quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

Militares fraudam licitação de R$ 46 milhões e recebem pena de apenas um ano

Dois oficiais da reserva do Exército Brasileiro foram condenados por fraudar uma licitação no valor de R$ 46 milhões destinada à compra de móveis hospitalares para o Hospital Central do Exército (HCE), no Rio de Janeiro. O coronel e o tenente-coronel, que ocupavam cargos de chefia no HCE, direcionaram o processo licitatório para beneficiar empresas específicas, ignorando alertas técnicos e aumentando os custos das aquisições. Apesar da gravidade do caso, ambos receberam penas de apenas um ano, suspensas, podendo recorrer em liberdade.

A decisão, tomada pelo Conselho Permanente de Justiça da 4ª Auditoria Militar, causou indignação em especialistas e levantou questionamentos sobre a leniência da Justiça Militar em casos que envolvem corrupção e danos ao erário.

Como funcionou o esquema de fraude

A fraude consistiu em manipular o pregão destinado à compra de móveis hospitalares para o HCE, favorecendo determinadas empresas em detrimento da concorrência. Os dois oficiais ignoraram pareceres técnicos da Consultoria Jurídica da União (CJU), que apontavam falhas no processo licitatório, e ainda forneceram informações falsas sobre a aprovação do certame.

Segundo a denúncia apresentada pelo Ministério Público Militar (MPM), os militares violaram normas de transparência e governança. Entre as irregularidades constatadas, destacam-se:

# Desconsideração de pareceres técnicos que indicavam falhas no edital e riscos de direcionamento;

# Ausência de um estudo de mercado adequado para definir os preços e parâmetros do certame;

# Reserva de 25% do objeto da licitação para empresas de pequeno porte, sem justificativa técnica;

# Uso de informações falsas para mascarar irregularidades na aprovação do edital.

Essas ações resultaram na contratação de fornecedores com preços acima do mercado, gerando prejuízos financeiros à Administração Pública.

·        Decisão judicial e penas aplicadas

Os militares foram condenados com base no artigo 339 do Código Penal Militar, que pune crimes de fraude em licitações. No entanto, a pena aplicada foi de apenas um ano de detenção cada, com suspensão condicional da execução e possibilidade de recurso em liberdade. Além disso, não houve determinação de ressarcimento do valor desviado aos cofres públicos.

O julgamento também não considerou a aplicação de sanções mais severas previstas em legislações modernas, como a Lei nº 14.133/2021, que regula licitações e contratos administrativos e prevê medidas como:

# Multas compensatórias e punitivas proporcionais ao prejuízo causado;

# Declaração de inidoneidade, impedindo os envolvidos de participar de novas licitações;

# Ressarcimento integral do dano ao erário.

A decisão também reforça críticas recorrentes à Justiça Militar, acusada de leniência com membros das Forças Armadas envolvidos em crimes. “É mais um exemplo de como a Justiça Militar protege seus próprios membros, aplicando penas irrisórias em casos que deveriam ser tratados com muito mais rigor,” afirmou um jurista consultado pela reportagem.

A ausência de sanções severas, somada à falta de mecanismos para garantir o ressarcimento do erário, reforça a sensação de impunidade. Segundo especialistas, a Justiça Militar opera sob uma lógica corporativa que protege os integrantes das Forças Armadas, mesmo em casos de graves violações.

·        Impacto e omissões na decisão

O prejuízo de R$ 46 milhões, que poderia ter sido destinado a melhorias no atendimento de saúde do HCE, permanece sem solução prática. A sentença não só falha em punir adequadamente os responsáveis como também não aborda a necessidade de medidas reparatórias para minimizar os danos causados.

O caso também revela a omissão na aplicação de novas leis que poderiam aumentar a penalidade. A Lei nº 14.133/2021, por exemplo, busca modernizar as regras de licitação e punir com mais rigor casos de corrupção. No entanto, sua ausência no julgamento demonstra um descompasso entre os avanços legais e a prática jurídica no âmbito militar.

·        Reflexo de um problema maior

Casos como esse expõem a necessidade de revisar a atuação da Justiça Militar no Brasil. A aplicação de penas brandas em crimes que causam prejuízo ao erário contrasta com o rigor observado em processos envolvendo civis. “A Justiça Militar precisa ser repensada. Não podemos mais tolerar um sistema que privilegia alguns em detrimento da sociedade,” concluiu um especialista ouvido pela reportagem.

Enquanto os militares condenados seguem em liberdade, a sociedade brasileira arca com as consequências de um sistema que parece favorecer a impunidade.

 

¨      Polícia investiga fraude e lavagem de dinheiro por coronel da PMDF

Jorge Eduardo Naime Barreto (foto em destaque), coronel da reserva da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF), e sua esposa, Mariana Fiúza Taveira Adorno, são investigados pelo Departamento de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Decor/PCDF). O casal é suspeito de envolvimento em estelionato, lavagem de dinheiro e desvio de recursos, utilizando empresas e transferências financeiras suspeitas para, supostamente, beneficiar-se ilegalmente.

Os primeiros indícios vieram à tona durante as investigações da CPI dos Atos Antidemocráticos da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF). Quebras de sigilos bancários revelaram movimentações financeiras atípicas envolvendo Naime, sua esposa e outros aliados. O coronel teria recebido transferências de policiais subordinados e de empresas contratadas por entidades, como a Associação dos Oficiais da Polícia Militar (Asof), enquanto presidida por ele.

Um dos principais esquemas investigados é a contratação possivelmente simulada da empresa Pico Serviços de Comunicação e Representação Comercial Ltda., administrada por Sérgio Barbosa de Assis, sócio de Mariana Adorno em outras empresas. Segundo os investigadores, os pagamentos feitos pela Asof à Pico Serviços retornavam, descontados os tributos, diretamente a Naime e Mariana, o que configura desvio de recursos.

Além disso, a empresa H&F Vigilância e Segurança Ltda., ligada a parentes de Mariana, teria transferido mais de R$ 42 mil para Naime entre 2022 e 2023. As justificativas apresentadas incluem o tratamento do filho do casal, que tem hidrocefalia e necessita de cuidados médicos constantes. No entanto, a recorrência e os valores elevados dos repasses levantaram suspeitas.

A H&F transferiu R$ 15.635,88 para Naime ao longo de cinco meses, com repasses mensais de R$ 3 mil e um adicional de R$ 635,88 em dezembro de 2022.

<><> Fraude

Identificou-se um esquema de desvio de recursos, por meio da contratação da Pico Serviços, durante a gestão de Naime como presidente da Asof. Documentos mostram que a empresa recebia pagamentos da associação, que eram repassados ao casal Naime-Adorno após dedução de impostos.

Empresas associadas a Mariana Adorno, como a Monumental Serviços de Segurança Patrimonial Ltda., também estão sob investigação. Apesar de registros societários, as operações dessas empresas são descritas como inexistentes ou incompatíveis com os valores movimentados.

<><>  O outro lado

O coronel Leonardo Moraes, presidente da Asof, informou que a associação foi questionada sobre o fato pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pela Corregedoria da PMDF, que também tem um inquérito aberto sobre o caso. “Nas nossas contas, aparece o pagamento regular do contrato com a Pico e os serviços foram prestados de acordo com a previsão contratual. Ao assumir, abrimos auditoria para verificar as contas da Asof e não foi encontrada nenhuma evidência de desvio de recursos”, afirmou.

A defesa de Jorge Eduardo Naime e Mariana Adorno Naime destacou que ambos sempre mantiveram uma conduta ética irrepreensível, sem qualquer indício de irregularidades em suas atuações. Eles reafirmaram confiança nas instituições e no devido processo legal. Mariana Adorno Naime informou, ainda, que permanece à disposição das autoridades competentes. A nota ressalta que nenhum dos dois teve conhecimento ou foi informado sobre qualquer investigação em andamento relacionada ao caso.

 

¨      PM ligado a CV pediu bônus após ser preso por tráfico de drogas

O policial militar de Rondônia Roberte Paulo Aguiar Souza (à direita na foto em destaque), condenado por tráfico de drogas, pediu na Justiça um bônus no próprio salário cerca de três meses depois de ser preso transportando 508 kg de cocaína em uma caminhonete.

Conforme revelou a coluna, a Polícia Militar de Rondônia (PMRO) paga, há mais de um ano, o salário de Roberte, embora o militar esteja foragido e responda por crimes de tráfico e associação criminosa. O cabo tem uma remuneração mensal de R$ 6.195,79.

Roberte é acusado pela Polícia Federal de integrar uma organização criminosa que enviava drogas para o Comando Vermelho (CV). Ele foi alvo da Operação Puritas, deflagrada no fim de 2024.

Em 31 de março de 2023, o policial ajuizou uma ação no Tribunal de Justiça do estado (TJRO) para ganhar um adicional de compensação por disponibilidade militar, benefício previsto em uma lei criada pelo governo Bolsonaro em 2019. Ele pedia mais de R$ 11 mil em retroativos, bem como o início do pagamento do bônus.

De acordo com cálculo da Procuradoria-Geral de Rondônia, caso o adicional fosse concedido a Roberte e aos outros policiais militares do estado, o impacto orçamentário chegaria a R$ 77,5 milhões por ano.

“Logo, além de juridicamente improcedente, a ação é uma grave violação às finanças públicas, na medida em que cria despesa orçamentária milionária às finanças estatais. Deste modo, não resta qualquer dúvida, da flagrante improcedência da ação proposta”, escreveu a PGE.

O juiz de direito do 1º Juizado Especial da Fazenda Pública do TJRO decidiu negar o pedido do PM traficante, em 15 de junho de 2023. O magistrado pontuou que o pagamento é destinado aos militares das Forças Armadas.

“Assim, não é possível estender a condição de Militar das Forças Armadas aos policiais militares de Rondônia, com fundamento no art. 4º da Lei nº 6.880/80 (Estatuto dos Militares), uma vez que não se confundem os militares da reserva das Forças Armadas com policiais militares”, acrescentou.

<><> PM fugiu da prisão

Em 31 de outubro de 2023, Aguiar fugiu do Centro de Correição da Polícia Militar, em Porto Velho, e nunca mais foi encontrado. Ele estava preso desde janeiro daquele ano, após ser flagrado com meia tonelada de cocaína.

Atualmente, Aguiar tem dois mandados de prisão em aberto. O primeiro deles foi emitido em 6 de novembro de 2023, pela 2ª Vara Criminal da Comarca de Vilhena, do TJRO, em razão da sua fuga.

O outro foi expedido pela 2ª Vara de Delitos de Tóxicos de Porto Velho no último dia 7 de novembro. Cabo Aguiar teve a prisão decretada novamente no âmbito da Operação Puritas, da Polícia Federal, que investiga organização criminosa de tráfico de drogas interestadual formada por policiais militares (PMs) e policiais rodoviários federais (PRFs).

 

¨      Mais de 7 mil militares da ativa estão filiados a clubes militares com intensa atuação política

Dados recentes revelam que 3.261 militares da ativa do Exército estão associados a clubes militares, destacando-se o Clube Militar do Rio de Janeiro, o Clube do Exército e a Casa do Sargento do Brasil. Essas associações, que tradicionalmente deveriam ser espaços de lazer e integração social para os militares, têm assumido uma postura política cada vez mais ativa, o que levanta preocupações sobre a influência desses espaços em temas de interesse nacional e o uso de recursos públicos para sustentar suas operações.

O Clube Militar, em especial, conta com 1.821 militares da ativa do Exército entre seus associados, seguido pelo Clube do Exército com 1.434 e pela Casa do Sargento do Brasil com 6. Já o Clube Naval, entidade ligada à Marinha do Brasil, apresenta 4.220 militares da ativa filiados, conforme informações do Sistema de Pagamento da Marinha, base até outubro de 2024. Além disso, o Clube Naval também conta com 3.609 veteranos e 245 pensionistas. Por outro lado, o Clube Militar registra 158 militares ativos, acompanhados de 263 veteranos e 62 pensionistas egressos da Marinha do Brasil.

A coluna também acionou a Aeronáutica solicitando informações sobre membros da ativa filiados a clubes militares, mas a Força se negou a fornecer os dados referentes ao efetivo alegando que, diferente das demais forças, apenas ela não tem acesso a essas informações.

Este alto número de militares ativos do Exército e da Marinha em clubes que mantêm uma intensa participação política é, para muitos, um ponto de alerta.

<><> Atuação política e histórico de manifestações

O Clube Militar do Rio de Janeiro se destaca entre essas associações por sua postura política aberta e contundente. Nos últimos anos, a instituição emitiu uma série de notas públicas e organizou eventos nos quais expressou posições sobre questões de política nacional. Um exemplo notável foi durante a reeleição de Dilma Rousseff em 2014, quando, embora afirmasse respeito ao resultado eleitoral, o clube deixou clara sua insatisfação com o governo e lançou uma campanha pela “moralidade nacional.” Durante o evento de lançamento dessa campanha, o então presidente do Clube Militar, general Gilberto Rodrigues Pimentel, criticou programas sociais como o "Mais Médicos" e acusou o governo de ter uma agenda "totalitária" e "autoritária."

Ao longo da última década, o Clube Militar também se posicionou em defesa do voto impresso, criticou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e acusou a instituição de promover uma “ditadura.” Durante o governo Bolsonaro, a associação publicou notas em apoio ao ex-presidente, com ataques frequentes ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao sistema de urnas eletrônicas, além de ter defendido o ex-deputado Daniel Silveira, condenado por ataques a instituições democráticas e por incitar violência contra opositores. A oposição do clube à CPI da Covid, em que insinuou a possibilidade de um golpe militar como resposta à investigação, também reforça a sua postura política inflamada e alinhada a setores conservadores.

<><> O custo para o público: designações de militares da ativa e uso de recursos

Esse contexto torna ainda mais complexo o fato de que muitos desses clubes recebem apoio financeiro significativo dos militares da ativa do Exército e da Marinha. Em maio de 2024, o Clube Militar recebeu mais de um milhão de reais em consignações, valores deduzidos diretamente dos contracheques de seus sócios militares. Além disso, o Clube Naval, com 4.220 militares da ativa associados, também se beneficia dessa mesma estrutura.

Sob a gestão do General Tomás Miné Ribeiro Paiva, o Comando do Exército autorizou que militares ocupem funções administrativas nesses clubes sob a modalidade de “Prestação de Tarefa por Tempo Certo.” Com isso, esses militares recebem adicionais sobre seus salários para atuar em funções essencialmente recreativas e administrativas, sem qualquer relação direta com a defesa nacional.

O Clube Militar, ao longo dos anos, tornou-se uma voz ativa entre os militares do Exército, consolidando-se como uma plataforma de influência política. Em 2018, Jair Bolsonaro, ao considerar nomes para a posição de vice em sua chapa, cogitou representantes do Clube Militar, reconhecendo a projeção política que o cargo de presidente da associação possui entre a tropa. Isso evidencia como a associação se tornou um pilar de poder simbólico dentro das Forças Armadas, com potencial para mobilizar a opinião pública e influenciar o debate político.

<><> Um cenário que exige transparência e revisão

A presença de mais de 3.200 militares da ativa do Exército e 4.220 militares da Marinha em clubes com histórico de atuação política intensa e, em certos momentos, antidemocrática, traz à tona a necessidade de maior transparência e regulamentação. As designações para funções administrativas em associações recreativas que não possuem ligação direta com a defesa nacional, financiadas por meio de recursos públicos, geram questionamentos sobre a real necessidade e impacto dessas práticas.

O contexto atual revela a importância de uma discussão mais aprofundada sobre o papel e os limites das associações militares no cenário político brasileiro. Em tempos de estabilidade democrática, é fundamental que as Forças Armadas mantenham sua neutralidade e que associações como o Clube Militar e o Clube Naval respeitem os limites de sua função recreativa, sem comprometer a confiança e a imparcialidade que a sociedade espera de seus militares em serviço ativo.

 

Fonte: Fórum/Metrópoles

 

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