Privatização de prisões avança no Brasil
com incentivo do governo: quem ganha com isso?
Dez anos depois de
inaugurada a primeira e única penitenciária com gestão 100% privada no Brasil,
em Minas Gerais, a privatização de presídios ganhou incentivo extra do governo
de Luiz Inácio Lula da Silva.
Condenado por
entidades de direitos humanos e abandonado como projeto de política pública
pelos EUA, precursor da iniciativa, no Brasil, o modelo foi renovado pelo
Decreto nº 11.498, de abril de 2023, assinado pelo vice-presidente, Geraldo
Alckmin, como presidente em exercício, e pelo ministro da Fazenda, Fernando
Haddad.
O documento alterou o
Decreto nº 8.874/2016, do governo de Michel Temer e incluiu segurança pública e
sistema prisional nas atividades econômicas prioritárias para a captação de
recursos privados, ou seja, no rol de setores integrados ao Programa de Parcerias
de Investimentos (PPI).
O decreto foi emitido
e assinado sem manifestação técnica dos ministérios da Justiça, de Direitos
Humanos e Cidadania, da Igualdade Racial, das Mulheres e da Secretaria Nacional
de Políticas Penais (Senappen).
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A cereja do bolo
O diferencial do
decreto está no incentivo fiscal à construção e gestão de presídios pela
iniciativa privada, com a emissão de debêntures incentivadas, como explica o
defensor público de São Paulo e diretor do Instituto Brasileiro de Ciências
Criminais (IBCCRIM), Bruno Shimizu, em conversa com a Sputnik Brasil:
"É renúncia
fiscal para o empresário que quiser construir e gerir um presídio. Ele terá
benefícios fiscais, poderá captar recursos do mercado privado sem precisar
pagar imposto. É uma perda de receita por parte do governo que está sendo
investida na privatização do sistema prisional", afirma ele em entrevista
à reportagem.
"Não bastasse
isso, a União fica como avalista dessa atividade e ainda remunera o empresário
por cada preso" acrescenta Shimizu.
O incentivo a esse
modelo de negócios, associado à surpreendente marca do Brasil de 3ª maior
população carcerária do mundo, tem atraído governos estaduais, empresas
nacionais e internacionais.
Atrás apenas dos EUA e
da China, o Brasil tem cerca de 650 mil pessoas encarceradas em presídios,
segundo dados de junho de 2023 do Ministério da Justiça e Segurança Pública
(MJSP).
Outro dado alarmante:
um em cada quatro presos não foi julgado e quase 70% das pessoas privadas de
liberdade no país são negras.
Ainda segundo o
levantamento do ministério, cerca de 93% dos estabelecimentos prisionais são
públicos (1.287 mil). Os 7% restantes se dividem em: i) 34 em modelo de
cogestão (a unidade prisional é construída pelo Estado e gerida pela iniciativa
privada); ii) 58 em parcerias com ONGs (espaços construídos pelo Estado e
administrados pela entidade); e iii) 5 em Parcerias Público-Privadas, as PPPs
(construídos e geridos pela iniciativa privada). Desses, três estão em Minas
Gerais, um no Paraná e um no Mato Grosso do Sul.
Poucos meses depois do
decreto, em outubro de 2023, foi leiloada a concessão de um presídio PPP em
Erechim, no Rio Grande do Sul. A empresa ganhadora da concessão, Soluções
Serviços Terceirizados, poderá explorar o serviço por pelo menos 30 anos.
O valor do contrato,
de acordo com o edital, é de cerca de R$ 2,52 bilhões, e a diária por cada
preso paga pelo Estado será de R$ 233, cerca de R$ 8 mil por mês. A obra está
prevista para ser realizada em até dois anos. O montante inclui a construção de
duas unidades, operação do presídio, equipamentos, alimentação, saúde,
educação, entre outros.
Com a lotação máxima
possível de 1,2 mil homens, a empresa receberá dos cofres públicos cerca de R$
8,4 milhões por mês e R$ 100 milhões por ano.
O projeto contou com o
apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), do Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID), do PPI e de nove consultoras do
Brasil, dos Países Baixos e de Portugal, lideradas pela multinacional PwC.
O secretário de
Parcerias e Concessões do governo do Rio Grande do Sul, Pedro Capeluppi,
afirma, também em declarações à Sputnik Brasil, que os resultados observados no
país em relação às parcerias público-privadas, em geral, apontam que as
concessões administrativas na área prisional darão mais celeridade e eficiência
na construção das unidades e qualidade à operação no apoio às forças de
segurança.
Ele cita como exemplo
o presídio de Ribeirão das Neves, em Minas Gerais, primeiro e único até o
momento nesse modelo que, segundo ele, tem infraestrutura e operação de melhor
qualidade do que a maioria dos presídios públicos.
O secretário informa
que os gastos para manter uma pessoa no sistema público prisional no Rio Grande
do Sul está em torno de R$ 2,8 mil mensais.
Ao ser questionado
sobre a diferença de quase três vezes entre o custo de um apenado em uma
unidade pública e na de Erechim, Capeluppi argumenta que não é possível
comparar tais valores.
"No caso do
presídio de Erechim, existe o custo também com a construção da infraestrutura.
Para comparar o custo do presídio feito com a parceria com a iniciativa
privada, com o operado diretamente pelo Poder Público, teríamos que incorporar
no custo do Poder Público com a construção e com uma infraestrutura com
qualidade semelhante", esclarece.
Segundo o secretário,
o principal benefício de um presídio privado para a sociedade é a maior
eficiência do setor privado na construção associada à operação dessa
infraestrutura, tanto de agilidade no prazo de entrega das unidades como nos
custos de operação.
"Nosso foco nesse
momento é tirar os benefícios do modelo, fazer a construção das unidades, tirar
o presídio que hoje está no centro de Erechim, que está operando acima de sua
capacidade, e construir uma infraestrutura de mais qualidade, com o objetivo
fundamental de promover a ressocialização desses apenados", justifica.
De acordo com o
secretário do governo gaúcho, toda a atuação do Poder Judiciário, da Defensoria
Pública, o apoio judicial aos apenados, o funcionamento das forças de segurança
e da Polícia Penal permanecerão exatamente como são atualmente quando o complexo
de Erechim estiver funcionando.
"A legislação
brasileira é muito bem definida em relação ao que pode e ao que não pode ser
delegado ou privado. Então o Estado, aquelas funções típicas de Estado,
permanecem e continuarão sob controle estrito e rigoroso do Estado",
defende o secretário.
Entretanto, mais de 80
entidades discordam da premissa do secretário e enviaram ao governo federal
nota técnica, em outubro de 2023, com argumentos sobre "a
inconstitucionalidade e demais limitações jurídicas, econômicas e políticas à
privatização da construção de unidades prisionais e gestão penitenciária".
O intuito era impedir o leilão de Erechim, sem sucesso.
Outro estudioso no
assunto ouvido pela Sputnik Brasil, o advogado alagoano Douglas de Assis Bastos
também destaca a ausência de motivos plausíveis para as privatizações nesse
setor.
Em entrevista
concedida para esta reportagem, ele defende que a medida não é vantajosa para o
Estado nem do ponto de vista econômico nem social:
"Agora, com
incentivo fiscal, com debêntures, isenção de imposto, há uma série de regalias
para quem quiser", frisa. "O Estado ainda garante, do ponto de vista
empresarial, um risco menor para a empresa, garante 90% da taxa do valor cheio e
vagas que têm no presídio", cita Bastos.
Em sua dissertação de
mestrado, o advogado investigou o Presídio do Agreste, inaugurado em 2013 em
Alagoas, com administração privada. O estudo virou livro: "Privatização
prisional: limites constitucionais e impactos político-criminais". Bastos
diz que, a princípio, não é contrário à privatização dos presídios, mas que sua
investigação concluiu que o modelo usado no Brasil não funciona.
"Segurança
pública é indelegável. Oficialmente, nos documentos, decretos não aparece, mas,
na prática, ela tem ocorrido em presídios privados no Brasil", salienta.
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Gato por lebre?
De acordo com Shimizu,
que tem doutorado em direito penal e criminologia pela Universidade de São
Paulo (USP), a máxima de que a iniciativa privada é mais competente para
enxugar gastos e eficiente na gestão de coisas públicas já caiu por terra no
Brasil e em vários países que experimentaram privatizar unidades prisionais.
Sobre a unidade de
Ribeirão das Neves mencionada pelo secretário Capeluppi como
"presídio-modelo", o defensor público afirma:
"Todos os
relatórios, seja do Mecanismo Nacional de Combate e Prevenção à Tortura
[MNPCT], seja do CNJ [Conselho Nacional de Justiça], apontam o mesmo padrão de
violações de direitos humanos na execução penal quando se compara com as
unidades públicas", comenta.
Já Bastos, que também
é representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Conselho
Penitenciário do Estado de Alagoas, chama a atenção para o fato de que
denúncias de violações de direitos ficam prejudicadas devido ao vínculo do
empregado com a empresa:
"Para uma
situação em que o preso foi torturado, por exemplo, ou recebeu punição
excessiva - que é outro erro também, pois existem membros da empresa privada no
sistema de poder disciplinar que não é para ter - a reflexão que fica é se
esses profissionais pagos pela empresa fariam o trabalho adequado, que
resultaria na diminuição da rentabilidade do seu empregador", pondera o
especialista. "O mesmo acontece com assistentes sociais, psicólogos".
O governo de Minas
Gerais foi condenado pela Justiça em 2014, por licitação ilícita em Ribeirão
das Neves, em atividades como custódia, guarda e assistência jurídica dos
presos.
Bastos acrescenta que
as normas vigentes sobre as PPPs e a precária fiscalização estimulam a criação
de um bolha especulativa carcerária, como ocorreu em outros países.
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Funpen + incentivo fiscal + presídios
sucateados = iniciativa privada
Em decisão liminar do
Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental (ADPF) 347, em 2015, a Corte reconheceu um estado de coisas
inconstitucional dos presídios, com "violação massiva de direitos
fundamentais" da população prisional por omissão do Poder Público.
Uma das medidas
cautelares concedidas pelo Plenário foi a liberação de recursos do Fundo
Penitenciário Nacional (Funpen) e a proibição de contingenciá-los.
Nos dois anos
seguintes à decisão do STF, a arrecadação do fundo, que recebe recursos
principalmente de multas decorrentes de sentenças penais, foi a maior desde
2000, quando o Tribunal de Contas da União (TCU) iniciou a série histórica.
Em 2016 e 2017 foram
repassados aos fundos penitenciários de estados e municípios R$ 1,48 bilhão e
R$ 997 milhões, respectivamente. Os valores vêm caindo desde então por mudanças
na legislação, com cortes de algumas fontes, mas as cifras continuam altas. Em
2023, a arrecadação foi de pouco mais de R$ 600 milhões.
"É muito
dinheiro, dada a quantidade de crimes e processos penais que a gente tem no
Brasil", comenta Bastos. "Todas as fianças que não forem devolvidas,
de pessoas que foram condenadas, vão para o fundo. Um cenário perfeito para
afirmarem que o sistema prisional público está sucateado e precisamos da ajuda
da intervenção privada na execução penal. Foi uma chuva de privatização",
explica ele.
Em outubro de 2022,
Santa Catarina iniciou, com a assessoria do BNDES, um projeto para atrair
capital privado para um complexo prisional em Blumenau, com investimento de R$
250 milhões.
O governo de Minas
Gerais marcou para abril a privatização de duas unidades de medidas
socioeducativas, em parceria com o governo federal, para adolescentes em
conflito com a lei. O contrato prevê cerca de R$ 52 milhões em investimentos
nos primeiros 24 meses para a construção e equipagem das unidades.
O governo de São Paulo
também anunciou neste ano interesse em fazer uma PPP para operar unidades da
Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (Fundação Casa).
As ações ocorrem, apesar da queda pela metade no número de adolescentes em regime
fechado nos últimos seis anos, de acordo com o Ministério dos Direitos Humanos
e Cidadania.
Os contratos com a
iniciativa preveem, ainda, exploração da mão de obra do preso. No caso de
Ribeirão das Neves, única referência nacional até o momento, a empresa Gestores
Prisionais Associados (GPA), que administra o complexo, informou que a
contratação da mão de obra prisional possibilita economia de até 47% na folha
de pagamentos das empresas parceiras.
Isso, porque a Lei nº
7.210/1984, mais conhecida como Lei de Execução Penal (LEP), permite que o
preso ganhe três quartos do salário mínimo pela mão de obra e não receba
benefícios trabalhistas, como férias, 13º salário, INSS, FGTS, entre outros.
·
'Estímulo à indústria do encarceramento'
Para não perder vagas,
analistas avaliam que há riscos de prisões arbitrárias com inflação penal,
criação de mais tipos penais, além de corrupção.
"O encarceramento
em massa passa a ser lucrativo. Essas empresas e esses conglomerados econômicos
começam a fazer pressão justamente para que as penas se tornem maiores",
alerta Shimizu.
O que se tem, segundo
ele, é "um circuito tenebroso em que o encarceramento em massa é causa e
consequência da retroalimentação do mercado de prisões privadas, que se valem
de cláusulas de lotação e do trabalho penitenciário para se manterem em um vertiginoso
crescimento em busca do lucro".
A principal cláusula
determina que o Poder Público deve garantir demanda mínima de 90% de lotação
carcerária para o gestor do presídio ou unidade socioeducativa. Na opinião de
Douglas Bastos, se o objetivo da segurança pública é ter menos pessoas presas,
a cláusula é no mínimo contraditória.
A expansão desse
modelo de negócios incentiva, ainda, segundo os especialistas ouvidos, a
ocorrência de lobby por parte das empresas junto ao Legislativo, ao Judiciário
e ao próprio governo para a manutenção de leis que estimulem o encarceramento
em massa, o aumento de penas, a criminalização de novas condutas e o fim da
progressão de regime.
"São
conglomerados, empreiteiros, capital estrangeiro envolvido, querendo lucrar com
essa atividade, que tem lobby dentro do governo, dentro do Congresso",
destaca o defensor.
Um caso emblemático
ocorreu nos EUA, no escândalo que ficou conhecido como "Kids for
Cash" (Crianças por Dinheiro, na tradução em inglês) em 2008.
"Era um esquema
que envolvia juízes e donos de presídios privados e, para cada criança
condenada, o empresário pagava propina aos juízes", lembra o advogado
alagoano.
O escândalo contribuiu
para que o governo norte-americano encerrasse os contratos de presídios
privados no sistema federal, em 2016, após estudos apontando que os presídios
privados eram mais violentos do que os públicos e que o modelo contribuiu para
o superencarceramento no país, principalmente de pessoas negras e de origem
latina, evidenciando o viés racista do sistema de Justiça.
·
(Des)casos no Brasil
O Brasil tem
experiências traumáticas de unidades geridas por empresários e construídas pelo
Poder Público, como o massacre de Pedrinhas, em 2013, no Complexo Penitenciário
de Pedrinhas, Maranhão, quando foram assassinadas 45 pessoas, e os do Complexo
Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), em Manaus, no Amazonas, em 2017 e 2019,
com resultado de 75 mortos.
Na época do primeiro
massacre no Compaj, o Ministério Público do Amazonas divulgou um relatório
revelando que um detento no complexo custava aos cofres públicos R$ 4,7 mil por
mês, quase o dobro da média desses custos no restante do país.
"Existe um estado
de coisa inconstitucional em todos os presídios no Brasil. As unidades públicas
têm índice de mortalidade absurdo, mas quando vemos que nas unidades privadas
isso, quando não é igual, é pior, realmente é muito difícil entender por que
gastar mais dinheiro público para colocar presos em risco, aumentar a população
carcerária. O que se ganha com isso?", questiona Shimizu.
Em julho passado, o
Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) investigou a morte de um detento no
complexo de Ribeirão das Neves. A denúncia era de que foi negado atendimento
médico ao homem, que passou mal durante dois dias e que ainda teria sido submetido
a condições de tortura.
Sobre a morte do
cativo, o governo mineiro informou que uma investigação preliminar encaminhada
ao Núcleo de Correição Administrativa da Secretaria de Estado de Justiça e
Segurança Pública (Sejusp) concluiu ausência de responsabilidade da Sejusp e da
GPA.
"A causa da morte
do indivíduo sob custódia foi por causas naturais, identificada como 'parada
cardiorrespiratória', e a assistência prestada estava em conformidade com os
procedimentos-padrão estabelecidos", diz a nota.
O projeto para incluir
o sistema prisional nas PPPs chegou a tramitar no governo de Dilma Rousseff, em
2015, mas acabou engavetado pelo Senado. Então, por que, com uma canetada, sem
ser provocado pelo Congresso, o governo atual incluiu as prisões no programa de
privatizações?
·
Posicionamento do governo federal
A Sputnik Brasil teve
dificuldade de obter posicionamento claro por parte do Executivo sobre a
iniciativa de incrementar as privatizações de presídios.
Com pedidos de
entrevistas frustrados, respostas evasivas e notas genéricas, os órgãos, os
ministérios e as autarquias envolvidos no processo de privatização de unidades
prisionais se eximiram de justificar o decreto e sua continuidade.
O MJSP indicou a
Secretaria de Comunicação Social (Secom) para responder se a privatização de
presídios fazia parte de um projeto estruturante de governo e se o Brasil se
inspirou na experiência de outros países na formulação do decreto. A Secom
também foi indicada pelo ministério para responder a seguinte pergunta: se o
Estado brasileiro economiza com a privatização e garantiria a segurança com
terceirização da custódia dos presos.
Sobre o presídio de
Erechim, a pasta afirmou que sua pactuação envolve o governo gaúcho e o BNDES.
Portanto, não cabe "por força do Pacto Federativo e orientação do governo
federal, ao MJSP e/ou Senappen decidir sobre a adoção dos modelos".
O BNDES informou
apenas que foi contratado pelo estado do Rio Grande do Sul para realizar a
estruturação da PPP e não financiou nada.
Sobre o pagamento para
a manutenção de presos sob gestão privada, o MJSP informou que esse tipo de
acordo é regulado pela Lei Federal nº 11.079/2000, que estipula conteúdo mínimo
dos contratos sobre obrigações das partes, modalidade licitatória, período mínimo
de vigência e valor da concessão e processo, por exemplo.
A Senappen informou
que não tem gerência sobre o sistema socioeducativo, mas somente sobre o
sistema prisional, com maiores de 18 anos. Caso haja parceria do Estado com o
governo federal, a secretaria declarou por nota que a questão deve ser tratada
diretamente com o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, órgão
responsável pelo tema.
Já o Ministério dos
Direitos Humanos e Cidadania não respondeu as perguntas e os pedidos de
entrevista enviados pela Sputnik por e-mail. Entretanto, em declarações
recentes, seu ministro, Silvio Almeida, foi contundente ao criticar o modelo de
privatização do sistema penal. Para ele, a medida é uma contradição do governo
Lula.
"É o contrário do
que queremos fazer. Dessa forma, abrimos espaço para que o crime organizado
tenha mais um pedacinho do Estado brasileiro. É inaceitável que a gente abra
espaço para esse tipo de coisa", declarou ele em coletiva de imprensa em 2
de fevereiro, na sede do ministério, em Brasília. "Isso não deu certo em
lugar nenhum."
Almeida, que é
jurista, afirmou ainda que a privatização de presídios é inaceitável e
inconstitucional, pois na prática "agentes privados podem fazer a execução
da pena e aplicar medida socioeducativa", abrindo espaço para a
"infiltração do crime organizado".
Na ocasião, ele
adiantou que conversaria sobre a problemática com o ministro da Justiça,
Ricardo Lewandowski: "Tenho minhas posições que são baseadas na política e
no governo e vou fazer essa discussão dentro do governo", completou o
ministro.
Shimizu concorda que o
termo certo para o tipo de segurança em presídios com gestão privada é
"milícia".
"Quando se
substitui o agente penitenciário pelo monitor nas unidades privadas,
basicamente é criada uma polícia privada. A definição de polícia privada é
milícia: corpo de segurança que vai atuar como polícia em usurpação de função
constitucional", argumenta.
O defensor de São
Paulo pondera que ao emitir um decreto, abrindo mão de recursos para um projeto
prisional que a academia e a experiência internacional dizem ser
"catastrófico", o governo dá sinais de que, sim, as privatizações
fazer parte de uma política de governo.
·
Afinal, quem ganha com as privatizações de
prisões?
"Quem ganha com
isso a gente sabe, mas o que a sociedade como um todo ganha com isso realmente
é uma pergunta que não tem resposta", opina o defensor público.
"Políticas
públicas voltadas ao sistema prisional não dão voto. Então quem ganha com a
privatização dos presídios no Brasil certamente não é a população, pelo menos
nesse modelo", acrescenta Bastos.
Para Shimizu, não há
como reverter, no curto prazo, a onda de privatizações que se iniciou, mas há
linhas possíveis se efetivamente houver boa vontade por parte do governo.
"Podemos levar
substratos científicos, experiências do exterior, dados para o governo, para
justificar e pressionar a revogação desse decreto, que outros decretos como
esse não aconteçam, para que o BNDES não inclua na sua carteira novos projetos
como esse", sugere.
Mas a luta é constante
e sempre pode piorar, e quem perde é a sociedade como um todo, ressalta o
defensor:
"Dentro do
sistema capitalista transnacional sempre existirá a tentativa da iniciativa
privada de se espraiar sobre uma atividade econômica que se mostrou muito
lucrativa em diversos lugares, apesar dos efeitos sociais catastróficos",
lamenta.
Fonte: Sputnik Brasil
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