Por que ex-chefão
do varejo britânico é contra o home-office
Trabalhar de casa
está criando uma geração que "não está trabalhando direito", alertou
Stuart Rose, ex-chefe do Marks and Spencer (M&S) e do Asda, duas grandes
redes do varejo britânico.
O executivo disse
ao programa Panorama, da BBC, que o trabalho
remoto fazia
parte do "declínio geral" da economia do Reino
Unido —
e que a produtividade dos funcionários estava sendo comprometida.
As declarações dele
foram feitas em um momento em que algumas empresas
estão acabando com o trabalho remoto. A Amazon, o banco JP Morgan
e a rede britânica de farmácias Boots são apenas algumas das empresas que agora
exigem que a equipe que trabalha na sede esteja presente todos os dias.
No entanto,
Nicholas Bloom, especialista em trabalho remoto, afirma que, embora trabalhar
totalmente de casa possa ser "bastante prejudicial" para a
produtividade de alguns funcionários, passar três dias em cada cinco no
escritório era tão produtivo quanto o trabalho totalmente presencial em geral.
Rose, que foi CEO
do M&S e recentemente deixou o cargo de presidente do Asda, afirmou:
"Nos últimos quatro anos, acredito que regredimos 20 anos neste país em
termos de práticas de trabalho, produtividade e bem-estar do país."
Em um levantamento
de novembro de 2024 realizado pelo Escritório de Estatísticas Nacionais (ONS,
na sigla em inglês) no Reino Unido, 26% das pessoas afirmaram ter trabalhado de
forma híbrida nos sete dias anteriores, com alguns dias no local de trabalho e
alguns dias em casa; enquanto 14% trabalharam de forma totalmente remota; e 41%
se deslocaram para o local de trabalho todos os dias (o restante não estava
trabalhando na semana em que a pesquisa foi realizada).
A mudança para o
trabalho remoto transformou as economias locais. As estimativas do setor
indicam que o espaço de escritório vago quase dobrou desde a pandemia de covid-19; um quarto dos
negócios de lavanderia fechou; e o número de partidas de golfe jogadas durante
a jornada de trabalho aumentou 350%, o que sugere que algumas pessoas estão
misturando trabalho e lazer.
Trabalhar de casa
está se tornando rapidamente um importante campo de batalha nas guerras
culturais. Atualmente, o governo está legislando para fortalecer o direito dos
funcionários de todo o Reino Unido de solicitar trabalho remoto — e diz que
pretende tornar mais difícil para os empregadores recusarem as solicitações.
Mas alguns
empregadores — incluindo órgãos do governo — estão lutando com os funcionários
para levá-los de volta ao escritório, argumentando que a interação presencial é
essencial para o trabalho colaborativo.
Em alguns casos,
como o da gravadora independente Hospital Records, isso exige negociação entre
uma força de trabalho jovem — alguns funcionários talvez nunca tenham
trabalhado em tempo integral em um escritório — e seus chefes mais velhos.
O fundador da
empresa, Chris Goss, introduziu uma nova política que exige que a equipe
trabalhe três dias no escritório, em vez de dois. Ele afirmou que tinha
"uma sensação incômoda" de que o trabalho remoto havia afetado os
resultados financeiros da companhia.
"Acredito
fortemente que o setor da música gira em torno de relacionamentos e, portanto,
a única maneira de qualquer um de nós construir esse tipo de relacionamento
significativo é fazendo isso pessoalmente."
Maya, uma gerente
de marketing de 25 anos que trabalha na empresa, disse que gosta de estar perto
de colegas mais experientes no local de trabalho.
"Há muitas
pessoas na minha equipe que estão muito avançadas em suas carreiras, então se eu
precisar de ajuda com alguma coisa, posso simplesmente pedir a alguém."
Mas ela acredita
que não seria capaz de trabalhar cinco dias por semana no escritório
"porque minha bateria social se esgota e, às vezes, preciso simplesmente
ficar em casa, e resolver um monte de tarefas administrativas".
Bloom, economista
da Universidade de Stanford, nos EUA, disse que sua pesquisa sobre o trabalho
remoto sugere que os funcionários na adolescência e na faixa dos 20 e poucos
anos deveriam provavelmente passar pelo menos quatro dias por semana no
escritório para maximizar suas oportunidades de serem orientados.
No entanto, ele
destaca que pesquisas com dezenas de milhares de funcionários no Reino Unido,
nos EUA e na Europa sugerem que os profissionais valorizam a possibilidade de
trabalhar de casa dois dias por semana tanto quanto um aumento salarial de 8%.
O ministro dos
Direitos Trabalhistas britânico, Justin Madders, disse ao programa Panorama que
há um conjunto cada vez maior de evidências mostrando que trabalhar de casa é
mais produtivo. Ele também afirmou que isso é bom para o crescimento porque as
empresas vão ter "uma força de trabalho muito mais motivada" — e que
"se conseguirmos colocar mais pessoas no mercado de trabalho porque a
flexibilidade está disponível para elas, isso vai nos ajudar a alcançar nossas
ambições de crescimento".
Bloom pode não ser
tão otimista quanto ao efeito do trabalho
híbrido sobre
a produtividade, mas concorda que aumentar o número de funções que podem ser
desempenhadas de casa poderia ajudar no crescimento econômico se incentivar
mais pessoas a voltar ao trabalho, como aquelas que têm responsabilidades de
prestação de cuidados familiares.
"É um grande
impulso" e "uma espécie de vitória do tipo ganha-ganha", porque
as pessoas poderiam trabalhar em melhores condições, contribuir para a receita
tributária, e "todos saem ganhando".
Uma das pessoas que
poderia se beneficiar é Harleen, que foi demitida depois de ter o segundo
filho, e não conseguiu voltar ao trabalho porque não consegue encontrar uma
função totalmente remota que se encaixe na rotina do filho autista.
"Não estou
vendo esses empregos anunciados.
Não estou vendo nada que atenda a essa flexibilidade", diz ela.
"Todo dia eu
acordo e acho que estou vivendo o Dia da Marmota. Tudo o que estou fazendo é
ser mãe. Gosto de ser mãe, mas quero produtividade. Começo a sentir que estou
tendo morte cerebral."
No setor público, a
produtividade é a mais baixa desde 1997 — com exceção dos anos de lockdown da
pandemia — e alguns culpam o trabalho remoto. Desde novembro de 2023, os
funcionários públicos têm sido chamados de volta para trabalhar de dois a três
dias por semana presencialmente.
Mas em vários
órgãos públicos, inclusive no Escritório de Estatísticas Nacionais em Newport,
no País de Gales, alguns funcionários estão se recusando a voltar.
Ed, gerente de TI
no ONS e representante do sindicato PCS, disse que tem trabalhado quase
totalmente de casa desde a pandemia. Ele afirma que isso o ajuda a levar os
filhos para a escola e a creche, e a não perder tempo com deslocamentos.
"Os altos
dirigentes do ONS nunca nos disseram que há um problema de produtividade, que
há um problema de qualidade, que há um problema de cumprimento de prazos",
ele afirma.
"Nunca mais
vamos ter esta oportunidade de novo. Temos que lutar pelos direitos dos
trabalhadores."
Ele e outros
membros do sindicato estão ameaçando entrar em greve se forem forçados a se
deslocar para o escritório 40% do tempo. Os funcionários civis da Metropolitan
Police, que responde pela região de Londres, e membros do sindicato do Land
Registry, agência oficial do governo britânico de registro imobiliário, também
estão divergindo sobre as políticas de retorno ao escritório.
O ONS, que está em
meio a negociações com o sindicato, afirma acreditar que a "interação
presencial" ajuda a "construir relações de trabalho, reforça a
colaboração e a inovação".
Mas seja qual for o
resultado de impasses como este, está claro que todo mundo trabalhar em tempo
integral no escritório agora é coisa do passado.
¨
Primeiro ano do Nova Indústria Brasil: o CDESS e o próximo passo. Por Marcos Rehder Batista
Em 22 de janeiro do ano passado, exatamente um ano atrás, foi lançado
oficialmente o Nova Indústria Brasil, plano de
retomada nas atividades produtivas brasileiras, como reação ao nítido processo
de desindustrialização acentuado nos últimos 10 anos. O presidente Lula colocou
a missão sob responsabilidade do vice-presidente e também Ministro do
Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços Geraldo Alckmin, que articulou
uma agenda interministerial que transformou a NIB na espinha dorsal do
crescimento econômico. Parte da abordagem das Missões de Desenvolvimento Sustentável sistematizada pela economista ítalo-americana Mariana Mazzucato,
pautada tanto no envolvimento de todos os setores do poder público, mercado e
sociedade civil participantes ou impactados, quanto numa visão que não se reduz
à recuperação da indústria tal como era antes da emergência da Economia 4.0,
mas da reestruturação em padrões sustentáveis.
Como resultado, conseguiu mobilizar esforços de outras áreas além do
MDIC, como Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Banco da Amazônia, Banco
do Nordeste, além do BNDES, Finep e Embrapii, ampliando consideravelmente o
montante de recursos destinados ao investimento, dos iniciais R$ 300 bilhões
para R$ 506,7 bilhões. Na medida em que esta nova concepção de desenvolvimento
industrial, mais sustentável (por isso justifica-se o uso do conceito
“neoindustrialização”, ao invés de simplesmente “reindustrialização”), é capaz
de mobilizar outros atores, como foi o caso, ganha importância a cooperação
entre um colegiado setorial como o Conselho Nacional de Desenvolvimento
Industria – CNDI, que deu sustentação para a NIB, e outro que abarque os mais
variados setores da sociedade, e certamente a instância do Governo Federal que
melhor satisfaz este critério é o Conselho de Desenvolvimento Econômico Social
Sustentável – CDESS. Além de trazer um apanhado geral deste primeiro
aniversário da NIB, pretendo aqui sustentar porque pode ser fundamental o
fortalecimento desta agenda no CDESS.
Voltando ao desenho e resultados da NIB, em seu lançamento foi divulgado
o Plano de Ação para a Neoindustrialização, onde constam 6 eixos prioritários:
§ Missão 1: Cadeias
agroindustriais sustentáveis e digitais para a segurança alimentar, nutricional
e energética
§ Missão 2: Complexo econômico
industrial da saúde resiliente para reduzir as vulnerabilidades do SUS e
ampliar o acesso à saúde
§ Missão 3: Infraestrutura,
saneamento, moradia e mobilidade sustentáveis para a integração produtiva e o
bem-estar nas cidades
§ Missão 4: Transformação Digital
da indústria para ampliar a produtividade
§ Missão 5: Bioeconomia,
descarbonização e transição e segurança energéticas para garantir os recursos
para as gerações futuras
§ Missão 6: Tecnologias de
interesse para a soberania e defesa nacionais
No final de 2024, 31 de dezembro, foi divulgado um balanço que atesta os
bons resultados, inclusive sobre como o Plano Mais Produção, sistema de financiamento da neoindustrialização executado pelo BNDES,
articulou estas missões em programas de outros ministérios,
proporcionando uma noção de ação em conjunto para um desenvolvimento integrado.
No total, os recursos da NIB somados aos do Novo PAC e do Plano de
Transformação Ecológica somaram R$ 2,212 trilhões em investimento. Dadas as
conhecidas demandas por infraestrutura, inclusive para a otimização dos demais
investimentos, era esperado que esta área contasse com valores bem acima das
demais. Porém, há de se destacar os valores em áreas até então estranhas à uma política
industrial, como agroindústria e bioeconomia. Seguem os valores apresentados:
§ 1,06 trilhão – construção civil
§ 100,7 bilhões – TICs
§ 130 bilhões – automotivo
§ 296,7 bilhões – agroindústria
§ 100 bilhões – siderurgia
§ 105 bilhões – papel e celulose
§ 380 bilhões – bioeconomia e energia renovável
§ 39,5 bilhões – indústria da saúde
(fonte: https://agenciagov.ebc.com.br/noticias/202412/mdic-avanca-na-retomada-da-industria-brasileira)
Desde 2023 a prioridade do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Industrial foi a retomada da industria em outros moldes. A abordagem, as
missões, o Plano de Ação, tudo consta em suas atas, antecipando o anunciado e
os resultados atingidos. Um passo adiante consiste na interlocução desta câmara
setorial com outra de maior abrangência, capaz de traduzir um projeto minucioso
numa linguagem mais geral, por canais diversificados, e aí entra o papel que
pode ser cumprido magnificamente pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico
Social Sustentável – CDESS. Por contar com uma representatividade mais plural,
seria capaz de elaborar uma estratégia mais sensível e criativa sobre como os
resultados podem chegar aos mais diversos setores da sociedade, inclusive
alguns grupos empresariais, fortalecendo um engajamento extraordinário.
De acordo com a 12ª Edição do Barômetro da Infraestrutura
Brasileira, diagnóstico desenvolvido em parceria da
consultoria EY e a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base
– ABDIB, esta clareza dos agentes econômicos em relação ao Plano e seus
resultados é o passo necessário para consolidar a confiança nesta mobilização
governamental para um novo ciclo de crescimento. Publicado em dezembro de 2024,
o estudo identifica que 57,8% dos empresários entrevistados apontam como
principal desafio para a NIB é a “articulação do governo com o setor produtivo”.
Considerando que se trata de um projeto de aceleração da atividade
produtiva que opera na fronteira da Economia Industrial, extremamente
sofisticado e sendo executado com efetividade – mesmo em uma conjuntura
complexa -, a iniciativa respaldada pelo CNDI e precisamente elaborado por ele
ganha uma adesão muito maior em parceria com o CDESS. Aprimorar a articulação
não apenas com o setor produtivo como com a sociedade como um todo levará à
otimização dos resultados e a esperada adesão geral prevista no paradigma
das Missões. Trata-se de algo de suma importância em um ano em
que as demandas socioambientais que estarão no topo das prioridades, pois
receberemos a COP 30.
O Nova Indústria Brasil é uma realidade, um dos projetos federais que
mais está dando certo, e cujos impactos devem marcar uma nova era de nosso
desenvolvimento. Como pode ser observado no montante direcionado para cada
setor, impacta algumas de nossas mais significativas cadeias de valor. Se
considerarmos que a reconstrução de nossa democracia passa pela geração de
emprego e renda sustentada no longo prazo, ganhar capilaridade proporcionará a
consistência econômica para a garantia dos direitos básicos do cidadão e um
ambiente vigoroso para nossos empresários. Está dando certo, e este tipo de
aprimoramento pode fortalecer ainda mais.
Fonte: BBC News/Opera
Mundi
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