EUA mantêm estratégia de criar 'estalido
político e social' para derrubar Maduro
A próxima eleição
presidencial na Venezuela está marcada para 28 de julho, em momento de grande
tensão entre o governo do presidente Nicolás Maduro, que busca a reeleição, e a
oposição, com apoio dos Estados Unidos, que vem realizando atos no país a fim de
tentar desestabilizar a política venezuelana.
Na última quarta-feira
(20), alguns dos principais assessores de María Corina Machado, principal nome
contrário ao atual presidente, foram detidos, acusados de planejar ações para
forçar sua elegibilidade.
No mesmo dia, o
procurador-geral da Venezuela, Tarek William Saab, apresentou um vídeo de uma
confissão de um dos colaboradores dela, Emil Brandt Ulloa, no qual ele admite
que seu partido, o Vente Venezuela, receberia financiamento do exterior.
Segundo Saab, o
financiamento se daria através da Agência dos Estados Unidos para o
Desenvolvimento Internacional (USAID, na sigla em inglês), que repassaria
"milhões de dólares" para ONGs venezuelanas.
O cientista político
formado pela Universidade dos Andes Luis Javier Ruiz comenta à Sputnik Brasil
que a interferência dos EUA na Venezuela traz impactos na estabilidade política
e na vida cotidiana dos cidadãos venezuelanos.
Ele destaca que o
interesse americano em derrubar o governo de Nicolás Maduro remonta a uma
"herança histórica", uma vez que o governo venezuelano desafiou a
influência estadunidense com a Revolução Bolivariana.
Segundo ele, a gestão
de Maduro assume como uma herdeira política e ideológica da revolução,
inaugurada pelo presidente Hugo Chávez, "que implicou uma mudança de
paradigma na política interna e externa da Venezuela e saiu, é claro, do domínio
dos EUA".
Para respaldar seus
argumentos, Ruiz cita casos históricos, como as "tentativas de golpe de
Estado" contra Chávez no início deste século.
"Em 2002, por
exemplo, vimos como o presidente Hugo Chávez foi alvo de uma tentativa de golpe
de Estado. Posteriormente, compreendemos e sabemos, de fontes diretas dos EUA,
que [os americanos] estavam por trás do golpe de Estado."
Em relação às ações
atuais, Ruiz aponta o "financiamento de governos paralelos" e o
"apoio à oposição venezuelana" como parte da estratégia de
Washington.
"Por essa razão,
diversos métodos de interferência política têm sido apresentados. Por exemplo,
ao presidente Nicolás Maduro foi instalado, por dois anos, um governo paralelo,
chamado de governo interino, que foi avalizado, promovido, incentivado e financiado
pelos EUA."
·
Oposição na Venezuela
No início deste ano, o
Tribunal Supremo de Justiça venezuelano confirmou que María Corina Machado
estava inabilitada politicamente por 15 anos, de acordo com um processo
iniciado em 2015, devido a irregularidades administrativas durante o período em
que era deputada, entre 2011 e 2014.
Sua substituta, a
filósofa Corina Yoris, não conseguiu completar o registro da candidatura na
plataforma do órgão eleitoral venezuelano antes do prazo, que se encerrou na
segunda-feira (25).
Para Ruiz, a confissão
de Ulloa sobre o financiamento à oposição através da USAID evidencia a contínua
interferência estadunidense na oposição venezuelana, feita por meio de outras
figuras locais.
Segundo ele, "não
é descabido" pensar que os EUA buscam provocar inseguranças na Venezuela,
inclusive com apoio de outros governos.
"Os EUA continuam
mantendo a estratégia de provocar um estalido político e social, e de que, pela
via da força, o presidente Nicolás Maduro seja retirado do poder."
O pesquisador afirma
que sanções unilaterais impactaram negativamente a economia venezuelana,
aumentando os índices de desnutrição e insegurança alimentar. Além disso,
contribuíram para o "êxodo de venezuelanos para outros países
latino-americanos".
Ruiz adverte que a
estratégia de "asfixia econômica" e "desestabilização
política" dos EUA contra a Venezuela teve graves consequências para os
venezuelanos, afetando sua qualidade de vida e gerando uma crise humanitária.
Além disso, enfatiza a necessidade de respeitar a "soberania dos
países" e buscar soluções diplomáticas para resolver os conflitos
internacionais.
Outro candidato da
oposição, Manuel Rosales, conseguiu se inscrever de última hora — contudo a
chapa de Corina informou que não apoiará o governador do estado venezuelano de
Zulia. Eles chegaram a se encontrar para discutir a possibilidade de Rosales
substituir a candidata da Plataforma Unitária (aliança da oposição), mas não
houve acordo.
·
Qual é a relação da Venezuela com os
Estados Unidos?
O historiador da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Roberto Santana Santos,
pesquisador da globalização neoliberal, ressalta que os EUA têm histórico de
interferência direta nos assuntos políticos da Venezuela, especialmente quando
se trata de governos que desafiam seus interesses geopolíticos e econômicos.
Ele argumenta que essa
interferência não é nova e remonta aos dias de Hugo Chávez, quando os EUA
também buscaram derrubar seu governo. "Os EUA sempre trabalharam, desde a
chegada de Hugo Chávez ao governo, em 1999, para derrubar Chávez, para assassinar
Hugo Chávez, e agora [tentam fazer] o mesmo com Maduro."
Essa interferência não
se limita apenas a tentativas políticas, mas se estende a esforços militares,
como evidenciado pelo caso do ex-autoproclamado presidente Juan Guaidó.
Santos ressalta que a
tentativa de Guaidó de estabelecer um "governo fantoche" foi
respaldada pelos EUA e por outros aliados, levando quase à invasão militar da
Venezuela em 2019.
"A invasão da
Venezuela por mercenários, ou até mesmo por militares norte-americanos, é algo
que o governo venezuelano e a sociedade venezuelana têm que levar em conta,
porque isso já foi tentado em outras ocasiões."
Além disso, o
pesquisador destaca que a interferência estadunidense mina qualquer
possibilidade de estabilidade na Venezuela, tanto econômica quanto política.
Ele comenta que o
bloqueio comercial e financeiro imposto pelos EUA tem prejudicado severamente a
economia venezuelana.
"A situação
econômica da Venezuela, que é ruim, é fruto de uma guerra econômica feita por
um bloqueio comercial e financeiro dos EUA […]."
A recente tentativa de
María Corina Machado de se candidatar, apesar de estar inelegível devido às
questões jurídicas, é vista por Santos como parte de uma estratégia mais ampla
dos EUA para desestabilizar a Venezuela e controlar seus recursos, especialmente
o petróleo.
·
Por que os EUA adotaram sanções contra a
Venezuela?
Santos argumenta que a
interferência constante de Washington busca minar a legitimidade das eleições
venezuelanas e, por extensão, justificar a proibição da compra de petróleo
venezuelano nos mercados internacionais.
Além disso, o pesquisador
aponta para a hipocrisia das chamadas "democracias ocidentais", que
frequentemente contestam a legitimidade das eleições venezuelanas sem
apresentar evidências de fraude.
Ele destaca que
instituições como o Carter Center atestaram a segurança e transparência das
eleições venezuelanas. E argumenta que a visão ocidental de democracia como
sinônimo de liberalismo está equivocada e é prejudicial para a soberania da
Venezuela.
Por fim, Santos
expressa preocupação com o impacto da instabilidade econômica e política na
vida dos venezuelanos e destaca a necessidade de uma abordagem regional mais
coerente para promover a estabilidade na Venezuela — inclusive enfatizando o
papel crucial que o Brasil e outros países vizinhos têm a desempenhar nesse
processo.
Recentemente, o
Ministério das Relações Exteriores do Brasil emitiu uma nota dizendo que
acompanha o processo com "expectativa e preocupação".
·
Como funciona o sistema eleitoral da
Venezuela?
O pleito presidencial
venezuelano está marcado para 28 de julho, dentro do estipulado pelos Acordos
de Barbados, e o atual mandato é de seis anos.
O Conselho Nacional
Eleitoral venezuelano já formalizou o convite a Comunidade dos Estados
Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), Comunidade do Caribe (Caricom), União
Africana, União Europeia, especialistas da ONU, BRICS e Carter Center para
observar as eleições de 2024 no país.
Além de Maduro e do
governador de Zulia, Manuel Rosales, (que já perdeu para Chávez em 2006), há
outros dez candidatos presidenciais — Luis Eduardo Martínez, Enrique Márquez,
Benjamín Rausseo, Antonio Ecarri, Daniel Ceballos, Claudio Fermín, Javier Bertucci,
Juan Carlos Alvarado, Luis Ratti e José Brito.
Ø
Brasil e Colômbia citam 'preocupação' com
eleição na Venezuela; Caracas rebate: 'Intervencionistas'
Nesta terça-feira
(26), os ministérios das Relações Exteriores brasileiro e colombiano
expressaram preocupação sobre o processo eleitoral na Venezuela. Em resposta,
Caracas disse que o comunicado "cinzento" do Itamaraty parece ter
sido escrito "pelo Departamento de Estado dos EUA".
Em nota publicada no
site do Itamaraty, a chancelaria brasileira disse que "esgotado o prazo de
registro de candidaturas para as eleições presidenciais venezuelanas […], o
governo brasileiro acompanha com expectativa e preocupação o desenrolar do processo
eleitoral naquele país".
Segundo o ministro das
Relações Exteriores brasileiro, a candidata da oposição indicada pela
Plataforma Unitaria Democrática (PUD), "sobre a qual não pairavam decisões
judiciais, foi impedida de se registrar, o que não é compatível com os acordos
de Barbados".
"O Brasil está
pronto para, em conjunto com outros membros da comunidade internacional,
cooperar para que o pleito anunciado para 28 de julho constitua um passo firme
para que a vida política se normalize e a democracia se fortaleça na Venezuela,
país vizinho e amigo do Brasil. O Brasil reitera seu repúdio a quaisquer tipos
de sanção que, além de ilegais, apenas contribuem para isolar a Venezuela e
aumentar o sofrimento do seu povo", afirmou o Itamaraty.
O governo brasileiro
participou ativamente das negociações em Barbados ocorridas no último 17 de
outubro, quando Caracas firmou um tratado com o governo dos Estados Unidos em
que se compromete a organizar um pleito presidencial competitivo e a permitir que
ele seja monitorado por observadores internacionais.
Em troca, a Casa
Branca aliviaria as sanções contra a indústria de petróleo do país
sul-americano.
A Colômbia também
expressou preocupação sobre o pleito em um comunicado publicado por sua
chancelaria nesta terça-feira (26), afirmando que se preocupa com o registro de
candidatura da oposição que pode "afetar a confiança de alguns setores da
comunidade internacional na transparência e competitividade do processo
eleitoral".
Caracas respondeu a
Bogotá e Brasília, por meio de seu chanceler Yván Gil. Sobre o governo
colombiano, a Venezuela diz que ele praticou "ingerência grosseira em
assuntos que só dizem respeito aos venezuelanos".
"Movido pela
necessidade de agradar aos desígnios do Departamento de Estado dos EUA, o
Ministério das Relações Exteriores da Colômbia dá um passo em falso e comete um
ato de ingerência grosseira em assuntos que só dizem respeito aos venezuelanos",
afirmou o chanceler Yván Gil.
Em seguida, repudiou o
comunicado brasileiro, classificando-o como "cinzento e intervencionista
redigido por funcionários da chancelaria brasileira, que parece ter sido ditado
pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos".
"O Ministério do
Poder Popular para Relações Exteriores da República Bolivariana da Venezuela
repudia o comunicado cinzento e intervencionista redigido por funcionários da
chancelaria brasileira, que parece ter sido ditado pelo Departamento de Estado
dos Estados Unidos, no qual são emitidos comentários carregados de profundo
desconhecimento e ignorância sobre a realidade política na Venezuela",
afirmou o chanceler.
As eleições
presidenciais estão programadas para 28 de julho de 2024, a fim de escolher um
presidente para um mandato de seis anos, com início em 10 de janeiro de 2025.
Ø
Coalizão de oposição venezuelana consegue
nomear candidato provisório em meio a tensões com EUA
A principal coalizão
de oposição venezuelana, a Plataforma Unitaria Democrática (PUD), anunciou
nesta terça-feira (26) a nomeação provisória de Edmundo González Urrutia como
candidato às eleições presidenciais.
A medida foi tomada
após o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) conceder prorrogação de duas horas
devido às dificuldades enfrentadas pela oposição para ingressar no sistema de
registro de requerentes.
"Decidimos
registrar provisoriamente o presidente do diretor da Mesa Redonda da Unidade
Democrática, Edmundo González Urrutia, para preservar o exercício dos direitos
políticos que correspondem à nossa organização política até conseguirmos
registrar a nossa candidatura unitária", afirmou a coalizão em comunicado
nas redes sociais.
A próxima eleição
presidencial na Venezuela está marcada para 28 de julho, em meio a uma grande
tensão entre o governo do presidente Nicolás Maduro, que busca a reeleição, e a
oposição, apoiada pelos EUA, que vem realizando ações no país, a fim de tentar
desestabilizar a política venezuelana.
Recentemente, a
oposição enfrentou desafios, como a detenção de alguns dos principais
assessores de María Corina Machado, figura destacada contrária ao governo de
Maduro.
Tais assessores foram
acusados de planejar ações para forçar a elegibilidade de Machado. Além disso,
o procurador-geral da Venezuela apresentou um vídeo de confissão de um dos
colaboradores de Machado, revelando financiamento estrangeiro ao seu partido, o
Vente Venezuela.
Fonte: Sputnik Brasil
Nenhum comentário:
Postar um comentário