quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

Moisés Mendes: Mentir é o vício sem cura na cracolândia do bolsonarismo

O novo ministro da Secretaria de Comunicação do governo disse, com ênfase, o que deixou de ser uma obviedade da natureza de quem lida com informação. Sidônio Palmeira assumiu anunciando que vai se dedicar à imposição da verdade.

Em outras circunstâncias, poderia parecer uma fala de pregação religiosa ou um juramento protocolar. Mas foi isso o que Sidônio disse em entrevista ao Globo, na festa da posse: 

 “Não podemos deixar a fake news entrar sozinha. Primeiro, você precisa passar a verdade e depois desfazer a mentira, não o inverso, não correr atrás da mentira”. 

Lutar pela verdade, nas circunstâncias que cercam o governo, talvez seja mais desafiador para Sidônio na Secom do que brigar pelo juro baixo para Gabriel Galípolo no Banco Central. 

O ministro assume correndo atrás da mentira, mas Nikolas Ferreira é mais rápido. A mentira anda junto com a percepção enviesada da realidade, mesmo que essa percepção nem sempre tenha relação com fake news. 

Sidônio chega anunciando que também vai tentar entender por que a população não se dá por satisfeita com os bons níveis de emprego, consumo e renda, como mostram as pesquisas.

Por que o sentimento de que há suportes sociais, estabilidade e perspectiva de melhoria de vida, que valia antes, sofre distorções aparentemente incompreensíveis no terceiro governo de Lula? 

Seria só por causa da ação destrutiva e mentirosa da extrema direita? Da sabotagem articulada pela grande imprensa, que produz pelo menos uma notícia ruim por dia? Quase sempre em manchete de alto de página.

A existência de um monolito inflexível de um terço da população identificada com o bolsonarismo explica a baixa aprovação do governo e de Lula? Esse um terço, que não existia com esse formato até a ascensão de Bolsonaro, vai estar sempre insatisfeito? 

O integrante desse contingente dissemina fake news intensamente, não por acreditar na mentira, mas porque a mentira é também o que o identifica como ativista antilulista, antiPT e anticomunista.

A disseminação da mentira é o que assegura a milhões de brasileiros a certeza do pertencimento. É um vício praticado com a reza diária e a empreitada coletiva do golpismo permanente. 

A tia e o tio do zap e das redes são parte de uma tribo, talvez a maior do país, a grande tribo dos mentirosos. Os redutos reais e virtuais de fabricação e consumo de mentira são as cracolândias do bolsonarismo. 

Rezam e propagam a mentira produzida pelas estruturas intactas do fascismo. Sem que esses praticantes de mentiras e de rezas tenham o mínimo sentimento do que, nas igrejas rezadeiras, chamam de contrição.

Não há culpa pelos danos das fake news porque essa é uma atribuição quase religiosa e purificadora. É com isso que Sidônio irá lidar. Com as engrenagens orgânicas e fundamentalistas da disseminação de fake news. 

A mentira passou a fazer parte da índole desse um terço de brasileiros que precisa manter o bolsonarismo vivo na sua essência. E as fake news, de preferência com ódio, são a alma dos afazeres dessa gente.

Poucas coisas são mais funcionais hoje no Brasil do que as estruturas e os mecanismos de propagação de mentiras, com as facilidades oferecidas pelas big techs e suas liberdades absolutas, mas só para a extrema direita. 

Desmontar a fake news da taxação do PIX é um desafio grandioso, mas só o primeiro do ano. Sidônio corre atrás de uma mentira, quando deveria estar pensando em como vender as verdades do governo.

E a verdade é hoje uma versão do que cada um emite ou capta a seu modo em meio a um pântano de mentiras criminosas, grotescas e devastadoras. 

A adoração da mentira é o que mais mobiliza e agrega gente no mundo todo. A mentira é componente essencial da organização e da articulação do fascismo analógico e digital livre de regras e de regulações. 

E essa é uma questão para a Justiça e para a ação política das esquerdas e não só para o governo, para muito além das táticas milagrosas de comunicação. Sidônio sabe que Lula sabe muito bem.

 

¨      É inútil e insano transformar o desmentido de fake news no foco central da comunicação do governo. Por Tiago Barbosa

É inútil e insano transformar o desmentido de fake news no foco central da comunicação do governo.

Isso equivale a reduzir a gestão a um reflexo das falcatruas ideológicas vomitadas nas redes, subordinando sua ação à agenda de quem subverte a realidade para perverter a vida e a política.

Persistir nessa lógica ignora aspectos fundamentais da alienação na era digital: a servidão irracional, o convencimento pela exposição massiva e o endosso midiático.

Os extremistas fundamentam sua convicção na submissão total ao ecossistema de desinformação. Consumir, apoiar e disseminar mentiras não é apenas um ato, mas uma forma de dar sentido a vidas medíocres e ressentidas. Daí o desprezo aos fatos e à informação: para eles, o ódio se sobrepõe à razão, e a fake news se torna um veículo para expressar o desejo de destruir o outro e afirmar uma identidade nula.

Desmentir, por si só, é ineficaz – sobretudo diante de uma mídia alucinada pelo prazer de manipular a ignorância com fins políticos e elitistas. Esse cenário é agravado pelo efeito persuasivo das redes sociais, onde o alto engajamento potencializa as mentiras, inutilizando os esforços pela verdade e prendendo o governo à pauta delirante e incessante das falsas versões da realidade.

Reagir passivamente a essas mentiras apenas retroalimenta essa anomalia comunicativa. O domínio do debate público exige que o governo ocupe a pauta e proponha os assuntos com narrativas próprias.

É essencial responder às mentiras com novos temas, utilizar os canais de TV para anúncios estratégicos a cada fake news, politizar a questão e associar a falsificação à criminalidade extremista. Mais do que isso, é preciso estabelecer uma agenda diária para explorar os avanços em projetos, programas e ações políticas, esgotando a atenção destinada às fraudes.

Uma batalha ideológica contínua deve ser travada, simbolizando atos concretos e criando contrapontos humanitários à barbárie oposicionista. Permanecer exclusivamente no desmentido apenas vicia os mentirosos, conferindo-lhes visibilidade e perpetuando a desinformação no imaginário público.

Quem define o tema dita a reação. Portanto, o governo deve assumir o protagonismo do debate, pautando a agenda com firmeza e clareza.

 

¨      Uma lei contra as fake news facilitaria o trabalho de Sidônio. Por Paulo Henrique Arantes

Sidônio Palmeira assume a comunicação de Lula incumbido de tornar os feitos positivos do governo conhecidos da massa, traduzindo-os em linguagem facilmente compreensível, explicando os ganhos proporcionados ao povo e contrapondo-se a movimentos de mídia contrários. Também caberá ao marqueteiro orientar as manifestações públicas do presidente, ao que parece. Além disso, terá de unificar os discursos do Planalto e dos ministérios.

Tudo isso é factível, bem como são possíveis - não certas - as melhoras de imagem decorrentes das novas estratégias. Partindo-se do pressuposto de que o governo está no caminho certo, e que as desaprovações decorrem de desinformação ou informação mal dada, imagina-se que Sidônio passará mais tempo desmentindo fake news do que criando discursos e peças de marketing institucional propositivo.

A indústria das notícias falsas nunca esteve tão pujante, e mentiras como a taxação do PIX são só faíscas. Os magos das fake news estão no topo, sejam eles políticos - Donald Trump -, marqueteiros - Steve Bannon - ou empresários - Elon Musk. Os três citados personificam hoje o poder americano sobre o mundo e deles pode-se esperar qualquer coisa, até Bannon atacando Musk, um rematado teatro em busca de espaço na Casa Branca. Ganha a corja direitista o apoio de Mark Zuckerberg, o cínico capo da Meta.

Por aqui, aquartelados em algum canto, os operadores do gabinete do ódio bolsonarista resistem enquanto o famigerado inquérito das fake news sofre prorrogações. As situações e falas forjadas nas redes sociais, algumas inverossímeis, continuam abundantes. Há de vir do Supremo Tribunal Federal algo que efetivamente ponha limite ao que essa gente classifica como “liberdade de expressão”. Do Congresso não vem nada.

A questão é polêmica, certamente. Mas este jornalista vê, a cada dia mais, como imprescindível uma legislação específica contra as fake news no Brasil. Se há um novo crime tipificado, ele deve ser objeto de lei.

As fake news são peças de estratégias políticas, friamente forjadas e adequadas ao terreno dos robôs e dos algoritmos. O Brasil precisa de uma lei para punir algo que serve de base para nada menos que tentativas de golpe de Estado. Não se pode conviver eternamente com dois mundos - um real, outro fictício, paralelo, forjado por estrategistas de extrema direita dedicados a promover o caos e a caluniar governos democráticos.

Como já escrevemos neste espaço, “o temor de que uma lei específica contra as fake news resulte em censura não se justifica, a não ser que seu texto seja mal escrito ou mal aplicado. É irritante ler, ouvir e assistir a ‘analistas’ falando sobre os ‘riscos’ que podem decorrer de uma lei das fakes, a qual seria potencialmente cerceadora de opiniões. De que planeta vêm esses senhores e essas senhoras? É preciso lhes desenhar a óbvia diferença entre uma opinião e uma acusação mentirosa, um fato forjado para destruir uma reputação ou desacreditar, por exemplo, uma eleição democrática?”

Uma lei das fake news facilitaria bastante o trabalho de Sidônio Palmeira.

 

¨      Fake news do imposto no Pix alcançou quase 10 milhões de usuários em uma semana

Mais de 9,4 milhões de brasileiros foram alvo de desinformação entre os dias 7 e 14 de janeiro com a propagação de notícias falsas em grupos públicos do WhatsApp e do Telegram, após o Banco Central (BC) revelar as novas regras para o compartilhamento de dados fiscais com a Receita Federal.

As mensagens, em sua maioria em vídeos ou textos, propagavam a mentira de que o governo Lula teria optado por taxar transações via Pix, prejudicando os pequenos e médios empresários.

A alegação, entretanto, é totalmente falsa. Como já foi explicado em reportagens da Fórum e por meio de comunicados tanto do governo quanto da Federação Nacional de Bancos (Febraban), o Pix continua isento de impostos. Segundo a Febraban, a diferença é que as instituições financeiras vão precisar informar à Receita Federal sobre transações acima de certos valores, como já fazem desde 2015 para outras modalidades de pagamento.

Conforme dados da Palver, adquiridos pela Agência Lupa, de checagem de fatos, mais de 18 mil mensagens únicas sobre o tema foram compartilhadas em 2,2 mil grupos de comunicação em português, com membros de diferentes partes do Brasil, nos últimos sete dias. 

Isso resulta em uma média de quase dois conteúdos novos (1,8 mensagem) sendo postados a cada minuto no WhatsApp ou Telegram desde terça-feira passada. A análise da Palver revelou que as mensagens falsas sobre o Pix, com conteúdo predominantemente negativo, se espalharam rapidamente por todo o Brasil, especialmente em São Paulo. 

As fake news, que associavam o Pix a uma nova taxação e a um suposto favorecimento de bancos e milionários, foram disseminados principalmente através do WhatsApp, nos códigos de área 11 e 19. A propagação dessas mensagens, nos dois aplicativos, segue um padrão semelhante: os ataques ao Pix começaram no dia 8 de janeiro e atingiram seu auge no dia 12. O dia em que o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) gravou um vídeo, com ironia, dizendo que o presidente "monitorava até quem pede dinheiro em semáforo", além dele, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) também foi e segue sendo um dos maiores responsáveis pela propagação da desinformação sobre o Pix, com um vídeo com mais de 50 milhões de visualizações.

Entre as 18 mil mensagens únicas sobre o Pix detectadas, pelo menos 38 receberam a classificação de virais pela Meta, com a seta dupla, que é atribuída a conteúdos “frequentemente encaminhados”. Dentro das mensagens mais populares, 20 mil pessoas tiveram acesso a pelo menos um desses conteúdos ultravirais em 39 grupos públicos. Além disso, todos os materiais que circularam no WhatsApp em 12 de janeiro foram classificados como “negativos” pelo sistema automático da Palver. 

<><> Movimentações despencaram no período

O sistema de pagamentos instantâneos Pix, lançado pelo Banco Central em novembro de 2020, registrou em janeiro uma expressiva queda no volume de transações, a maior desde sua implementação. O resultado foi divulgado nesta quarta (15).

Entre os dias 4 e 10 deste mês, foram realizadas 1,250 bilhão de operações, uma retração de 10,9% em relação ao mesmo período de dezembro, segundo levantamento do jornal O Globo com base em dados do Sistema de Pagamentos Instantâneos (SPI). O motivo é claro: desde o início do mês, a notícia falsa de que o governo iria taxar as transações via Pix ou espionar a movimentação financeira de pequenos comerciantes se espalhou nas redes e muitos ainda acreditam que serão cobrados através das transferências.

<><> Do "Taxad" à cotação do dólar no Google: fake news na economia é maior arma da extrema direita

O que parecia ser algo espontâneo e apenas engraçado, uma brincadeira com o ministro da Fazenda sobre a "taxação das blusinhas", se revelou algo coordenado e com alto grau de profissionalismo, visto a qualidade dos memes, os referenciais semióticos e culturais e, novamente, o volume. Inclusive, um dos cards contra Fernando Haddad foi exibido em um telão da Times Square. 

Para além da "memeficação" do ministro Fernando Haddad enquanto alguém obsessivo por taxar a população brasileira, alguns pontos devem ser levados em conta quanto ao timing da campanha contra o ministro da Fazenda: ela iniciou logo após duas pesquisas revelarem que a avaliação do presidente melhorou em 2024; também tinham por objetivo estabelecer um discurso em torno da figura de Haddad (como um político taxador) e fazer com que a rejeição de sua figura o inviabilize a projetos políticos futuros, por exemplo, as disputas eleitorais de 2026 e 2030.

Porém, dados divulgados pelo Ministério da Fazenda mostraram no ano passado que, ao contrário da campanha "Taxad", a carga tributária diminuiu no primeiro ano do governo Lula. 

Além disso, as notícias falsas surgiram em meio à instabilidade do mercado financeiro e tiveram impacto na valorização do dólar entre novembro e dezembro de 2024, que chegou a cotações recordes. Às vésperas do Natal no Brasil, depois de permanecer com a cotação incorreta por boa parte do dia, o valor do dólar foi removido do site de busca do Google. Em nota, a empresa reconheceu o erro e atribuiu a culpa das fontes de dados utilizadas à Morningstar, uma empresa que lidera pesquisas independentes de investimentos. 

O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) fez uma piada em relação ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e repercutiu uma fake news sobre a cotação do dólar, publicada pelo Google. "Presente de Natal do Lule. Mas 2025 será diferente, é apenas especulação dos malvadões do mercado. Confia", mentiu o parlamentar no X à época.

A propagação rápida e massiva de desinformação revela a fragilidade dos brasileiros diante de rumores financeiros e indica que o Brasil pode estar seguindo o mesmo caminho dos Estados Unidos em 2024, segundo a Agência Lupa. 

Durante a campanha presidencial americana, pesquisas apontaram que a percepção pública sobre inflação e economia nos EUA era majoritariamente negativa, apesar de dados como inflação, desemprego e PIB indicarem um cenário favorável. Na véspera das eleições gerais, a capa da revista The Economist destacou a economia dos EUA como “a inveja do mundo”. Mesmo assim, os eleitores americanos continuaram com uma visão negativa da economia e escolheram Donald Trump, com a promessa de que ele resolveria os problemas financeiros do país. 

 

Fonte: Brasil 247/Fórum

 

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