Ponte Rio-Niterói: mortes, atrasos,
tentativa de CPI e explosão de custos da ‘obra do século’ da ditadura
"Graças à visão
ampla de estadistas que a Revolução de Março de 1964 ofereceu ao Brasil,
podemos hoje, no mês em que comemoramos seu decimo aniversário, festejá-la com
legítimo orgulho, mediante essa magnífica estrada sobre as águas que liga, por
sobre a Baía de Guanabara, as cidades do Rio de Janeiro e de Niterói."
A declaração é do
ministro dos Transportes à época, coronel Mário Andreazza, no discurso de
inauguração da ponte Presidente Costa e Silva, mais conhecida como Ponte
Rio-Niterói, há 50 anos, em 4 de março de 1974.
O discurso evidencia a
dupla finalidade do ousado empreendimento, então a terceira ponte mais longa do
mundo, com seus 13,2 km de extensão: conectar as duas cidades e funcionar como
peça de propaganda da ditadura militar, algo que, de certa forma, se mantém até
hoje, com a controversa manutenção do nome em homenagem ao seu segundo
presidente.
A ditadura foi
instalada no país há 60 anos, com um golpe militar iniciado em 31 de março de
1964 que derrubou o presidente João Goulart.
Obras grandiosas de
infraestrutura foram um marco do regime autoritário, como a estrada
Transamazônica, as hidrelétricas de Itaipu e Balbina, as usinas nucleares de
Angra dos Reis e a própria Ponte Rio-Niterói.
Celebradas como
símbolos de um "Brasil grande", com acelerado crescimento econômico,
foram também polêmicas pelos atrasos e orçamentos estourados, impactos
ambientais e condições precárias de trabalho.
A Rio-Niterói é
simbólica em todos esses aspectos, vista como um marco da engenharia e exaltada
como "obra do século" pelo governo, como mostram jornais da época.
Seu vão principal, com
uma estrutura em aço inglês de 300 metros de extensão, é até hoje o maior do
mundo em viga reta contínua.
Esse tipo de
construção é pouco usado em grandes vãos, mas foi escolhido devido à
proximidade de dois aeroportos, Santos Dumont e Galeão. Outras técnicas de
engenharia, como ponte pênsil ou estaiada, teriam comprometido a passagem dos
aviões.
"Se você um dia
passar na ponte Rio-Niterói, no ponto mais alto, lembre-se que você está a 130
metros de onde estão cravadas as fundações da ponte na rocha", explica o
engenheiro Carlos Henrique Siqueira, que há 52 anos trabalha na ponte.
Siqueira começou em
1972, aos 24 anos, como engenheiro mais jovem na supervisão da obra e permanece
até hoje, como consultor da Ecoponte, concessionária responsável pela operação
da via.
"Se você pegar a
largura desse vão de 300 metros e essa altura de 130 metros, você coloca três
estádios do Maracanã ali embaixo."
A grandiosidade do
projeto impressiona, mas por outro lado sua construção ficou marcada por
acidentes fatais, atraso na obra e críticas à má-qualidade dos materiais
usados. A ponte virou alvo de uma tentativa de CPI.
O regime foi obrigado
a trocar o consórcio responsável e passou a tocar a obra em ritmo frenético a
fim de atender “prazos políticos”.
Os custos explodiram,
e, embora não existam dados oficiais a respeito, estima-se que o preço final
tenha ficado até quatro vezes o valor original.
• O fracasso inicial
Antes da ponte, a
viagem entre Rio de Janeiro e Niterói levava mais de duas horas, seja por
balsa, incluíndo o tempo de espera, seja contornando a Baía de Guanabara, em um
trajeto de cerca de 100 km que cruzava o que hoje são outros cinco municípios
da Baixada Fluminense.
A ideia de ligar as
duas cidades por uma ponte ou por túnel submerso era debatida há mais de um
século e ganhou força na ditadura sob o argumento de que a obra era de
interesse nacional, porque integraria também a BR-101, estrada que desce o
litoral do país de norte a sul.
Em fevereiro de 1965,
o presidente Castello Branco criou um grupo de trabalho sobre o tema que, dois
meses depois, optou pela ponte, alternativa mais barata e com tecnologia que o
Brasil dominava melhor.
Foram mais quatro anos
de estudos, elaboração de projetos e processos de licitação. A ponte começou a
ser construída, de fato, no início de 1969.
O Brasil atravessava
naquele momento o endurecimento da ditadura com a edição do Ato Institucional
número 5 (AI-5), medida mais extrema do regime, que autorizava o presidente a
fechar o Congresso Nacional, cassar mandatos parlamentares, intervir em Estados
e municípios, suspender os direitos políticos e civis.
A ousada previsão
inicial de entrega era março de 1971, e a execução do orçamento inicial foi
acelerada para dar conta do prazo. Mas só 20% da obra havia sido construída até
janeiro do ano previsto, como reconheceu o governo.
Também foram feitas
muitas críticas de engenheiros à qualidade dos métodos de construção,
equipamentos e materiais.
Alguns desses
problemas ficaram evidentes em acidentes fatais, o mais grave deles em 24 de
março de 1970, quando parte do empreendimento literalmente afundou.
Naquele dia, foi feito
um teste das fundações, aplicando uma técnica para fundações profundas de
concreto com uma plataforma que sustentava 34 tubulões, cada um com 22 metros
de comprimento, que seriam preenchidos com água.
• A tentativa de CPI da Ponte
Foi nesse contexto que
o MDB, único partido de oposição autorizado a atuar no país entre 1966 e 1979,
tentou criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito, a CPI da Ponte.
O objetivo seria
“apurar as causas que levaram o governo à desapropriação (do primeiro
consórcio) e possíveis prejuízos ao erário”, noticiou o Jornal do Brasil, em 2
de fevereiro de 1971.
A tentativa foi
barrada pelo Arena, partido governista com maioria no Congresso. O então líder
do governo, deputado Geraldo Freire, acusou o MDB de agir por interesses
políticos, “pretendendo criar em torno dela (a construção da ponte) não a
imagem de obra do século, mas de escândalo do século”, registrou o Jornal O
Globo, em 27 de maio do mesmo ano.
Entre os documentos
citados no pedido de CPI, estava um relatório de novembro de 1970 produzido
pelos engenheiros que haviam projetado a ponte e supervisionavam a obra.
Eles diziam que “o
andamento lento decorre de muitas modificações desnecessárias do projeto,
resultando no abandono de obras previamente executadas; de um planejamento e
sequência das operações de construção inapropriadas; e de atrasos causados pela
baixa qualidade da execução”.
Um trecho alertava que
“diversos tubulões e alguns blocos de coroamento (estrutura que transfere a
carga dos pilares para as fundações profundas) estão consideravelmente
defeituosos”.
O documento ainda
apontou sobre as fundações que “a qualidade do concreto estava tão ruim que
este material não poderia ser propriamente considerado como sendo concreto”.
O MDB citava também,
na justificativa para a CPI, uma carta ao Ministro dos Transportes enviada pelo
engenheiro Fernando Lobo Carneiro em julho de 1970.
Carneiro era chefe do
programa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e tinha
desenvolvido um método para calcular a resistência dos concretos à tração,
aplicado mundialmente e conhecido como “Brazilian Test”.
Na carta, ele
criticava técnicas usadas na construção, em especial a decisão de concretar a
laje superior em duas camadas, em vez de uma só. Esse método vinha provocando
rupturas em construções nos Estados Unidos, no Canadá, na África, e mesmo no
Brasil, na adutora de Ribeirão das Lajes.
O problema de realizar
em duas etapas, explicou Carneiro na carta, é que isso comprometeria a
eficiência e segurança da construção da ponte.
O engenheiro
argumentou que o método usado envolvia o uso de cabos dentro da estrutura de
concreto para aumentar sua resistência e que a forma mais adequada para que
isso fosse feito era a concretagem em uma única etapa.
“Certas técnicas
construtivas que se pretendem adotar na execução da ponte Rio-Niterói, e que
têm em vista, fundamentalmente, a redução de custo e do prazo de execução,
estão muito longe de terem sido comprovadas pela prática”, criticou.
“Trinta e três
tubulões já estavam cheios, e faltava apenas um, quando se ouviu um estrondo
violento, e a plataforma desabou”, descreveu a reportagem do jornal O Globo no
dia seguinte ao acidente.
“Os que trabalhavam na
proximidade foram arrastados pela sucção das duas mil toneladas dos tubulões
cheios de água". Três engenheiros e cinco operários morreram no acidente.
A situação da
construção da ponte a essa altura era tão delicada que, naquele mês, o regime
decidiu trocar o consórcio responsável pela maior parte da obra — a exceção
foram os vãos centrais, que seriam executados por um consórcio inglês.
O grupo formado pelas
empreiteiras Construtora Brasileira de Estradas (CCBE ), Ferraz Cavalcanti,
Servix e Empresa de Melhoramentos e Construção (Emec) tinha oferecido o menor
lance da licitação, quase metade do segundo colocado.
O consórcio perdedor
acabou chamado para concluir a ponte — entre as novas empresas, estavam Camargo
Corrêa e Mendes Júnior, que décadas depois foram alvo da Operação Lava Jato,
acusadas de pagamento de propinas em troca de favorecimentos em contratos da
Petrobras.
O engenheiro Benjamin
Ernani Diaz foi responsável por projetar a maior parte da ponte com Antônio
Alves de Noronha Filho. Ele aponta à BBC News Brasil dois fatores principais
para o difícil andamento inicial da obra.
O primeiro, afirma
Diaz, foi a compra de equipamentos fracos para a perfuração do solo, e o outro,
a opção por concretar a laje em duas etapas — ambas atribuídas ao consórcio
responsável.
Profissional renomado
em sua área, Diaz foi pioneiro no uso de computadores na engenharia civil
brasileira e pela introdução no país de uma tecnologia mais moderna de colagem
de aduelas (estruturas pré-fabricadas de concreto armado), no projeto da ponte.
“O que aconteceu é que
compraram equipamento muito fraco, barato, para fazer a fundação, e a máquina
que perfurava o solo não atingia profundidades adequadas”, lembra Diaz, que foi
também chefe de projeto da Usina Nuclear de Angra 2, professor da UFRJ e, hoje,
atua como consultor.
Já o consórcio
construtor dizia que o estudo de viabilidade da obra, que constava do edital de
licitação, trazia informações erradas sobre a profundidade da baía para a
fixação das fundações da ponte.
Isso exigiria a
importação de equipamentos de perfuração mais caros do que os previstos
inicialmente.
O governo acabou sendo
alvo de críticas também. O Clube de Engenharia divulgou um relatório em maio de
1971 condenando os “prazos políticos para conclusão de obras públicas”.
Segundo uma reportagem
do Jornal do Brasil, a carta citava a Ponte Rio-Niterói como exemplo de
empreendimento em que a definição inicial de prazos curtos e orçamentos baixos
pelo governo comprometiam a segurança da obra.
Em um editorial de 13
de janeiro de 1971, o próprio Jornal do Brasil também condenava a “pressa” no
lançamento do projeto.
“A ponte, que esperou
cem anos ou mais, poderia esperar mais algum tempo para sair um projeto
perfeito, baseado em cálculos exatos, em pesquisas detalhadas, previstas todas
as consequências”, dizia o editorial.
Por decisão política,
o regime militar não demoliu dois vãos construídos com os métodos criticados,
conta Carlos Henrique Siqueira.
Em vez disso, foram
projetados reforços para essa estrutura, que correspondiam aos dois primeiros
vãos sobre o mar, na margem do Rio de Janeiro.
“Aquilo que havia sido
feito, pensou-se derrubar. Destrói tudo e faz de novo. Porém, o governo
brasileiro disse que ia ser uma coisa muito dramática. A sociedade aí é que não
ia acreditar mesmo (na construção da ponte)”, recorda.
‘Pau na máquina’
Com a troca de
consórcio, o governo passou a gerenciar diretamente o empreendimento por meio
de uma estatal, pagando 9% dos custos como remuneração às empreiteiras, e
imprimiu um ritmo acelerado.
Andreazza dizia que a
ponte precisava ser entregue logo porque seria a cobrança de pedágio que
pagaria os empréstimos que bancaram a obra.
Mas havia também o desejo
do ministro e do presidente Emílio Médici de concluir a obra antes do fim do
seu mandato, que de fato acabou apenas onze dias após a inauguração da ponte.
Para Claudio
Frischtak, ex-economista do Banco Mundial e presidente da consultoria Inter.B,
o coronel Andreazza, ministro dos Transportes, tinha pretensões presidenciais,
mesmo não sendo general (a mais alta patente militar). Ele de fato tentou
disputar pelo PDS a eleição indireta de 1985, que marcou o fim do regime
militar, mas acabou preterido.
“Era um cara
relativamente jovem na época, boa pinta, (perfil de) executivo, e extremamente
ambicioso. Queria colocar sua a marca, não só em termos de rodovias, como
talvez na ópera máxima dele, que seria essa ponte”, dizia a reportagem.
“Aí ele fez uma coisa
comum em países autoritários, que era: 'pau na máquina!' Então, é um ‘pau na
máquina’ que você não sabe exatamente qual foi o custo humano e nem tampouco o
custo financeiro, quanto custou essa ponte, ao fim e ao cabo”, ressalta.
O engenheiro Ernani
Diaz lembra-se da pressa nessa segunda etapa: “(O orçamento subiu) porque o
segundo consórcio começou a cobrar equipamento para manter o prazo do governo.
Se for fazer uma ponte em quatro anos em vez de dois, precisa de menos equipamento.
Aí, para fazer mais rápido, começou a exigir outras duas treliças (para içar os
pedaços da ponte)”.
Carlos Siqueira também
se recorda do ritmo frenético. "O governo tinha ciência da magnitude do
projeto. Eu trabalhava na supervisão da ponte e, se eu quisesse trabalhar 24
horas por dia, era permitido, porque a minha empresa ganhava um percentual em
cima do meu salário. A obra deslanchou”, conta.
A construção acelerada
favorecia os acidentes de trabalho em meio à falta de equipamentos adequados se
segurança. No seu auge, 10 mil pessoas trabalhavam na ponte.
Em maio de 1971,
durante uma visita da imprensa à obra, o coronel João Carlos Guedes,
administrador da empreitada, disse que o governo já tinha distribuído "1,2
mil pares de sapatos, pois só no mês passado 170 trabalhadores furaram os pés
com pregos”.
“Como têm um prazo de
seis dias para tratamento, isso vinha produzindo prejuízos consideráveis ao
andamento da obra”, disse ainda.
Acidentes mais graves
causaram dezenas de mortes. Não há números oficiais, mas as pesquisas de
Siqueira apontam para cerca de 40.
• Custos altos e incertos
As informações sobre a
evolução dos custos da obra não são precisas. Registros oficiais e da imprensa
indicam que o projeto teria saído de um orçamento inicial de 344 milhões de
cruzeiros — considerando os contratos de 1968 com os consórcios brasileiro e
inglês — para ao menos 1 bilhão de cruzeiros, impactado por fatores como
alterações no projetos, novas vias a serem construídas nos acessos e reajustes
inflacionários.
Uma estimativa do MDB
divulgada durante a tentativa de CPI, em maio de 1971, previa gastos de mais de
1,8 bilhão de cruzeiros, englobando custos com projetos, desapropriação, obras
e a troca dos consórcios.
Também há informações
sobre a evolução dos valores em dólares. Segundo uma reportagem de 12 fevereiro
de 1971 do Jornal do Brasil, o estudo de viabilidade da obra feito em 1967
estimava um custo de US$ 100 milhões.
No início de 1971, o
primeiro consórcio já previa o custo final em US$ 250 milhões.
"Antes mesmo da
concorrência, os dirigentes do (primeiro) Consórcio sabiam que o custo previsto
no estudo de viabilidade econômica era insuficiente para a construção da ponte.
Confiavam em reajustamentos, usuais em obras públicas e que por certo não
faltariam na Ponte Rio-Niterói, obra considerada como de importância econômica
e promocional pelo Governo Costa e Silva", dizia outra reportagem do
Jornal do Brasil de fevereiro de 1971.
"As dificuldades
surgidas com as fundações (da ponte na Baía) ampliaram a margem de erro
original. As últimas análises mostraram que o custo final seria 2,5 vezes maior
que o calculado", continuava a reportagem.
O saldo final da obra
teria ficado na casa de US$ 400 milhões, segundo o engenheiro Carlos Henrique
Siqueira, pesquisador da ponte.
"Foi o valor que
encontramos ao final da obra, no fechamento do orçamento. Hoje, não se constrói
(ponte similar) por menos de R$ 8 bilhões (cerca de US$ 1,6 bilhão, para termos
de comparação)", estima, atribuindo o custo maior à disparada de preços de
insumos como gasolina e aço e regras mais rígidas com meio ambiente e
segurança.
"De fato, os
jornais da ocasião criticavam muito. Havia um determinado jornal que todo dia
dizia 'elefante branco, não vai servir para nada, jogar dinheiro fora', quando
não queriam dizer que algum dinheiro ia ser desviado", lembra Siqueira.
"Vejam como essas
vozes da discórdia estavam erradas. Quem pode imaginar hoje Rio e Niterói sem
essa ponte? Quando ela fica engarrafada, ela para literalmente o trânsito nas
duas cidades", defende.
Não há denúncias
concretas de corrupção envolvendo a ponte, e os engenheiros que atuaram na obra
ouvidos pela reportagem dizem não acreditar nisso.
Para o historiador
Pedro Campos, professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
(UFRRJ), a falta de denúncias não é garantia de que não houve corrupção.
Autor do premiado
Estranhas Catedrais, livro em que analisa a relação do regime autoritário com
empreiteiras, Campos diz que pagamentos de propinas e contratos direcionados
eram comuns, mas dificilmente eram revelados devido à repressão.
“Os mecanismos de
fiscalização e controle não estavam devidamente operacionais, porque a ditadura
censurava os veículos de comunicação, a oposição política, dentre outros
segmentos e agentes sociais que poderiam fazer acusações”, diz.
As denúncias ficaram
mais fortes ao final do regime e atingiram ministros do regime, como Delfim
Neto (Fazenda, Agricultura e Planejamento) e Andreazza (Transportes e
Interior), como registrou, inclusive, um telegrama secreto da embaixada dos
Estados Unidos no Brasil para Washington, revelado pelo jornal O Globo em 2018.
• Metrô e troca de nome: debates que não
avançam
Em média, 150 mil
veículos trafegam diariamente pela cinquentenária ponte Rio-Niterói,
transportando cerca de 400 mil pessoas por dia, segundo dados da concessionária
Ecoponte.
Engarrafamentos são
comuns pela manhã, no sentido Rio-Niterói, e no fim da tarde, no sentido
contrário.
Para Claudio
Frischtak, o principal problema da obra foi priorizar apenas o transporte
rodoviário, ou seja, sem estrutura para metrô ou trem, seguindo o modelo que
predominava no país desde os anos 1950.
"Foi uma obra
importante, mas com problema de desenho, porque não deu opção ferroviária. Hoje
nós temos um problema gravíssimo de conexão do Rio para Niterói e São Gonçalo,
um município dormitório (que a população deixa durante o dia para trabalhar),
pobre e muito populoso", analisa.
"E os mais pobres
se deslocam como? Com sorte, com van. Se não, com ônibus apertados",
continua.
Também crítico da
ponte exclusivamente rodoviária, o historiador Pedro Campos atribui esse tipo
de problema ao fato de a população não ter voz na ditadura.
"Essas grandes
obras não eram submetidas ao escrutínio popular para que as pessoas pudessem
escolher se queriam um hospital ou uma estrada no meio da região Amazônica. Se
queriam melhores escolas, ou maior hidrelétrica do mundo", destaca.
"São projetos
feitos à revelia da população, (decididos) por pouquíssimos agentes, um círculo
restrito a oficiais militares e grandes empresários, e marcados pela exploração
intensa da força de trabalho", acrescenta.
Embora se discuta a
construção de um túnel de metrô submerso para ligar Rio e Niterói, não há
qualquer previsão concreta para a obra. Outra questão controversa da ponte sem
previsão de mudanças é seu nome.
Já foram apresentados
projetos de lei para alteração na Câmara dos Deputados, e o Ministério Público
Federal pediu o mesmo à Justiça Federal do Rio de Janeiro em 2015, mas nenhuma
iniciativa prosperou.
"Ninguém a
conhece pelo nome do general sei lá o quê. Eu fui chefe de projeto da Ponte
Rio-Niterói. É perda de tempo (mudar o nome oficial)" avalia o engenheiro
Ernani Diaz.
O historiador Pedro
Campos discorda. "Isso expressa bem a dificuldade que a gente tem de
desenvolver uma política de memória que de fato avance no processo pedagógico
de mostrar à população o que foi ditadura, os crimes bárbaros que foram
cometidos naquela época", crítica.
"Infelizmente, a
ausência dessa política de memória é um terreno também fértil para o
desenvolvimento de uma certa extrema-direita que vai ser saudosa da
ditadura", acredita.
Fonte: BBC News Brasil
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