segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

Denise Assis: MPF pede a condenação das Forças Armadas por atentar contra o Estado Democrático de Direito

Uma decisão do Ministério Público Federal do Rio Grande do Norte pode jogar por terra o argumento que vem sendo construído caprichosamente pelo Ministério da Defesa e pelo comando do Exército Brasileiro: o de que as Forças Armadas não se envolveram nos preparativos das tentativas de golpe contra o Estado Democrático de Direito, que culminaram no 8 de janeiro de 2023. Na interpretação dos procuradores da República Victor Manoel Mariz, Emanuel de Melo Ferreira e Fernando Rocha de Andrade, os comandantes das Forças Armadas à época, em nota divulgada pelos três comandantes em 11 de novembro de 2022, defenderam que a liberdade de expressão e reunião poderia ser utilizada inclusive para estimular a prática de crimes.

“A emissão da nota demonstra politização inconstitucional das Forças Armadas e estimulou a manutenção dos atos antidemocráticos e golpistas em frente aos quartéis, a partir do desenvolvimento da narrativa de que as eleições foram fraudadas, fomentando a busca pela quebra da ordem democrática”, sustentam os procuradores da República.

“As pessoas reunidas nesses acampamentos defenderam o fechamento do Supremo Tribunal Federal e a necessidade de uma intervenção federal, feita por militares, para concretizar um verdadeiro golpe de Estado”, destacaram. Eles interpretaram também que: “Tratou-se de reunião realizada por associação antidemocrática, não protegida pela liberdade de expressão e reunião, incitando animosidade entre as Forças Armadas e os Poderes constituídos”.

Além de condenar a União – as Forças Armadas são forças de Estado –, o Ministério Público Federal (MPF) obteve também a condenação do deputado federal Eliéser Girão (PL) por danos morais coletivos ao fomentar atos antidemocráticos após as eleições de 2022. A União, o Estado do Rio Grande do Norte e o município de Natal também foram condenados por omissão na proteção à democracia. A sentença determina o pagamento, entre todos os réus, de R$ 5 milhões em indenizações e a exclusão de publicações em redes sociais do deputado, além da realização de evento público e ações educativas para coibir atos contra o Estado Democrático de Direito.

A ação civil pública tramita na 4ª Vara da Justiça Federal no RN sob o número 0803686-05.2023.4.05.8400. Ainda cabem recursos da decisão.

General Girão, nome pelo qual é conhecido o deputado, foi condenado a pagar R$ 2 milhões em danos morais coletivos por estimular os atos. Segundo a sentença, a atitude do parlamentar “afronta o Estado de Direito, a ordem jurídica e o regime democrático, pondo em ameaça a legitimidade do processo eleitoral e a atuação do Poder Judiciário, além de configurar discurso de ódio contra as instituições democráticas com divulgação de notícias falsas (fake news) acerca do resultado das eleições, confundindo e incitando o povo e as Forças Armadas à subversão contra a ordem democrática”. Ele deverá, ainda, apagar postagens no Instagram, Twitter (atual “X”) e Facebook em até dez dias.

O MPF também demonstrou na ação que os então comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, integrantes da União, divulgaram nota, em novembro de 2022, estimulando os acampamentos. Além de pagar indenização de R$ 2 milhões, a União deverá promover, em até 60 dias, cerimônia pública de pedido de desculpas, com participação dos comandantes.

O evento deverá ser amplamente divulgado em ao menos dois jornais de grande circulação nacional e contar com publicidade em rádio, televisão e internet. A União também fica obrigada a promover curso de formação aos militares de todo o país, com o objetivo de revisitar os atos antidemocráticos de 2022 e enfatizar o necessário respeito dos integrantes das Forças Armadas aos princípios inerentes ao Estado Democrático de Direito.

Para a Justiça Federal, “a nota emitida pelos então comandantes das Forças Armadas de fato normalizou os acampamentos e as manifestações antidemocráticas que ocorreram em face do não aceitamento do resultado das eleições, estimulando a ideia equivocada de legitimidade dos discursos de falsa insurreição e de ‘retomada do poder’, o que deu ensejo a um ambiente propício para a intentona de 8 de janeiro de 2023”. A decisão reforça que “de fato, agentes públicos militares em posição de alto comando adotaram procedimento que não se harmoniza com a legalidade nem com a neutralidade política das Forças Armadas”.

Quanto ao general Girão, segundo o MPF, ele utilizou ativamente suas redes sociais, em claro abuso da liberdade de expressão e da imunidade parlamentar, para encorajar condutas que atentavam contra a ordem democrática, inclusive a continuidade do acampamento existente à época em frente ao 16º Batalhão de Infantaria Motorizado, em Natal.

“Em postagem feita um mês antes da invasão dos prédios do STF, do Congresso Nacional e do Palácio do Planalto, o réu já instigava a violência contra as instituições, especialmente o Congresso”, ressalta o MPF ao afirmar que Girão, na qualidade de deputado federal e general da reserva do Exército, foi importante articulador e motivador dos atos criminosos. “A vontade do réu em ver a concretização de um golpe de Estado, como se sabe, quase se consumou pouco mais de um mês após tal postagem, havendo nexo de causalidade entre conduta e dano.”

A União, o Estado do Rio Grande do Norte e o município de Natal também foram condenados por omissão na proteção à democracia ao permitirem a manutenção dos acampamentos e a obstrução irregular da via em frente ao 16º Batalhão de Infantaria Motorizado (Batalhão Itapiru), na capital potiguar. Em conjunto, os entes deverão pagar mais R$ 1 milhão em danos morais coletivos.

 

¨      Liana Cirne Lins: "O Brasil precisa punir todos os terroristas do 8 de janeiro"

A vereadora e jurista Liana Cirne Lins destacou, em entrevista ao programa Bom Dia 247, a importância de preservar a memória democrática e de punir os responsáveis pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023. Ela defendeu o registro histórico da data e sua transformação em um feriado nacional como símbolo da defesa da democracia.

“É uma data fundamental. Nós precisamos registrar o 8 de janeiro na memória do Brasil. Concordo que tem que ser um feriado de defesa da democracia, um registro histórico para lembrar que o Brasil enfrentou uma tentativa de golpe de Estado”, afirmou.

Durante a entrevista, Liana Cirne ressaltou que os eventos do 8 de janeiro não ocorreram de forma isolada, mas foram consequência de um contexto histórico e político. “O 8 de janeiro não começou no 8 de janeiro. Ele começou na campanha de Bolsonaro, na sua primeira candidatura, quando dizia que ia ‘metralhar a petralhada’ e instaurou um ambiente de terror generalizado”, pontuou.

A jurista também destacou sua iniciativa como a primeira a apresentar uma representação criminal contra Jair Bolsonaro em 2022, por incitação ao terrorismo. Ela relembrou que, embora a Procuradoria-Geral da República tenha arquivado o caso na época, os fundamentos apresentados embasaram decisões futuras, como a desmobilização dos acampamentos golpistas em torno de quartéis.

“É fundamental lembrar que a decisão do ministro Alexandre de Moraes, que determinou a prisão de golpistas em janeiro de 2023, utilizou o crime de terrorismo como base jurídica. O Brasil ainda enfrenta um estado de latência de terrorismo, com tendências extremistas e radicais”, alertou.

Liana enfatizou a necessidade de avançar nas investigações sobre os financiadores dos atos golpistas. “Os inquéritos precisam identificar e punir todos os responsáveis, incluindo financiadores e autores intelectuais. Não podemos permitir que o Brasil seja novamente cenário de golpes civis-militares como em 1964”, afirmou.

A vereadora também apontou que a luta contra o terrorismo e a preservação da democracia são desafiadas por mudanças nas políticas de comunicação das plataformas digitais. “Decisões como as da Meta, de enfraquecer a checagem de fatos, alimentam um ambiente favorável à disseminação de mentiras e teorias conspiratórias, reforçando o extremismo.”

Ao fim da entrevista, Liana destacou a importância de união entre as instituições e de mobilizações populares para reafirmar o compromisso com a democracia: “Precisamos garantir que o 8 de janeiro entre para a história como uma data que reafirma os valores democráticos e encerre qualquer possibilidade de repetição dos atos golpistas.” 

 

¨      "A memória da ditadura precisa ser revisitada para que nunca mais aconteça", diz Fernando Horta

No programa Bom Dia 247, o historiador Fernando Horta discutiu a importância da memória histórica sobre a ditadura militar no Brasil, relacionando o recente prêmio da atriz Fernanda Torres com o resgate dessa temática no imaginário coletivo.

"O prêmio de Fernanda Torres, por um filme que trata da violência da ditadura, reforça que a cultura tem um papel crucial em chamar atenção para temas que a sociedade muitas vezes prefere evitar", afirmou Horta. Ele destacou que a ditadura não foi apenas marcada por torturas e assassinatos, mas também por interrupções de carreiras, vidas e direitos.

Horta criticou o que chamou de "anistia incompleta" no Brasil. "Os perpetradores dos crimes da ditadura estão aí, recebendo salários e vivendo bem. Enquanto isso, as vítimas e suas famílias continuam sem respostas, sem justiça e sem reparações adequadas."

O historiador comparou a preservação da memória da ditadura no Brasil com o trabalho feito em outros países, como o estudo do Holocausto. "Após a Segunda Guerra Mundial, as comunidades judaicas criaram a frase ‘para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça’. Esse deveria ser o lema do Brasil em relação à ditadura militar", declarou.

Horta também comentou a necessidade de fortalecer o debate público sobre a ditadura, especialmente após o governo de Jair Bolsonaro, que exaltou torturadores e minimizou os crimes do regime militar. "Filmes, livros e outras manifestações culturais têm o poder de resgatar essa memória e reforçar a ideia de que precisamos enfrentar nosso passado para construir um futuro mais justo", concluiu.

 

¨      "Estamos saindo de um imperialismo suave para um imperialismo barra-pesada", afirma José Genoino

No programa Conversa de Política, José Genoino, ex-presidente nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), discutiu as mudanças no cenário geopolítico mundial e os impactos para o Brasil e a América Latina. Durante a entrevista, Genoino afirmou: "Estamos saindo de um imperialismo suave para um imperialismo barra-pesada", destacando o papel das grandes corporações tecnológicas e financeiras nesse novo contexto de dominação.Genoino explicou que, atualmente, duas forças sustentam o sistema imperialista: as big techs e os administradores de ativos financeiros. Segundo ele, essas estruturas de poder centralizam recursos, influenciam governos e moldam políticas globais de acordo com seus interesses. "Esses grupos especulam com juros, privatizações e ações, além de exercerem pressões fiscais que engessam economias nacionais", pontuou.

Sobre a relação com os Estados Unidos, Genoino observou um acirramento das tensões com a posse de Donald Trump: "O governo norte-americano está determinado a construir um modelo imperialista de dominação que agrava conflitos no Oriente Médio e reforça sua hegemonia na América Latina."

Ao tratar do Brasil, o ex-deputado alertou para os desafios internos enfrentados pela democracia. Ele citou a necessidade de reformas estruturais nas instituições, como as Forças Armadas e a segurança pública, e defendeu maior protagonismo do governo em políticas transformadoras. "Precisamos de uma esquerda que dialogue com a sociedade e construa uma agenda estratégica com base na mobilização popular", afirmou.

A integração latino-americana também foi destacada como um tema essencial. Para Genoino, o Brasil deveria reforçar alianças com os BRICS e a Venezuela, além de buscar fortalecer a CELAC e outras iniciativas regionais. "O imperialismo divide para dominar, usando países como Paraguai e Argentina para isolar governos progressistas", disse.

Por fim, Genoino ressaltou o papel da cultura na luta política, mencionando o impacto do filme brasileiro premiado no Globo de Ouro, Ainda Estou Aqui. "A cultura é essencialmente rebelde e pode catalisar transformações sociais ao mobilizar juventudes e reacender debates históricos como o da ditadura militar", concluiu. 

 

¨      Relembrar para jamais esquecer. Por Julimar Roberto

Em 8 de janeiro, marcamos dois anos de um dos episódios mais sombrios da história recente do Brasil, a tentativa de golpe que invadiu as sedes dos Três Poderes em Brasília. Para lembrar este ataque à democracia, o presidente Lula promoveu um grande abraço simbólico na Praça dos Três Poderes. Foi um ato de resistência, união e memória, que reuniu movimentos sindicais, sociais e partidos políticos.

Naquele momento, o brado retumbante e uníssono era “Sem anistia!”.  Não se trata de vingança, mas de justiça. Não podemos deixar que aqueles e aquelas que tentaram subverter o sistema democrático saiam impunes.

A história já nos ensinou o alto preço da impunidade. O golpe de 1964 abriu as portas para um regime ditatorial que silenciou vozes, censurou a imprensa, destruiu vidas e produziu cicatrizes que o Brasil carrega até hoje. Muitos dos responsáveis jamais foram punidos, e o resultado foi uma sociedade que ainda luta para lidar com as consequências dos sangrentos anos de chumbo.

Longe de ser mi-mi-mi, a radiografia dos atingidos pela repressão política durante os 21 anos de Ditadura Militar no Brasil está longe de ser concluída, mas os dados levantados até agora são mais que aterrorizantes. Segundo a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), 50 mil pessoas foram presas somente nos primeiros meses da ditadura militar e cerca de 20 mil brasileiros passaram por sessões de tortura. Além disso, existem 7.367 acusados e 10.034 atingidos na fase de inquérito em 707 processos judiciais por crime contra a segurança nacional; sem falar nas milhares de prisões políticas não registradas, nas quatro condenações à pena de morte, nos aproximadamente 130 banidos, nos 4.862 cassados, nas levas de exilados e nas centenas de camponeses assassinados.

Não podemos fechar os olhos. Precisamos relembrar, para que nunca mais aconteça. As novas gerações precisam conhecer a verdade, por mais dolorosa que seja. Temos uma democracia a defender, e isso exige firmeza. Deixar de punir os responsáveis pela tentativa de golpe do 8 de Janeiro cria um precedente perigoso, capaz de incentivar novos ataques ao sistema democrático brasileiro.

Sendo assim, o abraço dado em Brasília é uma metáfora poderosa e um recado claro de que a nossa democracia resiste e não se curva.

Sigamos vigilantes para impedir que o ódio, o autoritarismo e a intolerância encontrem terreno fértil em nossa sociedade. Os valores democráticos são inegociáveis e devem ser defendidos com todas as forças. Sem anistia! Sem esquecimento! Por um Brasil que jamais volte a flertar com o autoritarismo.

 

Fonte: Brasil 247

 

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