quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025

Plinio Teodoro: Governo Lula - o racha entre Rui Costa e Haddad e a carta de Kakay

A tensão que paira sobre a ultradireita com a iminência da denúncia de Jair Bolsonaro (PL) por tentativa de golpe de Estado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) poderia ser um fator que daria tempo para o governo se alinhar para uma ferrenha disputa eleitoral, em um cenário internacional adverso, em 2026.

Poderia.

No entanto, Lula tem se dedicado a combater fogo-amigo, expresso na carta do advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, e um racha que se instalou no centro do governo, que opõe o grupo liderado pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa, contra outro, comandado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Fontes palacianas afirmam que Lula classificou como "forte" o conteúdo da carta de Kakay e teria se irritado com o que considera críticas infundadas do advogado.

No entanto, o principal ponto que irritou Lula foi a revelação por Kakay de uma conversa particular ocorrida na casa do advogado, em 12 de dezembro, em que Lula teria dito que um político presente almejava um ministério.

"Ao sair da roda o Lula me falou baixinho, rindo: 'este jamais será meu Ministro, e acha que vai ser'. Dia 1º de janeiro ele assumiu como Ministro", revelou Kakay.

Lula viu a divulgação do ocorrido como quebra de confiança por parte do advogado por expor a conversa e deixar no ar um clima de "quem seria?" no Ministério.

O presidente, no entanto, não pretende conversar com Kakay, a quem considera - considerava? - um amigo.

·        Racha

A carta de Kakay ainda alimentou o racha no governo por se antecipar ao próprio Lula na escolha de seu sucessor.

"Nós temos o Haddad, o mais fenomenal político desta geração em termos de preparo. Um gênio. Preparado e pronto para assumir seu papel", escreveu o advogado.

A declaração foi vista com desconfiança pelo grupo liderado por Rui Costa, que tem ao lado o ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira.

<><> ENTENDA:

Silveira assumiu o ministério na cota de Gilberto Kassab, presidente do PSD, que recentemente criticou Lula e classificou Haddad como um ministro "fraco".

Nos bastidores, o grupo de Haddad vê Silveira como uma espécie de "cavalo de Troia" de Kassab, que busca sabotar medidas econômicas da Fazenda.

A desconfiança aumentou após as críticas de Kassab - que recuou em relação a Lula, mas não em relação a Haddad.

Presidente do PSD, Kassab é assessor especial do governador Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos), que vem flertando com a terceira via, que funde a mídia liberal ao sistema financeiro.

Kassab seria o responsável por aglutinar as forças do Centrão à terceira via em uma cada dia mais provável candidatura Tarcísio em 2026.

No entanto, ele já estaria mirando uma possível disputa em 2030 entre Tarcísio e Haddad, a quem nutre mágoa desde 2012, quando o ministro venceu José Serra na disputa à prefeitura de São Paulo e desmontou todo o aparato de corrupção criado nas administrações tucanas que eram comandados e irrigavam as negociatas políticas de Kassab.

Em 2022, Haddad também articulou para levar Geraldo Alckmin ao PSB para ser o candidato a vice de Lula - acabando com o sonho do presidente do PSD de ser alçado ao posto.

·        Disputa no centro do governo

O racha no centro do governo Lula teria se aprofundado após o presidente ficar ao lado do grupo de Rui Costa e anunciar, ao mesmo tempo, o ajuste fiscal e a isenção do imposto de renda para aqueles que ganham até R$ 5 mil.

Haddad, juntamente com o presidente do Banco Central Gabriel Galípolo, teria alertado que a comunicação dos dois fatos ao mesmo tempo iria cair como uma bomba no mercado financeiro, elevando a cotação do dólar acima dos R$ 6 - o que, de fato, aconteceu.

Lula, no entanto, teria se posicionado ao lado do grupo de Rui Costa, que defendeu a divulgação simultânea das duas medidas.

O mal-estar continuou e no domingo (16), o grupo de Rui Costa se reuniu com Lula, indicando que a queda na popularidade do presidente estaria atrelada ao desgaste a medidas do Ministério da Fazenda.

Haddad, que está em viagem ao Oriente Médio, não participou da reunião.

No encontro, Lula foi informado que a queda na aprovação do governo teria se dado por causa da taxação das blusinhas da Shein, em 2023, e mais recentemente, pelo recuo diante das mudanças propostas pela Fazenda sobre o Pix, que foi alvo de uma série de fake news da oposição.

Fontes do Palácio avaliam que há uma tentativa de Costa em partir para cima de Haddad. Silveira, do PSD de Kassab, estaria aproveitando o cenário para cumprir a função de "cavalo de Troia" para atacar o adversário do presidente do PSD.

Aos 79 anos, em seu terceiro mandato após passar 580 dias preso por uma decisão injusta e parcial, Lula se colocou a serviço do Brasil para frear o avanço do neofascismo da ultradireita bolsonarista e colocar o país de volta nos trilhos para o futuro.

No entanto, para isso, o presidente precisa conviver com um antigo estigma que acompanha o PT: de que o partido é o principal adversário do próprio partido.

¨      "Quem distorce é porque vive de mentira", diz Kakay após texto sobre Lula

O advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, um dos nomes do Direito mais próximos a Lula, reafirmou em conversa com a Fórum seu apoio ao presidente após um texto no qual expressa preocupação com o atual governo viralizar nas redes sociais, inclusive entre bolsonaristas. 

Enviado em grupos de WhatsApp com ministros e aliados do governo, o texto em questão compara, em tom crítico, os dois primeiros mandatos do presidente com o terceiro, iniciado em janeiro de 2023. 

“O Lula do 3º mandato , por circunstâncias diversas, políticas e principalmente pessoais, é outro. Não faz política. Está isolado. Capturado. Não tem ao seu lado pessoas com capacidade de falar o que ele teria que ouvir. Não recebe mais os velhos amigos políticos e perdeu o que tinha de melhor: sua inigualável capacidade de seduzir, de ouvir, de olhar a cena política", diz um trecho da mensagem assinada por Kakay. 

A íntegra do texto foi veiculada pela imprensa nesta segunda-feira (17) e, prontamente, perfis bolsonaristas passaram a repercutir as críticas de Kakay e afirmar que o advogado "pulou do barco" do governo. 

À Fórum, Kakay criticou as distorções que vêm sendo feitas ao seu texto, que segundo ele tratou-se apenas de uma "reflexão" sobre o momento político, e reafirmou seu apoio a Lula. 

"Não quero polemizar com bolsonarista. Não acompanho rede social. Continuo com o mesmo desprezo aos fascistas. Recebi, diretamente, dezenas de manifestações de ministros, todos solidários. Não quero politizar meu texto. Nem era um alerta para ninguém. Nada mais do que uma reflexão. Quem distorce meu texto é porque vive de mentira e de análises truncadas", disse o advogado. 

"Fiz breve reflexão por apoiar o Lula e acreditar na sua enorme capacidade de liderança. Este é o ponto, quem apoia tem o direito, até obrigação, de levantar com lealdade certas questões", prosseguiu Kakay. 

<><> RELEMBRE

>>>>>>Íntegra da reflexão de Kakay enviada a ministros e aliados do governo: 

Lula, a esperança da democracia.

“Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro", Clarice Lispector.

Lula ganhou 3 vezes e elegeu Dilma como sua sucessora. À época elegeria o qualquer de seus Ministros pois era imbatível.

Certa vez conversando com um Senador-do PT- ele me disse que tinha um ano tentava uma audiência com a Presidenta Dilma. Ela não fazia política. Sofreu impeachment.

Um dia no Governo Lula um Senador da oposição me liga as 11 hs da manhã e reclama que tinha assumido há 15 dias- era suplente- e que não havia sido recebido pelo Zé Dirceu, chefe da Casa Civil. Liguei para o Zé . As 12.30 a gente estava almoçando no Palácio do Planalto. O Zé - de longe o mais preparado dos Ministros- deu um show discorrendo sobre o Estado de origem do Senador, que saiu de lá com o número do celular do Zé e completamente encantado.

Neste atual governo Lula fez o que de melhor podia ao enfrentar Bolsonaro e ganhar do fascismo impedindo que tivéssemos mais 4 anos de Bolsonaro. Seria o fim da democracia. Seriam destruídas de maneira irrecuperável tudo que foi construído nos governos democráticos, não só do PT. O fascismo acaba com tudo. Este o maior legado do Lula. Para tanto foi necessário, senão não teríamos ganhado, fazer uma aliança ampla demais. Só o Lula conseguiria unir e fazer este amplo arco para derrotar Bolsonaro. Aqui em casa , no dia da diplomação , 12 de dezembro,determinado político se aproximou em um momento em que Lula e eu conversávamos, colocou amistosamente a mão no meu ombro e fez uma brincadeira. Ao sair da roda o Lula me falou baixinho, rindo :” este jamais será meu Ministro, e acha que vai ser.” Dia 1º de janeiro ele assumiu como Ministro. Este o brilhantismo do Lula neste momento difícil. Não fosse sua maturidade não teríamos tido chance de vencer o fascismo. Por isto cometo aqui certa indelicadeza de comentar este fato: para ressaltar a maturidade do Presidente Lula.

Mas o Lula do 3º mandato , por circunstâncias diversas, políticas e principalmente pessoais, é outro. Não faz política. Está isolado. Capturado. Não tem ao seu lado pessoas com capacidade de falar o que ele teria que ouvir. Não recebe mais os velhos amigos políticos e perdeu o que tinha de melhor: sua inigualável capacidade de seduzir, de ouvir, de olhar a cena política.

Outro dia alguns políticos me confidenciaram que não conseguem falar com o Presidente. É outro Lula que está governando.

Com a extrema direita crescendo no mundo e, evidentemente aqui no Brasil, o quadro é muito preocupante. Sem termos o Lula que conhecíamos como Presidente e sem ele ter um grupo que ele tinha ao seu redor, corremos o risco do que parecia impossível: perdermos as eleições em 2026. Bolsonaro só perdeu porque era um inepto. Tivesse ouvido o Ciro Nogueira e vacinado, ou ficado calado sem ofender as pessoas, teria ganho com a quantidade de dinheiro que gastou. Perder uma reeleição é muito difícil, mas o Lula está se esforçando muito para perder. E não duvidem dele, ele vai conseguir.

Claro que as circunstâncias estão favoráveis ao projeto de perder as eleições. Não dou tanto importância para estas pesquisas feitas o tempo todo. Mas prestei atenção nesta que indica que 62% não querem que Lula seja candidato a reeleição. A pergunta é : quem é seu sucessor natural? Não foi feito um grupo ao redor do Presidente, que se identifique com ele e de onde sairia o sucessor político natural, o “ grupo” do Lula a gente sabe quem é. E certamente não vai tirá-lo do isolamento. Ele hoje é um político preso à memória do seu passado. E isolado. Quero acreditar na capacidade de se reencontrar. Quem se refez depois de 580 dias preso injustamente, pode quase tudo . E nós temos o Haddad, o mais fenomenal político desta geração em termos de preparo. Um gênio. Preparado e pronto para assumir seu papel.

Já fico olhando o quadro e torcendo para o crescimento de uma direita civilizada. Com a condenação do Bolsonaro e a prisão, que pode se dar até setembro, nos resta torcer para uma direita centrista, que afaste o fascismo.

Que Deus se apiede de nós!

É necessário lembrar o mestre Torquato Neto no Poema do Aviso Final:

“É preciso que haja algum respeito , ao menos um esboço ou a dignidade humana se afirmará a machadada.”

¨      Kakay errou, diz Marco Aurélio Carvalho, do grupo Prerrogativas. Por Blog do Rovai

Em mensagem ao blog na manhã desta terça-feira (18), o coordenador do Grupo Prerrogativas, Marco Aurélio Carvalho, criticou a carta em que o advogado  Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, afirma que Lula "não faz política" e "está isolado".

"O Lula do 3º mandato , por circunstâncias diversas, políticas e principalmente pessoais, é outro. Não faz política. Está isolado. Capturado. Não tem ao seu lado pessoas com capacidade de falar o que ele teria que ouvir. Não recebe mais os velhos amigos políticos e perdeu o que tinha de melhor: sua inigualável capacidade de seduzir, de ouvir, de olhar a cena política", diz trecho da carta de Kakay, enviado em grupo de WhatsApp com ministros e aliados do governo.

Para o coordenador do Prerrô, Kakay errou ao fazer uma análise parcial que não condiz com a realidade sobre Lula e seu governo.

"Kakay errou", disse Carvalho, sinalizando que o equívoco foi "tático" e "estratégico".

"A questão é tática e estratégica. E nem por uma questão tática e nem estratégica ele acertou", disse ao blog.

O advogado ainda ressaltou que tem respeito profundo por Kakay, mas que isso não o impede de divergir do posicionamento do colega.

"E não estou discutindo o mérito. Porque no mérito ele pode ter razão em algumas coisas. Porque você ouve algumas coisas, que confirmam que ele falou, e eu ouço outras que também confirmam. Agora dizer que ele foi capturado, que não está fazendo política. Não reconhecer o número enorme de atividades que o presidente, de 80 anos, teve só na semana passada. Ele esteve em quatro Estados. E parece que o Kakay não acompanha. Se quer criticar, estuda direito para fazer uma crítica correta", afirmou.

Carvalho ainda listou a agenda de Lula da última semana para exemplificar o que considera contrariedade no texto do colega.

"Lula esteve no Amapá, na Bahia, no Rio de Janeiro, no Pará. Recebeu o presidente da Câmara, o ex e o atual, do Senado. Recebeu as principais lideranças políticas, do Judiciário, se reuniu com a bancada do PT. Então, como ele não está fazendo política?", indagou.

Segundo o coordenador do Prerrô, Kakay, em seu texto, "cria a ideia de um cara frágil" sobre Lula e acena à ultradireita ao mencionar Ciro Nogueira, presidente do PP e ex-ministro da Casa Civil de Jair Bolsonaro (PL).

Segundo Kakay, se Bolsonaro tivesse ouvido o cacique do Centrão "e vacinado, ou ficado calado sem ofender as pessoas, teria ganho [as eleições presidenciais] com a quantidade de dinheiro que gastou".

"Ele fala no texto em 'direita civilizada', faz um aceno para aquele Ciro Nogueira. Olha o Kakay é um amigo irmão, amo ele de paixão, mas cometeu um grande erro", concluiu o coordenador do Prerrô.

¨      Berzoini avalia que há um problema de coordenação do governo Lula

O ex-ministro e ex-secretário de Relações Institucionais do governo federal, Ricardo Berzoini, foi entrevistado no programa Fórum Onze e Meia, desta terça-feira (18), e avaliou questões relacionadas às críticas recebidas pelo executivo, até mesmo por setores ligados ao campo progressista.

Indagado sobre o tema, Berzoini revelou que observa um problema de coordenação do governo.

“É óbvio que não podemos cobrar do Lula a solução para tudo, mas ele é o presidente. Há muita reclamação em relação ao funcionamento da chamada coordenação política. Não é uma crítica direta, mas é importante ver como às vezes as coisas podem ser melhor planejadas”, afirmou.

O ex-ministro citou um exemplo: “O governo chamou uma reunião para discutir o preço dos alimentos. Parece que havia cinco ministros. A expectativa que se criou é que dessa reunião sairia o anúncio de medidas concretas pra enfrentar uma questão que o governo não tem tanto poder assim, porque depende dos mercados local e internacional”, destacou.

Porém, argumentou Berzoini, o governo gasta muito dinheiro com o Plano Safra. “Portanto, em tese, tem um poder de interlocução grande com o setor, tem o ministro da Agricultura que é do setor, além de ter o ministro do Desenvolvimento Agrário que é bem relacionado com a agricultura familiar”.

Berzoini ressaltou que, diante deste cenário, a expectativa que se criou é que, durante a reunião, seriam anunciadas medidas concretas. “Mas, na coletiva depois da reunião, em minha opinião, não foi preparado o que cada um ia dizer e só tinham, digamos, possibilidades de, talvez, quem sabe...”.

Na avaliação do ex-ministro, eventos como esse “desgastam o governo, tanto quanto o PIX. Isso pode estar ocorrendo por falta de coordenação política, planejamento do que vai ser dito. O governo não pode ser pautado, tem que pautar. Quando você tem um assunto como este, delicado, o preço dos alimentos, você tem que pensar o seguinte: ou eu tenho algo muito importante para dizer, ou vou tratar de outro assunto, vou criar outra pauta”.

Berzoini considera que o assunto não é de fácil solução. “O governo tem que agir no crédito, na questão fundiária, nos estoques. Isso revela uma falta de coordenação, que já apareceu na questão do PIX e já apareceu em outros assuntos que nós estamos torcendo para que o pessoal se acerte, para que não haja mais esse tipo de desgaste”, acrescentou.

“O que o PT cresceu na constituição, reduziu o trabalho de base”

Berzoini também analisou o avanço das igrejas neopentecostais nas periferias e como isso afeta, diretamente, a atuação e a aprovação do governo.

Ele destacou em, em pouco mais de duas décadas, mudou muito o cenário da periferia no Brasil.

“A presença dos evangélicos neopentecostais na periferia era muito menor do que hoje. O fato é que cresceu muito. A principal característica dessa atuação é que não é só religiosa. Aliás, não é nem majoritariamente religiosa, é comunitária. Há uma relação comunitária, de solidariedade, de busca de atendimento psicológico, de apoio a casais, apoio no desemprego”, disse.

“Eu creio que a esquerda fez menos isso do que no passado. A esquerda brasileira retrocedeu em capilaridade. O que o PT cresceu na constituição, reduziu o trabalho de base. Tenho insistido nisso desde a época do golpe. Há tempo de mudar essa percepção”, apontou Berzoini.

 

Fonte: Fórum

 

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