Moisés
Mendes: Mentir é o vício sem cura na cracolândia do bolsonarismo
O novo
ministro da Secretaria de Comunicação do governo disse, com ênfase, o que
deixou de ser uma obviedade da natureza de quem lida com informação. Sidônio
Palmeira assumiu anunciando que vai se dedicar à imposição da verdade.
Em
outras circunstâncias, poderia parecer uma fala de pregação religiosa ou um
juramento protocolar. Mas foi isso o que Sidônio disse em entrevista ao Globo,
na festa da posse:
“Não podemos deixar a fake news entrar
sozinha. Primeiro, você precisa passar a verdade e depois desfazer a mentira,
não o inverso, não correr atrás da mentira”.
Lutar
pela verdade, nas circunstâncias que cercam o governo, talvez seja mais
desafiador para Sidônio na Secom do que brigar pelo juro baixo para Gabriel
Galípolo no Banco Central.
O
ministro assume correndo atrás da mentira, mas Nikolas Ferreira é mais rápido.
A mentira anda junto com a percepção enviesada da realidade, mesmo que essa
percepção nem sempre tenha relação com fake news.
Sidônio
chega anunciando que também vai tentar entender por que a população não se dá
por satisfeita com os bons níveis de emprego, consumo e renda, como mostram as
pesquisas.
Por
que o sentimento de que há suportes sociais, estabilidade e perspectiva de
melhoria de vida, que valia antes, sofre distorções aparentemente
incompreensíveis no terceiro governo de Lula?
Seria
só por causa da ação destrutiva e mentirosa da extrema direita? Da sabotagem
articulada pela grande imprensa, que produz pelo menos uma notícia ruim por
dia? Quase sempre em manchete de alto de página.
A
existência de um monolito inflexível de um terço da população identificada com
o bolsonarismo explica a baixa aprovação do governo e de Lula? Esse um terço,
que não existia com esse formato até a ascensão de Bolsonaro, vai estar sempre
insatisfeito?
O
integrante desse contingente dissemina fake news intensamente, não por
acreditar na mentira, mas porque a mentira é também o que o identifica como
ativista antilulista, antiPT e anticomunista.
A
disseminação da mentira é o que assegura a milhões de brasileiros a certeza do
pertencimento. É um vício praticado com a reza diária e a empreitada coletiva
do golpismo permanente.
A tia
e o tio do zap e das redes são parte de uma tribo, talvez a maior do país, a
grande tribo dos mentirosos. Os redutos reais e virtuais de fabricação e
consumo de mentira são as cracolândias do bolsonarismo.
Rezam
e propagam a mentira produzida pelas estruturas intactas do fascismo. Sem que
esses praticantes de mentiras e de rezas tenham o mínimo sentimento do que, nas
igrejas rezadeiras, chamam de contrição.
Não há
culpa pelos danos das fake news porque essa é uma atribuição quase religiosa e
purificadora. É com isso que Sidônio irá lidar. Com as engrenagens orgânicas e
fundamentalistas da disseminação de fake news.
A
mentira passou a fazer parte da índole desse um terço de brasileiros que
precisa manter o bolsonarismo vivo na sua essência. E as fake news, de
preferência com ódio, são a alma dos afazeres dessa gente.
Poucas
coisas são mais funcionais hoje no Brasil do que as estruturas e os mecanismos
de propagação de mentiras, com as facilidades oferecidas pelas big techs e suas
liberdades absolutas, mas só para a extrema direita.
Desmontar
a fake news da taxação do PIX é um desafio grandioso, mas só o primeiro do ano.
Sidônio corre atrás de uma mentira, quando deveria estar pensando em como
vender as verdades do governo.
E a
verdade é hoje uma versão do que cada um emite ou capta a seu modo em meio a um
pântano de mentiras criminosas, grotescas e devastadoras.
A
adoração da mentira é o que mais mobiliza e agrega gente no mundo todo. A
mentira é componente essencial da organização e da articulação do fascismo
analógico e digital livre de regras e de regulações.
E essa
é uma questão para a Justiça e para a ação política das esquerdas e não só para
o governo, para muito além das táticas milagrosas de comunicação. Sidônio sabe
que Lula sabe muito bem.
¨ É inútil e
insano transformar o desmentido de fake news no foco central da comunicação do
governo. Por Tiago Barbosa
É
inútil e insano transformar o desmentido de fake news no foco central da
comunicação do governo.
Isso
equivale a reduzir a gestão a um reflexo das falcatruas ideológicas vomitadas
nas redes, subordinando sua ação à agenda de quem subverte a realidade para
perverter a vida e a política.
Persistir
nessa lógica ignora aspectos fundamentais da alienação na era digital: a
servidão irracional, o convencimento pela exposição massiva e o endosso
midiático.
Os
extremistas fundamentam sua convicção na submissão total ao ecossistema de
desinformação. Consumir, apoiar e disseminar mentiras não é apenas um ato, mas
uma forma de dar sentido a vidas medíocres e ressentidas. Daí o desprezo aos
fatos e à informação: para eles, o ódio se sobrepõe à razão, e a fake news se
torna um veículo para expressar o desejo de destruir o outro e afirmar uma
identidade nula.
Desmentir,
por si só, é ineficaz – sobretudo diante de uma mídia alucinada pelo prazer de
manipular a ignorância com fins políticos e elitistas. Esse cenário é agravado
pelo efeito persuasivo das redes sociais, onde o alto engajamento potencializa
as mentiras, inutilizando os esforços pela verdade e prendendo o governo à
pauta delirante e incessante das falsas versões da realidade.
Reagir
passivamente a essas mentiras apenas retroalimenta essa anomalia comunicativa.
O domínio do debate público exige que o governo ocupe a pauta e proponha os
assuntos com narrativas próprias.
É
essencial responder às mentiras com novos temas, utilizar os canais de TV para
anúncios estratégicos a cada fake news, politizar a questão e associar a
falsificação à criminalidade extremista. Mais do que isso, é preciso
estabelecer uma agenda diária para explorar os avanços em projetos, programas e
ações políticas, esgotando a atenção destinada às fraudes.
Uma
batalha ideológica contínua deve ser travada, simbolizando atos concretos e
criando contrapontos humanitários à barbárie oposicionista. Permanecer
exclusivamente no desmentido apenas vicia os mentirosos, conferindo-lhes
visibilidade e perpetuando a desinformação no imaginário público.
Quem
define o tema dita a reação. Portanto, o governo deve assumir o protagonismo do
debate, pautando a agenda com firmeza e clareza.
¨ Uma lei contra as fake news facilitaria o trabalho de
Sidônio. Por Paulo Henrique Arantes
Sidônio
Palmeira assume a comunicação de Lula incumbido de tornar os feitos positivos
do governo conhecidos da massa, traduzindo-os em linguagem facilmente
compreensível, explicando os ganhos proporcionados ao povo e contrapondo-se a
movimentos de mídia contrários. Também caberá ao marqueteiro orientar as manifestações
públicas do presidente, ao que parece. Além disso, terá de unificar os
discursos do Planalto e dos ministérios.
Tudo
isso é factível, bem como são possíveis - não certas - as melhoras de imagem
decorrentes das novas estratégias. Partindo-se do pressuposto de que o governo
está no caminho certo, e que as desaprovações decorrem de desinformação ou
informação mal dada, imagina-se que Sidônio passará mais tempo desmentindo fake
news do que criando discursos e peças de marketing institucional propositivo.
A
indústria das notícias falsas nunca esteve tão pujante, e mentiras como a
taxação do PIX são só faíscas. Os magos das fake news estão no topo, sejam eles
políticos - Donald Trump -, marqueteiros - Steve Bannon - ou empresários - Elon
Musk. Os três citados personificam hoje o poder americano sobre o mundo e deles
pode-se esperar qualquer coisa, até Bannon atacando Musk, um rematado teatro em
busca de espaço na Casa Branca. Ganha a corja direitista o apoio de Mark
Zuckerberg, o cínico capo da Meta.
Por aqui,
aquartelados em algum canto, os operadores do gabinete do ódio bolsonarista
resistem enquanto o famigerado inquérito das fake news sofre prorrogações. As
situações e falas forjadas nas redes sociais, algumas inverossímeis, continuam
abundantes. Há de vir do Supremo Tribunal Federal algo que efetivamente ponha
limite ao que essa gente classifica como “liberdade de expressão”. Do Congresso
não vem nada.
A
questão é polêmica, certamente. Mas este jornalista vê, a cada dia mais, como
imprescindível uma legislação específica contra as fake news no Brasil. Se há
um novo crime tipificado, ele deve ser objeto de lei.
As
fake news são peças de estratégias políticas, friamente forjadas e adequadas ao
terreno dos robôs e dos algoritmos. O Brasil precisa de uma lei para punir algo
que serve de base para nada menos que tentativas de golpe de Estado. Não se
pode conviver eternamente com dois mundos - um real, outro fictício, paralelo,
forjado por estrategistas de extrema direita dedicados a promover o caos e a
caluniar governos democráticos.
Como
já escrevemos neste espaço, “o temor de que uma lei específica contra as fake
news resulte em censura não se justifica, a não ser que seu texto seja mal
escrito ou mal aplicado. É irritante ler, ouvir e assistir a ‘analistas’ falando
sobre os ‘riscos’ que podem decorrer de uma lei das fakes, a qual seria
potencialmente cerceadora de opiniões. De que planeta vêm esses senhores e
essas senhoras? É preciso lhes desenhar a óbvia diferença entre uma opinião e
uma acusação mentirosa, um fato forjado para destruir uma reputação ou
desacreditar, por exemplo, uma eleição democrática?”
Uma
lei das fake news facilitaria bastante o trabalho de Sidônio Palmeira.
¨ Fake news do
imposto no Pix alcançou quase 10 milhões de usuários em uma semana
Mais de 9,4 milhões
de brasileiros foram alvo de desinformação entre os dias 7 e 14 de janeiro com
a propagação de notícias falsas em grupos públicos do WhatsApp e
do Telegram, após o Banco Central (BC) revelar as
novas regras para o compartilhamento de dados fiscais com a Receita Federal.
As mensagens, em
sua maioria em vídeos ou textos, propagavam a mentira de que o governo Lula
teria optado por taxar transações via Pix, prejudicando os pequenos e médios
empresários.
A alegação,
entretanto, é totalmente falsa. Como já foi explicado em reportagens da Fórum e
por meio de comunicados tanto do governo quanto da Federação Nacional de
Bancos (Febraban), o Pix continua isento de impostos. Segundo a Febraban, a
diferença é que as instituições financeiras vão precisar informar à Receita
Federal sobre transações acima de certos valores, como já fazem desde 2015 para
outras modalidades de pagamento.
Conforme dados
da Palver, adquiridos pela Agência Lupa, de checagem de fatos, mais
de 18 mil mensagens únicas sobre o tema foram compartilhadas em 2,2 mil grupos
de comunicação em português, com membros de diferentes partes do Brasil, nos
últimos sete dias.
Isso resulta em uma
média de quase dois conteúdos novos (1,8 mensagem) sendo postados a cada minuto
no WhatsApp ou Telegram desde terça-feira passada. A análise da Palver revelou
que as mensagens falsas sobre o Pix, com conteúdo predominantemente negativo,
se espalharam rapidamente por todo o Brasil, especialmente em São Paulo.
As fake news, que
associavam o Pix a uma nova taxação e a um suposto favorecimento de bancos e
milionários, foram disseminados principalmente através do WhatsApp, nos códigos
de área 11 e 19. A propagação dessas mensagens, nos dois aplicativos, segue um
padrão semelhante: os ataques ao Pix começaram no dia 8 de janeiro e
atingiram seu auge no dia 12. O dia em que o senador Flávio Bolsonaro
(PL-RJ) gravou um vídeo, com ironia, dizendo que o presidente
"monitorava até quem pede dinheiro em semáforo", além dele, o
deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) também foi e segue sendo um
dos maiores responsáveis pela propagação da desinformação sobre o Pix, com um
vídeo com mais de 50 milhões de visualizações.
Entre as 18 mil
mensagens únicas sobre o Pix detectadas, pelo menos 38 receberam a
classificação de virais pela Meta, com a seta dupla, que é atribuída a
conteúdos “frequentemente encaminhados”. Dentro das mensagens mais populares,
20 mil pessoas tiveram acesso a pelo menos um desses conteúdos ultravirais em
39 grupos públicos. Além disso, todos os materiais que circularam no WhatsApp
em 12 de janeiro foram classificados como “negativos” pelo sistema automático
da Palver.
<><> Movimentações
despencaram no período
O sistema de
pagamentos instantâneos Pix, lançado pelo Banco Central em novembro de 2020,
registrou em janeiro uma expressiva queda no volume de
transações,
a maior desde sua implementação. O resultado foi divulgado nesta quarta (15).
Entre os dias 4 e
10 deste mês, foram realizadas 1,250 bilhão de operações, uma retração de 10,9%
em relação ao mesmo período de dezembro, segundo levantamento do jornal O Globo
com base em dados do Sistema de Pagamentos Instantâneos (SPI). O motivo é
claro: desde o início do mês, a notícia falsa de que o governo iria
taxar as transações via Pix ou espionar a movimentação financeira de pequenos
comerciantes se espalhou nas redes e muitos ainda acreditam que serão cobrados
através das transferências.
<><> Do
"Taxad" à cotação do dólar no Google: fake news na economia é maior
arma da extrema direita
O que parecia ser
algo espontâneo e apenas engraçado, uma brincadeira com o ministro da Fazenda
sobre a "taxação das blusinhas", se revelou algo coordenado e com
alto grau de profissionalismo, visto a qualidade dos memes, os referenciais
semióticos e culturais e, novamente, o volume. Inclusive, um dos cards contra
Fernando Haddad foi exibido em um telão da Times Square.
Para além da
"memeficação" do ministro Fernando Haddad enquanto alguém obsessivo
por taxar a população brasileira, alguns pontos devem ser levados em conta
quanto ao timing da campanha contra o ministro da Fazenda: ela
iniciou logo após duas pesquisas revelarem que a avaliação do presidente
melhorou em 2024; também tinham por objetivo estabelecer um discurso em torno
da figura de Haddad (como um político taxador) e fazer com que a rejeição de
sua figura o inviabilize a projetos políticos futuros, por exemplo, as disputas
eleitorais de 2026 e 2030.
Porém, dados
divulgados pelo Ministério da Fazenda mostraram no ano passado que, ao
contrário da campanha "Taxad", a carga tributária diminuiu no
primeiro ano do governo Lula.
Além disso, as
notícias falsas surgiram em meio à instabilidade do mercado financeiro e
tiveram impacto na valorização do dólar entre novembro e dezembro de 2024, que
chegou a cotações recordes. Às vésperas do Natal no Brasil, depois de
permanecer com a cotação incorreta por boa parte do dia, o valor do dólar foi
removido do site de busca do Google. Em nota, a empresa reconheceu o erro e
atribuiu a culpa das fontes de dados utilizadas à Morningstar, uma
empresa que lidera pesquisas independentes de investimentos.
O deputado
federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) fez uma piada em relação ao
presidente Luiz Inácio Lula da Silva e repercutiu uma fake news sobre a cotação
do dólar, publicada pelo Google. "Presente de Natal do Lule. Mas 2025 será
diferente, é apenas especulação dos malvadões do mercado. Confia", mentiu
o parlamentar no X à época.
A propagação rápida
e massiva de desinformação revela a fragilidade dos brasileiros diante de
rumores financeiros e indica que o Brasil pode estar seguindo o mesmo caminho
dos Estados Unidos em 2024, segundo a Agência Lupa.
Durante a campanha
presidencial americana, pesquisas apontaram que a percepção pública sobre
inflação e economia nos EUA era majoritariamente negativa, apesar de dados como
inflação, desemprego e PIB indicarem um cenário favorável. Na véspera das
eleições gerais, a capa da revista The Economist destacou a economia
dos EUA como “a inveja do mundo”. Mesmo assim, os eleitores americanos
continuaram com uma visão negativa da economia e escolheram Donald Trump, com a
promessa de que ele resolveria os problemas financeiros do país.
Fonte: Brasil 247/Fórum
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