Qual é a melhor
forma de tomar banho? Como a humanidade trocou os banhos coletivos por
chuveiros
Os brasileiros
são famosos em todo mundo por seu hábito de tomar muitos banhos – mas não
é só uma fama. De acordo com uma pesquisa recente de 2024, realizada
pela World Population Review (organização independente que fornece
dados demográficos e populacionais globais atualizados), o povo brasileiro
é o campeão mundial em frequência de
banhos,
com uma média de dois banhos diários de chuveiro.
Para
o norte-americano médio, o dia não está completo sem uma ducha,
ao menos. Mais de 60% dos adultos dos Estados Unidos relataram
tomar banho pelo menos uma vez por dia, por uma média de 8,2 minutos a
cada vez, de acordo com uma pesquisa pública de 2021.
Por mais
indispensáveis que sejam hoje, os chuveiros (ou duchas) são
uma adição relativamente nova à civilização humana. Durante a maior
parte da história humana registrada, que remonta a aproximadamente 3 mil anos
a.C., as evidências sugerem que os banhos comunitários desempenhavam um
papel central na vida diária. Desde os antigos banhos gregos até os
onsen japoneses, pessoas de todas as classes sociais se reuniam nas casas de
banho para se exercitar, tomar banho e socializar.
Hoje em dia, as
pessoas gostam mais de tomar banho sozinhas do que de banhos
sociais, priorizando a eficiência em detrimento da comunhão e do
relaxamento. Mas, por mais arraigado à cultura atual que o banho de
chuveiro possa parecer, a prática não é necessariamente preferível do
ponto de vista da saúde. Os especialistas refletem sobre a evolução da
cultura do banho e o que foi ganho e perdido no processo.
·
Milhares
de anos de banhos de banheira
Como parte central
da vida, as práticas de banho ao longo da história refletiram as
mudanças nos ideais de cuidado pessoal e saúde.
Na
Antiguidade, especialmente no Império Romano, o banho era
quase que inteiramente um assunto público. Somente os poucos mais ricos tinham
seus próprios banhos particulares, enquanto todos os outros participavam
do ritual de banho comunitário, que geralmente ocorria em grandes
complexos de banho e incluía massagens, bibliotecas e até
mesmo comida e bebida.
“Há muitas ilustrações artísticas
mostrando festas e coisas acontecendo nos banhos e pessoas jantando
no banho”, comenta Virgina Smith, historiadora e autora do livro “Clean: A
History of Personal Hygiene and Purity”.
Para os gregos antigos, o banho era
muitas vezes um ritual de autopurificação antes de ritos religiosos ou de
receber convidados, de acordo com Katherine Ashenburg, autora de “The Dirt on
Clean: An Unsanitized History”. As casas de banho tradicionais em estilo
japonês eram usadas inicialmente para fins terapêuticos e
religiosos e, posteriormente, como locais de reunião social.
Os banyas russos e os hammams turcos também foram
centros historicamente importantes de atividades sociais e religiosas.
“O banho nem sempre
estava ligado à limpeza e higiene na mente das
pessoas”, diz Ashenburg. “Às vezes, achava-se que entrar na água não só não
fazia nada por você em termos de limpeza, como também era perigoso para sua
saúde.”
Durante a Peste Negra, por exemplo,
os banhos públicos foram fechados porque os europeus medievais
acreditavam que a abertura dos poros com água quente permitiria que a peste
entrasse pela pele.
Embora esse
pensamento estivesse incorreto, havia preocupações com a higiene nos
banhos públicos, de acordo com James Hamblin, médico e professor da
Universidade de Yale, nos Estados Unidos, e autor do livro “Clean: The New
Science of Skin and the Beauty of Doing Less”. “Alguns relatos de casas de
banho antigas descrevem camadas de lodo na superfície da água”, afirma
ele. “Na verdade, você estava se expondo a agentes patogênicos.”
·
Uma
nova era para os banhos
Os banhos
coletivos em larga escala acabaram desaparecendo por volta da virada
do século 20 no Ocidente. Um dos principais fatores foi o surgimento
da teoria dos germes das doenças, “quando o banho passou a ser
fortemente associado à limpeza”, explica Hamblin. A partir de meados de
1800, as cidades do Reino Unido começaram a
construir banheiros públicos e casas de banho principalmente para os
pobres.
Um fenômeno
semelhante logo aconteceria nos Estados Unidos, principalmente
na cidade de Nova York, onde o
encanamento ainda era bastante inacessível e as populações de imigrantes
aumentavam. Com o desenvolvimento do chamado “banho de chuva” – um
tipo de chuveiro antigo que foi usado pela primeira vez por militares
europeus e trabalhadores da indústria – surgiu uma nova visão de saúde
pública e higiene em massa.
Foi-se o tempo dos
longos e luxuosos banhos comunitários. Por causa do espaço, da água, do
combustível e do custo-benefício, o banho de chuva tornou-se a forma
preferida de banho. À medida que as pessoas começaram a ter encanamento em suas
casas, as banheiras e chuveiros pessoais tornaram-se cada vez mais
comuns e, por fim, passaram a ser a norma.
Naomi Adiv,
professora assistente de ciências políticas da Universidade de Toronto
Mississauga, no Canadá, atribui essa mudança, em grande parte, à “ascensão
do capitalismo
industrial”
nos Estados Unidos. “A ideia de sair para tomar banho à tarde não está de
acordo com a produtividade do trabalhador.”
Ainda existem casas de banho
públicas em
todo o mundo, inclusive na Turquia, Rússia e Japão. Mas
nossos rituais diários de limpeza foram em grande parte relegados
a banheiras e chuveiros individuais – e não necessariamente para
melhor.
“Perdemos o aspecto
social [do banho] e, para muitas pessoas, a sensação de prazer”, diz
Hamblin.
·
O
que é melhor, tomar banho de chuveiro ou de banheira?
Do ponto de
vista do saneamento, há poucas
pesquisas sobre a preferência entre tomar banho de chuveiro ou de
banheira. Com uma fonte de água limpa, ambos são eficazes para a higiene
pessoal, afirma Kelly Reynolds, professora de Comunidade, Meio Ambiente e
Política na Universidade do Arizona (Estados Unidos), e “realmente parece ser
uma questão de escolha pessoal”.
Para aqueles
que se preocupam em ficar de molho em água não higiênica, Amy Huang,
dermatologista do Medical Offices of Manhattan, em Nova York, diz que “a
menos que você esteja extremamente sujo, não deve haver nenhuma
preocupação”.
Assim como o
microbioma intestinal, o bioma da pele contém milhares de espécies de
micróbios que vivem e apoiam a saúde da pele, explica Hamblin. Tanto
o banho quanto a ducha podem remover temporariamente esse
bioma ou danificar nossa
pele se
a água estiver muito quente, se for usado muito sabão e se a esfregação for
muito vigorosa.
“O regime ideal é
basicamente um sabonete suave sem fragrância, sem corantes e, de
preferência, sem espuma”, diz Huang. Você nem precisa esfregar em todos os
lugares – concentre-se nas axilas, nos órgãos genitais, nos pés e no couro
cabeludo se estiver lavando o cabelo, acrescenta ela. Katrina Abuabara,
professora associada de dermatologia da Universidade da Califórnia de San
Francisco (UCSF), acrescenta que “usar buchas e panos pode danificar a barreira
da pele, e lavar com as mãos é suficiente”.
Para pessoas
com eczema ou outros problemas de pele, por exemplo, os banhos podem
ser uma parte eficaz de seu regime de tratamento. “Como você fica na
banheira por mais tempo do que no chuveiro, você deixa a pele mais macia para
que, ao aplicar o medicamento, a pele o absorva melhor”, diz Huang.
Tomar um banho
quente também pode funcionar como um estímulo físico e mental, de
acordo com Justine Grosso, psicóloga mente-corpo em Nova York e na Carolina do
Norte. O banho de imersão, mais do que o banho de chuveiro,
“demonstrou melhorar o humor de pessoas com depressão,
melhorar o sono de pessoas com insônia e ter efeitos
positivos no sistema cardiovascular”, comenta a psicóloga.
Como
exatamente o banho quente afeta o corpo ainda está sendo pesquisado. “Há
algumas evidências de que ele funciona por meio da vasodilatação, na qual
os vasos sanguíneos se alargam, permitindo que mais oxigênio e nutrientes
cheguem à periferia do corpo”, acrescenta Grosso.
“A questão é o
calor”, diz Ashley Mason, psicóloga clínica do Osher Center for Integrative
Health da UCSF. Estudos preliminares sugerem que mergulhar em saunas,
salas de vapor, banheiras de hidromassagem e chuveiros ou banheiras
quentes pelo menos uma vez por dia pode ser benéfico.
Em geral, quando se
trata de limpeza, diz Hamblin, menos é mais. O setor de higiene pessoal
“medicalizou” uma prática que tem muito pouco a ver com a prevenção de
doenças, afirma ele. Sem desconsiderar a necessidade do sabonete na saúde
pública, ele culpa o marketing moderno por manipular os consumidores
com crenças distorcidas sobre a importância de um ritual diário
que usa produtos caros.
Do ponto de vista
médico, o banho coletivo nunca foi um meio de melhorar a saúde, acrescenta
Hamblin. Mas “em termos de conexão social, de relaxamento psicológico, não
duvido que tenha tido algum efeito”.
¨ Mito ou realidade: tomar banho de água fria traz
benefícios à saúde?
O banho com água fria é uma
prática que se tornou popular nos últimos anos devido a uma série de supostos
benefícios comentados nas redes sociais. Muitas pessoas tomam
banhos frios
após atividades físicas, mas também há quem mergulhe em duchas geladas apenas
por diversão.
Devido à
popularidade do fenômeno, uma pesquisa de 2022 que foi publicada pela
Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos (NLM) procurou descobrir se
tomar banho ou mergulhar em água fria
tem realmente efeitos positivos sobre a saúde das pessoas.
Conforme
argumentado pela NLM, alguns estudos indicam que essa exposição voluntária tem
alguns efeitos
benéficos à saúde.
Entretanto, a questão está sujeita a debate porque muitos dos pontos positivos
sugeridos são baseados em alegações subjetivas das pessoas e evidências sem
provas.
<><> Tomar
banho frio traz benefícios?
Há uma crença de
que os banhos de água fria podem estimular o sistema imunológico, tratar
a depressão, melhorar a
circulação periférica, aumentar a libido, queimar calorias e até reduzir
o estresse.
No entanto, o
estudo publicado pela NLM adverte que muitos dos benefícios à saúde atribuídos
a essa exposição regular à água fria podem não ser causais e, em vez disso, são
explicados por outros fatores.
Entre essas
influências, o estudo da biblioteca norte-americana menciona que um estilo de
vida ativo, o gerenciamento de estresse por meio de meditação e técnicas de
respiração, além de interação social constante, alimentação
saudável e
uma mentalidade positiva são pontos a serem considerados.
É por essa razão
que os autores do artigo insistem que esse é um assunto que deve continuar a
ser debatido na ciência. Só que a pesquisa reconhece que a exposição do corpo a
um ambiente frio tem uma variedade de efeitos sobre o corpo.
Como os banhos de
água fria afetam o corpo
De acordo com a
NLM, a exposição à água fria é um desafio fisiológico para os sistemas de
órgãos. O corpo precisa se adaptar ao ambiente de água fria para manter a
temperatura no cérebro e nos órgãos,
regulando adequadamente os mecanismos de produção e perda de calor.
>>>> Diante
disso, veja alguns efeitos da exposição à água fria no corpo humano:
<<<< Respostas cardiopulmonares: devido ao choque das baixas
temperaturas, a pressão arterial pode aumentar.
<<<< Termogênese
por tremores: aumenta a produção de calor metabólico no corpo por meio de
tremores – que são contrações dos músculos para aumentar a temperatura
corporal.
<<<< Termogênese
sem tremores: o tecido adiposo marrom (gordura subcutânea) é ativado pela
liberação de noradrenalina e pela queima de gordura para proteger o corpo como
um isolante contra o frio externo.
É importante
observar que, de acordo com a pesquisa, todas essas reações corporais podem
variar de pessoa para pessoa. Isso se deve a características de gênero,
idade, ritmo circadiano, constituição
corporal e temperatura da água à qual o organismo específico está exposto.
Fonte: National
Geographic Brasil
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