'Se os latinos nos EUA fossem uma
única economia, seria a quinta maior do mundo', diz pesquisadora
Somente em 2022, as comunidades latinas
foram responsáveis pela produção - em bens e serviços - de 3,6 trilhões de
dólares do PIB dos EUA (cerca de R$ 21,24 trilhões). Isto significa que,
se os latinos fossem um país separado dentro dos Estados
Unidos,
representariam a quinta maior economia do mundo, à frente de países como o
Reino Unido, a França ou mesmo o Brasil.
Os dados foram apresentados por Ana Tereza
Ramirez Valdez, presidente e diretora executiva da Latino Donor Collaborative,
durante a coletiva de imprensa da presidente mexicana Claudia Sheinbaum na
manhã desta quinta-feira (23). Eles fazem parte dos resultados do estudo Fast Facts:
Latinos in the United States 2024, que, com base em fontes oficiais dos EUA,
mostra o impacto econômico da comunidade latina no país.
"Estes dados sobre mexicanos e latinos
são surpreendentes e ajuda muito que sejam conhecidos no México, mas também que
esta informação seja conhecida nos Estados Unidos, porque a comunidade
mexicana contribui muito”, disse a presidente Claudia Sheinbaum.
Ela assegurou também que os mexicanos nos
Estados Unidos são “heróis e heroínas”, a quem agradeceu porque “contribuem
para a economia nacional com remessas que representam o amor por suas famílias,
o amor por seu país”.
O estudo mostra que atualmente existem mais
de 4,7 milhões de empresas latinas nos Estados Unidos, as quais contribuem
anualmente com cerca de 800 bilhões de dólares para a economia dos EUA. No
entanto, apenas 463 mil dessas empresas latinas empregam mais de 3,5 milhões de
trabalhadores no país. Além disso, anualmente, 50% das novas empresas nos
Estados Unidos são fundadas por latinos.
Fundada em 2010, a Latino Donor
Collaborative é uma organização sem fins lucrativos que, de acordo com sua
própria apresentação, é “dedicada a mudar a percepção dos latinos como parte da
sociedade dominante dos EUA”.
Nas últimas semanas, em resposta à retórica
e às políticas cada vez mais xenófobas do presidente Trump, que - sem qualquer
base na realidade - tem apontado os migrantes como a fonte dos problemas que o
país enfrenta, o governo mexicano da Quarta Transformação vem implementando
uma campanha integral para proteger os direitos
humanos dos migrantes perseguidos
e promover o “orgulho de ser mexicano”.
<><> Um motor de crescimento
Enquanto o discurso oficial do trumpismo e
a mídia de direita constroem falsos estereótipos em que os latinos estão
ligados ao crime ou fingem viver de esmolas do governo, os dados mostram que a
grande maioria são famílias e pessoas trabalhadoras.
Atualmente, as comunidades latinas são o
segundo maior grupo do país, atrás apenas dos anglo-saxões. Elas representam
19,5% da população total, o que significa que uma em cada cinco pessoas que
vivem nos Estados Unidos é de origem latina. De todos os latinos, 60% são de
origem mexicana.
Diferente da narrativa preconceituosa
propagada pela Casa Branca, a maioria dos latinos tem algum tipo de status
legal no país. E na grande maioria dos casos em que isso não acontece, são
pessoas que trabalham e querem regularizar sua situação imigratória.
De acordo com os dados apresentados, 81%
dos latinos (4 em cada 5) são cidadãos americanos. “Dos 20% que não são cidadãos,
a maioria tem permissão”, afirmou Ramirez Valdez.
“Venezuelanos, cubanos, salvadorenhos
chegam aos Estados Unidos com licenças. Portanto, a verdade é que a
porcentagem, o número de migrantes sem documentos nos Estados Unidos é muito
menor do que toda a retórica de que falam os jornais e a mídia nos Estados
Unidos”, afirma.
Estima-se que 93% dos jovens latinos são
nascidos no país. Enquanto 8 em cada 10 latinos nos EUA são bilíngues.Trata-se
de uma potência cultural.
Além disso, o enorme peso demográfico que
as comunidades latinas têm no país significa que elas representam uma crescente
influência cultural, econômica e também política. Em nível eleitoral, as
comunidades latinas - levando em conta sua diversidade - representam um setor
estratégico na política dos EUA. Nas últimas eleições de novembro, 14,7% dos
eleitores foram latinos.
A população latina é também uma das mais
jovens do país. Isso projeta um grande potencial de crescimento nos próximos
anos. De acordo com dados apresentados por Ramirez Valdez, em 2022 a idade
média dos latinos foi de 30,7 anos, quase dez anos a menos do que a idade média
dos anglo-americanos, que foi de 41,1 anos.
A população jovem das comunidades latinas
faz delas um importante contribuinte para os setores economicamente ativos do
país. Atualmente, os latinos representam 19% de todos os trabalhadores do país.
Espera-se que, até 2030, 78% da nova força de trabalho seja composta por
latinos.
¨ Trump inicia 'operação de deportação
em massa' com prisão de mais de 500 imigrantes nos EUA
O Serviço de Imigração e Alfândega dos
Estados Unidos (ICE, na sigla em inglês) informou, na última quinta-feira (23),
que centenas de imigrantes já foram presos nos primeiros dias do governo de
Donald Trump, que promete “a maior operação de deportação da história”.
Segundo os dados da agência, desde a posse do republicano na última segunda-feira
(20), 538 pessoas foram presas e 373 foram colocadas sob detenção, em um método
do ICE que solicita a extensão da custódia.
A secretária de imprensa da Casa Branca,
Karoline Leavitt, confirmou os números, detalhando ainda que “centenas de
imigrantes ilegais criminosos foram deportados por meio de aeronaves
militares”. “A maior operação de deportação em massa da história
está em andamento. Promessas feitas. Promessas cumpridas”, afirmou por meio da
rede social X.
Segundo Leavitt, a partida dos “voos
de deportação” foram iniciadas nesta sexta-feira (24).
“O presidente Trump está enviando uma mensagem forte e clara para o mundo
inteiro: se você entrar ilegalmente nos Estados Unidos da América, sofrerá
graves consequências”, acrescentou.Também na quinta-feira, Ras Baraka, prefeito
de Newark, na cidade de Nova Jersey, denunciou que agentes do ICE
"invadiram um estabelecimento local, detendo moradores e cidadãos sem
documentos, sem apresentar uma ordem judicial”.
Por meio de um comunicado no site da
prefeitura de Newark, Baraka detalhou que “um dos detidos é um veterano militar
dos EUA que sofreu a indignidade de ter a legitimidade de sua documentação
militar questionada”.“Este ato flagrante é uma violação clara da Quarta Emenda
da Constituição dos EUA, que garante 'o direito das pessoas de estarem seguras
contra buscas e apreensões irracionais’”, denunciou o prefeito.“Newark não
ficará de braços cruzados enquanto as pessoas são aterrorizadas ilegalmente”,
ressaltou.
<><> 'Maior
deportação em massa da história'
Trump prometeu reprimir a imigração de pessoas
sem documentação durante sua campanha eleitoral e começou seu segundo mandato
com uma série de ações para impedir as entradas nos Estados Unidos. O magnata
também demonizou os migrantes durante sua campanha, descrevendo-os como
"selvagens", "animais" ou "criminosos", e
prometeu a maior deportação da história em um país onde cerca de 11 milhões de
pessoas vivem sem documentação.
Em sua retórica, o republicano
frequentemente usa a palavra "invasão" para se referir à entrada de
imigrantes sem visto nos Estados Unidos e os acusa de envenenar o "sangue"
do país. Na última terça-feira (21), informou que seu governo restabelecerá o
programa Remain in Mexico (Fique no México) — uma política que
ele implementou em seu primeiro mandato (2017-2021) — que envolve requerentes
de asilo esperando no lado mexicano da fronteira enquanto sua petição é
processada.
O presidente cancelou um programa que seu
antecessor Joe Biden (2021-2025) havia criado para fornecer vias legais para
solicitantes de asilo que fugiam da violência e denunciavam perseguição
política. Esta medida afeta muitas pessoas de países da América Central e do
Sul.Trump também suspendeu até novo aviso todas as chegadas aos Estados Unidos
de refugiados que solicitaram asilo, incluindo aqueles que o obtiveram.
No início desta semana, o Congresso de
maioria republicana aprovou uma lei para prorrogar a prisão preventiva de
estrangeiros não-documentados suspeitos de crimes. Os decretos de Trump ainda
incluem uma ordem executiva que busca restringir o direito à cidadania por
nascimento nos Estados Unidos, consagrado na 14ª Emenda da Constituição,
adotada na segunda metade do século XIX.
Contudo, um juiz federal em Seattle suspendeu
temporariamente esta
última ordem na quinta-feira, alegando “inconstitucionalidade”. Em resposta às
ações do presidente republicano, a porta-voz do Alto Comissariado da ONU para
os Direitos Humanos, Ravina Shamdasani, disse, também nesta sexta-feira, que
enquanto os países "têm o direito de exercer sua jurisdição em suas
fronteiras internacionais", devem lembrar que "o direito de buscar
asilo é um direito humano universalmente reconhecido".
Shamdasani refere-se à Declaração Universal
dos Direitos Humanos, adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1948,
para evitar que crimes contra a humanidade voltassem a ser cometidos, como
durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).“Todo ser humano, vítima de
perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países”,
garante o documento, entre outros artigos que mencionam a migração e o direito
à liberdade de locomoção.
¨ Perseguição a imigrantes deve criar
problemas internos nos EUA, afirma especialista
Procuradores-gerais de 22 estados
estadunidenses entraram na justiça do país contra o decreto do presidente
recém-empossado Donald Trump que muda regras para a concessão da cidadania a
bebês nascidos nos EUA. Pela décima-quarta emenda da constituição dos Estados Unidos, são cidadãos do
país todas as pessoas nascidas dentro do território ou naturalizadas.
Nas primeiras horas como presidente, Trump
assinou um pacote de decretos, entre eles, está uma ordem executiva que revoga
o direito à cidadania de bebês filhos de mães imigrantes ilegais ou com visto
temporário, se o pai não for cidadão dos Estados Unidos ou residente permanente
legal no momento do nascimento desse filho.
Na terça-feira (22), o departamento de
segurança interna dos Estados Unidos publicou um comunicado com duas novas
diretrizes sobre a deportação de imigrantes ilegais. A primeira delas revoga
uma norma do governo de Joe Biden que proibia a prisão de imigrantes ilegais em locais
sensíveis como escolas e igrejas.
A segunda diretriz restringe o uso de
instrumento que permitia a entrada legal de imigrantes em situação de
emergência. Chamado em inglês de “parole”, o instrumento também foi muito usado
na gestão Biden. Agora, cada caso vai ser analisado individualmente.
As novas regras dão base para o programa de
deportação em massa que Trump prometeu durante a campanha.
Em entrevista ao Central do Brasil desta quarta-feira (22), o
advogado e cientista político Jorge Folena criticou as medidas.
“Estamos diante e um fato político de
perseguição a estrangeiros nos Estados Unidos, principalmente latinos. É uma
visão preconceituosa, racista, discriminatória e que atenta inclusive contra
princípios até mesmo do direito norte-americano. Curioso é que os Estados
Unidos são um país formado essencialmente por imigrantes, e eles agora querem
perseguir exatamente os imigrantes que vão para lá e as pessoas que nascem [no
país]”.
O especialista afirma que, caso as medidas
sejam concretizadas, a situação política no país ficará conturbada.
“Vai ser uma medida que vai criar problemas
internos nos Estados Unidos, inclusive com ausência de trabalhadores em
atividades que os cidadãos americanos não querem fazer. Muitos desses
trabalhadores que vão pra lá, vão fazer trabalho duro, trabalhar como pedreiro
na construção civil, vão trabalhar no comércio, no restaurante, vão trabalhar
em casas de família. São trabalhadores necessários em qualquer país, e [Trump]
quer restringir isso”.
Folena afirma que a agressividade e o
desrespeito aos direitos humanos devem ser
marcas do governo Trump, porém, ele acredita que é preciso esperar para ver se
o mandatário terá êxito em suas promessas.
“Não se pode esperar muito de Donald Trump
e do seu governo com relação à questão dos direitos humanos. O que vai ter por
parte dele é o que nós ouvimos no discurso de posse, muita repressão. Ele vai
prestigiar as polícias para exatamente limpar a sociedade americana, e
reprimir. Eu considero tudo isso um festival de bravatas típico dos fascistas.
Na verdade, vai ter uma disputa interna dentro dos Estados Unidos. Tem muita
gente na sociedade americana que se contrapõe, tem os imigrantes. Então vamos
ver se [será possível] essa limpeza étnica que ele prometeu”.
¨ 'Teatro de Trump' é importante para
levar adiante reformas políticas impopulares, diz analista política
As perspectivas das novas políticas
internas e externas dos Estados Unidos com o início do governo do republicano de extrema direita Donald
Trump foram
o tema do décimo episódio de O Estrangeiro,
podcast de política internacional do Brasil de Fato.
"O que está sendo proposto é um
governo de teatro político; muitos movimentos e ações para sinalizar uma
retomada de assertividade e autoridade no plano internacional [dos EUA]",
pontuou Stephanie Brito, analista política da Assembleia Internacional dos
Povos.
Para Brito, Trump "faz coisas que são
insignificantes, já no primeiro dia [de governo]. Insignificantes, na prática,
mas para esse teatro político que ele busca construir, isso é importante".
Segundo ela, esta ação de Trump mascara uma retomada das políticas neoliberais
no país: redução de impostos para ricos e grandes empresas, menor regulação
sobre tecnologias digitais e transações financeiras, afrouxamento das leis
trabalhistas e congelamento do salário mínimo, sem reajuste há 15 anos nos EUA.
"Como são medidas muito impopulares, é
importante gerar um teatro político para distrair e gerar uma ideia de que a retomada econômica é por outro
caminho. E também tem a ver com a ideia de recolocação dos Estados Unidos no plano internacional
como uma potência a se respeitar", acrescentou Stephanie.
<><> América
Latina
Desde o início da campanha, Trump já havia
sinalizado políticas migratórias e sanções
violentas contra países da América Latina, em especial Cuba e México. Para Stephanie, este
discurso é muito "preocupante". "É possível que ele de fato leve
adiante as tais políticas. Ele propõe tarifas para as exportações mexicanas,
por exemplo, o que seria muito grave para a economia mexicana."
O magnata também propõe deportações em massa, "mas isso pode
ser difícil de executar, porque requer uma violação dos direitos dos Estados
também. Muitos estados onde moram, e que abrigam, imigrantes, são governos
democratas que não se prestarão automaticamente a facilitar essas
deportações", relembrou a analista.
"A ameaça de deportações também pode
fazer parte do teatro político. [Trump] sinaliza o que vai fazer para depois
acusar os democratas de não o deixarem, [com um discurso] de que os democratas
são defensores de pessoas que estão ameaçando a segurança do país."
Correspondente do Brasil de Fato em Cuba, Gabriel Vera Lopes também
lembrou que, com a chegada de Marco Rubio como novo secretário de
Estado,
"há uma força [da política anti-imigrante] dentro do governo que nunca
tiveram antes. [...] Porque o outro lado do confronto com a China é o confronto
com a América Latina, que tem muita influência da China também. E por isso,
eles também precisam, digamos assim, proteger o seu entorno".
Essa política, aponta Lopes, não se reflete
apenas na nomeação de Rubio. "O narcotráfico, a migração, a mudança climática, que têm relação
com os governos latinoamericanos, também são atravessados pelas pautas pessoais
de outros escolhidos de Trump. Portanto, a América Latina será uma discussão
muito presente [no governo Trump]."
<><> Oriente
Médio
Para Stephanie, em outras questões
relevantes para o panorama mundial, "os objetivos dos Estados Unidos não
mudaram": a tentativa de conter o crescimento da China e eliminar o que
consideram inimigos do governo, "que são países que têm armas
nucleares". Ela considera que as chances de isso se reverter para uma
guerra nuclear, e afetar os EUA, é muito grande. "Eles não podem perseguir
um conflito frontal, e eu acho que o Trump é consciente disso",
acrescentou.
Esta postura também poderá ser vista na
forma de lidar com o Oriente Médio. "O Trump tem uma política
internacional muito mais pragmática e ideológica. No sentido de ver onde estão
as oportunidades, quais brigas ele precisa comprar e quais ele pode evitar. Ele
tem um perfil maior de negociação. Mas isso não quer dizer que vá ser um
governo menos bélico. O que eu acho é que terá uma estratégia diferente para
enfrentar com os seus inimigos", esclareceu Stephanie.
Ela pondera, no entanto, que um presidente
sozinho não coloca políticas e estratégias em ação. "Temos que lembrar que
existe o Departamento de Defesa (DoD), que é um monstro com enormes
burocracias, um orçamento gigantesco e uma lógica interna, e que às vezes atropela
o presidente para cumprir com a sua agenda".
"Terão conflitos internos com relação
a como enfrentar essas ameaças. Eu acredito que ele tende a ser mais
pragmático, [e essa postura ressalta] esse teatro. Mas isso não significa que
ele vá abrir um novo conflito", completa a analista.
Fonte: Brasil de
Fato
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