Moisés Mendes: Bandidos que se transformam
em autoridades para matar e roubar
Os brasileiros merecem
os presentes que o sistema de Justiça vem oferecendo ao país às vésperas de
mais um 31 de março. O resgate da democracia passa também pelo fortalecimento
da autoestima.
E o próximo presente,
depois da prisão dos mandantes da morte de Marielle, poderia ser o pacote
completo dos mandantes que mandavam nos mandantes presos.
Precisamos chegar aos
mandantes dos mandantes e suas motivações. Que o sistema de Justiça ofereça aos
brasileiros, mas agora sem tanta demora, os nomes dos que levaram os irmãos
Chiquinho e Domingos Brazão e o delegado Rivaldo Barbosa ao planejamento da morte
de Marielle.
É o que os clássicos
da literatura, os antigos livros policiais de bolso e até as séries da Netflix
e as novelas da Globo ensinam. Um mandante que manda executar tem atrás dele um
mandante ou vários outros mandantes mais poderosos e encobertos.
As estruturas que
conseguiram manter segredos em torno do assassinato da vereadora até agora são
mais do que parte de uma facção criminosa. São parte das estruturas políticas
que os sustentam.
Marcelo Freixo sabe
disso, como sabem todos os que conhecem o funcionamento das milícias e
similares. Não existe crime organizado no Rio sem suporte de estruturas
políticas e institucionais poderosas.
O Rio é a escola onde
funcionam essas organizações, com interesses específicos em várias áreas, mas
sempre sob sustentação da política e de seus tentáculos no Estado, desde a
polícia até o Judiciário e o governo.
A espera pela
identificação dos mandantes que mandavam nos mandantes presos pode reproduzir e
prolongar a angústia que persistiu até aqui, seis anos depois do crime. Mas
agora o Brasil vai querer saber.
Pelas conexões que
começam a ser expostas, poderemos ter, daqui a pouco, mais um desmaio de
fascista, desta vez talvez até de um general. Para que também nessa área dos
desmaiadores exista alguma hierarquia. Chega de coronéis desmaiando.
O caso Marielle
amplifica o sentimento de que o Brasil é uma fábrica de bandidos que se
transformam em delegados, promotores, procuradores, militares, juízes de baixas
e altas cortes, deputados, senadores e até presidente da República.
Ø
Rivaldo planejava assassinato de Marielle
há mais de um ano quando foi indicado por militares
Nomeado pelos generais
Braga Netto e Richard Nunes para ser chefe da polícia civil no estado ainda em
2018, Rivaldo Barbosa, já tinha plano para executar Marielle Franco.
Segundo o relatório da
Polícia Federal (PF) o crime já era idealizado desde setembro do ano anterior e
só não havia ocorrido antes por exigência do próprio Rivaldo que determinou que
o crime só poderia ser cometido dentro de circunstâncias específicas. Uma delas
é a de que o crime não poderia ocorrer caso a vereadora estivesse saindo da
Câmara da cidade.
Para fundamentar a
alegação a PF anexou ao relatório um depoimento do assassino confesso, Ronnie
Lessa, executor do crime e que tinha contato com Rivaldo.
Lessa chegou a revelar
que Rivaldo cogitou cancelar a operação diante da impossibilidade de execução
da operação sob seus termos dando a entender que diversas tentativas foram
abortadas por este motivo.
Quando Rivaldo ascende
ao comando da Polícia Civil no estado, já teriam passados mais de 7 meses de
tentativas e operações voltadas para o assassinato de Marielle Franco. Além
disso, a nomeação de Rivaldo pelos militares contrariou orientações da
inteligência da própria polícia civil e também recomendações de procuradores do
estado, que eram contra a indicação por conta do
histórico problemático do policial com o jogo do bicho no Rio de Janeiro.
Porém, a própria
investigação da PF também revelou que um ano antes do crime, o Escritório do
Crime havia infiltrado Laerte Silva de Lima nas fileiras do PSOL, partido de
Marielle, ou seja. Quando Rivaldo chegou ao topo da PC-RJ, já atuava na
orquestração do crime há um ano.
¨
Pivô do crime, delegado é acusado de
instruir sobre melhor local para assassinato de Marielle
Segundo informações da
delação premiada de Ronnie Lessa, incluída no relatório da Polícia Federal
(PF), o delegado Rivaldo Barbosa teria orientado os assassinos de Marielle
Franco para evitar que o crime ocorresse na saída da Câmara dos Vereadores do
Rio de Janeiro. Isso, segundo Lessa, visava manter as investigações sob a
alçada da polícia local e não atrair a atenção da PF.
A delação aponta que
Rivaldo Barbosa, que ocupava cargos importantes na Divisão de Homicídios e
depois se tornou chefe da Polícia Civil, teria informado aos assassinos que
realizar o crime na saída da Câmara dos Vereadores seria mais facilmente
caracterizado como um “crime político” e, consequentemente, a investigação
seria transferida imediatamente para a PF.
De acordo com Lessa,
Edmilson da Silva Oliveira, conhecido como “Macalé” e suposto contratante dos
assassinos de Marielle, afirmou que Rivaldo era “um deles”. Essas revelações
sugerem uma estreita ligação entre o delegado e os executores do crime.
O relatório da PF
ainda destaca que a garantia de impunidade em torno do assassinato de Marielle
seria apenas uma das muitas transações ilícitas realizadas pela Divisão de
Homicídios na época.
Há alegações de que as
delegacias do Rio recebiam pagamentos mensais de propina pelas milícias, sendo
que a Divisão de Homicídios teria recebido entre R$ 60 mil e R$ 80 mil por mês.
“Isso quando não auferia uma remessa adicional em razão dos crimes que deixavam
provas/rastros”, afirma o relatório da PF.
Rivaldo chefiou a
polícia civil do RJ por indicação do ex-ministro Braga Neto, que foi candidato
a vice de Bolsonaro em 2022.
Ø
Braga Netto reconhece ter promovido Rivaldo
Barbosa, mas nega sua indicação
A defesa de Walter
Braga Netto, ex-candidato à vice na chapa de Jair Bolsonaro na eleição de 2022,
disse que em 2018 ele endossou a promoção de Rivaldo Barbosa a chefe da Polícia
Civil do Rio de Janeiro por meras “razões administrativas”.
Barbosa é suspeito,
segundo a Polícia Federal (PF), de ter planejado o assassinato da vereadora
Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Na ocasião, Braga Netto liderava
a intervenção federal na segurança pública do Rio.
“Durante o período da
intervenção federal na área da segurança pública no estado do Rio de Janeiro,
em 2018, a Polícia Civil era diretamente subordinada à Secretaria de Segurança
Pública”, afirmam os advogados de Braga Netto em comunicado.
“A seleção e indicação
para nomeações eram feitas, exclusivamente, pelo então Secretário de Segurança
Pública, assim como ocorria nas outras secretarias subordinadas ao Gabinete de
Intervenção Federal, como a Defesa Civil e Penitenciária”, diz outra parte do
comunicado.
O secretário era o
general Richard Nunes, indicado por Braga Netto. A nota é assinada pelos
advogados Marcus Vinicius de Camargo Figueiredo e Luís Henrique César Prata.
“Por questões
burocráticas, o ato administrativo era assinado pelo Interventor Federal que
era, efetivamente, o governador na área da segurança pública no RJ”, diz outro
trecho.
Braga Netto foi
nomeado como interventor na segurança do RJ pelo então presidente Michel Temer
(MDB). Depois, ocupou os cargos de ministro da Defesa e da Casa Civil do
governo Bolsonaro, e concorreu a vice na chapa derrotada do ex-presidente à
reeleição, em 2022.
No relatório final
sobre o caso Marielle, a PF aponta que Richard Nunes “apoiou” a nomeação de
Rivaldo, apesar de ter recebido recomendações contrárias.
“Por sua vez, Braga
Netto nomeou o General Richard Nunes como Secretário de Estado de Segurança
Pública, tendo ele nomeado o Delegado Rivaldo Barbosa como seu Chefe de
Polícia.
Nesta altura, já
estavam na iminência de eclodir as suspeitas retratadas nos PICs acima
mencionados, o que ensejou, inclusive, a contraindicação de Rivaldo pela
Subsecretaria de Inteligência, conforme reconhecido pelo General em sede de
depoimento”, diz o relatório da PF. “Entretanto, o General apoiou a nomeação de
Rivaldo à revelia do que havia sido recomendado.”
Por ordem do Supremo
Tribunal Federal (STF), foi deflagrada na manhã deste domingo a Operação Murder
Inc. para prender de forma preventiva, além de Rivaldo Barbosa, o deputado
federal Chiquinho Brazão (União-RJ) e seu irmão Domingos, conselheiro do Tribunal
de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ).
Os três são suspeitos
de serem os mandantes do crime. Também foram expedidos 12 mandados de busca e
apreensão no Rio.
A prisão dos suspeitos
ocorreu após o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski,
anunciar a homologação da delação premiada do ex-policial militar Ronnie Lessa,
apontado como o responsável por executar os assassinatos, em março de 2018.
O caso foi
federalizado e passou a ser de responsabilidade do STF após Lessa citar o
deputado Chiquinho Brazão, que tem foro privilegiado. A relatoria na Corte
ficou o ministro Alexandre de Moraes.
Lewandowski e o
diretor-geral da PF, Andrei Passos, disseram neste domingo, em entrevista
coletiva, que as investigações mostram como motivação básica para o assassinato
de Marielle o fato de ela se opor ao grupo dos mandantes do crime, que queria
regularizar terras para fins comerciais.
A vereadora defendia o
uso dessas propriedades para a construção de moradias populares.
“Envolve, sim, a
questão ligada à milícia, à disputa de territórios, de regularização de
empreendimentos, loteamentos”, disse Passos.
“Se a pauta
imobiliária não era central para o mandato da vereadora, era uma pauta que ela
tinha, como investimento em moradias sociais, que iam em confronto com o que o
grupo mandante defendia.”
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Chefe de gabinete de Braga Netto já
conhecia Rivaldo Barbosa
Conforme revelado pela
coluna, quem levou o nome de Rivaldo Barbosa, arquiteto da morte de Marielle
Franco, para o gabinete de intervenção federal no Rio de Janeiro comandado pelo
general Braga Netto foi o Comando Militar do Leste (CML) que na ocasião também
era comandado pelo próprio general.
Em depoimento, o
general Richard Nunes já havia dito à investigadores que conhecerá Rivaldo
durante os trabalhos da Força de Pacificação na comunidade da Maré.
Porém, outro ponto que
liga o Braga Neto ao alvo de prisão preventiva na operação de hoje é o general
Mauro Sinott que foi chefe de gabinete de Braga Netto no CML e na intervenção.
Sinott atuou com Rivaldo Barbosa na ocupação militar complexo da Maré.
Sinott era comandante
da 6ª Brigada de Infantaria Blindada de Santa Maria, Rio Grande Sul quando em
30 de maio de 2014, assumiu o posto de número dois no comando da força de
pacificação na comunidade. O general também esteve na ocupação da comunidade da
Rocinha, onde Rivaldo também esteve presente. Meses mais tarde também
participou da polêmica missão brasileira no Haiti.
Em 2015 Sinott foi
comandante da Brigada de Operações Especiais, em Goiânia (GO). Onde foi
encarregado de planejar e desenvolver as operações de contra terror para os
Jogos Olímpicos do Rio.
Vale ressaltar que,
embora não existam evidências que desabonem a passagem de Sinottt pela brigada,
as forças especiais do exército brasileiro, desde 8 de janeiro de 2023 são alvo
de desconfiança por conta das inúmeras evidências de que diversos de seus membros
atuaram ou se disponibilizaram para as conspirações golpistas de 2022 que
visavam suas as eleições daquele ano.
Fonte: DCM/O Cafezinho
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