Hepatite: tudo o
que você precisa saber sobre os diferentes tipos da doença, que pode levar à
morte
Todos os anos,
segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as hepatites virais causam 1,7
milhão de mortes no mundo.
No Brasil, entre 1999 a 2018,
foram registrados 632.814 casos da doença. Desse total, 167.108 (26,4%) foram
do tipo A, 233.027 (36,8%) do B, 228.695 (36,1%) do C e 3.984 (0,7%) do D (ou
Delta).
Os dados constam no
Boletim Epidemiológico de Hepatites Virais 2019, divulgado esta semana pelo
Ministério da Saúde.
A boa notícia é
que, de 2008 a 2018, houve redução de 7% no número de notificações, passando de
45.410 para 42.383. O levantamento também apontou queda de 9% nos óbitos,
saindo de 2.362 em 2007 para 2.156 em 2017, sendo 1,6% associados à hepatite A,
21,3% a B, 76% a C e 1,1% a D.
Em relação à
distribuição dos casos pelo país, o Nordeste, concentra a maior proporção das
infecções pelo vírus A (30,3%), o Sudeste, pelos vírus B e C, com 34,9% e
60,0%, respectivamente, e o Norte acumula, pelo D (74,9%).
·
O
que é hepatite?
Segunda maior
doença infecciosa letal do mundo (a primeira é a tuberculose), a hepatite é a
inflamação do fígado. As principais causas dessa condição são os vírus (A, B,
C, D e E) - alguns medicamentos, consumo excessivo de álcool e outras drogas e
doenças autoimunes, metabólicas e genéticas também podem
desencadeá-la.
Para saber mais
sobre ela, a BBC News Brasil conversou com o patologista Helio Magarinos Torres
Filho, membro da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica (SBPC) e diretor
médico do Richet Medicina & Diagnóstico; Ivan França, infectologista do
Hospital Alemão Oswaldo Cruz, e Raquel Stucchi, infectologista e professora da
Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp) e coordenadora do Grupo de Estudos das Hepatites da FCM.
<><> Hepatite
A
Em 2018, de acordo
com o Ministério da Saúde, foram notificados 2.149 casos de hepatite A no Brasil,
o que equivale a uma taxa de detecção de 1 caso por 100 mil habitantes - em
2008, era de 6,2 por 100 mil habitantes.
Sua transmissão se
dá por contágio fecal-oral, na ingestão de alimentos e/ou água contaminados,
especialmente em locais com condições precárias de saneamento básico. Outra
forma, essa menos comum, é através da prática sexual oral-anal, pelo contato da
mucosa da boca com o ânus da pessoa infectada.
Nem sempre a
hepatite A apresenta sintomas, apenas nos quadros agudos. Entre os principais estão
dor abdominal, diarreia, náusea, vômito, intolerância a cheiros, pele e olhos
amarelados, urina escura, fezes claras, mal estar e dor no corpo.
Na maioria dos
casos, a doença se cura sozinha, em uma ou duas semanas, e a pessoa adquire
imunidade, ou seja, não terá uma nova infecção.
O tratamento deste
tipo de hepatite é sintomático e ainda inclui repouso, dieta e evitar o consumo
de bebida alcoólica.
A melhor forma de
se prevenir é com a vacina, disponível gratuitamente para crianças de 15 meses
a 5 anos incompletos (4 anos, 11 meses e 29 dias) nas unidades básicas de saúde, e para grupos de
risco (pessoas de qualquer idade que tenham hepatopatias crônicas, coagulopatias,
hemoglobinopatias, HIV, doenças imunossupressoras e de depósito, fibrose
cística e trissomias, candidatos a transplante de órgãos e doadores de órgãos
cadastrados em programas de transplantes), nos Centros de Referência para
Imunobiológicos Especiais (CRIEs) - para os demais indivíduos, a imunização
está disponível em clínicas e laboratórios privados.
Além disso, é
importante lavar bem os alimentos antes de consumi-los, não comprá-los em
qualquer lugar, só beber água limpa, ter atenção à água que usará para cozinhar
e cuidar da higiene pessoal.
<><> Hepatite
B
No ano passado,
13.992 casos de hepatite B foram registrados no país, o que representa 6,9
casos por 100 mil habitantes.
Nesta variação, a
transmissão ocorre pelo contato com sangue contaminado, por meio do
compartilhamento de seringas, agulhas, lâminas de barbear, alicates de unha e
outros objetos que furam ou cortam, materiais que não foram esterilizados
corretamente, sexo desprotegido e de mãe para filho (transmissão vertical) no
parto.
Apresenta tanto
formas agudas, ou seja, quando há sintomas - são cerca de 10% das ocorrências,
tendo as mesmas manifestações clínicas da hepatite A -, quanto crônicas (quando
o vírus persiste no organismo por mais de seis meses).
A enfermidade tem
tratamento, ofertado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), e controle, a fim de
que não evolua para cirrose e câncer de fígado. Ele é feito com a administração
de medicamentos antivirais.
O Ministério da
Saúde também disponibiliza vacina. Para as crianças, são quatro doses (ao
nascer, 2, 4 e 6 meses) e, para os adultos, três doses a depender da situação
vacinal. Pessoas que tenham algum tipo de imunodepressão ou o vírus HIV
precisam de um esquema especial, com dose em dobro.
<><> Hepatite
C
Pelos dados do
Boletim Epidemiológico de Hepatites Virais 2019, no ano passado foram
notificados 26.167 casos de hepatite C no Brasil, com taxa de detecção de 13
por 100 mil habitantes.
Dentro todos os
tipos da doença, essa é a mais mortal. Para se ter uma ideia, de 2000 a 2017,
foram 53.715 óbitos associados a ela.
O Ministério da
Saúde relata que, atualmente, mais de 500 mil pessoas convivem com o vírus e
não sabem, já que se trata de uma enfermidade geralmente silenciosa, até que
atinja maior gravidade.
A forma crônica é
comum em 80% dos pacientes e, desses, 20% podem evoluir para cirrose hepática e
de 1% a 5% para câncer de fígado.
A patologia é
transmitida da mesma forma que a B, por contato com sangue contaminado, sexo
desprotegido e de mãe para filho na hora do parto.
O tratamento, gratuito
pelo SUS, se dá com o uso de antivirais de administração oral, determinados de
acordo com o genótipo do vírus e o comprometimento do fígado. Ele é realizado
de três meses a um ano e tem excelentes chances de cura, passando de 95%.
Por não ter vacina,
a melhor forma de se prevenir é não compartilhar objetos de uso pessoal e
cortantes ou perfurantes, usar preservativo e, ao se submeter a qualquer
procedimento, certificar-se de que os materiais usados são esterilizados e os
descartáveis não estão sendo reaproveitados.
<><> Hepatite
D
No ano passado, no
país, houve 145 casos da hepatite D, também chamada de Delta. Esse tipo da
enfermidade depende da presença do vírus B para contaminar uma pessoa.
Da mesma forma que
as outras variações, dificilmente apresenta sintomas - que também são os
mesmos. A forma de transmissão é por relações sexuais sem camisinha com alguém
infectado, da mãe doente para o filho durante o parto e pelo compartilhamento
de objetos cortantes.
A infecção pode ser
tanto aguda quanto crônica e tem tratamento - com duração de três meses a um
ano - e controle, evitando a evolução para cirrose e câncer. A melhor forma de
se prevenir e não contrair a hepatite B, o que se consegue com vacina.
<><> Hepatite
E
Esse tipo de
hepatite tem baixa prevalência no Brasil, tanto que nem consta no Boletim
Epidemiológico de Hepatites Virais 2019.
Seu contágio é
igual ao da A: por condições precárias de saneamento básico, água e alimentos
contaminados e falta de higiene pessoal.
Também quase não
apresenta sintomas, mas, quando eles surgem, são basicamente os mesmos das
demais: cansaço, enjoo, vômitos, febre, dor abdominal, fezes claras, urina
escura e pele e olhos amarelados.
Na maioria dos
casos, não necessita de tratamento, sendo indicado apenas repouso, dieta e não
consumir bebida alcoólica. Há o risco de cronificar em pessoas imunodeprimidas
e transplantados.
Por não ter vacina,
a melhor forma de se prevenir é lavar bem as mãos após ir ao banheiro e antes
de comer, lavar bem os alimentos e não ter contato com água de valões, riachos,
chafarizes, enchentes e esgoto.
<><> Exames
periódicos
Junto com as
recomendações relacionadas a cada um dos tipos das hepatites virais, os
especialistas consultados pela BBC News Brasil afirmam que é imprescindível
fazer, pelo menos, uma vez no ano, exames de rotina para saber se tem a doença
- são realizados com a coleta de uma amostra de sangue.
Isso porque o
diagnóstico precoce é essencial para evitar complicações e para o sucesso do
tratamento.
Em anúncio recente,
por conta do Julho Amarelo, ação que visa prevenir e conscientizar sobre as
hepatites virais, o governo disse que pretende aumentar o número de testagem e
que irá ampliar a expectativa de tratamento para 50 mil por ano.
¨ Como se proteger contra a hepatite
Autoridades sanitárias
e organizações não-governamentais estão pedindo que as pessoas busquem exames
para detectar hepatite, já que milhões de
pessoas no mundo todo estão portando a doença sem saber.
A mensagem está
sendo reforçada nesta semana, na véspera do Dia Mundial Contra
Hepatite,
no domingo (28/7).
A hepatite mata mais de
um milhão de pessoas por ano — e o número está crescendo.
<><> O
quão disseminada é a hepatite?
A OMS estima que
254 milhões de pessoas estão vivendo com hepatite B crônica e 50 milhões de
pessoas tem hepatite C crônica. Há mais de dois milhões de casos novos a cada
ano.
<><> A
hepatite B afeta:
- 97 milhões de
pessoas na região da OMS chamada de Pacífico Ocidental (que inclui China, Japão
e Australásia) estão infectadas de forma crônica
- 65 milhões de
pessoas na África
- 61 milhões de
pessoas na região da OMS chamada de Sudeste Asiático (que inclui Índia,
Tailândia e Indonésia).
A OMS diz que a
hepatite E infecta 20 milhões de pessoas por ano no mundo todo e provocou 44
mil mortes em 2015. Ela é mais comum no sul e no leste da Ásia.
Dados do ano
passado no Brasil estimam que 520 mil pessoas tinham hepatite C, mas sem
diagnóstico e tratamento. Até 2022, cerca de 150 mil pessoas já tinham sido
diagnosticadas, tratadas e curadas da hepatite C, afirma o governo brasileiro.
No caso da hepatite
B, a estimativa oficial é que quase 1 milhão de pessoas possuam o vírus no
Brasil e, destas, 700 mil ainda não foram diagnosticadas. Até 2022, 264 mil
pacientes tinham recebido diagnósticos com a doença e 41 mil estavam em
tratamento — segundo dados do ministério da Saúde.
<><> Como
se pega hepatite?
A hepatite A é pega
ao se comer ou beber alimentos e líquidos contaminados com fezes, ou através do
contato direto com uma pessoa infectada.
É comum em países
de renda média e baixa onde há condições sanitárias precárias.
Os sintomas
desaparecem depois de pouco tempo, e quase todo mundo se recupera. Mas pode
causar problemas renais fatais.
A hepatite A
costuma surgir em epidemias em locais com comida e água contaminada, como
aconteceu em Xangai, na China, em 1998, quando 300 mil pessoas foram
infectadas.
<><> A
hepatite B costuma ser transmitida:
- de mãe para
filho, no parto
- do contato de uma
criança com outra
- de seringas,
agulhas, tatuagem, piercing ou exposição a sangue e líquidos corpóreos (como
durante o sexo, por exemplo)
As hepatites C e D
também são transmitidas através do contato com sangue infeccionado, como quando
se compartilha agulhas e seringas, ou através da transfusão de sangue
contaminado.
Só pessoas com
hepatite B podem pegar hepatite B. Isso acontece com cerca de 5% das pessoas
que têm infecção crônica com hepatite B, e faz com que a infecção seja muito
intensa.
A hepatite E é
transmitida através do consumo de água ou comida contaminadas. É mais comum no
sul e leste da Ásia, e é especialmente perigosa para mulheres grávidas.
<><> Como
saber se tenho hepatite?
Os sintomas mais
comuns são:
# febre
# fadiga
# perda de apetite
# diarréia
# náusea
# dor na região do
estômago
# fezes claras e
urina escura
# olhos amarelados
<><> Quais
são os testes e tratamentos para hepatite?
É possível fazer
exames de sangue para hepatite A, B e C.
Não existe um
tratamento específico para hepatite A. Mas a maior parte das pessoas infectadas
costuma se curar rapidamente e criar imunidade.
Hepatites B e C
crônicas podem ser tratadas com antirretrovirais, que retardam a progreção da
cirrose e as chances de se desenvolver câncer de fígado.
Há vacinas que
previnem contra a hepatite A e B. Dada a bebês no nascimento, a vacina para
hepatite B previne contra a doença ser transmitida pelas mães — e também
protege contra a hepatite D.
Não existe vacina
para hepatite C, e a vacina para a hepatite E não é amplamente distribuída.
<><> Como
é a prevenção para se evitar pegar hepatite?
Segundo a OMS, a
hepatite A pode ser evitada das seguintes formas:
lavar com
frequência as mãos antes de refeições ou após o uso do banheiro
fornecer água
potável para comunidades
tratamento adequado
de esgotos em comunidades.
A OMS afirma que
hepatites B, C e D podem ser evitadas:
- com prática de
sexo seguro, usando-se camisinhas, e reduzindo o número de parceiros sexuais
- evitando o
compartilhamento de agulhas no uso de drogas, ou em tatuagens e piercings
- no caso da
hepatite B, lavando as mãos ao se ter contato com sangue, líquidos corpóreos ou
superfícies contaminadas
- no caso da
hepatite B, se vacinando. As vacinas tomadas na infância duram cerca de 20 anos
- A hepatite E é
evitada com boas práticas de higiene e cozinhando carne de fígado por bastante
tempo, especialmente fígado de porco.
<><> O
que as autoridades estão fazendo para eliminar a hepatite?
A OMS diz querer
reduzir em 90% o número de pessoas que pegam hepatites B e C e em 65% o número
de mortes até 2030.
Mas a entidade
alerta que as mortes por vírus de hepatite estão subindo. Dados recentes mostram
que houve um aumento de 1,1 milhão em 2019 para 1,3 milhão em 2022.
Centenas de milhões
de pessoas ainda têm dificuldades de testarem para hepatite porque apenas 60%
dos países ao redor do mundo oferecem exames gratuitos ou subsidiados e
tratamento. Na África, a OMS afirma que apenas um terço dos países oferecem
testes assim.
Fonte: BBC News
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