Avanço da
energia nuclear pode ser bom para o clima?
A energia nuclear não libera
emissões de carbono durante sua produção, vantagem que tem alavancado o modelo como uma
solução limpa para suprir a demanda de energética, que cresce em ritmo acelerado em todo o mundo.
Contudo, embora não polua da
mesma forma que os combustíveis fósseis, a energia nuclear tem seu próprio
conjunto de problemas ambientais. Entre eles, as emissões indiretas
liberadas pela extração do urânio, o acúmulo de resíduos radioativos e o risco
de contaminação da água ou da ocorrência de um desastre como o de Chernobyl.
Apesar dos riscos, a Agência
Internacional de Energia (AIE) projeta que a energia nuclear vai representar
quase 10% da produção global de eletricidade em 2025 – o maior nível em 30
anos.
Segundo Fatih Birol, diretor
executivo da AIE, esse crescimento foi liderado pela China, impulsionado em
parte para suprir a demanda energética de grandes centros de dados e de
tecnologias como a inteligência artificial (IA).
Nos últimos meses, os
gigantes da tecnologia Meta, Amazon, Microsoft e Google anunciaram planos de
investir em energia nuclear sob a bandeira da neutralidade carbônica –
apesar de antes terem prometido apostar exclusivamente de energias renováveis. E com a
pressão crescente para se reduzir as emissões de gases de efeito estufa,
alguns formuladores de políticas também se manifestaram a favor de um novo
impulso para o modelo.
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Energia nuclear é uma solução climática realista?
Quase dois anos depois de
a Alemanha fechar seus últimos reatores nucleares, os partidos União Democrata Cristã e Social Cristã (CDU/CSU) de
oposição conservadora, pediram mais pesquisas sobre a tecnologia nuclear.
De olho nas eleições
federais alemãs em fevereiro, seu manifesto eleitoral da afirma que a energia
nuclear "tem um papel importante a desempenhar, especialmente no que diz
respeito às metas climáticas e à segurança de abastecimento".
05:18
Friedrich Merz, candidato a
chanceler federal pela CDU, descreveu o fechamento dos reatores alemães como um
"erro estratégico", mas diz que não é realista pensar em reativar
agora as usinas desligadas.
Outras siglas querem
examinar a possibilidade. A ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD),
por exemplo, está pressionando pelo retorno à energia nuclear, como parte de uma "combinação de energia sustentável e
séria". Em entrevista recente à emissora alemã ZDF, a candidata do partido
à chefia de governo, Alice Weidel, afirmou que a energia nuclear tem "uma
pegada zero de CO2".
A coalizão governamental do
chanceler federal alemão Olaf Scholz, hoje composta pelos social-democratas e verdes, descarta o
retorno à energia nuclear, que também envolve emissões carbônicas indiretas ao
longo do complexo processo de construção dos reatores.
Henry Preston, porta-voz da
Associação Nuclear Mundial (WNA), acredita que os formuladores de políticas se
tornaram mais "pragmáticos" nos últimos anos, equilibrando a
segurança energética e a emergência climática, enquanto pesam o aumento do
custo e do cronograma de construção de um reator nuclear com o potencial de
produzir uma "enorme quantidade” de energia limpa.
No entanto, grupos
ambientalistas têm apontado que os novos e caros projetos nucleares, que
normalmente levam cerca de uma década para ser construídos após todo o
processo de planejamento e licenciamento, não entrarão em operação a tempo de
cumprir as metas climáticas.
"Uma transição rápida
requer o uso de tecnologias e soluções existentes que possam ser implementadas
mais rapidamente, como as energias renováveis, principalmente a solar e a
eólica, além de eficiência energética e flexibilidade sistêmica",
frisou a Climate Action Network Europe, uma organização global de defesa do
clima, em publicação online.
"As energias renováveis
superam consistentemente a nuclear em termos de custo e velocidade de
implantação e, portanto, são escolhidas em vez da energia nuclear na maioria
dos países", consta do Relatório de Status da Indústria Nuclear Mundial de
2024 (WNISR), que considera
"irrealistas" os planos de aumentar a capacidade nuclear.
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Reatores modulares pequenos são alternativa mais segura?
Nos Estados Unidos, a Amazon e a
Google planejam comprar energia de pequenos reatores modulares (SMRs), que
funcionam como usinas nucleares avançadas com capacidade inferior a 300
megawatts, cerca de um terço de uma usina nuclear padrão.
As gigantes da tecnologia
afirmam que a energia nuclear ajudará a suprir as necessidades energéticas da
inteligência artificial e dos centros de dados. Atualmente, essas tecnologias
consomem entre 1% e 3% do suprimento mundial de energia – parcela que alguns
analistas contam dobrar até 2030.
Os centros de
dados precisam de "uma abundância de energia que seja livre de
carbono e confiável a cada hora do dia, e as usinas nucleares são as únicas
fontes que podem cumprir essa promessa de forma consistente",
disse em setembro Joe Dominguez, diretor executivo da Constellation
Energy nos EUA, ao anunciar um acordo de fornecimento de energia nuclear de 20
anos com a Microsoft.
Os defensores afirmam que os
SMRs serão mais seguros e mais baratos, e sua integração à rede mais
rápida do que os reatores tradicionais, podendo ser construídos nos locais de
antigas usinas de combustíveis fósseis. As parcerias da Amazon e da Google nos
EUA para a implementação da tecnologia devem estar operacionais no início da
década de 2030.
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Ambientalistas: "promessas vazias"
Mas a Climate Action Network
rebate o que classifica de "promessas vazias" dos SMRs, pois
"a tecnologia ainda não foi testada em escala comercial". Em
nível global, apenas dois projetos de SMR foram construídos até o momento, cada
um com reatores de diferentes padrões russos e chineses. Eles foram conectados
à rede em 2019 e 2021, respectivamente.
O relatório WNISR 2024, financiado em parte pelo
Ministério do Meio Ambiente da Alemanha, apontou que ambos os projetos sofreram
atrasos significativos na construção, levando duas ou três vezes mais tempo
para ser construídos do que o planejado. Eles também ultrapassaram o
orçamento e, até o momento, não tiveram bom desempenho na geração de energia.
Segundo o setor nuclear, no
entanto, os atrasos não foram surpresa, pois os primeiros SMRs construídos
na Rússia e na China eram projetos-piloto. Os futuros, agora em fase de
planejamento, poderiam "entrar em operação mais rapidamente", disse
Preston, da Associação Nuclear Mundial.
Mas Mycle Schneider,
analista independente de políticas nucleares e editora do WNISR, lembra que isso só seria possível
com a "reprodução de unidades idênticas ou praticamente idênticas", e
não com SMRs de padrões diversos, como acontece na Rússia e na China.
Schneider entende que o
rápido aumento da produção de painéis solares, baterias conectadas à rede e
turbinas eólicas, com dezenas de milhares de unidades construídas a cada ano,
representa uma "fabricação verdadeiramente modular", permitindo que
esses setores inovem e reduzam rapidamente os custos: "O setor
nuclear aprendeu com os projetos pilotos de SMR na China e na Rússia que ninguém
quer reproduzi-los, e não há tentativas de licenciá-los em nenhum país
ocidental."
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É preciso energia nuclear para atingir as metas
climáticas?
Na conferência
climática COP28, de 2023, em Dubai, a
energia nuclear foi listada pela primeira vez entre as tecnologias de baixa
emissão necessárias para alcançar as "reduções profundas, rápidas e
sustentadas nas emissões de gases-estufa".
O relatório de 2022 do Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU também mencionou a energia
nuclear, dizendo que era "improvável que todos os sistemas de energia de
baixo carbono em todo o mundo dependam inteiramente de fontes de energia
renováveis".
Embora admitam que a energia
eólica e a solar devam desempenhar um papel importante no esforço para
substituir os combustíveis fósseis, os especialistas em energia costumam
ressaltar a falta de confiabilidade da energia renovável que depende
da disponibilidade do sol e do vento.
Desde a COP28, 31 países –
entre eles protagonistas nucleares como França, Reino Unido, Estados
Unidos e Japão – se comprometeram a triplicar sua capacidade dessa energia até
2050. Estados não nucleares, como El Salvador, Jamaica, Moldávia e Mongólia,
fizeram o mesmo.
No entanto, o WNISR 2024 é cético em relação a essa
promessa. Listando uma série de possíveis obstáculos, incluindo altos custos,
tempo de construção e falta de capacidade industrial, o cálculo é que
seriam necessários mais de mil novos reatores para triplicar a capacidade
instalada atual.
¨ Renováveis
já geram quase metade da energia elétrica da UE
O aumento acentuado do uso
das energias solar, eólica, hidrelétrica e de biomassa na União Europeia (UE) elevou a
participação das energias renováveis na matriz
elétrica do bloco de 34% em 2019 para 47,5% em 2024, segundo um
relatório divulgado nesta quinta-feira (23/01) pelo think tank climático Ember, com sede
no Reino Unido.
Responsável por 11% do
fornecimento de eletricidade para os 27 Estados-membros do bloco, a energia solar se tornou
a fonte de energia de crescimento mais rápido da UE. Com isso, ela ultrapassou
o carvão pela primeira vez em
2024. No ano passado, apenas 10% da energia do bloco foi gerada com
carvão.
O relatório do Ember
destacou um declínio contínuo na dependência de combustíveis fósseis –
registrando uma baixa histórica de 29% – com a geração de gás natural liquefeito (GNL) em queda pelo quinto ano consecutivo.
Com participação de 17%, a
utilização de energia eólica superou a de gás natural pelo segundo ano
consecutivo. Em 2024, a geração de eletricidade a partir do gás caiu pelo
quinto ano seguido e representou pouco menos de 16% do total.
"Os combustíveis
fósseis estão perdendo o controle sobre a energia da UE", observou Chris
Rosslowe, especialista em energia da Ember.
<><> Guerra na
Ucrânia e Acordo Verde
O Acordo Verde Europeu, de
2019, foi fundamental para acelerar a transição da UE para as energias limpas.
O pacto prevê a redução das emissões do bloco em 55% até o final da década,
além de tornar a Europa climaticamente neutra até 2050.
"Quando o Acordo Verde
Europeu foi lançado, poucos imaginariam que a transição energética na UE
pudesse estar tão avançada", disse Rosslowe.
O aumento dos preços do gás
natural após a invasão da Ucrânia pela Rússia também forçou a Europa a recorrer à energia renovável em busca de
alternativas de menor custo e limpas. A queda da demanda na UE reduziu
significativamente a dependência do gás russo.
Com o uso cada vez maior de
novas capacidades eólica e solar, a região conseguiu evitar importações de
combustíveis fósseis no valor de quase 61 bilhões de dólares (R$ 362 bilhões)
desde 2019, diz o relatório.
"Isso envia um sinal
claro de que as necessidades [europeias] de energia serão atendidas por meio da
energia limpa, não através das importações de gás", disse Pieter de Pous,
analista de energia do think tank europeu
E3G, em Bruxelas.
<><> Esforços
europeus por energia limpa
A presidente da Comissão
Europeia, Ursula von der Leyen, afirmou
nesta terça-feira que a Europa "continuará trabalhando com todas as nações
que querem proteger a natureza e deter o aquecimento global".
O relatório chega em um
momento em que o presidente dos Estados Unidos, Donald
Trump, retirou o país do Acordo Climático de Paris, criado para conter o aquecimento global, e optou por uma política
energética que prioriza a utilização de combustíveis fósseis.
Trump declarou que os EUA
têm as maiores reservas de petróleo e gás do mundo e pretendem usá-las. Os EUA
são o segundo maior emissor de gases causadores do efeito estufa no mundo.
Rosslowe, da Ember, enfatizou
que a liderança da UE em energia limpa se torna ainda mais importante em meio a
esses desenvolvimentos. Segundo o especialista, "trata-se de aumentar a
independência energética europeia e de demonstrar essa liderança
climática".
Fonte: DW Brasil
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