terça-feira, 14 de janeiro de 2025

Emerson Barros de Aguiar: Primavera fascista - o novo desabrochar da podridão

Na Alemanha, a ascensão da Alternativa para a Alemanha, AfD, partido de extrema-direita, está influenciando decisivamente o cenário político em meio a uma grave crise de governo. O colapso da gestão de Olaf Scholz, após a demissão do ministro das Finanças e da saída do FDP de sua coalizão, resultou na dissolução do Parlamento e na convocação de novas eleições antecipadas para fevereiro de 2025.

O problema é que a AfD tem se destacado nas pesquisas como a segunda força política do país, à frente até mesmo do Partido Social-Democrata, de Scholz. Apesar do mal estar dos partidos tradicionais em formarem coalizões com a AfD, a sua crescente influência dificulta a composição de maiorias estáveis no parlamento, o que compromete o futuro político do país.

O avanço da extrema-direita alemã reflete o uso eficaz de discursos nacionalistas e anti-imigração, confirmando a tendência global de fortalecimento de partidos de extrema direita, como observado em outros países como Estados Unidos, Áustria, França, Argentina e Brasil.

Na Alemanha, esse fortalecimento pressiona os partidos tradicionais a lidar com um parlamento fragmentado e com desafios à governabilidade. A AfD já havia perigosamente obtido o seu maior resultado histórico nas eleições europeias em junho de 2024, a partir de discursos anti-imigração e da exploração de sentimentos nacionalistas e agora aspira ao poder máximo, fortalecida, principalmente, pela demagogia xenofóbica.

Na Áustria, em outubro de 2024, o Partido da Liberdade alcançou um patamar histórico ao sair vitorioso nas eleições legislativas, explorando o discurso antissistema e a frustração da população com a classe política dominante. O Reagrupamento Nacional, partido francês liderado por Marine Le Pen, superou o partido do presidente Emmanuel Macron nas eleições para o Parlamento Europeu em junho de 2024.

Na Argentina, a eleição de Milei, candidato de retórica neoliberal, marcou uma guinada política que precipitou o país numa profunda crise social. Desde sua posse como presidente em dezembro de 2023, as condições de vida se deterioraram, com aumentos alarmantes nos índices de pobreza e de insegurança alimentar. No primeiro semestre de 2024, a taxa de pobreza atingiu 52,9%, o nível mais alto desde 2004, representando um aumento de 11 pontos percentuais em relação ao semestre anterior, com a indigência superando os 18%. Hoje, 32,2% das crianças e adolescentes do país enfrentam algum grau de insegurança alimentar, com 13,9% em situação severa. As medidas de austeridade econômica implementadas pelo governo Milei, turbinaram o aumento da pobreza e da fome. 66% dos menores de 14 anos vivem hoje na pobreza. Além disso, os cortes no financiamento na educação pública resultaram na rápida deterioração da qualidade do ensino.

A estratégia da extrema-direita de se apresentar como "antissistema" é uma tática que repete as estratégias demagógicas utilizadas por partidos fascistas, numa abordagem que consiste principalmente em explorar o descontentamento popular com a política tradicional e se posicionar como a única alternativa legitima e viável para uma suposta mudança radical, simplificando problemas urgentes e complexos com soluções autoritárias, vulgares, rasas e populistas.

A demagogia fascista se baseia em promessas de retorno a uma “grandeza” perdida e na adesão a uma ordem idealizada, ainda que sem qualquer base histórica realista. Seus líderes utilizam uma retórica barata e emocional para instigar o medo e a raiva contra a legalidade, contra os imigrantes, contra grupos minoritários e contra instituições democráticas. Hitler usou o descontentamento com o Tratado de Versalhes e a crise econômica da República de Weimar para se apresentar como o salvador que restauraria a glória perdida da Alemanha. De modo análogo, partidos como a AfD capitalizam o medo da globalização e da imigração, prometendo recuperar a soberania nacional e reforçar a segurança econômica. A crise dos refugiados foi amplamente explorada pelo Reagrupamento Nacional, na França, que apresenta as políticas anti-imigração como solução contra a “ameaça” à identidade nacional.

Movimentos de extrema-direita prosperam em tempos de crise econômica, social ou política, pois capitalizam e exploram crises, gerando incertezas que favorecem o seu discurso fácil e autoritário. 

Embora o discurso fascista antissistema se apresente como renovador, os partidos de extrema-direita, uma vez instalados no poder, como primeira providência, atacam instituições democráticas, promovendo medidas que enfraquecem a liberdade de imprensa e a independência do judiciário, que precarizam os direitos sociais e que promovem as desigualdades. Países que elegeram governos populistas de direita registraram quedas acentuadas nos índices de liberdade e democracia, como ocorreu na Polônia e na Hungria, onde medidas para limitar a imprensa e consolidar o poder executivo foram adotadas. A comparação com o fascismo histórico não é apenas retórica, mas baseada em padrões facilmente identificáveis, como o culto personalista dos líderes, que são sempre apresentados como figuras redentoras, carismáticas e indispensáveis. Outras características são a propagação da ideia de “pureza”, seja ela racial, cultural ou religiosa, e a atribuição de culpa a inimigos fabricados especialmente para serem responsabilizados pelos principais problemas nacionais. Em geral, os partidos de extrema-direita contemporâneos apontam os imigrantes, as ONGs, os movimentos sociais e as instituições internacionais como os principais causadores dos problemas sociais e econômicos.

A estratégia tem raízes na manipulação emocional e no apelo ao descontentamento popular, numa abordagem que reinventa velhas táticas autoritárias, adaptando-as ao contexto político atual. Segundo Hannah Arendt, regimes autoritários se consolidam ao explorar as frustrações e o desespero das massas desiludidas com sistemas políticos incapazes de resolver imediatamente crises econômicas e sociais. Sem dúvida, a extrema-direita atual é quem melhor utiliza essa vulnerabilidade para mobilizar as massas, apresentando-se como alternativa à "ineficiência" das democracias liberais.

A política do medo é central para os movimentos autoritários. O receio de mudanças demográficas, da imigração e da globalização é manipulado para justificar a implementação de medidas autoritárias. Tanto quanto no passado, a extrema-direita se posiciona como "defensora" da soberania nacional contra ameaças externas, reais ou imaginárias, num discurso que cria inimigos para galvanizar apoio e justificar políticas que restringem direitos. Movimentos e partidos de viés fascista constroem sua popularidade por meio da criação de antagonismos e polarizações, apresentando-se como a voz legítima do "verdadeiro povo" em oposição às "elites corruptas", aos "inimigos externos" e aos “sabotadores” domésticos dos valores tradicionais, numa dicotomia simplista e perigosa, mas eficaz. 

A extrema-direita explora a crise de representação das democracias liberais para construir uma identidade coletiva excludente, baseada no nacionalismo e na nostalgia doentia, rejeitando a complexidade em favor de soluções simplistas e irracionais, e prometendo resolver problemas estruturais com ações autoritárias, mesmo sem apresentar planos concretos ou viáveis. Líderes fascistas prometem fortalecer a democracia ao mesmo tempo em que solapam as suas fundações, ao restringir liberdades civis e enfraquecer as instituições, erodindo lentamente as garantias democráticas, em sua estratégia deliberada para capturar o descontentamento e transformar o medo em apoio político massivo.

O cenário internacional mostra uma clara tendência global de fortalecimento de movimentos e partidos de extrema direita. A eleição de Donald Trump marca o fortalecimento da extrema-direita internacional. O “agente laranja” retornou prometendo "drenar o pântano" de Washington, priorizar os “interesses americanos”, cortar programas sociais e a adotar políticas de imigração ainda mais restritivas, numa retórica antissistema e de austeridade econômica semelhante à de Milei, que usa a "motosserra" como símbolo de cortes profundos, que só ampliam e aprofundam as desigualdades sociais.

A ascensão de partidos de extrema-direita na Europa reflete um padrão semelhante, com campanhas eleitorais centradas em temas nacionalistas e anti-imigração.

O fenômeno global de populismo autoritário utiliza o descontentamento para implementar políticas que, ao invés de resolverem problemas estruturais, agravam as desigualdades e ampliam as crises sociais, pois o fascismo é especialista em criar problemas para depois se apresentar como solução a eles, criando ou amplificando crises para, em seguida, colocar-se como a cura.

Na Europa, a extrema-direita explora o tema da imigração sendo, paradoxalmente, responsável pelas políticas que introduziram contingentes de imigrantes de forma desregulada, para, depois, criticá-los e lhes recusar direitos. Nos anos 1990 e 2000, governos conservadores e de direita na Europa implementaram políticas que facilitaram a entrada massiva de imigrantes em condições precárias, a fim de suprir demandas por mão de obra barata em setores como construção, agricultura e serviços. Na Alemanha, nas décadas de 1980 e 1990, imigrantes foram introduzidos em grande número, especialmente os de países como Turquia e do Leste Europeu. Contudo, no que pese a importância para a economia, a sua integração foi negligenciada. Até hoje, os trabalhadores convidados durante o programa Gastarbeiter não tem acesso à cidadania plena e a direitos sociais, mesmo após décadas de residência. Na Itália, durante os governos de inspiração fascista de Silvio Berlusconi, a introdução de imigrantes igualmente foi usada para atender demandas do mercado de trabalho informal.

De modo contraditório e hipócrita, após facilitarem a entrada de trabalhadores estrangeiros, governos e partidos de direita depois mudaram a sua retórica, passando a criticar sua presença, explorando medos culturais e econômicos das populações nacionais para fins eleitorais.

Marine Le Pen acusa os imigrantes, buscando associá-los ao aumento da criminalidade e ao desemprego, ocultando o fato de que eles ingressaram na França durante governos conservadores que facilitaram a sua entrada para revitalizar setores econômicos. Na Inglaterra, o Partido Conservador também explora a questão da imigração como um problema, apesar de ter sido o principal responsável pela implementação de políticas que atraíram grandes contingentes de trabalhadores do leste europeu. Na agricultura espanhola e italiana, o trabalho de imigrantes é essencial, mas os direitos desses trabalhadores continuam sendo ostensivamente negados.

A crise migratória foi construída e instrumentalizada por líderes populistas de extrema-direita justamente para reforçar as suas agendas xenofóbicas, enquanto escondem que a imigração foi uma resposta às demandas econômicas de seus próprios sistemas. A retórica xenofóbica varreu para debaixo do tapete a introdução de contingentes de imigrantes para atender interesses econômicos imediatos e de curto prazo e, agora, utiliza a sua presença como bode expiatório para problemas sociais e econômicos, refletindo o padrão fascista de manipulação política.

Desafortunadamente, a extrema-direita se encontra em franca ascensão, tendo as suas promessas demagógicas e insustentáveis acolhidas, do mesmo modo que a infecção que vai se instalando, e, até não se tornar crítica, engana e não parece a doença grave que causará danos desastrosos. Ao que parece, a memória, embora recente, dos enormes desastres humanitários produzidos por ideologias nazifascistas se arrefeceu e necessita ser restaurada através de uma nova tragédia. O fenômeno alarmante, apesar de evidentes precedentes históricos devastadores, demonstra o apelo do fascismo, quando se manifesta sob novas roupagens, mesmo preservando o seu núcleo autoritário e manipulador.

Discreto em sua introdução, mas letal em seu impacto, o vírus do fascismo vai corroendo as estruturas sociais e democráticas até finalmente se revelar. Infelizmente, as pessoas, em tempos de crise, buscam respostas rápidas e fáceis para problemas complexos. A memória coletiva, que deveria servir como antídoto, está esmaecida. O genocídio e as guerras desencadeadas por ideologias extremistas, letais e perigosas se tornaram, para muitos, histórias distantes, e não lições vivas e necessárias.

O esquecimento histórico e a passividade diante das erosões democráticas abrem as portas para regimes injustos, brutais e sanguinários. Quando sinais claros são ignorados, mesmo por sociedades supostamente esclarecidas, como é o caso da Europa, os sistemas democráticos se tornam vulneráveis, e a ascensão de líderes carismáticos, mas destrutivos, torna-se inevitável. O preço desse esquecimento é terrível, pois a sedução fascista atua como uma cortina de fumaça, mascarando suas intenções destrutivas, que só se tornarão visíveis para a grande maioria quando já for tarde demais...

 

¨         Acca Larenzia: Quando o fascismo criou seus mártires. Por Railson Barboza

Acca Larentia, em uma das tradições da mitologia romana, foi esposa de Fáustulo, pastor e empregado de Amúlio, que era irmão e rival do rei Numitor. Este confia seus netos, Rômulo e Remo, a Fáustulo, que, por sua vez, os entrega a Acca Larentia. A partir desse momento, ela assume a guarda dos dois e torna-se sua mãe adotiva. Segundo outra tradição, os dois meninos foram lançados ao rio Tibre por ordem de Amúlio, mas foram salvos por Acca Larentia, que os protegeu e os adotou. O culto a essa deusa romana simboliza o poder da fertilidade da terra, tanto na cidade quanto em suas culturas particulares.

A Via Acca Larentia, em Roma, abrigava a antiga sede do Movimento Sociale Italiano, partido de inspiração neofascista na capital italiana. Em 7 de janeiro de 1978, dois jovens ativistas neofascistas, Franco Bigonzetti e Francesco Ciavatta, foram mortos em uma emboscada ao deixarem a sede do partido. O tumulto causado pelos assassinatos foi imediato, resultando na morte de outro ativista neofascista, Stefano Recchioni, durante um confronto com a polícia no protesto ocorrido no próprio local da emboscada.

<><> O que realmente aconteceu?

Quando o relógio da capital italiana marcava 18h20, no dia 7 de janeiro de 1978, cinco jovens militantes neofascistas saíram da sede do MSI, localizada na Via Acca Larentia. Segundo relatos, o objetivo deles era divulgar, com panfletos, uma apresentação de música alternativa de direita chamada Amici del Vento. Uma saraivada de balas, disparadas por diversas armas, os atingiu. Um grupo de cinco a seis pessoas abriu fogo contra eles.

Um dos jovens militantes, Franco Bigonzetti, de 20 anos, estudante do primeiro ano da faculdade de Medicina e Cirurgia, morreu instantaneamente. Francesco Ciavatta, de 18 anos, mesmo ferido, tentou escapar, mas foi perseguido pelos agressores e atingido novamente com um tiro nas costas, falecendo durante o traslado para o hospital, dentro da ambulância. Vincenzo Segneri, ferido no braço direito, conseguiu retornar à sede do partido junto com outros dois que saíram ilesos, trancando a porta e escapando da emboscada.

<><> Consequências

Os assassinatos acirraram ainda mais a polarização da situação política italiana. Os chamados Anni di Piombo (Anos de Chumbo) foram marcados pela violência e convulsão social na Itália, durando da década de 1960 até o final da década de 1980. Inúmeros incidentes de terrorismo político e confrontos violentos caracterizaram o cenário da época, intensificando a polarização entre os extremos. Dentro do movimento neofascista, ocorreu uma fratura: alguns militantes culparam a liderança do MSI por sua falha em denunciar a morte de Recchioni e, por conta disso, uniram-se a grupos extremistas emergentes, como os Núcleos Revolucionários Armados, de extrema-direita.

Em 1987, cinco membros do grupo de esquerda Lotta Continua foram acusados dos assassinatos, todavia foram absolvidos de todas as acusações.

<><> O início da devoção fascista

Em 1979, um ano após os assassinatos na Via Acca Larentia, o compositor Fabrizio Marzi dedicou a canção Giovinezza a Recchioni. A coincidência dessa dedicatória está no título da música: para quem não sabe, Giovinezza foi o hino oficial do Partido Nacional Fascista italiano, do regime e do exército, além de ser o hino não oficial do Reino da Itália entre 1924 e 1943. Sempre presente na Itália em meados do século XX, a canção enfatizava a juventude como tema central do movimento fascista.

A dedicatória de uma música que exaltava os jovens e tinha o mesmo título do hino fascista “caiu como uma luva” para os adeptos do movimento neofascista, saudosos dos anos vividos sob a ditadura de Mussolini.

Os eventos que rememoram as vítimas sempre foram marcados por intensos tumultos e manifestações de violência. Um exemplo foi o acontecido em 10 de janeiro de 1979, que o jovem Alberto Giaquinto, de 17 anos, foi ferido e morto pelo policial Alessio Speranza, condenado após quatro julgamentos.

Em 2013, o ex-membro do MSI, Gianni Alemanno, então prefeito de Roma, nomeou uma rua da “cidade eterna” em homenagem às três vítimas de 1978. Essa atitude reforçou os diversos movimentos que já aconteciam desde muito tempo, pois a via Acca Larenzia se tornou “centro de peregrinação” de neofascistas que em janeiro se reúnem para fazer memória aos “mártires fascistas”.

<><> Tolerando o intolerável nos dias de hoje

Como mencionado anteriormente, o mês de janeiro tornou-se uma referência para o culto aos “mártires” do Movimento Social Italiano de 1978. No ano passado, um fato curioso chamou a atenção do mundo, especialmente daqueles que analisam um possível risorgimento de simpatizantes do fascismo na Itália: grupos extremistas de direita realizaram a saudação romana durante um ato em memória do caso de Acca Larentia. Enquanto diversos políticos, sobretudo da ala esquerda italiana, condenaram o episódio, a primeira-ministra Giorgia Meloni manteve-se em silêncio.

Cerca de mil apoiadores fizeram a saudação fascista durante um ato em memória dos três militantes mortos em 1978, em frente à sede do Movimento Social Italiano. Uma longa fila de homens realizou a saudação com os braços erguidos e rígidos, clamando com força, por três vezes, “Presente!”, enquanto um deles bradava em alta voz uma frase tipicamente repetida em eventos neofascistas: “Por todos os companheiros mortos!”.

Vale lembrar que o antigo partido fascista deu origem ao MSI, do qual o partido da primeira-ministra, o Fratelli d’Italia, é descendente. Na Itália, até então, manifestações de cunho fascista eram consideradas crime. A lei italiana proíbe não apenas demonstrações de apoio ao fascismo, mas também a reorganização do partido.

Todavia, o Supremo Tribunal da Itália, poucos dias depois, permitiu a saudação fascista em comícios, desde que não representem ameaça à ordem pública. Contraditoriamente, afirmou ser legal realizar tais saudações, exceto quando houver risco de reviver o partido fascista, que permanece ilegal no país. O imbróglio já estava formado, gerando críticas por parte da comunidade judaica, que planejou uma mobilização contra a decisão da Justiça.

O Supremo entende que a saudação não constitui crime, a menos que esteja vinculada a um projeto concreto de reconstrução do partido fascista ou que tenha como objetivo a discriminação racial e a violência. Uma decisão que muitos consideram profundamente equivocada.

<><> A lição que podemos tirar desse episódio

O episódio ocorrido em 1978 revela mais sobre seus desdobramentos do que sobre o fato em si. Os devotos do fascismo encontraram terreno para perpetuar sua esquizofrenia totalitária, por meio da constante lembrança do caso e da canonização de seus mártires. Duas questões chamam a atenção: o crescimento do número de jovens e adultos neofascistas em território italiano, que não hesitam em exibir símbolos e manifestar apoio ao extinto regime, e, não menos importante, talvez até mais intrigante, a permissão concedida pelo Supremo Tribunal Italiano com justificativas frágeis.

Obviamente, há impossibilidades: demonstrar apoio, proferir frases e gesticular símbolos do fascismo não seria uma forma de desejar que ele ressurja do abismo? Ou, mais ainda: seria possível um indivíduo apoiar o regime fascista sem aderir às suas pretensões abjetas? E outra pergunta, mais simples, mas igualmente desafiadora: é possível conviver democraticamente com apoiadores neofascistas nos dias atuais?

O caso de Acca Larentia demonstra a frágil defesa da preservação da sociedade contra os avanços de ideologias perniciosas.

 

Fonte: Brasil 247/Le Monde

 

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