EUA: Os arautos do negacionismo de
negócio
Alguns dias após Donald Trump, do Partido Republicano,
ser eleito pela segunda vez à presidência dos EUA, soube-se, em 14 de novembro
de 2024, que Robert F. Kennedy Jr comandaria o Department
of Health and Human Services (HHS), órgão equivalente, no
federalismo daquele país, ao nosso Ministério da Saúde. O HHS tem como missão
supervisionar as principais agências de saúde dos EUA, incluindo o CDC, sigla
que identifica o Centro de Controle e Prevenção de Doenças, a mais importante
agência de saúde pública do país – apenas para se ter uma noção de sua
importância, está sob controle do CDC uma das duas amostras do vírus da varíola
existentes no mundo. A outra está num órgão equivalente na Rússia.
Kennedy Jr é sobrinho do ex-presidente John F. Kennedy
e filho do ex-senador Robert F. Kennedy, ambos filiados ao Partido Democrata.
John foi assassinado em novembro de 1963, quando exercia o mandato
presidencial. Robert foi assassinado cinco anos depois, em junho de 1968,
quando disputava a indicação do seu partido à presidência do país.
Apesar da forte ligação da sua família com o Partido
Democrata, Kennedy Jr integrou-se à campanha do republicano Donald Trump por
sua identificação com as posições negacionistas do candidato. Para o trumpismo
não houve maiores dificuldades para acolher aquele a quem um amigo qualificou
como “a fruta podre do clã dos Kennedy”, dada a sua trajetória abertamente
antivacinista. Entidades e cientistas alertaram para o significado de colocar Kennedy Jr no
comando da política de saúde. Trump, que tem apoio da maioria do Congresso, os
ignorou, obteve a confirmação de Kennedy Jr no Senado e o nomeou para o HHS.
Uma das “teses” que ganharam o coração de Kennedy Jr é
a farsa da associação entre autismo e vacina contra o sarampo, que teve origem
no artigo do médico britânico Andrew Wakefield, publicado em 1998 na revista
científica The Lancet. O artigo foi produzido com dados fraudados e foi comprovado o conflito de
interesse do autor, pois Andrew Wakefield havia sido contratado por advogados
para produzir dados contra a vacina utilizada na época, para que eles pudessem
ganhar dinheiro processando os fabricantes. Em 2010, o Conselho Geral de Medicina do Reino Unido, julgou Andrew
Wakefield, condenando-o. O médico foi considerado inapto para o exercício da
profissão e sua conduta qualificada como irresponsável, antiética e enganosa.
Como consequência a revista The Lancet fez uma retratação e reiterou que as conclusões
do estudo eram falsas.
Nada disso, porém, demoveu Kennedy Jr de sua crença. Ao
contrário. Em 2021, Kennedy Jr foi o produtor executivo de Vaxxed 2: The People’s Truth, sequência do
documentário Vaxxed, dirigido por ninguém menos do que Andrew Wakefield, o
reconhecido falsificador dos dados da pesquisa sobre autismo e vacina contra o
sarampo.
Sabendo da falsificação, por que Kennedy Jr seguiu
abraçado com o falsificador? Estupidez? Não. Negócio. O negacionismo nunca foi,
e não é, apenas ignorância. É, também, negócio.
Advogado, 70 anos, com atividades profissionais na área
de direito ambiental, Kennedy Jr foi nomeado, pois Donald Trump crê que
ele será
capaz de
“garantir que todos estejam protegidos dos produtos químicos nocivos, dos
poluentes, dos pesticidas, dos produtos farmacêuticos e dos aditivos
alimentares que contribuíram para a avassaladora crise de saúde” naquele país.
Para o presidente, seu “ministro” da saúde defenderá os interesses dos cidadãos
contra “o complexo industrial de alimentos e as companhias farmacêuticas que se
envolveram em farsas e desinformação”, bem como dará fim à “epidemia de doenças
crônicas, fazendo com que os Estados Unidos voltem a ser grandes e saudáveis
novamente”.
Kennedy Jr não deixou por menos e, ao agradecer a
indicação, afirmou que pretende “varrer a corrupção e acabar com os conflitos
de interesse generalizados em nossas agências governamentais de saúde”. Com
esse ímpeto, prometeu “fazer com que os americanos voltem a ser as pessoas mais
saudáveis do mundo”.
Porém, a julgar por suas declarações, há riscos
importantes de que aconteça o oposto do que ele pretende.
Os EUA, país em que os índices de cobertura vacinal são
piores do que os registrados no Brasil, mesmo nos desgovernos de Michel Temer e
Jair Bolsonaro, terá coberturas ainda menores na gestão de Kennedy Jr, com a
promoção do antivacinismo a partir de órgãos do próprio governo. Essa
orientação política repete a estratégia adotada no Brasil, pelo governo
Bolsonaro, caracterizada por incessante hostilidade ao SUS e às ações de saúde
pública, que partiam do Palácio do Planalto, impulsionadas pelo denominado “Gabinete
do Ódio”. O negacionismo e o antivacinismo transformados em política pública,
produziram efeitos devastadores sobre a cobertura vacinal em todo o
Brasil.
Outra “tese” abraçada com entusiasmo por Kennedy Jr se
refere simultaneamente às áreas de saúde e ambiente. Além da reiterada oposição
ao Acordo de Paris, o tratado internacional sobre mudanças
climáticas, adotado em 2015, o agora dirigente do HHS tem declarado sua oposição à fluoretação da água que, em sua
visão negacionista é feita com “um resíduo industrial” que produz “artrite,
fraturas ósseas, câncer ósseo, perda de QI, distúrbios do neurodesenvolvimento
e doenças da tireoide”. Embora o flúor seja um elemento natural, ocorrendo no
ar, solo e água, o representante do governo de Donald Trump para a saúde
prefere crer que se trata de um veneno.
Após a eleição de Donald Trump, Kennedy Jr prometeu que
“em seu primeiro dia, o governo recomendará que todos os sistemas de
abastecimento público de água dos EUA interrompam a medida”. Trata-se de recomendação pois a
decisão sobre o assunto não cabe ao governo federal, mas a cada autoridade
pública local. Se essa recomendação for aceita, será um golpe duríssimo para a
saúde pública, com notáveis prejuízos às pessoas.
A tecnologia de saúde pública conhecida como
“fluoretação da água” consiste em ajustar os níveis de fluoretos encontradas
naturalmente em todas as águas, situando-os em patamares seguros para a saúde
humana. Conhecimentos científicos consolidados há mais de 50 anos indicam que
quando a água utilizada para consumo humano contém teores de fluoretos
similares aos encontrados nas águas dos mares e oceanos, o flúor é muito eficaz
para prevenir a cárie dentária e seguro para as pessoas.
Nos EUA essa tecnologia começou a ser utilizada há 80
anos, em 1945. Em 1999 foi considerada uma das dez
principais conquistas da saúde pública naquele país. Como resultado da sua
eficácia, comprovada por algumas centenas de pesquisas independentes, sua
cobertura vem sendo ampliada: era de 65% da população no ano 2000; aumentou
para 73% em 2018. A meta para 2030 é chegar a 77%.
Atualmente, os EUA lideram em nível
mundial a
utilização dessa tecnologia. O Brasil ocupa o segundo posto em escala global,
considerando-se números absolutos. Mas o Brasil registra, também nessa área,
importantes desigualdades macrorregionais, com a situação
sendo melhor no Sul do que no Norte.
Na capital paulista, que em 2025 completa 40 anos de
uso ininterrupto da fluoretação da água, a medida é a principal responsável
pelo declínio na prevalência e severidade da cárie dentária. Em 1985, quando
teve início a fluoretação, apenas 5% das crianças paulistanas estavam livres da
doença na idade-índice de 12 anos, usada por epidemiologistas para comparações.
Essa porcentagem se elevou para 40% em 2002 e alcançou 55% em 2023. O número
médio de dentes atingidos por cárie declinou de 6,5 em 1985
para 1,4 em 2023.
Se a decisão de Kennedy Jr fosse levada em conta na
capital paulista, esses números dão a medida do impacto brutalmente negativo
sobre a saúde bucal das crianças paulistanas. Em São Paulo, e no Brasil, o
emprego da tecnologia de fluoretação das águas para consumo humano, pela Sabesp
e demais empresas de tratamento da água, é amparada pela lei
6.050,
de 1974, corroborada pela lei 14.572, que instituiu em 2023 a Política Nacional
de Saúde Bucal. Baixo Guandu, no Espírito Santo, é a primeira cidade brasileira
em que a medida foi implementada, em 1953. Diferentemente dos EUA, no Brasil a
decisão sobre o tema não cabe, portanto, às autoridades locais de saúde e
saneamento, mas ao Congresso Nacional. Sua execução, porém, nos termos das leis
e normais nacionais, compete à empresa de tratamento da água que administra o
setor em cada cidade.
Por sua comprovada segurança e eficácia, a fluoretação
das águas de abastecimento público é recomendada por entidades de odontologia e
de saúde pública em todo o mundo. Inclusive pelo CDC dos EUA e
pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Mas Kennedy Jr anunciou também que o governo Trump
retirará os Estados Unidos da OMS já nos primeiros dias de governo. Essa decisão foi
duramente criticada, dentro e fora dos EUA, mas
foi tomada no dia da posse de Trump, por meio de uma “ordem
executiva”.
O país sediou, no pós-Guerra, a criação da OMS, instituída como um órgão da Organização
das Nações Unidas (ONU) em 17 de abril de 1948.
Nas últimas décadas a participação estadunidense
no financiamento da OMS, cujo orçamento anual é de cerca de US$ 6,8 bilhões, é
de aproximadamente US$ 450 milhões. Boa parte dos recursos da OMS tem origem em
doações de apoiadores não estatais. Dentre os países, a participação dos EUA
gira em torno de 20%, o que faz enorme diferença no orçamento. Mas Trump quer
dar outro destino a esse dinheiro. Porém, a saída dos EUA do órgão fragiliza
não apenas a OMS, mas a própria ONU – um conhecido instrumento de exercício do
poder imperial daquele país.
E prejudica, sobretudo, populações ao redor do mundo,
não apenas a população estadunidense, que ficará desprotegida de acordos
globais sobre epidemias e pandemias. Impactará forte e negativamente os povos
da África, da Ásia e da América Latina, regiões onde a OMS participa ativamente
nos esforços para assegurar proteção sanitária universal.
Nas três américas, a OMS atua por meio de sua
representação na região, a Organização Pan-americana da Saúde (OPAS). O órgão
supranacional vem desenvolvendo atividades decisivas para a saúde pública em
vários países, há mais de um século. São feitos notáveis na prevenção e
controle de epidemias, como o processo de erradicação da varíola – esforço mundial do qual participou o brasileiro Ciro
de Quadros que, em seguida, dedicou-se ao controle da poliomielite nas Américas,
tendo sido bem-sucedido mesmo enfrentando enormes dificuldades, inclusive
conflitos armados em El Salvador, Nicarágua e Peru.
Criada em 1902, a OPAS tem sede em Washington, se
integrou à OMS no processo de instituição do órgão mundial da ONU e teve, até o
momento, 11 diretores. Dois brasileiros a dirigiram: Carlyle Guerra de Macedo,
no período de 1983 a 1995 e Jarbas Barbosa, seu atual diretor, eleito em 2022. O SUS,
criado em 1988, e o Programa
Mais Médicos,
ambos duramente criticados por conservadores no Brasil, contaram com apoios
decisivos da OPAS, que também participou das articulações de que resultou
o Programa Nacional de Imunizações (PMI), em
1973.
Atualmente, o Programa Nacional de Imunizações disponibiliza
48 imunobiológicos a todos os brasileiros, gratuitamente, por meio do SUS: 31
vacinas, 13 soros e 4 imunoglobulinas. A saída dos EUA da OMS atinge duramente
a OPAS e, indiretamente, todas as suas atividades na América Latina, incluindo
o Brasil.
O antivacinismo, o antifluoracionismo, a renúncia à
liderança na OMS, todas essas medidas parecem não se coadunar com o papel que
os EUA exercem no mundo contemporâneo. Então, por quê?
Dinheiro. Negócio. Os interesses privados
entranharam-se a tal ponto no interior do poder do império norte-americano, que
começa a se espraiar sobre os instrumentos de exercício desse poder, uma
espécie de “anarquia da produção capitalista”, perdendo-se a perspectiva do
interesse público – ainda que se trate, no caso de Donald Trump, do interesse
público apenas nacional, como reiterou, de modo inequívoco, em seu discurso de
posse em 20/1/2025. O negacionismo, em suas diferentes expressões, das vacinas
às mudanças climáticas, não é, portanto, desinteressado. Não é apenas produto
de notável ignorância. É negócio.
O modo jubiloso com que Donald Trump se referiu ao
petróleo na cerimônia de posse expressa um tipo de negacionismo motivado por
interesses econômicos e não por desconhecimento sobre o significado climático
de seguir queimando petróleo. Trata-se, portanto, de uma espécie
de negacionismo de negócios, em que interesses particularistas prevalecem sobre
o interesse público, destruindo políticas públicas e comprometendo o interesse
do país em acordos internacionais.
Até onde o negacionismo de negócios prevalecerá no
governo Donald Trump? Resposta nos próximos quatro anos. Ou em alguns meses.
¨ Capitalismo: quem são os novos titãs.
Por Ladislau Dowbor
Peter Phillips escreveu um livro que mais parece um
relatório de pesquisa, e que é de uma prodigiosa utilidade: em vez de ilustrar
as suas opiniões, ele nos dá ferramentas para entender como todo o processo de
acumulação do capital se deformou, gerando a convergência das catástrofes da
desigualdade e da destruição ambiental. Ao detalhar como as coisas efetivamente
funcionam no topo da pirâmide do poder econômico – e, portanto, do poder
político, Phillips põe em nossas mãos uma excepcional ferramenta de trabalho.
Quem lê os meus trabalhos sabe que eu não sou muito
pródigo em flores, mas neste caso, os dois dias que gastei em ler este pequeno
livro me deixaram entusiasmado. E como as traduções demoram a aparecer,
recomendo a todo o nosso pequeno mundo que se interessa por entender a zona
econômica que vivemos, que comprem o livro em inglês mesmo. Nada de complexo
nesta escrita.
Para já, pensando nas pessoas que têm dúvidas sobre a
nossa dependência do poder econômico global, tema central deste livro, vou só
apresentar este gráfico, que não está no livro, mas que ilustra este tema no
Brasil:
O nome BlackRock é pouco familiar para as pessoas no
Brasil. Lembremos que em 2024 essa empresa gestora de ativos (fortunas)
administra um pouco mais de 10 trilhões de dólares. O presidente americano Joe
Biden administras 6 trilhões, orçamento federal dos Estados Unidos. Vejam no
gráfico acima para onde essa corporação estende os seus drenos no Brasil, isso
que ela se encontra em inúmeros países. Empresas chave da economia brasileira têm
os seus interesses ligados à BlackRock, cujo objetivo não é produzir nada, é
apenas drenar dividendos, e o máximo possível, como vimos no caso da Petrobrás,
elevando os preços para aumentar os dividendos, um dreno amplo sobre toda a
população, a chamada profit
inflation, inflação gerada por elevação de lucros. O preço que
você pagou a mais no botijão de gás ou no posto de gasolina foi para pagar
dividendos.
Bastam participações acionárias limitadas para colocar
as empresas ao seu serviço, ou seja, maximizar dividendos para acionistas, os
que hoje chamamos de “proprietários ausentes”, absentee owners. Isso é a realidade da indústria
dita nacional. Não tenham dúvida de que quando os diretores da Samarco ou da
Vale tiveram de optar entre consertar as barragens ou aumentar os dividendos,
optaram pelos dividendos, e os bônus correspondentes para eles mesmos.
Privatizar, ou seja, abrir as portas para acionistas internacionais, é também
desnacionalizar. Isso para situar o mecanismo que permite aos gigantes financeiro
no topo drenar recursos da base da sociedade em escala mundial.
Phillips selecionou as 10 maiores empresas de gestão de
ativos. No conjunto, administram quase 50 trilhões de dólares, equivalentes em
2022 a mais ou menos a metade do PIB mundial de 100 trilhões. Essa é a
dimensão. Em seguida, ele elenca, para cada empresa, os diretores, um total de
117 para o conjunto das 10 empresas. Essa gente não constitui a lista de
bilionários, e sim gente que ganha muitos milhões, mas essencialmente tomando
as decisões. O detalhe da diretoria de cada uma destas gigantescas corporações
mostra que a maior parte dirige não uma empresa, mas várias outras, tanto entre
os 10 como para fora. Vejam também que em 5 anos, entre 2017 e 2022, aumentaram
esse controle em 89,5%, quase dobrando. O controle no topo está se reforçando
rapidamente.
Gera-se assim um universo de interesses entrecruzados
das corporações, um gigantesco oligopólio planetário, que não tem nada a ver
com o que chamamos de economia de mercado, a tradicional visão que nos ensinam,
de empresas que concorrem lealmente para prestar melhores serviços à população.
Estão solidamente articuladas para se servir. Uma ficha para cada diretor
permite ver que se trata de boas famílias, que estudaram essencialmente nas mesmas
escolas de elite e universidades correspondentes, formando uma classe de
colegas. Dois terços são americanos. Participam todos das três principais
organizações intracorporativas, o Council for Foreign Affairs, Business Round
Table e Business Council. Todos são convidados regulares do Fórum Econômico
Mundial, do qual Larry Fink, da BlackRock, é inclusive um dos administradores (trustee).
O fato de cada um dos diretores ter interesses cruzados
com outros no grupo dos 10 vai ser reforçado pelo fato de participarem dos
conselhos de administração de numerosas outras instituições, como a CIA, ou o
Departamento de Estado, com forte presença nas decisões militares, mas também
como conselheiros políticos em várias áreas, de numerosos departamentos
públicos, permitindo manter ofensiva permanente contra por exemplo a regulação
do mercado de medicamentos, a política tributária, e em particular a regulação
das fontes de gases de efeito estufa na área da energia.
Phillips traz de maneira detalhada, empresa por
empresa, quanto cada uma investe no petróleo e no gás (apesar de proclamarem a
sua adesão aos ESG e às energias limpas), no carvão, no tabaco, no álcool, na
indústria do plástico, na produção de armas de fogo, na indústria das apostas,
na privatização dos sistemas carcerários, inclusive de armamento pesado
militar. E em cada setor buscam a maximização de vendas e de retorno a curto
prazo.
Igualmente importante é o fato da apresentação dos
dados, empresa por empresa, diretor por diretor, setor por setor de atividade,
ser extremamente bem organizada, permitindo uma visão de conjunto sobre como o
sistema funciona, o grau de poder que alcançou, o ritmo de avanço que continua,
e tipo de impacto que gera, por exemplo ao apoiar combustíveis fósseis ou o
tabaco. Dois capítulos complementares, sobre a China e sobre a Rússia, fecham
este pequeno volume, que nos traz uma claridade impressionante sobre como
funciona o topo da pirâmide, o poder realmente existente.
Simplesmente organizando a informação mais
significativa sobre as maiores corporações do mundo, o autor deixa clara quem
está no topo da pirâmide mundial de poder corporativo, e como usa este poder.
Essas corporações por sua vez controlam indiretamente, por participação
acionária, os gigantes da comunicação (GAFAM – Google, Apple, Facebook, Amazon,
Microsoft) e evidentemente os banco menores, seguradoras, grandes empresas de
seguro de saúde, o Big Pharma e assim por diante. Os algoritmos movem o
dinheiro segundo os interesses da maximização no curto prazo.
A fratura entre a maximização dos interesses
corporativos, este universo que curiosamente chamamos de “os mercados”, e os
interesses da sociedade, em termos de progresso econômico, social e ambiental
fica claramente exposta. É o poder de cima para baixo que fica claro, poder que
permite que o dinheiro flua de baixo para cima. Simplesmente pela desproporção
entre o dinheiro que colocam nas inúmeras empresas, o dinheiro que extraem,
explica-se que neste universo de tanto progresso tecnológico tenhamos tantos
desastres sociais e ambientais.
Deixem-me lembrar que a pesquisa de Eduardo Magalhães
Rodrigues, no pós-doutorado que fez comigo na PUC-SP, na Pós-Graduação em
Economia Política, apresenta um primeiro desenho semelhante em como as
corporações, através de tomadas cruzadas de participação acionária e de
diretorias cruzadas, constituem igualmente um universo extremamente
centralizado, com papel particularmente central da Eletrobrás. Não à toa
batalharam a sua privatização. Mas fica também claro o funcionamento do
universo oligopolizado das finanças e, surpreendentemente, dos planos de saúde,
hoje em dia uma grande indústria da doença.
Fonte:
Por Paulo Capel Narvai, no A Terra é Redonda/Outras Palavras
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