4 questões para
entender o que está acontecendo na Venezuela em meio à nova posse de Maduro
Neste 10 de
janeiro, um novo mandato presidencial começa na Venezuela cercado de
tensão e incertezas.
A prisão e a
posterior libertação da líder da oposição María Corina Machado na
quinta-feira (9/1) foi um sinal do crescente conflito político sobre o que
ocorrerá nesta sexta-feira.
Nicolás Maduro deve tomar
posse para um terceiro mandato em uma cerimônia tradicional no Palácio
Legislativo Federal, sede do parlamento unicameral da Venezuela.
E, por sua
vez, Edmundo González Urrutia, considerado o
presidente eleito pela oposição e por governos internacionais, afirma que
retornará ao país para prestar juramento após ter comprovado a sua vitória nas
eleições presidenciais de julho a partir da publicação das atas de votação.
Diante desta nova
fase do conflito, o país está mergulhado na incerteza e sob um grande
destacamento militar e policial — que não impediu que milhares de manifestantes
saíssem às ruas na quinta-feira para protestar contra Maduro.
Os apoiadores do
governo também mostraram sua força nas ruas e há expectativa de que façam isso
novamente nesta sexta-feira.
"A partir de
hoje, estamos em uma nova fase", afirmou Machado na quinta-feira.
Mas por que este
dia 10 é tão significativo? Confira a seguir as respostas para quatro
perguntas-chave que ajudam entender o que está acontecendo na Venezuela.
·
1.
O que a lei determina?
"O candidato eleito
tomará posse como Presidente da República no dia 10 de janeiro do primeiro ano
do seu mandato constitucional, mediante juramento perante a Assembleia
Nacional."
Isso está
estabelecido no artigo 231 da Constituição venezuelana de 1999.
Para cumprir esse
mandato, a previsão é que Maduro vá ao Palácio Legislativo Federal nesta
sexta-feira para tomar posse perante os deputados.
A formalidade,
porém, foi manchada por dúvidas dentro e fora do país sobre a anunciada vitória
do atual presidente nas eleições presidenciais realizadas 28 de julho do ano
passado.
Segundo o Conselho
Nacional Eleitoral (CNE), controlado pelo partido no poder, o candidato à
reeleição venceu com 52% dos votos.
No entanto, a
agência não apresentou resultados detalhados para que entidades independentes
pudessem verificar essa afirmação.
Em contrapartida, a
oposição afirma que o vencedor das eleições foi o seu representante, o
diplomata Edmundo González Urrutia, que teria obtido quase 70% dos votos,
segundo 80% dos registos eleitorais obtidos pela aliança anti-Maduro.
A veracidade dos
registros mantidos pela oposição foi corroborada pelo Carter Center, um dos
poucos observadores internacionais independentes convidados pelas autoridades
para acompanhar o processo.
González Urrutia,
que já foi reconhecido como presidente eleito pelos Estados Unidos e vários
governos latino-americanos, disse que retornará à Venezuela na sexta-feira para
vestir a faixa presidencial.
Em setembro, ele
deixou a Venezuela e foi para a Espanha por sofrer ameaças de prisão.
As autoridades
alertaram o ex-candidato que ele será preso se pisar na Venezuela.
·
2.
Mais vigilância e mais prisões?
Desde o início de
2025, a presença policial e militar foi reforçada em toda a Venezuela,
particularmente em Caracas.
Milhares de policiais
uniformizados foram mobilizados ao redor do palácio presidencial em Miraflores,
bem como no vizinho Palácio Legislativo Federal, sede do parlamento. Ambos
ficam no centro histórico da cidade.
Enquanto isso, nas
rodovias que levam à capital e nas principais vias de Caracas, os militares e a
polícia montaram postos de controle para inspecionar veículos e seus ocupantes,
segundo fontes ouvidas pela BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC, que
pediram para não ser identificadas.
A presença policial
foi notável nos protestos de quinta-feira.
"A direita
venezuelana está nervosa com o envio de forças policiais e militares, algo que
é bastante normal", disse o ministro do Interior, Diosdado Cabello, esta
semana.
"Presidentes e
representantes de mais de 100 países virão à Venezuela para a posse e temos que
garantir a segurança desses convidados, como também a dos venezuelanos",
justificou Cabello.
O ministro garantiu
que há planos em curso para "desestabilizar o país", além de
"conspirações" para um "golpe de Estado".
Embora Cabello
tenha descrito a operação como "normal", há elementos incomuns na
movimentação das forças de segurança.
Uma delas é a
participação de membros da Direção Geral de Contrainteligência Militar (DGCIM),
uma das duas agências de inteligência venezuelanas.
A DGCIM, junto com
o Serviço Nacional de Inteligência Bolivariano (Sebin) e a Polícia Nacional,
está entre os órgãos acusados por organismos como
a Missão Internacional Independente de Investigação das Nações Unidas para a
Venezuela de cometer torturas, desaparecimentos forçados, detenções arbitrárias
e outros crimes contra a humanidade.
Em vídeo divulgado
pelo Comando Operacional Estratégico das Forças Armadas (Ceofan), um dos
diretores do órgão de inteligência, o coronel Alexander Granko Arteaga,
justificou que a ação é necessária porque "o país está ameaçado".
Essa versão foi
defendida também por Maduro, que anunciou na quarta-feira (8/1) a prisão de
sete "mercenários estrangeiros", que se juntariam à lista de 150
detidos nos últimos meses.
"As prisões
continuam, porque uma informação leva à outra. Há boas informações para
desmantelar o que estamos desmantelando, uma conspiração internacional
financiada pelo governo dos Estados Unidos", disse ele.
Mas não foram
apenas os mercenários suspeitos que foram presos.
Até quarta-feira,
partidos de oposição e organizações de direitos humanos contabilizaram que mais
de uma dúzia de políticos, líderes comunitários e ativistas de direitos humanos
foram detidos em pelo menos três Estados do país.
Entre essas prisões
estão as de Rafael Tudares, genro de González Urrutia, a do ex-candidato
presidencial Enrique Márquez e do ativista de direitos humanos Carlos Correa.
As autoridades
confirmaram as detenções deles e as justificaram dizendo que os presos fazem
parte de uma "conspiração".
Até o momento, o
paradeiro dos detidos não foi revelado. Eles também não foram autorizados a
entrar em contato com as famílias, razão pela qual os defensores dos direitos
humanos descreveram os casos como "desaparecimentos forçados".
Na terça-feira
(7/1), Maduro deu mais um passo em sua "união civil-militar-policial"
ao ativar a Organização de Defesa Integral (ODI), um grupo que, como ele
explicou, "integra todo o poder político, o poder popular, as Forças
Armadas, as milícias e todas as forças policiais".
Em evento realizado
no Palácio de Miraflores, o presidente empossou os corpos de combatentes das
diversas empresas públicas, que são formados por trabalhadores e que foram
vistos com armas de guerra.
Desde quarta-feira,
grupos de motociclistas pró-governo, conhecidos como colectivos, são
vistos em patrulha pelas ruas de Caracas e de outras cidades.
·
3.
Qual a estratégia da oposição?
"O enorme
destacamento militar e policial tem como objetivo inibir qualquer tipo de
protesto contra a posse", disse à BBC News Mundo uma autoridade judicial,
que pediu para permanecer anônima por razões de segurança.
No entanto, María
Corina Machado, a líder da oposição que não foi autorizada pelas autoridades
venezuelanas a concorrer nas eleições presidenciais de julho passado, pediu aos
venezuelanos que superem o medo causado pelas prisões ocorridas após as
eleições e pelos inúmeros casos de tortura e maus-tratos.
"Chegou a hora
[…] Todos sabemos que isso acabou", disse ela, ao pedir para os
compatriotas saírem às ruas em massa para protestar contra a posse de Maduro.
"Que o medo
nos tema", reforçou ela.
O apelo foi
atendido. Na quinta-feira, foram registrados 157 protestos em todo o país, dos
quais 17 foram reprimidos, segundo dados provisórios do Observatório
Venezuelano de Conflitos Sociais (OVCS).
Mas a estratégia da
oposição não busca apenas "esquentar as ruas" para forçar uma ruptura
na coalizão que mantém Maduro no poder, mas também faz manobras no exterior com
o mesmo objetivo.
Nos últimos dias,
González Urrutia realizou uma turnê que o levou a lugares como Argentina,
Estados Unidos, Panamá e República Dominicana para angariar apoio internacional.
O ex-candidato da
oposição também anunciou que retornará ao país para tomar posse e disse que
estará acompanhado de vários ex-presidentes hispano-americanos.
Caracas alertou que
esse plano representa um "risco muito sério" para os envolvidos, que
seriam considerados "invasores" — e tratados como tal.
"Recomendo que
não comecem a inventar coisas", disse o ministro Cabello. Ele lembrou que
nos últimos anos a Força Aérea abateu 400 aeronaves que entraram ilegalmente em
território venezuelano.
A autoridade também
disse que o verdadeiro plano da oposição é que González Urrutia seja empossado
em uma das embaixadas venezuelanas que o governo não controla desde 2019.
A analista Carmen
Beatriz Fernández diz que a dupla estratégia da oposição visa criar
"impulso político em torno da figura de Edmundo González Urrutia".
"O que não
sabemos é se essa estratégia será bem-sucedida o suficiente para atingir o
objetivo: a posse", analisa ela.
"Na melhor das
hipóteses, o plano levará a uma ruptura [dentro do chavismo] e a uma negociação
que permitiria a González Urrutia assumir o cargo no dia 10 ou depois. Na pior
das hipóteses, torna a vida mais difícil para ele e Maduro permanecerá no
poder", especula Fernández, que é professora de Comunicação Política da
Universidade de Navarra, na Espanha.
·
4.
Quem apoia quem?
Autoridades
venezuelanas disseram que cerca de 2 mil convidados de 100 países diferentes
comparecerão à terceira posse de Maduro, mas apenas cinco são presidentes.
A imprensa
venezuelana presumiu que os líderes de Cuba e da Nicarágua, Miguel Díaz-Canel e
Daniel Ortega, respectivamente, estarão presentes.
Luis Arce,
presidente da Bolívia, outro aliado da Venezuela, anunciou que não comparecerá,
apesar de reconhecer a controversa vitória de Maduro.
Sua ausência se
deve à presença no evento de seu rival e antigo mentor político, o
ex-presidente Evo Morales.
Na quarta-feira, o
presidente colombiano, Gustavo Petro, confirmou que não vai à posse.
Ele atribuiu a
decisão não apenas à recusa das autoridades venezuelanas em mostrar os
registros que corroborariam a vitória de Maduro nas eleições, mas também à
recente onda de prisões.
A reeleição de
Maduro foi questionada por Estados Unidos, Canadá, União Europeia e um número
significativo de países latino-americanos.
O governo
brasileiro também não reconheceu a vitória de Maduro na votação de julho do ano
passado (leia mais aqui sobre como o Brasil pretende lidar com 'nó'
nas relações com a Venezuela).
As relações entre
os dois países estão estremecidas depois que o governo brasileiro criticou o
processo eleitoral venezuelano e se recusou a aceitar a vitória de Maduro sem
que fossem apresentadas as atas de votação que atestam o resultado.
A decisão de países
como o Paraguai de reconhecer a oposição como vencedora das eleições
desencadeou a ira de Maduro, que decidiu romper relações diplomáticas com
países que seguiram essa mesma linha.
Rússia, Irã e China
reconheceram a reeleição de Maduro e enviarão delegações à cerimônia.
¨ Renan Filho
critica posse de Maduro na Venezuela: "ditador incansável"
O
ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB), manifestou publicamente sua
indignação com a posse do presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, que ocorre
nesta sexta-feira (10) no Palácio Legislativo Federal da Assembleia Nacional.
Maduro inicia seu terceiro mandato, que se estenderá até 2031, em meio a
críticas internacionais sobre a legitimidade de seu governo.
Em
publicação nas redes sociais, Renan Filho condenou a continuidade do governo
venezuelano, classificando Maduro como um "ditador incansável". O
ministro afirmou que a permanência no poder por meio de métodos autoritários
deve ser repudiada por todos os defensores da democracia.
"Manifesto
minha indignação à posse de Nicolás Maduro. A tomada do governo pela força
bruta e sem legitimidade precisa ser condenada por todos nós defensores da
Democracia. Como membro do MDB, partido que historicamente sempre defendeu o
respeito às liberdades individuais, à justiça e o voto popular, deixo aqui o
meu repúdio ao truculento regime que se impõe mais uma vez hoje com a tentativa
de posse desse ditador incansável em desrespeitar a soberana vontade do povo
venezuelano", declarou.
Enquanto
Maduro reforça sua permanência no poder, milhares de venezuelanos participaram
da chamada Grande Marcha pela Paz e Alegria, organizada pelo governo. O evento,
marcado por atividades recreativas, desportivas e presença militar ostensiva,
foi descrito como um dia histórico pelo vice-presidente do Partido Socialista
Unido da Venezuela (PSUV), Diosdado Cabello. Segundo ele, a escassa presença de
opositores nas ruas representou uma vitória para o governo.
Maduro
anunciou que seu primeiro ato no novo mandato será a criação de uma comissão
nacional e internacional para promover uma ampla reforma constitucional.
Segundo o presidente venezuelano, a proposta buscará definir o modelo de
desenvolvimento do país para os próximos 30 anos e aprofundar a participação
popular nas decisões políticas e sociais.
A posse
de Maduro conta com a presença de mais de dois mil representantes de governos
estrangeiros, movimentos sociais e organizações internacionais, como o Fórum de
São Paulo e a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP). A
cerimônia reforça a posição do governo venezuelano de buscar apoio
internacional, apesar das críticas de diversos líderes mundiais sobre a
condução política do país.
Renan
Filho se junta a outras vozes internacionais que questionam a legitimidade do
governo de Maduro, destacando a preocupação com a democracia e os direitos
humanos na Venezuela.
Fonte: BBC News
Mundo/Brasil 247
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