sábado, 13 de dezembro de 2025

Trump deixa clã Bolsonaro 'à deriva', diz analista americano

decisão do presidente americano Donald Trump de revogar a sanção a Alexandre de Moraes sob a Lei Magnitsky representa "uma virada", na avaliação do brasilianista Brian Winter, editor da revista Americas Quarterly.

"É um abandono total da estratégia que foi anunciada no 9 de julho, que já vinha sendo modificada, mas agora é uma virada em 180 graus", disse à BBC News Brasil Winter, referindo-se à data em que mais tarifas contra o Brasil foram anunciadas por Trump.

Para o americano, Trump sempre mudará sua estratégia caso ela não esteja funcionando.

Segundo Winter, o começo dessa virada de Trump ocorreu quando ele se encontrou com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em Nova York, na Assembleia Geral da ONU.

"Hoje é uma confirmação total de como se nada tivesse acontecido."

"Ele quis ajudar um aliado [Jair Bolsonaro], porque é um presidente que acha que na América Latina ele tem o direito de ajudar abertamente seus parceiros ideológicos, e ele continua fazendo isso", diz.

"A eleição em Honduras é um sinal claro disso. Ele também atuou para ajudar o Milei na eleição [legislativa] argentina em outubro."

Winter afirma que essa mudança agora não significa uma desistência em ajudar os aliados.

"Mas é evidente que ele decidiu que, por enquanto, não tem como ajudar a família Bolsonaro", afirma. "Ele está deixando a família Bolsonaro à deriva."

Nesse sentido, a suspensão de algumas tarifas sobre produtos brasileiros que o presidente americano anunciou mostra que os impactos delas são mais domésticos que políticos, segundo Winter.

"Por um lado, ele abandonou ou modificou as tarifas porque estava tendo um impacto na inflação, especialmente em áreas muito sensíveis, que é o café e a carne. Isso explica a decisão de ampliar a lista de exceções", diz.

"Mas a decisão da Lei Magnitsky agora é um sinal de que as conversas estão avançando com o governo brasileiro em outras áreas", diz.

Uma suspeita é que o tema das terras raras — elementos que não são exatamente raros, mas sim de difícil exploração, presentes em produtos como celulares, telas, turbinas eólicas e carros elétricos — possa ter relevância, segundo ele.

O Brasil tem uma quantidade significativa de terras raras e minerais em seu território.

"Usar a Magnitsky para o Moraes foi grave, porque gerou um certo barulho político nos EUA no âmbito doméstico. Abandonar essa decisão é um sinal de outras possibilidades de colaborações com o governo Lula", avalia o americano.

A Lei Magnitsky é uma das mais severas disponíveis para Washington punir estrangeiros que considera autores de graves violações de direitos humanos e práticas de corrupção.

Alexandre de Moraes se tornou a primeira autoridade brasileira a ser punida sob a lei, quando foi sancionado em 30 de julho.

Em discurso em 1º de agosto, Moraes comentou a decisão do governo americano, durante cerimônia de abertura do segundo semestre do Judiciário.

"Esse relator vai ignorar as sanções que foram aplicadas e continuar trabalhando como vem fazendo, tanto no plenário quanto na Primeira Turma, sempre de forma colegiada", afirmou.

A esposa de Moraes, a advogada Viviane Barci, também teve nesta sexta-feira seu nome retirado da lista de punidos pela Magnitsky — ela havia sido sancionada em setembro.

Segundo fontes ouvidas pela BBC News Brasil, a decisão do governo Trump atende a um pedido direto de Lula para que Trump retirasse as sanções contra Moraes.

<><> Eduardo Bolsonaro recebe notícia com 'pesar'

O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho de Jair Bolsonaro que atuou junto ao governo americano para a imposição de sanções ao Brasil e a Moraes, lamentou a decisão.

"Recebemos com pesar a notícia da mais recente decisão anunciada pelo governo dos EUA. Agradecemos o apoio demonstrado pelo presidente Trump ao longo deste processo e a atenção que dedicou à grave crise de liberdades que afeta o Brasil", escreveu Eduardo, em nota publicada no X (antigo Twitter).

"Esperamos sinceramente que a decisão do Presidente @realDonaldTrump seja bem-sucedida na defesa dos interesses estratégicos do povo americano, como é seu dever. Quanto a nós, continuaremos trabalhando com firmeza e determinação para encontrar um caminho que permita a libertação de nosso país, pelo tempo que for necessário e apesar das circunstâncias adversas", completou o deputado, que vive nos EUA desde fevereiro e corre o risco de ter o mandato cassado por faltas.

Em novembro, o STF tornou Eduardo Bolsonaro réu por coação no curso do processo, por articular sanções contra o Brasil e autoridades brasileiras, na tentativa de influenciar o julgamento de seu pai.

<><> Moraes diz que 'verdade prevaleceu'

Em um evento no canal SBT News, Alexandre de Moraes disse que 'a verdade prevaleceu' e agradeceu ao presidente Lula por seu empenho.

"A vitória da democracia. O Brasil chega hoje, quase final de ano, o Brasil chega dando exemplo de democracia e força institucional a todos os países do mundo. E isso também muito graças à liberdade de imprensa."

No mesmo evento, o presidente Lula disse que Trump deu um 'presente' a Moraes.

"O Trump deu de presente pra ele [Moraes] o reconhecimento de que não era justo um presidente de um outro país punir um ministro da Suprema Corte brasileira porque estava cumprindo a Constituição brasileira."

Lula afirmou ainda que, na conversa que teve com Trump, o presidente americano teria perguntado se a revogação seria boa para ele.

"Eu falei não é bom pra mim. É bom pro Brasil e pra democracia brasileira."

<><> 'Lei da anistia'

O governo americano atribuiu a retirada das sanções contra Moraes e sua esposa à aprovação na Câmara do projeto de lei que reduz as penas dos condenados por tentativa de golpe, que pode beneficiar Jair Bolsonaro.

Em nota enviada à BBC News Brasil, um oficial do governo Trump disse que "os EUA veem a aprovação de um importante projeto de lei de anistia pela Câmara dos Deputados do Brasil como um passo na direção certa, indicando que as condições de lawfare estão melhorando no país".

Lawfare é um termo em inglês que combina as palavras "law" (lei) e "warfare" (guerra) e significa o uso de instrumentos legais para se atacar politicamente uma pessoa.

A nota diz ainda que manter sanções como as contra Moraes é "inconsistente com os interesses da política externa dos EUA".

Na quarta-feira (10/12), deputados aprovaram o projeto de lei da Dosimetria, que reduz as penas dos condenados pelos crimes relacionados aos ataques de 8 de janeiro, entre eles Bolsonaro. O projeto será agora apreciado pelo Senado.

Na quinta, antes da retirada das sanções, o vice-secretário de Estado dos EUA, Christopher Landau, já havia elogiado a aprovação da lei pela Câmara.

"Os Estados Unidos têm expressado consistentemente preocupação com as tentativas de usar o processo legal para instrumentalizar as diferenças políticas no Brasil e, portanto, saúdam o projeto de lei aprovado pela Câmara dos Deputados como um primeiro passo para combater esses abusos. Finalmente, estamos vendo o início de um caminho para melhorar nossas relações", escreveu Landau no X.

¨      Bolsonaristas falam de 'traição' e 'decepção' com Trump 

decisão do governo americano de retirar o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e sua esposa, Viviani Barci de Moraes, da lista de sanções da Lei Magnitsky gerou reações entre aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Alguns parlamentares da oposição que se manifestaram nas redes sociais criticaram o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, dizendo que se sentiam traídos e decepcionados.

"O sentimento, não escondamos, é de traição. Certamente o preço cobrado por Trump não foi baixo, e em breve saberemos se Lula ofereceu as terras brasileiras ou o apoio na queda de Nicolás Maduro", disse o vice-líder da oposição na Câmara, o deputado federal Maurício Marcon (Podemos-RS), em uma publicação no X.

"Trump pensou nos EUA, com seu slogan 'American First'", acrescentou.

O deputado Carlos Jordy (PL-RJ) disse que a Lei Magnitsky foi "banalizada" por Trump e que o presidente americano é uma "grande decepção".

"Não existe 'ex-violador de direitos humanos'. Infelizmente colocamos esperanças em alguém que só queria negociar. Uma grande decepção com o presidente americano e uma enorme lição para nós: não terceirizemos nossa responsabilidade", declarou.

O deputado Rodrigo Valadares (União-SE), também fez críticas, dizendo que "o sistema se fechou em si e nos seus próprios interesses" apesar do "sacrifício" de Eduardo Bolsonaro.

A retirada das sanções, anunciada nesta sexta-feira (12/12), era defendida pelo governo brasileiro em conversas mantidas com interlocutores da administração norte-americana.

Em uma publicação no X, a ministra-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann (PT), atribuiu a decisão a uma vitória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

"Foi Lula quem colocou esta revogação na mesa de Donald Trump, num diálogo altivo e soberano", afirmou.

"É uma grande derrota da família de Jair Bolsonaro, traidores que conspiram contra o Brasil e contra a Justiça".

As sanções contra Alexandre de Moraes foram impostas em julho, em meio às pressões do governo americano para tentar influenciar o julgamento de Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado.

Em setembro, a esposa de Moraes também foi incluída na lista, assim como a empresa administrada por ela e pelos três filhos do casal.

Na época, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) disse que estava trabalhando para que isso acontecesse, e que a sanção era uma pressão por anistia

Na tarde desta sexta-feira, pouco depois do anúncio do fim das sanções, Eduardo se manifestou sobre o assunto.

Em uma publicação no X, o parlamentar divulgou uma nota conjunta com o influenciador Paulo Figueiredo. Eles disseram receber com "pesar" a notícia, mas que eram "gratos pelo suporte dado pelo presidente Trump demonstrado durante este processo e pela atenção que ele deu a esta séria crise de liberdade afetando o Brasil"

Eduardo e Paulo Figueiredo foram denunciados pela Procuradoria-Geral da República por articular as sanções para tentar influenciar o julgamento de Jair Bolsonaro. No mês passado, o parlamentar se tornou réu em um processo no STF por coação no curso do processo.

Seguindo a linha de Eduardo, o líder do PL na Câmara, deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) também agradeceu a Donald Trump pela "ajuda", disse que a aplicação da Lei Magnitsky "abriu janela para o Brasil" e que restava aos brasileiros, agora, fazer sua parte.

"A guerra para tirar a suprema esquerda do poder no Brasil será nossa, dos brasileiros", escreveu.

"Ou o Brasil reage agora, ou normaliza o autoritarismo togado."

O deputado Mario Frias (PL-SP) pediu que as pessoas não buscassem culpados e também "não colocassem mais lenha na fogueira".

"Quem mais sofre ncesse processo são os inocentes que são presos políticos e o próprio presidente Bolsonaro. Como ele já disse certa vez: não é o fim", afirmou.

<><> Em evento, Moraes e Lula comentam decisão do governo americano

Tanto Alexandre de Moraes quanto Lula participaram nesta sexta-feira do evento de lançamento do canal SBT News.

Ao discursar, Moraes agradeceu a Lula pelo "empenho" em demonstrar a "verdade" relativa à sua situação e à de sua esposa.

"A verdade, com o empenho do presidente Lula e de toda a sua equipe, a verdade prevaleceu", disse Moraes em evento de lançamento do SBT News, onde Lula também estava.

O ministro do STF disse que o anúncio desta sexta-feira foi resultado de uma "tripla vitória" — do Judiciário, que "não se vergou a ameaças"; da soberania nacional; e da democracia brasileira.

"O Brasil chega hoje, no quase final de ano, dando exemplo de democracia e força institucional a todos os países do mundo", disse Moraes.

O magistrado contou ainda que, em julho, pediu a Lula que não tomasse qualquer medida contra a decisão americana, porque a "verdade" prevaleceria quando chegasse ao conhecimento das autoridades norte-americanas.

No mesmo evento, Lula brincou que Moraes ganhou de Trump um presente, já que o ministro fará aniversário neste sábado (13).

O presidente relatou que conversou na semana passada com Trump, que teria perguntado se a retirada das sanções seria positiva para Lula.

"É bom para você?", perguntou Trump, segundo Lula.

"Não é bom para mim, é bom para o Brasil e é bom para a democracia brasileira. Aqui, você não está tratando de amigo pra amigo. Você está tratando de nação pra nação. E a Suprema Corte para nós é uma coisa muito importante, Trump", respondeu o presidente brasileiro, de acordo com seu relato no evento do SBT News.

Segundo os jornais O Globo e Folha de S. Paulo, Lula enviou uma mensagem direta ao presidente Trump agradecendo pela retirada das sanções.

<><> Reação da base do governo

Parlamentares da base do governo viram a retirada da sanções como uma derrota do bolsonarismo.

"É uma vitória da diplomacia de Lula e uma prova de solidez da nossa democracia. Expõe o fracasso da campanha bolsonarista de tentar deslegitimar o Brasil no exterior e atacar a nossa soberania", afirmou o senador Humberto Costa (PT-PE) nas redes sociais.

O líder do PT na Câmara dos Deputados, Lindbergh Farias (PT), chamou a medida de uma "derrota histórica dos traidores da pátria que tentaram negociar sanções internacionais, revogação de vistos, tarifas e a chamada 'pena de morte financeira' contra o ministro".

Já o deputado federal Zeca Dirceu (PT-PR) atribuiu a vitória à "química" entre o presidente Lula e Trump, fazendo referência a uma fala do presidente americano, durante a Assembleia Geral da ONU, de que havia uma "química excelente" entre ele e o líder brasileiro.

"Nova vitória da diplomacia do presidente Lula. Química continua produzindo bons resultados", afirmou o parlamentar.

 

Fonte: BBC News Brasil

 

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