Teste
de DNA é aliado para detectar HPV e pode substituir papanicolau
Um estudo feito por
pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), no interior de
São Paulo, utiliza um teste de DNA para detectar o Papilomavírus Humano (HPV)
no lugar do tradicional papanicolau, exame ginecológico que faz o rastreamento
de doenças no colo do útero.
O teste de DNA é feito
de maneira muito parecida com o papanicolau: uma amostra de secreção é coletada
durante exame ginecológico. Mas, segundo o estudo — publicado em setembro na
revista científica Scientific
Reports —, essa técnica pode mudar o cenário da
prevenção do câncer de colo de útero no Brasil.
“A cobertura da
população-alvo do programa passou de 30% para mais de 90%”, destaca o
ginecologista Júlio Cesar Teixeira, professor e pesquisador da Unicamp que
coordenou o estudo. “Tivemos um aumento de quatro vezes na detecção de lesões
pré-câncer, e os casos da doença identificados em fase microscópica, que são
curáveis com procedimentos simples e acessíveis, passaram de 10% para 66%.”
Participaram do estudo
20.551 mulheres, com idades entre 25 e 64 anos. Os pesquisadores compararam
dados da primeira rodada de cinco anos (outubro de 2017 a setembro de 2022) de
rastreio do HPV usando o teste de
DNA com informações obtidas nos cinco anos prévios (2012 – 2016), nos quais foi
usado o papanicolau. Todos os exames haviam sido realizados no sistema público
de saúde, na cidade de Indaiatuba (SP).
A localidade foi
escolhida por ter um sistema de saúde informatizado, no qual todas as unidades
de atendimento estão ligadas em rede, o que permitiu monitorar os dados com
mais eficácia e possibilitou o aumento da cobertura, considerada essencial para
o sucesso do programa.
Os resultados do projeto
vêm sendo acompanhados pelo Ministério da Saúde e estão sendo utilizados como
base para uma mudança nas políticas públicas voltadas à prevenção do câncer de
colo de útero no Brasil. Em março de 2024, a Comissão Nacional de Incorporação
de Tecnologias (Conitec) aprovou o uso da genotipagem de HPV no Sistema Único
de Saúde (SUS), e a expectativa é de que em 2025 o teste seja disponibilizado
no sistema público.
Teixeira calcula que, se
o projeto for implementado em escala nacional, poderá evitar mortes pela doença
no país. Segundo relatório anual de 2023 do Instituto Nacional do Câncer
(Inca), entre as mortes de mulheres causadas por câncer no Brasil em 2021,
os óbitos por câncer do colo do útero ocuparam o quarto lugar, representando
6,05% do total, excluindo aqueles por câncer de pele não melanoma.
·
Como é feito o teste?
Enquanto o papanicolau
depende de interpretação humana em diferentes etapas, o teste de DNA é
automatizado, eliminando o risco de falsos negativos ou positivos. A
genotipagem também consegue identificar o tipo de HPV presente no organismo —
existem mais de 200, dos quais pelo menos 12 são considerados oncogênicos, de
acordo com o Inca.
O método tradicional,
por sua vez, identifica apenas as células que já estão doentes. “Em cerca de
10% dos casos, os resultados indicam a necessidade da realização da citologia
(papanicolau) para ajudar na condução do caso e, nessa situação, se utiliza o
mesmo material, sem a necessidade de nova coleta”, explica Teixeira. Essa visão
mais global é importante, pois muitas mulheres jovens apresentam o resultado
positivo sem ter lesões.
No estudo, 87% dos
testes realizados apresentaram resultados negativos. Como aponta que não há
infecção, o exame só precisaria ser refeito após cinco anos. Já o papanicolau é
necessário ser refeito após três anos, nos casos em que a mulher apresentou dois
resultados negativos consecutivos. Além disso, com a técnica recente, a idade
média das mulheres com lesões detectadas baixou em 10 anos, antecipando
consideravelmente o diagnóstico.
·
Economia de recursos
Apesar de o exame ainda
ser pouco conhecido e utilizado, não é novidade que a genotipagem do HPV é uma
solução para melhorar o rastreio, a prevenção e o tratamento do câncer
cervical. Desde 2013, a Organização Mundial da Saúde (OMS) tem defendido a
necessidade de mudanças, que incluem a preferência pelo teste de HPV-DNA em
relação a métodos como a inspeção visual com ácido acético (VIA) e o
papanicolau.
Muitos países já usam o
exame como rotina. “Nos Estados Unidos, há um tempo os protocolos são baseados
nesse tipo de testagem”, relata a ginecologista e obstetra Renata Lamego, do
Hospital Israelita Albert Einstein. Por aqui, no sistema suplementar de saúde,
o teste DNA-HPV já é realizado e ajuda a nortear a conduta do especialista.
“Nas políticas públicas
brasileiras, fica mais difícil instituir esse tipo de procedimento, pois se
trata de um exame mais caro e o papanicolau é muito barato”, pontua Lamego.
“Além disso, a citologia já está incorporada culturalmente nas mulheres
brasileiras, que sabem que devem se submeter a ela anualmente, exceto se apresenta
dois resultados normais para o teste, o que permite que o realize novamente
após três anos.”
A questão financeira
também foi avaliada no trabalho da Unicamp. Apesar de o teste ser mais caro, em
longo prazo ele pode ser mais econômico ao sistema de saúde, se implementado
com um plano de monitoramento eficaz. Além de poder ser realizado a cada cinco
anos, o exame antecipa a detecção de cânceres em fase microscópica.
Quando a doença está
mais avançada, ela deixa de ser operável e, na maioria das vezes, necessita de
radioterapia e quimioterapia, métodos caros e que não estão disponíveis em
todos os lugares do país. “Além de economizar recursos, se associamos um
programa de prevenção organizado com a vacinação contra HPV abaixo de 15 anos,
o câncer de colo de útero será eliminado no futuro”, afirma Júlio Cesar
Teixeira.
¨ HPV em
homens pode aumentar morte de espermatozoides, diz estudo
Os cientistas há muito
questionam se as infecções por papilomavírus humano (HPV) em homens
poderiam afetar a saúde dos espermatozoides e a fertilidade. Agora, um estudo
preliminar, publicado na sexta-feira (23), encontrou uma possível relação entre
infecções por HPV de alto risco e níveis ligeiramente elevados de morte de
espermatozoides.
Infecções com cepas
de HPV de alto risco
parecem estar associadas a “níveis significativamente mais altos” de
espermatozoides mortos do que infecções com cepas de baixo risco, segundo o
estudo. O trabalho foi publicado no jornal científico Frontiers in Cellular and Infection Microbiology.
As taxas mais altas de
morte de espermatozoides podem ser parcialmente atribuídas ao aumento do
estresse oxidativo nos espermatozoides, o que pode resultar em danos ao DNA ou
função prejudicada.
“Estudos anteriores
mostraram que infecções por HPV podem impactar a função dos espermatozoides. No
entanto, muito poucos investigaram os efeitos diferenciais entre genótipos de
HPV de baixo risco e alto risco”, diz Virginia Rivero, professora na
Universidad Nacional de Córdoba na Argentina e autora sênior do novo estudo, em
um e-mail.
O HPV inclui um grupo de
mais de 150 vírus que são transmitidos principalmente por contato sexual, e estima-se que cerca de 80% das pessoas terão uma infecção por
HPV em sua vida nos Estados Unidos.
Na maioria dos casos, o
HPV desaparece por conta própria em até dois anos, mas quando as infecções não
desaparecem, podem ocorrer problemas de saúde. Cepas de baixo risco geralmente
causam verrugas, e cepas de alto risco estão associadas a um risco aumentado de
certos tipos de câncer, como câncer do colo do útero,
anal, peniano e orofaríngeo.
Rivero e seus colegas
examinaram dados de 205 homens adultos que forneceram amostras de sêmen em uma
clínica de urologia na Argentina entre 2018 e 2021. Nenhum dos homens havia
sido vacinado contra o HPV.
Os pesquisadores
descobriram que o HPV foi detectado em 39 (19%) das amostras, com infecções de
alto risco sendo mais prevalentes. A cepa de alto risco HPV 16 foi a mais
frequente identificada, encontrada em 16 amostras.
Os pesquisadores
organizaram as amostras em três grupos: sem HPV ou 11 outras infecções
urológicas detectadas, HPV de alto risco detectado e HPV de baixo risco
detectado. Em seguida, examinaram de perto a qualidade dos espermatozoides em
cada grupo, realizando uma análise de sêmen pelo menos duas vezes para cada
amostra.
A análise mostrou que
não houve associação entre infecção por HPV e uma redução nos marcadores padrão
usados para avaliar a qualidade do sêmen, como concentração de espermatozoides
ou motilidade dos espermatozoides, que é a forma como os espermatozoides se
movem até seu destino. Mas as amostras de homens com infecções por HPV de alto
risco apresentaram 2,5 vezes mais morte de espermatozoides do que aquelas com
infecções de baixo risco, segundo Rivero.
Os pesquisadores também
encontraram que as amostras com infecções por HPV de alto risco mostraram
níveis mais altos de marcadores de estresse celular em comparação com as
amostras com infecções por HPV de baixo risco e as amostras em que nenhum HPV
foi detectado. As amostras com infecções por HPV de alto risco também pareceram
ter menos leucócitos, que são componentes importantes do sistema
imunológico.
“Tipos de HPV de alto
risco têm um efeito mais prejudicial sobre os espermatozoides e também criam um
ambiente imunossupressor local, o que pode facilitar ainda mais a presença de
co-infecções”, diz Rivero, acrescentando que essas descobertas sugerem que pode
haver benefício em testar homens para HPV.
A maioria das mulheres
geralmente é testada para HPV durante exames de papanicolau de rotina para
rastreamento do câncer do colo do útero, mas nos Estados Unidos, os testes de
HPV não são recomendados para rastrear homens, e não há rastreamento para
homens aprovado pela Food and Drug Administration (FDA), agência reguladora dos
Estados Unidos.
“Na prática clínica, os
urologistas geralmente não solicitam testes de HPV em homens, e ainda menos
frequentemente solicitam testes de genótipo para determinar se é um tipo de
alto risco ou baixo risco”, explica Rivero. “No entanto, nossas descobertas
sugerem que seria muito benéfico determinar se a cepa de HPV é de alto risco.”
<><> Sem
motivos para pânico
O estudo contribui para
a base de pesquisas sobre HPV em homens, mas os achados não são motivo para
casais que desejam engravidar se preocuparem, segundo Bobby Najari, urologista
do NYU Langone Health em Nova York, que não participou do novo estudo.
Por exemplo, entre
casais heterossexuais, se a parceira feminina testar positivo para HPV de alto
risco, isso pode indicar que o parceiro masculino provavelmente também o tem –
mas Najari ressalta que os casais não devem entrar em pânico.
“Houve um aumento
significativo no número de espermatozoides moribundos em homens com HPV de alto
risco, mas, no geral, o número de espermatozoides necróticos, ou moribundos,
foi relativamente baixo entre todos os homens, incluindo aqueles com HPV de
alto risco”, diz o especialista.
“Além disso, eu simplesmente
não acho que esses espermatozoides sejam os que contribuem para a gravidez,
seja gravidez natural ou quando estamos fazendo tecnologia de reprodução
assistida. Espermatozoides que estão morrendo não são os espermatozoides que
estão nadando vigorosamente e fazendo o trajeto para fertilizar o óvulo. E no
laboratório, esses espermatozoides não são os espermatozoides saudáveis e
vigorosamente movendo-se que selecionamos para fertilizar um óvulo quando
estamos fazendo tecnologia de reprodução assistida”, completa.
“Se houver algo, eu acho
que é reconfortante que os indicadores mais importantes do potencial
reprodutivo masculino – contagem de espermatozoides e motilidade dos
espermatozoides – foram semelhantes entre homens com infecções por HPV de alto
risco e outros homens”, diz Najari.
“O principal cenário que
eu posso imaginar onde este estudo é relevante é um homem com produção de
espermatozoides já severamente comprometida. Este estudo me deixaria preocupado
de que uma infecção por HPV de alto risco exacerbaria uma situação já ruim.
Infelizmente, não há maneiras clinicamente disponíveis para diagnosticar
infecção por HPV em homens fora dos sinais visíveis de verrugas ou câncer
peniano”, acrescenta.
O estudo parece levantar
mais perguntas do que respostas, pois sugere que uma pesquisa mais ampla sobre
HPV em homens poderia ajudar a esclarecer se infecções por HPV de alto risco
podem afetar a fertilidade e os resultados da gravidez – e em que medida,
analisa Janet Choi, endocrinologista reprodutiva e obstetra-ginecologista que
atua como diretora médica da empresa de benefícios de fertilidade e saúde das
mulheres Progyny.
“Embora os pesquisadores
não tenham encontrado anormalidades gerais no sêmen ligadas ao HPV, eles
observaram que homens com HPV de alto risco tinham mais espermatozoides mortos.
Espermatozoides mortos potencialmente indicam aumento da fragmentação do DNA,
um fator associado à infertilidade e abortos espontâneos em outros estudos”,
diz Choi, que não participou do novo estudo, em um e-mail.
“Um estudo de
acompanhamento útil poderia comparar homens com infertilidade e sêmen anormal
com aqueles com sêmen normal, ao lado de parceiros com infertilidade não
relacionada aos homens”, afirma. “Estudar a prevalência de HPV nesses
diferentes grupos ajudaria a esclarecer a conexão, já que pesquisas anteriores
mostraram uma prevalência de HPV detectável em homens com infertilidade
masculina e sêmen anormal, sugerindo pelo menos uma associação, se não um
potencial vínculo, entre os dois.”
Alguns estudos sugeriram
que o HPV pode afetar os componentes celulares do sêmen e prejudicar a contagem
de espermatozoides, motilidade, integridade, morfologia e concentração, levando
a efeitos na fertilidade. Mas outros não mostraram diferença estatística na
concentração de espermatozoides entre amostras de sêmen negativas e positivas
para HPV, nem demonstraram um papel para a infecção por HPV na infertilidade masculina.
No geral, a
significância clínica do novo estudo – e o que isso significa para a
fertilidade – ainda não está clara, segundo Ashley Lipps, médica especialista
em doenças infecciosas do The Ohio State University Wexner Medical Center, que
não participou da nova pesquisa.
“Este estudo não avaliou
se essas diferenças realmente levam a uma redução significativa na fertilidade
masculina. A principal limitação deste estudo é o tamanho muito pequeno da
amostra – dos 205 homens avaliados no estudo, o HPV foi detectado em apenas 39
amostras”, escreve Lipps em um e-mail.
“Resumo – estudo
interessante, mas os dados são muito preliminares. Estudos adicionais maiores
são necessários para avaliar melhor o impacto da infecção por HPV na fertilidade
masculina”, afirma. “Se alguém estiver preocupado com problemas de fertilidade,
é melhor falar com seu profissional de saúde para avaliação. É importante notar
que o HPV é prevenível – há uma vacina disponível.”
<><> Como
reduzir o risco de HPV
Embora não haja
tratamento para o HPV, a vacina pode ajudar a prevenir infecções.
“A infecção por HPV de
alto risco é totalmente prevenível por meio da vacinação. Portanto, se os pais
querem fazer tudo o que for possível para otimizar suas chances de ter netos,
eles devem garantir que seus filhos sejam totalmente vacinados contra o HPV na
idade apropriada”, diz Najari.
O Centro de Controle e
Prevenção de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, recomenda duas doses da vacina
contra o HPV para meninos e meninas com 11 e 12 anos.
A primeira dose é recomendada por volta dessa idade, e a segunda é recomendada
seis a 12 meses após a primeira dose. Crianças que começam a série de vacinas a
partir do 15º aniversário precisam de três doses ao longo de seis meses. A
vacinação não é recomendada para pessoas com mais de 26 anos.
A taxa de vacinação
contra o HPV entre adolescentes nos EUA não aumentou desde a pandemia de Covid-19, de acordo com um relatório do CDC divulgado na quinta-feira, e
houve uma queda na quantidade de crianças em dia com a vacina contra o HPV aos
13 anos entre aquelas nascidas em 2010, em comparação com as nascidas em 2007.
De 2015 a 2023, cerca de
52,9% dos adolescentes nascidos em 2007 estavam em dia com a vacinação contra o
HPV aos 13 anos, em comparação com 45,8% dos nascidos em 2010, segundo o
relatório.
Isso sugere que, entre
os nascidos em 2010, a cobertura aos 13 anos foi semelhante aos níveis
pré-pandemia, mas a porcentagem daqueles que estavam em dia foi 7,1 pontos
percentual mais baixa do que entre a geração nascida em 2007.
“A vacinação contra o
HPV é essencial para prevenir cânceres atribuíveis ao HPV”, escreveram os
pesquisadores do CDC. “Embora o início da vacinação contra o HPV por ano de
nascimento tenha retornado aos níveis pré-pandemia, são necessários mais
esforços para aumentar a cobertura da vacinação contra o HPV.”
Outras formas de
proteção contra o HPV incluem o uso de preservativos durante a relação sexual
ou, para mulheres, realizar testes para o vírus durante exames de papanicolau
de rotina.
Fonte: CNN Brasil
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