sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

EUA precisam do Brasil ou não? Veja dados de comércio e investimentos de empresas americanas no país

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, iniciou um novo mandato nesta semana anunciando profundas mudanças, como a saída do país do acordo climático de Paris, combate à imigração ilegal, mais liberdade para as redes sociais e taxação de países estrangeiros, por exemplo.

Uma declaração que chamou a atenção por aqui, entretanto, foi a de que o Brasil e a América Latina precisam "mais dos EUA do que os EUA precisam deles". E que os Estados Unidos não precisariam do Brasil e da América Latina.

"A relação é excelente. Eles precisam de nós, muito mais do que nós precisamos deles. Não precisamos deles. Eles precisam de nós. Todos precisam de nós", disse Trump ao ser perguntado se iria falar com o presidente Lula e como seria a relação com o Brasil e com a América Latina.

A ministra interina das Relações Exteriores, Maria Laura da Rocha, declarou que a diplomacia brasileira trabalhará para encontrar convergências na relação com o novo presidente dos EUA.

“O presidente Trump pode falar o que ele quiser. Ele é presidente eleito dos Estados Unidos. Nós vamos analisar cada passo das decisões que forem tomadas pelo novo governo. Mas acredito, que como somos um povo que tem fé na vida, que tudo vai dar certo sempre. Vamos procurar trabalhar as nossas convergências, que são muitas”, declarou a ministra.

Os números de investimentos e das relações comerciais entre o Brasil e os EUA, relacionamento que completou 200 anos em 2024, indicam que os Estados Unidos precisam do país, mas que, sendo os maiores importadores e os segundos maiores vendedores do mundo, a dependência brasileira é maior.

·      Comércio entre os países

Dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) mostram, por exemplo, que em 2024, o fluxo comercial entre Brasil e Estados Unidos chegou a cerca de US$ 81 bilhões.

Os números indicam equilíbrio na relação comercial com os Estados Unidos.

Em 2024, foram registrados:

·        US$ 40,33 bilhões em exportações brasileiras para os EUA, novo recorde;

·        US$ 40,58 bilhões em importações brasileiras dos EUA.

Números do Ministério do Desenvolvimento mostram os principais produtos exportados aos Estados Unidos em 2024.

Se destacaram produtos básicos ou semimanufaturados, como petróleo, aço, ferro, café, carnes, mas também produtos de maior valor agregado, como suco de laranja e aviões.

>>>> Veja abaixo:

1.    Óleos brutos de petróleo

2.    Outros produtos semimanufaturados de ferro ou aço não ligado

3.    Café não torrado, não descafeinado, em grão

4.    Pastas químicas de madeira

5.    Ferro fundido bruto

6.    Aviões e outros veículos aéreos, de peso superior a 15 mil kg, vazios

7.    Gasolinas, exceto para aviação

8.    Aviões e outros veículos aéreos, a turbojato

9.    Carnes desossadas de bovino, congeladas

10. Produtos semimanufaturados, de outras ligas de aços

11. Suco (sumo) de laranja

12. Bulldozers e angledozers, de lagartas (máquinas pesadas usadas principalmente em construção, mineração e outros projetos de infraestrutura. O termo "de lagartas" representa máquinas com esteiras em vez de pneus).

13. Carregadoras e pás carregadoras, de carregamento frontal

14. Açúcares de cana

15. Pedras de cantaria, trabalhadas de outro modo e obra

16. Preparações alimentícias e conservas, da espécie bovina

17. Querosenes de aviação

Ao mesmo tempo, as vendas dos Estados Unidos para o Brasil se concentram em produtos industrializados, combustíveis, produtos químicos, óleos lubrificantes e aviões, entre outros.

Ao todo, em 2024, foram importados mais de 6 mil tipos diferentes de produtos dos EUA.

>>> Veja os destaques:

1.    Partes de turborreatores ou de turbopropulsores

2.    Turborreatores

3.    Gás natural liquefeito

4.    Óleos brutos de petróleo

5.    Gasóleo (óleo diesel)

6.    Naftas para petroquimica

7.    Hulha betuminosa (carvão mineral)

8.    Copolímeros (utilizados na fabricação de brinquedos, eletrodomésticos e autopeças)

9.    Óleos lubrificantes sem aditivos

10. Polietilenos

11. Adubos e fertilizantes

12. Hidróxido de sódio (soda cáustica)

13. Propanos liquefeitos

14. Aviões e outros veículos aéreos, a turbojato

15. Inseticidas

16. Partes de aviões ou de helicópteros

17. Medicamentos

De acordo com o presidente-executivo da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, o Brasil, de fato, precisa mais dos Estados Unidos — o maior comprador mundial.

Mas ele ponderou que muitas empresas norte-americanas têm representação no Brasil, e que as trocas comerciais acontecem, neste caso, entre matrizes e filiais.

"O que o Trump falou uma certa razão, mas na prática não se aplica. É mais uma frase de feito. Pode se dizer que eles precisam um pouco da gente, é uma verdade. Pergunta uma matriz americana que exportam para o Brasil o que eles acham. Acham ótimo. No fundo no fundo, precisam", avaliou José Augusto de Castro, da AEB.

O executivo afirmou que a corrente de comércio (exportações mais importações) com os Estados Unidos pode crescer nos próximos anos, e avaliou que o Brasil precisa reduzir custos para melhorar sua competitividade.

Ele citou a importância da reforma tributária, que terá impacto gradual ao longo dos próximos anos, e elogiou a postura do presidente Lula de não arrumar confusão.

"Lula sabe muito bem que precisa deles. Tudo o que Lula falar não será bem recebido [pela posição ideológica diferente] Tem que ficar quieto mesmo, não dar frase negativa. Deixa assentar o pó, pois muitas coisas estão sendo faladas e nem tudo avaliado com a devida atenção", declarou.

·        Empresas norte-americanas e investimentos

Quando se considera o investimento realizado no Brasil por países, de acordo com relatório divulgado pelo Banco Central no final do ano passado, trazendo dados relativos ao ano de 2023, os Estados Unidos lideram.

Tanto no conceito de "investidor imediato" (domicílio da empresa não residente que investiu diretamente na subsidiária ou filial) quando no de "controlador final" (residência do investidor que detém o efetivo controle e interesse econômico na empresa investida no Brasil).

Os dados referem-se à participação no capital, que considera as entradas de recursos em moeda ou bens relativos à aquisição, subscrição ou aumento total ou parcial do capital social de empresas residentes.

Dados do Banco Central citados pela Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil) mostram o crescimento do número de empresas norte-americanas no Brasil, e também da participação dessas empresas no país.

A Amcham também detalhou setores ligados a investimentos recentes no país, assim como informações sobre marcas norte-americanas e patentes no país. Os dados são do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).

De acordo com Abrão Neto, CEO da Amcham Brasil, os Estados Unidos e o Brasil têm uma relação econômica que gera benefícios para ambas as economias, que se caracteriza pelo alto valor agregado das trocas, complementariedade e diversificação no comércio bilateral.

"Os Estados Unidos são, para o Brasil, o principal mercado de exportação de bens industriais e de serviços. E os Estados Unidos são também o principal investidor estrangeiro no Brasil, com um estoque de mais de US$ 350 bilhões e quase quatro mil empresas americanas operando no país", destaca Abrão Neto, da Amcham Brasil.

"É uma relação mutuamente benéfica, bastante longínqua, com um número considerável de empresas brasileiras nos Estados Unidos e americanas no Brasil", prosseguiu.

Ele lembrou que os Estados Unidos tiveram superávit comercial com o Brasil, pelo menos, nos últimos dez anos, sendo que, apenas em 2023, o saldo positivo em favor das empresas norte-americanas foi de quase US$ 24 bilhões — o sexto maior superávit que os EUA tiveram com qualquer outro parceiro individual.

"É importante destacar também que há uma integração muito saudável entre a economia brasileira e americana que se reflete no perfil do comércio bilateral", acrescentou.

Na prática, "existem exportações brasileiras de insumos, partes e peças e bens de capital e da mesma forma, o Brasil importa não só bens acabados, mas um número bastante considerável de insumos para o seu setor produtivo".

Para o CEO da Amcham Brasil, um bom exemplo da ligação comercial entre os países é o setor aeronáutico, no qual o Brasil exporta e importa bilhões de dólares em partes e peças de naves e aeronaves acabadas.

"Então essa integração mostra uma interdependência e uma complementariedade no comércio entre os dois países", concluiu.

 

¨      Ato de Trump acende alerta sobre intervenções dos EUA na América Latina, diz pesquisador. Por Rafael Custódio

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou mais de 70 atos no seu primeiro dia de governo. No pacote de políticas de combate ao narcotráfico, a Casa Branca anunciou um ato extraordinário que coloca o país em “emergência nacional” e passa a classificar cartéis e organizações criminosas como terroristas.

O anúncio acendeu um sinal de alerta no Ocidente e, em especial, para os latino-americanos, sobre a possibilidade de o governo estadunidense realizar incursões militares nos países que compõem o continente.

A lista de organizações criminosas e cartéis que atuam em solo estadunidense e que passarão a ser classificadas como terroristas deve ficar pronta em até 15 dias após o anúncio do ato. No entanto, a Casa Branca cita dois exemplos de facções criminosas, o La Mara Salvatrucha 13, de salvadorenhos, e o Trem de Aragua, de origem venezuelana.

De forma genérica, o republicano também cita os cartéis mexicanos e sua atuação no sul dos Estados Unidos, na fronteira entre os dois países, uma área de fluxo imigratório intenso. A ordem descreveu que “em certas partes do México, eles funcionam como entidades quase governamentais, controlando quase todos os aspectos da sociedade”.

Embora seja a maior organização criminosa das Américas em exercício, o Primeiro Comando da Capital (PCC), que também tem indícios de atuação nos Estados Unidos, não foi citado no texto. Segundo o professor e pesquisador Thiago Rodrigues, do Departamento de Relações Internacionais da Universidade Federal Fluminense (UFF), a ordem executiva “tem um tom altamente repressivo” e “parece ser um aceno de apoio a perspectivas de ultradireita na América Latina”.

“O Trem de Arágua me parece ter sido citado como uma forma de abrir espaço para uma intervenção contra o regime bolivariano da Venezuela”, avaliou Thiago Rodrigues.

Em julho de 2024, o Departamento de Estados dos EUA informou que o Trem de Aragua é uma “crescente ameaça que representa para as comunidades americanas”. Além disso, pagaria 12 milhões de dólares a quem fornecesse informações sobre os líderes da facção venezuelana, que estariam escondidos na Colômbia e Venezuela.

No mesmo dia em que a Casa Branca anunciou o combate ao Trem de Aragua, o Ministério Público da Venezuela havia declarado que a organização criminosa já estava desmantelada, em virtude de duas operações que culminaram em 48 prisões, incluindo a dos líderes da facção.

O Trem de Aragua teve origem no estado de Aragua, no norte da Venezuela, nos anos 2010. Segundo a apuração da jornalista e escritora venezuelana Ronna Rísquez, autora do livro El Tren de Aragua. La banda que revolucionó el crimen organizado en América Latina, o grupo também teria estabelecido relações de parceria com o Primeiro Comando da Capital (PCC) na Bolívia, onde supostamente ocorreu troca de armas.

Há indícios de atuação do Trem de Aragua em pelo menos sete países, sendo eles Brasil, Colômbia, Peru, Chile, Equador, Bolívia e Estados Unidos, conforme a declaração da Casa Branca na ordem extraordinária.

Nos Estados Unidos, os governadores do Texas e Colorado afirmaram ter prendido 31 supostos integrantes do Trem de Aragua, de acordo com a apuração do jornal O Globo.

<><> Recado indireto ao Brasil 

Após o anúncio da ordem extraordinária, instaurou-se a preocupação de quais ações os Estados Unidos poderiam tomar com relação ao Brasil, berço de uma das maiores facções criminosas em atuação, o Primeiro Comando da Capital (PCC), e com atuações em solo estadunidense.

O professor de relações internacionais Thiago Rodrigues diz que, embora não cite o PCC, o anúncio pode ser interpretado como um recado indireto para o Brasil.

“Existe um potencial teórico, conceitual para isso. Eu não acho que o documento, no momento, diga que há a possibilidade concreta, próxima de uma intervenção na Amazônia a título de combate a essas organizações. Mas [também] não há nada no documento que impeça chegar a isso”, disse.

<><> Ato político

A ordem de Trump faz citação também à Mara Salvatrucha 13, conhecida como MS-13, uma organização criminosa que nasceu nas ruas de Los Angeles, na Califórnia, ainda na década de 1980, composta majoritariamente por salvadorenhos.

Thiago Rodrigues explica que o processo massivo de deportação de supostos integrantes da gangue, feito ainda no governo do ex-presidente Ronald Reagan (1981-1988), levou a organização criminosa a se expandir em El Salvador.

Na avaliação do professor, a citação à organização criminosa salvadorenha é uma demonstração de apoio ao governo de ultradireita do presidente de El Salvador, Nayib Bukele, um dos convidados para comparecer à posse de Trump, em 20 de janeiro.

“A citação ao grupo de El Salvador [MS-13] me parece mais destinada a fortalecer um governo de ultradireita, que é o do Bukele, do que colocar esse governo sob a mira de Washington.”

A ação da gangue já despertava preocupações a Donald Trump ainda no seu primeiro mandato. Em abril de 2014, quatro pessoas foram encontradas decapitadas em uma floresta de Long Island e a autoria seria da gangue MS-13. Na época, o presidente havia classificado o grupo como “perverso”.

O ultradireitista Bukele trata a MS-13 como o seu principal alvo, tendo ganhado espaço no noticiário internacional após prender cerca de 2% da população de El Salvador como forma de combate ao crime organizado.

<><> Guerra ao narcotráfico não mira na cannabis, diz professor

Em setembro de 2024, o então candidato republicado à Casa Branca declarou que votaria a favor da legalização da maconha para uso de adultos no estado da Flórida, o que o colocou em desacordo com o então governador do estado Gavin Newsom.

posicionamento de Trump foi publicado, na época, na rede Truth Social, onde ele disse que “é hora de acabar com as prisões e encarceramentos desnecessários de adultos por pequenas quantidades de maconha para uso pessoal. Devemos também implementar regulamentações inteligentes, proporcionando ao mesmo tempo acesso aos adultos a produtos seguros e testados. Como morador da Flórida, votarei ‘SIM’ na emenda 3 em novembro”. O uso recreativo da maconha no estado segue proibida.

Na avaliação do professor Thiago Rodrigues, a política de combate ao narcotráfico nos Estados Unidos não deve atingir o processo de legalização da maconha, uma vez que o produto tem sido explorado pelo capital farmacêutico.

“Do ponto de vista do outro tipo de legalização, que é a legalização para consumo recreativo, também já há interesses bilionários que mobilizam, nos Estados Unidos, grandes corporações”, argumentou o docente.

 

Fonte: g1/Agencia Pública

 

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