terça-feira, 14 de janeiro de 2025

Jair de Souza: O livre arbítrio e o uso da razão

Precisamos levar em conta que no Brasil atual, nos Estados Unidos e em diversos outros países, o movimento político de extrema direita, de cunho nazifascista, vem tendo como sua mais importante base de sustentação de massas pessoas de origem humilde que, desesperadas com as terríveis dificuldades com que se deparam em seu dia a dia, buscam nas igrejas ditas cristãs algum amparo para escapar de sua situação de agonia social.

É inegável que o principal fator de motivação que leva essas pessoas a procurar igrejas que se autodenominam evangélicas cristãs é o enorme peso simbólico que a figura de Jesus desempenha no imaginário de nossa população.

É quase que absoluta a visão que se tem de Jesus como o defensor maior daquilo que poderíamos classificar como bondade, justiça, solidariedade e fraternidade.

Com exceção de uns poucos espertalhões que veem no cristianismo um instrumento para ludibriar incautos e fazer fortuna a partir disto, a imensa maioria daqueles que se acercam a essas igrejas fazem-no por um propósito sincero de busca de uma saída digna para o atoleiro de sua vida.

No entanto, o que estamos constatando cada vez com mais nitidez é que a variante do cristianismo que tem predominado entre nossa população mais carente é algo inteiramente diferente daquilo que podemos extrair dos ensinamentos deixados pelo próprio Jesus nos relatos de sua vida encontrados nos Evangelhos.

É que, embora nessas passagens, o Jesus que nos aparece esteja sempre vinculado às causas favoráveis aos mais humildes, como a defesa da justiça, da solidariedade e da tolerância, a atenção prioritária aos mais carentes e mais necessitados, ou seja, aos pobres, o posicionamento da maioria das igrejas que apelam para o nome de Jesus se volta para o rumo oposto, com o absoluto privilegiamento dos interesses dos acaudalados, dos que detêm a riqueza, daqueles que exercem o poder.

Na verdade, sem que tenham a coragem de admiti-lo abertamente, boa parte dessas igrejas abandonaram por completo os preceitos que Jesus defendia para se dedicarem exatamente a operar em sentido contrário.

Por isso, não é mera casualidade que a grande maioria delas se identifiquem na prática com o bolsonarismo, com o fascismo e, até mesmo, com o nazismo.

Neste processo de usar Jesus como símbolo de atração, ao passo que se elimina de suas pregações o significado de suas mensagens, essas igrejas abandonaram quase que totalmente aquelas partes dos textos bíblicos que se referem à vida efetiva de Jesus para se concentrarem nos textos do Antigo Testamento, especialmente naqueles que lhes abrem a possibilidade de fazer a defesa de inúmeros casos de arbitrariedade e atrocidades que andam sendo praticadas, tanto no Brasil como na Palestina e em outras partes do mundo.

Além do mais, convém recordar que alguns dos mais horrendos crimes contra a humanidade ao longo da história foram praticados apelando-se para o nome de Jesus, como, por exemplo, no caso das Cruzadas.

Em vista disto, creio ser conveniente refletir sobre algumas das questões atuais que acabam nos remetendo a uma discussão sobre a interpretação de certas passagens contidas no Antigo Testamento.

Ao fazer isto, vamos nos dar conta de como se busca inculcar na mente de gente imbuída de boa intenção certos conceitos e crenças que se chocam frontalmente com o que esperaríamos derivar dos ensinamentos de vida proporcionados por Jesus.

Se aceitarmos como válido o princípio de que Deus é o criador de tudo e de todos, deveríamos levar em conta que:

a) Deus precisa necessariamente representar apenas o bem, nunca o mal;

b) Deus tinha seus propósitos ao criar o ser humano dotado da capacidade de raciocinar;

c) Ao atribuir ao ser humano o direito ao livre arbítrio, Deus lhe indicou que teria de tomar decisões por sua própria conta diante das situações concretas.

Portanto, todo ser humano deve refletir, fazer uso de sua capacidade de raciocinar, antes de acatar qualquer determinação, para não incorrer em práticas do mal.

Por exemplo, se alguém nos diz que Deus tem mesmo um povo escolhido, pois assim está escrito na Bíblia, nossa obrigação é usar nosso poder de raciocinar para comprovar se isto pode realmente ser algo digno de Deus.

Devemos nos perguntar: Poderia Deus ser um racista, que dá preferência a um povo em detrimento dos outros?

Seria justo que a mera casualidade de nascer em um certo povo servisse para determinar a pertinência ao povo de Deus?

Um ser justo e bondoso poderia ser racista, discriminador e cruel a tal ponto?

Ou quando a Bíblia diz que Deus cobrou de Abraão uma prova de lealdade com uma ordem para que ele sacrificasse seu próprio filho. Em lugar de se dispor a cumprir a ordem de imediato, Abraão deveria ter refletido sobre a mesma antes de decidir o que fazer.

Ele deveria ter se perguntado: Se Deus é a representação máxima do bem, por que ele está me exigindo prova de lealdade pela prática de uma maldade tão monstruosa?

A conclusão lógica a que chegaria é que, para comprovar sua fidelidade aos princípios de Deus, ele teria de rechaçar rotundamente aquele inaceitável pedido.

Também no caso bíblico em que Deus ordena a Josué que entre com suas tropas em Canaã e extermine a todos os seus habitantes, sem poupar nem mesmo as crianças. Poderia um Deus do bem ser um assassino tão impiedoso, um genocida da pior espécie?

Outra vez, para atuar em verdadeira consonância com o espírito de um Deus bondoso e justo, Josué jamais poderia ter concordado com a medida. Nesta oportunidade, novamente, Deus deve ter se sentido defraudado.

Nos relatos da vida de Jesus, a gente vê que ele nunca aceita submeter-se a nenhuma determinação que lhe pareça servir a causas malignas, tão somente por estarem elas nos textos considerados sagrados.

Ou seja, Jesus nunca toma nenhuma posição sem fazer uso da razão. Ele não acata nenhuma determinação apenas por ela constar na Bíblia.

Como o ser humano nasce dotado da faculdade do exercício da razão e lhe foi atribuído o direito de livre arbítrio, sua obrigação é fazer uso desta capacidade sempre que confrontado com situações que se mostrem pouco claras.

Se não fosse para ser empregada em momentos de dúvidas, Deus não criaria o ser humano com esta potencialidade. Em tal caso, o ser humano seria tão somente uma outra espécie animal, pouco se diferenciando dos demais.

Porém, nunca deveríamos culpar a Deus pelos erros que nós cometemos, já que, por termos sido criados com a maravilhosa possibilidade de distinguir o que é certo do que é errado, além de contar com o direito de livre arbítrio, cabe a nós avaliarmos a correção ou incorreção das determinações que nos são atribuídas.

Assim, independentemente de que tenhamos ou não crença religiosa, somos forçados a reconhecer que Deus não pode ser responsabilizado por aquilo que diz respeito a decisões de nossa própria alçada.

Para que fique evidente como algumas das mais significativas manipulações dos textos bíblicos foram forjadas, é importante que dediquemos atenção aos trabalhos científicos de arqueologia realizados por alguns estudiosos sérios e escrupulosos no intuito de dirimir dúvidas existentes sobre as narrativas bíblicas e suas correspondentes bases históricas.

E, para que não paire nenhuma suspeita, os investigadores aos quais nos referimos estão vinculados ao próprio Estado de Israel e, portanto, não podem ser tidos como meros agentes a serviço do antissemitismo, como gostam de arguir muitos daqueles que não aceitam que sejam feitas críticas a nada que ponha em cheque pontos que dão amparo ao sionismo, neste caso, mais especificamente, a sua vertente majoritária cristã.

Os vídeos postados na sequência são documentários sobre as descobertas reveladas pelas escavações arqueológicas realizadas sob o comando do arqueólogo Israel Finkelstein.

Por considerá-los de suma importância para o tema em questão, fiz sua tradução ao português e preparei as respectivas legendas.

Creio que vale a pena vê-los e refletir sobre seu conteúdo.

 

¨      Mundo neofeudal, ‘engraçadinho’ como Trump ou trágico como a guerra? Por Pedro Pinho

As manifestações a respeito da posse na presidência da Venezuela, dia 10 de janeiro, de Nicolás Maduro desencadeou verdadeiro show de estupidez, lugar comum, falta de inteligência em todos programas jornalísticos nas televisões brasileiras. Seríamos tão imbecis?

Estaria a profissão, como vem ocorrendo com o saber em tudo mais, sob o domínio do poder neoliberal, ficado cada vez mais obtuso, menos capaz de reflexões minimamente inteligentes?

Yanis Varoufakis, ex-ministro das Finanças da Grécia, em 2015, lançou instigante expressão em seu último livro: “Technofeudalism: What Killed Capitalism” (setembro/2023).

<><> O que significa?

Com a palavra Varoufakis:

“É assim que termina o capitalismo: não com um estrondo revolucionário, mas com uma lamúria evolucionária. Como deslocou o feudalismo gradualmente, sub-repticiamente, até que um dia o grosso das relações humanas se baseou no mercado e o feudalismo foi varrido, o capitalismo hoje está sendo derrubado por novo modo econômico: o tecnofeudalismo”.

Prosseguindo:

“Esta é uma grande reivindicação que vem no calcanhar de muitas previsões prematuras do fim do capitalismo, especialmente a partir da esquerda. Mas desta vez pode muito bem ser verdade. As pistas já são visíveis há algum tempo. Os preços dos títulos e das ações, que deveriam estar se movendo em direções nitidamente opostas, têm disparado em uníssono, caindo ocasionalmente, mas sempre no mesmo passo firme de marcha. Similarmente, o custo do capital (o retorno exigido para possuir um título) deveria estar caindo com volatilidade; ao invés disso, ele tem aumentado à medida que os retornos futuros se tornam mais incertos”.

“Talvez o sinal mais claro de que algo sério está em curso tenha aparecido em 12 de agosto do ano passado (2022). Naquele dia, soubemos que, nos primeiros sete meses de 2020, a renda nacional do Reino Unido havia diminuído mais de 20%, bem acima até mesmo das previsões mais obscenas. Alguns minutos depois, a Bolsa de Valores de Londres saltou mais de 2%. Nada comparável havia até então ocorrido. As finanças tinham se tornado totalmente dissociadas da economia real”.

Curiosamente, procurando a situação que retratasse a nova divisão do mundo, não mais pelos Estados Nacionais, já eliminados pelos “mercados”, também chegamos à Idade Média, onde os feudos não seriam identificados territorialmente mas pelos objetivos dos “gestores de ativos”, individualmente ou em consórcios.

Exemplificado: feudo das fontes de energia primária, espalhando-se por continentes, pertencentes a meia dúzia de gestores de ativos, tipo BlackRock, State Street, Vanguard, J.P. Morgan etc.

Porém, o que se pretende aqui refletir é sobre a comunicação. Neste mundo descrito por Varoufakis e muitos outros perspicazes estudiosos, a comunicação é capítulo importantíssimo, da maior relevância.

Miguel Nicolelis, o genial neurocientista brasileiro, escreveu “O Verdadeiro Criador de Tudo; como o cérebro humano esculpiu o universo como nós o conhecemos” (Editora Planeta, SP, 2020), onde separa as mensagens, que vem e vão do cérebro, conforme possam ser digitalizadas, shannoniana (devidas a Claude Shannon – 1916-2001) ou tratadas de modo analógico, gödeliana (Kurt Gödel – 1906-1978).

Além dos tratamentos das mensagens, cada vez mais sofisticados como se sabe pelas novas armas utilizadas nas diversas guerras do século XXI, há, também, suas aplicações na conquista do espaço e dos planetas, satélites, enquanto o Brasil abre mão de sua Base de Alcântara (Estado do Maranhão) demonstrando governos subservientes ao interesse estrangeiro e onde fica o poder aqui dirigente.

O dano mais profundo da ideologia neoliberal que chega ao Brasil por pressão do capital financeiro na sucessão do presidente Ernesto Geisel, que denomino o terceiro golpe do período 1964-1985, duração dos governos militares autoritários do século XX.

O primeiro (1964) foi para afastar o vice-presidente eleito, João Goulart; o segundo (1967-1979) para nacionalizar a governança, entregue pelo primeiro aos Estados Unidos da América (EUA); e o terceiro (1979) para impedir a continuidade do nacionalismo tenentista daquela fase, impondo presidente discordante, porém de pouca capacidade gerencial para sucessão.

Valeram-se as finanças, para chantagear Geisel, da dívida externa entre outras razões para suportar a importação de petróleo, cujo consumo cresceu com o “milagre brasileiro”, e o preço do barril com as crises, igualmente forjadas pelas finanças, na década 1970.

Verifica-se que, excluindo os Centros Integrados de Educação Pública, os CIEPS de Leonel Brizola e Darcy Ribeiro no Rio de Janeiro, nada foi feito para melhorar a qualidade do ensino no Brasil. Ao contrário, os professores continuariam sendo profissionais mal remunerados e, socialmente, não dos melhores avaliados.

Hoje já se discute o uso da inteligência artificial para exames de redação no vestibular às universidades. Mais um passo para o sepultamento do saber e se tornar comentarista político na televisão aberta.

<><> Qual o embate deste século XXI

É fundamental entender o que está em questão para avaliar as estratégias das partes.

O mundo neoliberal financeiro começou a mostrar-se vencedor da disputa pelo poder mundial com as desregulações financeiras obtidas em duas grandes praças, Londres e Nova Iorque, ainda na década de 1980. Este período conclui com aprovação de importante documento, a nova Bíblia, a Constituição Mundial, o “Consenso de Washington (CW)”.

Armados pelas desregulações que decuplicou o número de “paraísos fiscais” em menos de trinta anos, e pelo CW, tratou de dar o empurrão (financeiro, é claro) para demolir a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), em 1991.

Fim da industrialização e fim do socialismo, era a vez das finanças apátridas colocarem a ignorância a seu serviço, cavalgando, como inteligentes que são, a ideologia neoliberal, misturada com figuras conhecidas do liberalismo clássico e do iluminismo.

E fazendo propositais confusões com membros da Escola de Viena (Carl Menger, Ludwig Von Mises, Friedrich von Hayek, o estadunidense Milton Friedman) e os liberais clássicos e iluministas (Adam Smith, David Hume, John Locke, Jean-Jacques Rousseau, Diderot).

A deseducação estava preparada e foi profunda e profusamente aplicada. Em menos de trinta anos temos este resultado trágico nos EUA, na Europa, nas Américas e Ásia, com algumas exceções.

Os EUA (maior expressão de poder ocidental) elegem presidente um tipo de marionete, que há uns setenta anos era conhecido por “mané-gostoso”, fazia rir e divertir as crianças.

Hoje falam em comprar Estados Nacionais ou territórios de outros países, no que dá razão a Varoufakis.

Mas há que se esperar reações, mesmo que sejam de disputas. E há expectativa de guerra, morte, miséria, migrações, fome e desespero.

<><> Estamos diante de uma gracinha e da tragédia anunciada?

Afinal, quem sabe os limites do Estado Judeu aprovado no Congresso da Basileia (Suíça), em 29/08/1897. Theodor Herzl seu mentor escreveu:

“Se eu tivesse que resumir o Congresso de Basileia numa só frase, ela seria “em Basileia eu fundei o Estado Judeu”.

O que será dos palestinos e islâmicos que moram há mais tempo do que os judeus nestas mesmas terras?

Mas Trump quer comprar países como quem compra supermercados; para ampliar seus negócios. E o ditador é Maduro?!

E a Europa? Onde estão lideranças que orgulhavam o país, das mais distintas ideologias políticas?

Diga o caro leitor em que países o responsável pela gestão é o presidente e onde é o primeiro-ministro? Ambos figuras atualmente inexpressivas. Não pelos méritos pessoais mas pela necessária submissão aos capitais financeiros.

Realmente, l’état est fini!

Não é caso de desesperança, mas do mínimo de compreensão e nenhuma sabujice. Há um outro mundo se formando, menos midiatizado, o que não significa ser menor nem mais fraco: o multipolar.

Quem são lideranças no mundo multipolar? A China e Índia de quase um bilhão e meio de habitantes, Indonésia de perto de 300 milhões, Rússia, com 150 milhões.

A China, conforme o estadunidense Fundo Monetário Internacional (FMI), tem seu Produto Interno Bruto (PIB) avaliado para 2024 em US$ 18 trilhões, a Índia, US$ 4 trilhões, a Rússia US$ 2 trilhões, a Indonésia US$ 1,5 trilhão.

Estes quatro países estão no BRICS alargado, apenas a Indonésia ainda não pertence à Organização para Cooperação de Xangai (OCX), mas muitos outros já participam, fazendo da Iniciativa do Cinturão e Rota (a Nova Rota da Seda) um grupo de países que já forma quase outra Organização das Nações Unidas (ONU).

Quem pensa que ficará sozinho, entre derrotados, se engana. A força multipolar já representa mais da metade da população da Terra, recursos em proporção semelhante e, o que é mais importante, soberania de cada Estado Nacional e o interesse na paz, na humanidade.

Já o mundo dos subservientes, do mané-gostoso, da unipolaridade, afunda na desigualdade, nas guerras e na miséria da maioria. E EUA e aliados ainda insistem: ditador é Maduro!

 

Fonte: Viomundo

 

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