segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

Fake News para desestabilizar governos reforça necessidade de regulação das redes

A suposta “liberdade de expressão” tão alardeada pela extrema direita tem, na verdade, colocado a população contra o sistema democrático de direito ao manipular vídeos que induzem a população a acreditar que o atual governo federal irá criar novos impostos, inclusive sobre o PIX e até mesmo a posse de animais domésticos e o pré-natal.

A fake news sobre a cobrança de imposto sobre a posse de animais ocorreu após a sanção pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, da Lei 15.046/2024, aprovada em novembro pelo Congresso, que autorizou a criação do cadastro pela União. O sistema vai reunir informações sobre os proprietários e os pets, para facilitar o controle de zoonoses e o combate a abandono e maus-tratos de animais. A medida também deve proporcionar mais segurança em transações de compra e venda.

Diante das fake news, o ministro da Fazenda Fernando Haddad (PT) publicou na plataforma X uma resposta. Segundo ele “a única coisa verdadeira desse vídeo que está circulando é que, de fato, as empresas, os cassinos virtuais, chamadas bets, que são casas de apostas que lucram uma montanha de dinheiro, essas casas de apostas vão ter que pagar impostos devidos como qualquer outra empresa instalada no Brasil. Fora isso, é tudo falso”, esclareceu.

A Advocacia-Geral da União (AGU) tomou uma medida enérgica ao notificar o Facebook, exigindo a remoção do vídeo em um prazo de 24 horas. Mas este tipo de veiculação pode prejudicar não apenas a reputação de governos como de pessoas físicas, após a decisão da Meta, dona do Instagram, Facebook, WhatsAPP e Threads em acabar com seu sistema de checagem de fake News

Para o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), com a decisão da Meta temas sensíveis como imigração e gênero, assim como o enfraquecimento de iniciativas de checagem de fatos, contribuem para a proliferação de fake news e, consequentemente, reforça conteúdos que promovem a extrema direita, colocando em risco a democracia, a liberdade de expressão responsável e o próprio tecido social. Tais medidas representam um ataque direto à proteção de direitos individuais e coletivos no ambiente digital, promovendo a desinformação e ampliando a margem para discursos de ódio.

O CEO da Meta Mark Zuckerberg também criticou abertamente instituições democráticas, como o Supremo Tribunal Federal (STF) do Brasil, apontando-o como uma “corte secreta”, e se posicionou contra regulação das big techs propostas ou promovidas por países como Brasil, Alemanha e China.

“Essa postura revela as big techs como verdadeiras ferramentas geopolíticas que visam desestabilizar a ordem internacional e impedir a construção de um novo equilíbrio geopolítico, que inclua maior autonomia para os países do Sul Global, especialmente diante do fortalecimento dos BRICS e da ascensão chinesa”, diz a entidade em nota.

O FNDC reforça que o anúncio da Meta não se limita a uma nova política de moderação de conteúdo, mas configura um movimento político que ameaça a integridade das democracias em todo o mundo. “Ao alinhar-se às ideias de Donald Trump, Elon Musk, e outros representantes da extrema direita, a Meta reforça uma agenda política destrutiva internacional, com objetivo de fragilizar as instituições democráticas e a justiça social, e concentrando ainda mais poder político e econômico nas mãos de poucos, preferencialmente, nos Estados Unidos”, diz outro trecho da nota.

O Fórum alerta que a decisão do Meta é “uma declaração de guerra ao mundo que exige uma resposta robusta e imediata. É imprescindível que governos democráticos e organizações da sociedade civil de todos os países intensifiquem os esforços para regular as plataformas digitais, a fim de garantir um ambiente online mais justo, seguro e respeitoso, livre de manipulação, desinformação e ódio.

“Regulação não é censura, mas um mecanismo essencial para defender as pessoas e proteger as democracias, preservando os direitos humanos e a liberdade de expressão responsável”, conclui o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação.

 

¨      Até que ponto as redes sociais podem influenciar uma eleição

Em 23 de fevereiro de 2025, a Alemanha define seu novo Parlamento, em eleições antecipadas. Para o multibilionário Elon Musk, está claro quem deve vencer: a Alternativa para a Alemanha (AfD). Só ela pode salvar o país, escreveu o aliado de Donald Trump em sua plataforma X, ao convidar Alice Weidel, colíder desse partido – em parte classificado como extremista de direita pelo serviço de segurança interna alemão –,  para uma conversa online, transmitida ao vivo nesta quinta-feira (09/01).

A AfD é considerada a legenda alemã mais ágil nas redes sociais, sobretudo na plataforma chinesa TikTok, onde centenas de milhares consomem seus vídeos. O assessor de política e comunicação Johannes Hillje estima que em 2022 e 2023 cada conteúdo foi acessado mais de 430 mil vezes. Para comparar: em segundo lugar ficaram as conservadoras União Democrata Cristã e Social Cristã (CDU/CSU), com uma média 90 mil visualizações.

Segundo Andreas Jungherr, professor de ciências políticas e transformação digital da Universidade Otto Friedrich, de Bamberg, a questão não é que as mídias sociais favoreçam os partidos de ultradireita: "A AfD já estava nas redes sociais desde cedo", e assim aprendeu que tom funciona melhor.

Trata-se de uma clara vantagem em termos de alcance, mas não basta para assegurar uma vitória eleitoral. Prova disso teria sido a campanha da candidata democrata à presidência americana em 2024, Kamala Harris, cuja enorme penetração nas redes não resultou na conquista da Casa Branca.

<><>Redes sociais ajudam a cimentar valores e convicções

Como os resultados de buscas e conteúdos sugeridos nas redes são personalizados, criam-se no espaço online "bolhas de filtros" e "câmaras de eco". Os algoritmos dos provedores determinam o que é apresentado aos usuários, priorizando conteúdos de personalidades conhecidas ou que muitos usuários curtiram ou comentaram – e deixam de mostrar aquilo que é ignorado com frequência.

Assim se cria uma perspectiva unilateral: a própria visão de mundo é reforçada, as contrárias são obliteradas, cimentam-se acima de tudo os valores e convicções pré-adquiridos.

Por isso as mídias de todo tipo têm influência mínima sobre decisões eleitorais, explica a professora de pesquisa de comunicação Judith Möller, que estuda os efeitos sociais da mídia junto ao Instituto Leibniz.

"A decisão eleitoral tem motivações diversas. Depende de onde a pessoa cresceu, de suas experiências pessoais, principalmente nas semanas antes do pleito, ou com quem mais ela conversa sobre a eleição e política." São os mesmos fatores que, segundo Möller, influenciam a escolha de determinadas redes e que impacto elas têm.

A mídia social permite que novos movimentos e partidos ganhem visibilidade muito rápido. Mas em princípio elas servem para alcançar, acima de tudo, os próprios adeptos – e eventualmente alguns indecisos. "Na verdade, quase não é possível convencer alguém de algo novo, mas só convencer mais ainda quem já está convicto de alguma coisa", resume a pesquisadora.

<><> Fake news vencem também pela insistência

No futuro, a confrontação com as fake news ficará ainda mais problemática. E seu volume deverá aumentar quando, como anunciado pelo fundador da Meta,  Mark Zuckerberg, a empresa abrir mão da checagem de dados profissional em suas plataformas, como o Facebook e Instagram, e passar a bloquear cada vez menos conteúdos questionáveis.

Aqui observam-se dois efeitos, frisa a professora Nicole Krämer, diretora do setor de Psicologia Social, Mídia e Comunicação da Universidade Duisburg-Essen.

Por um lado, consultas populares mostraram que o público não quer se deixar enganar por desinformação. "Quanto mais importante uma questão é para a própria vida, mais hábil ele é em procurar informações que realmente o auxiliem, ou seja: que tenham credibilidade e considerem as duas perspectivas."

Por outro lado, quando a desinformação corrobora crenças pré-existentes, ela pode ser considerada pelo menos plausível, "mesmo que de início a gente pense: não pode ser".

E há um outro mecanismo, prossegue Krämer: "Quando mais se escuta, lê ou vê uma notícia falsa, mais provável é que ela permaneça na memória." O resultado é que às vezes as fake news se estabelecem – apesar do desejo de, na verdade, evitá-las.

Judith Möller antecipa uma proliferação das fake news nas redes sociais, pois há cada vez menos opiniões diversificadas nesses ambientes, devido ao clima de interação cada vez mais agressivo, com ofensas ou discurso de ódio: "Assim, determinados grupos se distanciam das discussões. Só fica quem consegue lidar com essa cultura tóxica."

<><> Prova de fogo para a democracia

Em dezembro de 2024 o Supremo Tribunal da Romênia deliberou que, através da plataforma social chinesa TikTok, a Rússia teria interferido maciçamente nas eleições parlamentares do país que deram vitória à ultradireita pró-russa, e ordenou a repetição do pleito.

Mas será realmente possível influenciar o resultado das urnas a esse ponto, através das redes?

O cientista político Jungherr ressalta que, do ponto de vista científico, é errado achar que redes sociais não influenciam a campanha. Mas frisa que é preciso analisar bem como a campanha se desenrolou. "Principalmente quando suspeitamos de influência estrangeira nas eleições, há outros caminhos que independem do TikTok", afirma.

O que torna uma mensagem bem sucedida não é o uso em si das redes sociais, concorda Möller, e sim o fato de ela dialogar com temas de interesse que ganham espaço nas redes sociais, mas são ignorados em outros meios.

As discussões nas plataformas sociais não devem ser ignoradas, mas é preciso contextualizá-las bem, frisa Philipp Müller, conselheiro acadêmico do Instituto de Ciências da Mídia e da Comunicação da Universidade de Mannheim.

"De certo modo, as redes sociais apresentam uma imagem distorcida da realidade, pois com frequência posições ignoradas são hiperacentuadas e parecem talvez maiores do que eram originalmente na população como um todo."

Isso, segundo ele, se aplica também aos grandes movimentos progressistas dos últimos anos, como o de tolerância perante as diversas identidades de gênero.

Jungherr vê nas redes sociais uma espécie de prova de fogo para a democracia: os meios digitais de fato tornaram visíveis as linhas de fratura entre as diversas posições na sociedade, mas não as representam corretamente.

Por isso, argumenta, é preciso se perguntar: "Este é realmente um problema da sociedade em geral? O que dizem os fatos? E se se trata mesmo de um problema, é possível resolvê-lo por meios políticos?"

Quando a sociedade recalca tais temas, em vez de analisá-los e situá-los num contexto, "a democracia desperdiça uma chance", afirma Jungherr.

 

¨      Zuckerberg, Bezos, Musk e o arco de apoio das bigtechs à solução cesarista do trumpismo

A vitória de Trump nos Estados Unidos é ao mesmo tempo um "sintoma mórbido" da crise de hegemonia norte americana e um catalisador das tendências à decomposição da ordem neoliberal que definem este momento.

Já analisamos o significado das últimas eleições nos EUA bem como os impactos internacionais da vitória de Trump no Brasil e ao redor do mundo em diversos materiais, aqui quero voltar os olhos à recente declaração de Mark Zuckerberg sobre a política de regulação da Meta e refletir uma hipótese de análise sobre alinhamento de grandes figuras da burguesia americana, como Zuck, Bezos e Musk a Trump e ao trumpismo.

<><> Afinidades eletivas

Diferentemente de Elon Musk (Dono do X/Twitter, bem como da Tesla, Starlink e SpaceX) que já vem há anos sendo um franco apoiador de Donald Trump (e que agora vai ocupar o "Departamento de Eficiência Governamental" em seu governo), o alinhamento aberto de Jeff Bezos (fundador da Amazon) e Mark Zuckerberg (CEO da Meta, empresa dona do Instagram e do Facebook) a Trump é mais recente.

No caso de Bezos, se destaca mais recentemente seu papel em impedir o apoio do Washington Post (jornal do qual é dono) à candidatura de Kamala Harris, em seguida parabenizando Trump por sua vitória e doando 1 milhão de dólares à posse de Trump, bem como suas declarações após um jantar com Trump em Mar-a-Lago, do qual participaram CEOs de outras gigantes como Apple, Microsoft, etc., onde se disse "muito otimista" com um novo governo Trump e declarando seu apoio a quaisquer políticas de "redução de regulações".

Já na relação de Zuckerberg com Trump destacam-se três pontos. O primeiro foi o escândalo da Cambridge Analítica, onde informações de 50 milhões de usuários do Facebook foram concedidas sem consentimento à empresa de análise de dados presidida por Steve Bannon (então principal assessor de Trump) e que trabalhou com o time de Trump em sua primeira eleição, em 2016, para potencializar sua propaganda política. Anos depois, em 2021, os perfis de Trump no Instagram e no Facebook foram suspensos após a sua influência na invasão do capitólio nos EUA, sendo desbloqueadas em janeiro de 2023, seguindo a medida de Musk no X (então Twitter). O terceiro ponto é a nova movimentação de Zuckerberg nesta semana, anunciando a suspensão do uso de checagem independente de fatos no Instagram e no Facebook, sob um discurso demagógico de "liberdade de expressão" que agora vai permitir abertamente ataques a imigrantes e definir LGBTs como doentes nas redes da Meta.

A declaração de Zuckerberg cita também se aliar a Trump contra "tribunais secretos" da América Latina que podem "mandar companhias derrubarem conteúdo de forma silenciosa" em clara alusão ao STF e à tensão imperialista da disputa entre Elon Musk e o bonapartismo judiciário brasileiro na metade do ano passado. No que se resgata esse evento é preciso também reafirmar, como dissemos à época, que se por um lado Musk é uma face da ingerência imperialista na América Latina e tem interesses muito bem definidos no Brasil seja em sua sanha extrativista, seja no consumo da Starlink no Brasil pela Marinha e pelo garimpo, por outro lado o STF não poderia estar mais longe de ser um garantidor da soberania nacional ou defensor da democracia e da liberdade de expressão tendo sido um dos operadores do reacionário golpe institucional de 2016, bem como da prisão arbitrária de Lula em 2018.

Isto dito, há que se entender o que significa o alinhamento de setores tão expressivos da burguesia norte americana do mercado tecnológico à figura de Trump.

<><> Rios, pontes e microchips

O contexto desses acontecimentos é muito significativo. O encontro de Bezos com Trump ocorreu durante a maior greve na história da Amazon que, mesmo com seus limites em parte pela atuação da burocracia sindical do Teamsters, demonstrou um importante apoio da população aos trabalhadores em greve. Aos motoristas e trabalhadores de galpão da Amazon se somaram também os trabalhadores da Starbucks greve, em um fenômeno que podemos entender como uma erguida de cabeça da geração U (de Union/Sindicato), a geração de jovens trabalhadores dentre os quais muitos negros, imigrantes e LGBTs que extraíram de processos de luta como o Black Lives Matter, mesmo após a repressão pelo partido democrata, lições importantíssimas como a necessidade de sindicalização dos trabalhadores para lutar tanto por melhores condições de vida e trabalho mas também contra as opressões.

Junto a isso, os EUA foram palco central em 2024 de uma luta estudantil internacional com dezenas de universidades ocupadas por estudantes em solidariedade à luta do povo palestino exigindo de suas universidades o rompimento de seus financiamentos e acordos de pesquisa com Israel no que ficou marcado como o maior levante estudantil desde a luta contra a guerra do Vietnam.

Esses dois marcos são fenômenos à esquerda muito importantes para pensar os os receios da classe dominante nos EUA frente a uma crise da hegemonia norte americana que segue se alastrando e que se por um lado gera soluções de força à direita como a aposta de um cesarismo trumpista, por outro lado abre espaço para saídas à esquerda para os trabalhadores e setores oprimidos. Seja frente a um movimento operário que se desenvolve com passos limitados mas expressivos, seja frente a um movimento estudantil cuja sensibilidade anti-imperialista pode se chocar com os projetos extrativistas do imperialismo dos quais as grandes bigtechs dependem para conseguir obra-prima a baixos custos, a grande burguesia de Musk, Bezos e Zuckerberg decide apostar em uma resposta ainda mais reacionária contra os explorados e oprimidos para garantir seus lucros. Pegando como exemplo simples e limitado a própria dinâmica das redes da Meta, não é de surpreender que se permita ataques a imigrantes e LGBTs ao mesmo tempo em que se censuram materiais em apoio à Palestina. Mas isso leva a um último questionamento.

<><> A serviço de quê e quem deve estar a tecnologia?

Quando falamos em Bezos, Musk e Zuckerberg, falamos em uma quantidade gigantesca de dados e de um poder de controle das redes sociais que pode efetivamente interferir (bem como já interferiu) na conjuntura política de diversos países. Um exemplo direto de para o que a tecnologia é utilizada pela burguesia: garantir seus lucros aumentando a exploração dos trabalhadores. Mas a conclusão disso não pode ser qualquer forma de “tecnofobia”, de concepção distópica ou decrescionista de que a tecnologia per se é o problema, também não se pode confiar em uma concepção “tecnófila” de que a tecnologia per se é a solução. Sob o capitalismo, o sentido progressista ou reacionário de uma tecnologia está intrinsecamente ligado ao interesse da classe que a opera. Isso por si descarta qualquer possibilidade de que uma regulação do poderío das grandes bigtechs seja uma solução definitiva. As novas tecnologias são utilizadas contra a classe trabalhadora precisamente porque esta não tem o controle do processo produtivo.

Mas ao contrário do que propaga a ideologia neoliberal e suas narrativas de “grandes empreendedores produtores de mil e uma inovações tecnológicas”, toda grande inovação tecnológica é síntese histórica não apenas intelectual mas também material de um esforço coletivo da classe trabalhadora. E se é a classe trabalhadora que desenvolveu essa tecnologia e a opera, é também a classe trabalhadora que pode lhe dar um novo sentido, tomando o controle da produção e construindo sobre a base das suas relações de cooperação uma nova sociedade.

É em sua luta independente da burguesia e da direita, e aliada aos setores oprimidos, que a classe trabalhadora pode pôr em suas mãos a produção da sociedade e dar fim ao projeto da burguesia imperialista de nos explorar até a morte. Utilizando as novas tecnologias para garantir a redução drástica da jornada de trabalho, uma planificação socialista da produção, uma nova relação com o meio ambiente que encerre o extrativismo capitalista, a construção de uma nova sociedade sem qualquer forma de opressão e exploração.

 

Fonte: Página da Cut/DW Brasil/Esquerda Diário

 

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