apoio a organizações terroristas
estrangeiras.
O
governo da Venezuela classificou a apreensão como "um roubo descarado e um
ato de pirataria internacional", alegando que ela revela que a agressão
dos EUA "sempre teve como alvo nossos recursos naturais, nosso petróleo,
nossa energia".
Nem
todos se opuseram. Quando Ted Cruz, senador republicano do Texas, foi
questionado sobre sua reação à apreensão do petroleiro, ele desconversou e
disse que Trump estava salvando vidas americanas ao combater o tráfico de
drogas.
Em
novembro, quando o Irã apreendeu um petroleiro com bandeira das Ilhas Marshall
no Estreito de Ormuz, o Comando Central dos EUA condenou o ato como uma
"violação flagrante do direito internacional" que prejudicava a
liberdade de navegação e comércio.
Adam
Schiff, senador democrata pela Califórnia, classificou a situação como uma
"escalada muito perigosa e um prelúdio para um potencial conflito".
Na semana passada, ele e Paul, juntamente com os senadores Tim Kaine, da
Virgínia, e Schumer, apresentaram uma resolução sobre poderes de guerra com o
objetivo de impedir o envolvimento militar do governo com a Venezuela sem a
aprovação do Congresso.
O
governo implantou o que descreve como a maior presença naval no Caribe desde a
Crise dos Mísseis de Cuba, em 1962, ostensivamente para atingir o que Trump
chamou de "narcoterroristas". Mas autoridades antidrogas americanas
observaram, em um relatório de maio, que o fentanil entra nos EUA
principalmente por meio de produtores chineses e organizações criminosas
mexicanas, enquanto a cocaína vem principalmente da Colômbia, Peru e Bolívia.
Fonte:
Por Gibran Jordão, em Esquerda Diário

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