quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

Caminho sem volta: BRICS impulsionou desdolarização do mercado mundial, opina analista

A exclusão do dólar já é uma realidade em acordos comerciais entre grandes potências, como a Rússia e o Irã e vem sendo discutida com cada vez mais frequência e intensidade entre os integrantes do BRICS, tirando o sono do governo dos EUA, principal afetado por esse movimento.

A hegemonia do dólar está com os anos contados? Para analisar o momento atual e arriscar conjeturas a respeito, o podcast Mundioka da Sputnik Brasil ouviu estudiosos no assunto.

Para a professora de Relações Internacionais do Ibmec- SP, Karina Calandrin, graças a grupos como o BRICS, a dependência do dólar tem diminuído consideravelmente nas exportações de países como o Brasil. O recente aumento do número de integrantes deve acelerar esse processo, opinou.

"Com o BRICS aumentando é muito difícil os Estados Unidos recuperarem essa essa pujança econômica e mesmo geopolítica que eles tiveram no passado", opinou ela. "Acho que é um caminho sem volta, um caminho longo, mas é um caminho que já está acontecendo".

A Indonésia acaba de entrar como membro pleno do BRICS, juntando-se ao Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, Irã, Emirados Árabes Unidos, Egito, Etiópia e Arábia Saudita.

Outros nove se enquadram na categoria de parceiros: Belarus, Bolívia, Indonésia, Cazaquistão, Tailândia, Cuba, Uganda, Malásia e Uzbequistão.

Sob a batuta de Donald Trump o governo norte-americano “vai tentar de qualquer forma” enfraquecer o BRICS e ameaçar essa tentativa de quebra da hegemonia do dólar, ponderou ela, que também colocou em dúvidas sua eficácia.

Atualmente, essas trocas comerciais alternativas no BRICS ocorrem com as próprias moedas dos países envolvidos nas transações, mas a pesquisadora vê em um futuro próximo a criação de uma moeda virtual para transações comerciais.

O professor de economia do Ibmec de Brasília, Renan Silva, ponderou que, embora viável, até que uma nova moeda ganhe credibilidade e peso em transações comerciais, é necessário uma série de estratégias e tempo, muito tempo de maturação.

Entre as complexidades que envolvem a implementação de uma moeda, mesmo que virtual, estão as diferenças políticas dos países do BRICS, apontou ele. Silva também citou o atual protecionismo norte-americano como resultado do impacto da entrada da China nos últimos 40 anos na economia globalizada.

"O maior exportador de petróleo hoje para a China são os Estados Unidos. Assim como a soja. Consequentemente, quando a China produz lá, quem é o principal mercado consumidor dos produtos com valor agregado da China? São os Estados Unidos. Por isso que a balança comercial com a China, Estados Unidos-China, é negativa para o lado dos Estados Unidos", disse ele ao lembrar que as principais empresas e fábricas dos Estados Unidos foram para a China nos últimos 30 anos.

As transações comerciais com moedas locais também preocupam o governo Trump, avaliou Silva, pois isso torna esses países "mais autossuficientes, com uma logística mais barata, que é um grande trunfo dos Estados Unidos com relação ao resto do mundo", comentou o economista.

<><> Sanções contra a Rússia catalisaram o processo

As sanções aplicadas à Rússia devido ao conflito na Ucrânia, que incluiu o banimento do sistema Swift de transações financeiras internacionais, acelerou o processo de desdolarização, na opinião dos entrevistados. Ao passar a utilizar outros sistemas, como o chinês, a Rússia tem ajudado a fortalecê-los como alternativas eficientes.

Caso Trump cumpra as recentes promessas de enfraquecer o BRICS por meio de sanções ou ultra taxações dos Estados Unidos, outros países tomarão o mesmo rumo da Rússia.

“O Brasil já tem feito esse caminho já nas últimas décadas pelo menos uma década e meia pelo menos [...] Acredito que seja um caminho que o Brasil vai continuar fazendo e no começo pode vir um um um revés se isso de fato se a política do Trump se consolidar”.

<><> Desdolarização e Brasil

Para Caladrin, a busca pela desdolarização livraria o Brasil do momento atual, em que o dólar interfere diretamente na economia brasileira, consequentemente, na política e na vida das pessoas.

"Se sobe o dólar sobe, sobe o preço de tudo dentro do Brasil e o brasileiro perde poder aquisitivo. O seu poder de compra diminui, porque o nosso salário, o real perde poder de compra em relação ao dólar. O Brasil é um país agrário exportador e todos os insumos para a área agrícola vêm de fora e são comprados em dólar [...] Se a gente fizesse o comércio não em dólar, mas nas nossas moedas locais isso facilitaria", explicou a professora.

Para o economista, o Brasil não está suscetível às oscilações dos Estados Unidos, mas sim a questões estruturais, como gastos obrigatórios, que forçam as contas públicas negativamente.

Entretanto, ele admitiu que um país como os EUA, com risco soberano menor, quando passa a pagar uma taxa de juros maior atrai investimentos que visam taxa de juros maior em ambiente mais seguro.

Uma moeda virtual do BRICS que dispute esse lugar do dólar de única moeda universalmente conversível torna-se nesse contexto mais que oportuna, para a pesquisadora. Mas, para isso, é necessária massiva adesão dos parceiros, defendeu Calandrin, o que ainda é um desafio, já que produtores veem o dólar como mais vantajoso em termos de lucro.

"Não depende só dos países. Estamos em países capitalistas, em que a produção não é estatal, não é toda feita pelo Estado. É feita por produtores privados individuais que controlam suas produções. Então, no caso, depende do interesse deles também nessa negociação".

A disputa regional entre Índia e China, segundo ela, também prejudica o processo de aceleração da desdolarização na opinião da especialista, pelo temor do governo indiano que isso deixará a China ainda mais poderosa econômica e comercialmente.

"Seria realmente uma mudança no jogo e então a Índia tem que ponderar isso: 'Quero que meu adversário regional tenha esse avanço enquanto alta potência ou prefiro perder um pouco'?", disse ela ao destacar que a Índia é aliada dos EUA que é uma aliança importante para ela somente na esfera militar considerando que ela tem um conflito com o Paquistão, ainda não resolvido", comentou ela.

Ela ressaltou que a oscilação do preço do dólar se dá não apenas por conta do comércio, como também devido ao uso da moeda como reserva de valor. E é justamente por isso, que hoje o dólar representa o lastro de todas as outras moedas do mundo, quase uma moeda universal para as transações correntes no mundo.

Dentre as alternativas ao dólar como reserva de valor, o ouro é a principal e cada vez mais utilizada por China e Rússia na última década.

"Os países investindo em outras formas de ter a sua própria reserva de valor que não seja o dólar também auxilia em que esse processo da desdolarização seja mais rápido".

Silva alertou no entanto, que com a cotação do ouro subindo nos últimos quatro anos, os EUA ficaram mais ricos, pois são os maiores detentores mundiais de reservas do metal precioso.

"Por que eles são estrategistas e desde os anos 70. Com o fim do padrão ouro, com receio de um ataque contra o dólar ou com a desvalorização do dólar, eles fizeram uma reserva absurda de ouro. E esse é um outro quesito que dificulta a vida do BRICS", observou.

Ao mesmo tempo, acrescentou: "Se você tiver um arrefecimento do dólar, as reservas do BRICS, da China estão praticamente tudo em dólar. Então todo mundo empobrece também se você tiver uma desdolarização relevante", comentou.

¨      Uganda vê parceria com BRICS como oportunidade de desenvolvimento, diz ministro

Junto com outros oito países, Uganda se juntou oficialmente ao BRICS como um Estado parceiro na última quarta-feira (8). A categoria de "países parceiros" foi introduzida na cúpula do grupo em Kazan, na Rússia, em outubro passado.

O novo status de Uganda como estado parceiro do BRICS é visto como uma oportunidade significativa para o desenvolvimento econômico e o avanço tecnológico, disse o ministro ugandês das Relações Exteriores, John Mulimba, à mídia chinesa.

"Nos juntamos a uma plataforma ou associação de países altamente industrializados. […] O BRICS oferece uma oportunidade significativa de aprender com seus avanços e inovações tecnológicas, incluindo o uso das tecnologias da informação e comunicação como ferramenta para a transformação social", observou.

Com seu novo status como Estado parceiro do BRICS, Uganda pode atrair investimentos de membros do BRICS para explorar os recursos energéticos e minerais do país, o que também ajudaria a criar empregos, enfatizou a alta autoridade ugandense.

Segundo Mulimba, a parceria entre os países do bloco é uma forma de acessar opções alternativas de financiamento além das instituições financeiras ocidentais, que impõem uma série de condições.

¨      Lavrov: Brasil, Índia e países africanos devem ser membros permanentes do CSNU

O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, está falando em uma grande coletiva de imprensa anual, onde destaca os eventos no mundo diplomático que determinaram o desenvolvimento das relações exteriores da Rússia e suas posições no cenário mundial.

A coletiva de imprensa, que deve abranger uma ampla gama de questões de grande importância, é moderada pela representante oficial do Ministério das Relações Exteriores russo, Maria Zakharova.

No início da coletiva de imprensa, antes das perguntas dos jornalistas, o ministro fez um comentário em que, em particular, enfatizou a importância da Carta das Nações Unidas e de sua observação por todos os países sem exceção, inclusive pelo Ocidente.

Lavrov citou uma tentativa recente da Ucrânia de atacar o gasoduto TurkStream (Corrente Turca), que fornece gás russo da Rússia à Europa através do mar Negro, com todos os nove drones ucranianos sendo derrubados pela defesa antiaérea russa.

A decisão, segundo o ministro, foi incentivada pelos Estados Unidos, que querem repetir a sabotagem do gasoduto Nord Stream (Corrente do Norte).

Ele ressaltou que é preciso seguir cuidadosamente as ações do presidente eleito dos EUA Donald Trump, levando em conta seu lema de "tornar a América grande novamente".

·        Reforma da atual ordem mundial

O sistema de relações internacionais de Yalta-Potsdam, formado após a Segunda Guerra Mundial pelos EUA, Reino Unido e então União Soviética, tem correspondido aos princípios das relações entre os países, mas as posições no cenário mundial se alteraram.

O Brasil, a Índia e países africanos mereciam há muito tempo se tornar membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, declarou Lavrov.

"Os países que têm responsabilidade especial na economia mundial, nas finanças mundiais e, consequentemente, na política mundial, nos arranjos militares mundiais, é claro, nem todos estão representados no Conselho de Segurança da ONU. Temos dito repetidamente que potências como a Índia e o Brasil, de acordo com todos os parâmetros, há muito que merecem presença permanente no Conselho de Segurança da ONU, simultaneamente com a decisão relevante sobre a participação africana permanente no Conselho de Segurança."

Ele sublinhou que tais países economicamente desenvolvidos como o Japão e a Alemanha não merecem se sentar lá, pois seguem a mesma política que os Estados Unidos, não representando uma voz independente.

·        Negociações possíveis com Trump sobre Ucrânia

Lavrov lembrou que, na questão da crise ucraniana, da mesma maneira como deverá ser resolvido o futuro da Groenlândia, a Rússia reconheceu o interesse das pessoas que habitam os territórios da Crimeia, Repúblicas Populares de Donetsk e de Lugansk e regiões de Zaporozhie e de Kherson.

Trump deve assumir uma postura firme e fazer uma proposta concreta sobre a solução do conflito armado na Ucrânia, levando em conta os interesses da Rússia e do povo dos territórios onde o conflito está em andamento, disse o chanceler russo.

"Vamos esperar por iniciativas concretas. O presidente [russo Vladimir] Putin tem dito repetidamente que está pronto para se reunir, mas até agora não houve propostas."

Contudo, Lavrov destacou que Trump foi o primeiro dos políticos ocidentais de alto escalão a admitir que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) mentiu e não cumpriu a promessa de não se expandir em direção às fronteiras russas.

A Rússia, por sua vez, está pronta a discutir as garantias de segurança para a Ucrânia, mas as negociações deverão abranger uma gama mais ampla de questões de segurança, afirmou.

·        Crise na Síria

O chanceler russo explicou o agravamento da situação na Síria pela relutância de vários participantes do conflito armado de desenvolver ações pacificadoras e de reconciliação entre as partes em confronto e reformar a estrutura política interna do ex-governo sírio.

Segundo Lavrov, a Rússia está mantendo contatos permanentes com o novo governo sírio e está prestes a contribuir para encontrar uma solução para a prolongada crise.

Ele ressaltou o envolvimento dos Estados Unidos no agravamento da situação e disse esperar que a administração Trump, à qual o atual presidente Joe Biden deixa uma "legado pesado", formule sua abordagem em relação aos problemas mundiais.

¨      Amorim volta a condenar sanções dos EUA contra a Venezuela e defende 'princípio de não ingerência'

O assessor para assuntos internacionais da Presidência da República, Celso Amorim, avaliou ao jornal O Globo sobre as relações entre Brasil e Venezuela nesta segunda-feira (13).

Na última sexta-feira (10), o presidente Nicolás Maduro tomou posse para o terceiro mandato à frente do país ao longo dos próximos seis anos. O Brasil foi representado na cerimônia pela embaixadora em Caracas, Glivânia Maria de Oliveira.

Na reportagem, Amorim voltou a reforçar a posição do governo brasileiro, contrária às sanções dos Estados Unidos contra a Venezuela. "Enquanto houver sanções, fica muito difícil falar em democracia. Isso dificulta qualquer negociação", mencionou Amorim.

Além disso, o assessor especial pontuou que o país mantém o princípio de não ingerência, o que significa evitar interferir na situação do país. O Brasil ainda não reconheceu a vitória de Maduro nem acatou os argumentos da oposição, que afirma ter derrotado o presidente com a candidatura do opositor Edmundo González.

"Continuaremos acompanhando a situação na Venezuela, mas sem ingerência, o que não quer dizer que não se pode ter opinião", acrescentou.

Defesa do diálogo entre Brasil e Venezuela

Em novembro, Mauro Vieira declarou que, apesar do incidente diplomático que envolveu os dois Estados, o Brasil deve continuar a ter diálogo com a Venezuela. Na época, o embaixador venezuelano no Brasil, Manuel Vadell, chegou a ser chamado para prestar esclarecimentos ao governo de Nicolás Maduro quanto à posição do país nas eleições.

"Pelo contrário, diálogo e negociação, e não isolamento, são a chave para a construção de qualquer solução pacífica e duradoura na Venezuela", disse, acrescentando que a crise política venezuelana não deve ser resolvida com sanções e isolamento por parte de outros países.

"A solução precisa ser construída pelos próprios venezuelanos, e não imposta de fora com mais sanções e isolamentos. Isso nós já vimos que não funciona. Não podemos cometer os erros que cometemos na época da autoproclamação de Juan Guaidó como presidente, em 2018."

         

Fonte: Sputnik Brasil

 

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