André Barbieri: A Europa
do capital nas mãos de Trump
Trump
busca aprofundar a decadência e subordinação da Europa no marco da competição
com a China e a Rússia. Uma política independente dos trabalhadores precisa
recolocar a ideia dos Estados Unidos socialistas da Europa.
As primeiras semanas da administração Trump
foram um exercício de duro auto-reconhecimento por parte da Europa. As
potências europeias atinaram com sua própria fraqueza. Pior, sentiram em magro
esplendor sua dependência agravada diante dos Estados Unidos. Até então
ensombrados pelo abraço de Washington - que com Joe Biden ainda mostrava
condescendência com as alianças transatlânticas e suas instituições - os governos
europeus se veem agora mergulhados no amargo desprezo do expansionismo
trumpista. Recebem doses cavalares daquela máxima do historiador grego
Tucídides: “o forte faz o que quer e o fraco sofre o que deve” - máxima que
passou a ser o cinismo reacionário do ecossistema do capital.
Eram previsíveis determinados aspectos da
mensagem que o novo governo estadunidense preparava à Conferência de Segurança
em Munique, a primeira da era Trump 2.0. Os governos europeus, que encabeçaram
uma nefasta corrida militarista como parte de sua ação logística coordenada com
os EUA na Guerra da Ucrânia - instrumentalizando para seus propósitos de
exploração o justo repúdio da população à invasão militar reacionária da Rússia
- sabiam que Trump buscaria descarregar o peso da defesa continental sobre o
continente. J.D. Vance, vice-presidente no bilhete trumpista, anunciou
taxativamente que a presença dos Estados Unidos não durará para sempre na
Europa.
Entretanto, os enviados da Casa Branca
iluminaram os resultados da submissão europeia de uma forma nova. A Doutrina
Trump não se limita a funcionários de Estado ideologicamente alinhados no
domínio interno; também inclui a “Europa para os trumpistas”. Segundo Vance, “A ameaça mais grave quanto à segurança da Europa não é a Rússia,
não é a China, não é qualquer outro ator externo. O que mais temo na Europa é a
ameaça que vem de dentro, o recuo europeu de alguns de seus valores mais
fundamentais”. A repressão aos movimentos dos trabalhadores, a
catarata de ajustes econômicos e cortes orçamentários, a criminalização
daqueles que defendem a Palestina contra o terrorismo sionista de Israel: todos
esses “valores” estão bastante presentes nos governos de Emmanuel Macron, Keir
Starmer, Olaf Scholz e cia. Mas deveriam estar acompanhados de um elemento
fundamental, para Vance: a adesão completa à visão de mundo de Donald Trump. A
coincidência, que parecia completa, está perturbada pela incompreensão das
nações europeias de que é Washington quem dá as cartas - e oferece o vinho a
quem escolhe estar à mesa.
A uma semana das eleições alemãs, Vance
aproveitou o palco em Munique para dar seguimento à campanha de Elon Musk em
favor da extrema direita europeia, criticando a “marginalização de forças
julgadas extremistas”, como a neonazista AfD (Alternativa pela Alemanha). Musk
havia participado virtualmente de uma manifestação da AfD em Berlim
anunciando-a como a “única salvação da Alemanha”. A Vance só faltou uma nova
saudação romana. De resto, imitou as diretrizes do bilionário dono da Tesla.
Como discutimos aqui, Trump deu novo
seguimento à campanha xenófoba de deportações contra os imigrantes que havia
sido uma das marcas registradas dos governos Barack Obama e Joe Biden -
agregando às prisões, encarceramentos, e deportações patrocinadas pelo Partido
Democrata um muito peculiar discurso de terror, próprio do trumpismo. A
perseguição aos jovens e trabalhadores que se manifestaram nos Estados Unidos
contra a política sanguinária de Biden-Harris em apoiar Netanyahu no genocídio
contra os palestinos em Gaza também se tornou uma chave política para Trump,
que enfatiza os “inimigos internos”. Políticas semelhantes são parte do
repertório atual das administrações europeias. Como não lembrar das
perseguições de Macron contra ativistas pró-palestinos na França, levando a
julgamento referências do movimento operário como o companheiro Anasse Kazib,
porta voz do Révolution Permanente? Ou a repressão aos atos contra o genocídio
em Gaza, com a prisão de dezenas de manifestantes pelo Partido Trabalhista de
Keir Starmer em Londres? Ou a Zeitenwende do
Partido Social Democrata Alemão (SPD), política de militarização que estimulou
o racismo e o nacionalismo da extrema direita alemã? Apesar de tudo,
entretanto, cada governo tem suas predileções. Com o crescimento da extrema
direita fomentada pelas políticas xenófobas e pró-sionistas de Paris, Berlim e
Londres, Trump se encorajou a facilitar-lhes o caminho.
Vance criticou a decisão da corte
constitucional da Romênia em anular as eleições que haviam dado como vencedor o
ultranacionalista pró-russo Calin Georgescu; assim como a condenação de um
manifestante contrário ao direito das mulheres ao aborto, e a exclusão dos
políticos da AfD da própria Conferência de Segurança em Munique. “O que parece
algo menos claro para mim, e creio que para muitos dos cidadãos europeus, é de
quem exatamente vocês se defendem”, disse o vice-presidente aos representantes
dos governos capitalistas da Europa. A tensão levou o chanceler alemão a
responder criticamente a provocação de Vance. “Também estamos lutando pelo seu
direito de estar contra nós”, disse o ministro da defesa alemão Boris Pistorius,
também em resposta ao discurso do vice-presidente dos EUA. O analista Thomas Latschan lamenta “Quanto mais tempo durava o discurso [de J. D. Vance], mais claro
ficava que a discordância transatlântica não é mais ‘apenas’ sobre as zonas de
crise do mundo, a Ucrânia, o Oriente Médio ou a divisão justa do fardo [militar
na OTAN]. O racha entre os EUA e seus parceiros europeus é muito mais
fundamental. Durante décadas, a tão aclamada ‘comunidade de valores’ foi a cola
ideológica que manteve o mundo ocidental unido. Os aliados da OTAN e da UE
sempre puderam contar com confiança na defesa da democracia, da liberdade de
expressão e do Estado de Direito. Agora, porém, esses termos estão sendo
sequestrados, reinterpretados e redefinidos por elementos da elite política - e
não apenas nos EUA. A brecha também se abriu dentro da aliança transatlântica.”
Em contrapartida, o ministro das Relações
Exteriores da China, Wang Yi, subiu ao palco, com um tom muito mais
conciliatório. Wang disse que considerava a Europa e a China como “parceiros,
não rivais”. Pequim, disse ele, “sempre viu na Europa um pólo importante no
mundo multipolar”. O alto representante chinês enfatizou a necessidade de
“preservar o sistema internacional liderado pela ONU” e afirmou que a Europa
tinha um “papel fundamental” a desempenhar no processo de paz na Ucrânia.
Trata-se da política oficial de Xi Jinping, de aproveitar as fissuras causadas
por Trump para fazer o Estado capitalista chinês emergir como representante da
globalização neoliberal e da estabilidade das relações comerciais com os velhos
aliados agora atacados pelos Estados Unidos.
Trump havia deixado claras suas intenções
quanto à diminuição do peso da Europa em seus planos dias antes da Conferência
de Munique. Já havia declarado a imposição de tarifas recíprocas contra todas
as nações que as aplicassem a produtos exportados pelos Estados Unidos, medida
que afeta em particular a Alemanha, cuja indústria automotriz seria seriamente
abalada em um momento de drástica crise econômica (a Volkswagen disse que
fechará três das dez plantas de produção que possui em terras germânicas), em
um país mergulhado na recessão e às vésperas de uma eleição tingida pela crise
de autoridade estatal.
Mas o principal veio com a Ucrânia. Em
ligação “longa e altamente produtiva” com o autocrata russo Vladimir Putin,
Trump anunciou que buscava um “fim imediato” à Guerra da Ucrânia em base a negociações
unilaterais entre os Estados Unidos e a Rússia. Enfatizou as “potências de
nossas respectivas nações, e o grande benefício de que um dia trabalhemos
juntos”, em temas como “Ucrânia, Oriente Médio, energia, inteligência
artificial”, entre outros - uma conduta oposta àquela levada adiante por Joe
Biden e o Partido Democrata. Trump não deixou claro o que vislumbra como
possível auxílio da Rússia no Oriente Médio - se quer negociar a estruturação
do novo poder na Síria, ou se busca apoio para o projeto racista de limpeza
étnica da população palestina em Gaza, e seu deslocamento a países vizinhos a
fim de converter a faixa costeira destruída pelo terrorismo sionista na
“Riviera do Oriente Médio”. Tampouco fica claro se a política norte-americana
passa a ser de seduzir Putin a fim de afastá-lo de Pequim e da influência
econômica e política de Xi Jinping, um objetivo de difícil execução dada a
aproximação entre China e Rússia. O que deixou claro com a ligação é que
secundariza a importância da Europa na discussão sobre o destino do conflito -
e negligencia a própria participação das potências aliadas à OTAN na Europa nas
conversas sobre as cláusulas de um vago acordo de cessar-fogo.
Com efeito, Pete Hegseth, secretário de
Defesa de Trump, questionou duas das diretrizes até aqui consideradas
inabaláveis pela política belicista europeia. Em entrevista, declarou que o
governo ucraniano de Volodymyr Zelensky não podia ter ilusões de recuperar
militarmente o território incorporado pela Rússia, quer seja a península da
Crimeia arrebatada em 2014, quer seja a região oriental do Donbass, tomada pela
invasão de 2022. Além disso, negou qualquer possibilidade
de que a garantia de segurança da Ucrânia num acordo de cessar-fogo fosse sua
incorporação à OTAN.
“Qualquer garantia de segurança deve ser apoiada por tropas
europeias e não europeias competentes [...] as tropas enviadas para a Ucrânia
não devem fazer parte de uma missão da OTAN, nem ser cobertas pela cláusula de
defesa mútua do Artigo 5 da aliança”. No curso da Conferência de
Munique, os EUA solicitaram às capitais
europeias que apresentassem propostas detalhadas sobre o armamento, as tropas
de manutenção da paz e os acordos de segurança que poderiam
fornecer à Ucrânia como parte de qualquer garantia para pôr fim à guerra com a
Rússia.
Trata-se de uma humilhação aos governos
europeus que acataram velozmente a orientação militarista dos Estados Unidos
para a região oriental do continente; um insulto direto para a Ucrânia, cujo
governo Zelensky regateia a entrega das riquezas minerais nacionais - as
famosas terras raras, utilizadas para a confecção de baterias elétricas e
semicondutores - desejadas por Trump em troca do seguimento do apoio logístico.
As negociações seguirão provavelmente à revelia da vontade europeia. O
secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, conversou durante a Conferência de
Munique com o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, antes
das conversações de alto nível entre Washington e Moscou que ocorrerão na
próxima semana na Arábia Saudita. Segundo o Financial Times, Rubio “reafirmou o compromisso de Donald Trump em encontrar um fim para o
conflito na Ucrânia [...] Além disso, discutiram a oportunidade de
potencialmente trabalharem juntos em uma série de outras questões bilaterais.”
Eles também concordaram em criar “uma linha de comunicação para
resolver os problemas no relacionamento entre os EUA e a Rússia no interesse de
remover as barreiras unilaterais à cooperação comercial, econômica e de
investimentos mutuamente benéfica herdada da administração anterior”,
em uma aparente indicação de que os EUA estavam preparados para reverter as
sanções contra Moscou por causa da invasão.
Essa é uma reversão quase completa diante
da política de Biden, que foi usufruída pelos Estados Unidos como engrenagem
para submeter a Europa a sua orientação militarista, que passava pelo
debilitamento da Rússia sem o uso de tropas ou soldados estadunidenses no
terreno. O objetivo estratégico era preservar a ordem mundial unipolar dominada
pelos Estados Unidos, enfraquecendo o principal aliado da China na política
“revisionista” do estatuto de Estados. Embora compartilhe a primeira porção da
fórmula, Trump tem uma postura distinta em relação à Rússia de Putin, a quem
louvou como “gênio” depois da invasão em fevereiro de 2022. Isso inclina a
política de Washington a uma saída mais negociada do que planejava o Partido
Democrata, assim como a tentativas de sedução do governo russo sobre as
perspectivas de um “trabalho comum em múltiplas áreas” com a Casa Branca - algo
que deve aguçar as preocupações de Pequim.
De todo modo, se a Rússia demonstra muita
dificuldade em conquistar pela força o território ucraniano, tampouco o
belicismo Democrata mostrava êxito em debilitar uma Rússia auxiliada pela China
e pelo Irã. Muito antes dos três anos de conflito, ficou claro que Kiev não
poderia vencer a guerra, e o próprio Zelensky assim o confessou. Richard Haas, do Foreign
Affairs,
preparava o terreno para a reviravolta política de Trump na Guerra da Ucrânia
questionando a definição prévia do que significaria um “triunfo” no conflito. “Se pressionada, a maioria provavelmente definiria ‘vitória’ de
forma semelhante à definição de Kiev, inclusive em seu mais recente ‘plano de
vitória’: expulsar as tropas russas de todo o território da Ucrânia, inclusive
da Crimeia, e restabelecer o controle sobre suas fronteiras de 1991. Há boas
razões para adotar essa definição. A norma mais básica, embora nem sempre
honrada, da ordem internacional - uma norma que perdura há cerca de 400 anos -
é que as fronteiras devem ser respeitadas. O território não deve ser adquirido
por meio da ameaça ou do uso da força armada. Esse foi um dos principais
motivos pelos quais os Estados Unidos e outros países se uniram para defender a
Coreia do Sul em 1950 e o Kuwait em 1990. No entanto, embora essa definição
seja desejável, ela é, em última análise, impraticável. Em princípio, a Ucrânia
poderia liberar seu território perdido se os Estados Unidos e seus parceiros
europeus interviessem com suas próprias forças. Mas isso exigiria abandonar a
estratégia indireta que escolheram em 2022. Isso acarretaria um grande custo
humano, militar e econômico. Além disso, apresentaria um risco muito maior,
pois significaria uma guerra entre a OTAN e a Rússia com armas nucleares. Por
esse motivo, essa política não será adotada”.
Após as palavras de Trump, analistas buscam
a reconciliação com a realidade, e passam a pintar com tintas otimistas uma
política que até então rechaçavam. De acordo com Lawrence
Freedman:
“Muitos na Ucrânia acolheriam um cessar-fogo. O país está cansado e
danificado por quase três anos de guerra, e poderia se beneficiar de uma pausa
para fortalecer suas forças armadas e reanimar sua economia. Um cessar-fogo não
exige, como os russos esperam, que a Ucrânia abandone para sempre as esperanças
de recuperar seu território perdido. Os norte-americanos também não sugeriram
que a Ucrânia deveria aceitar o restante das exigências de Moscou - que conceda
ainda mais território à Rússia, desarme suas forças e mude seu regime e sua
constituição. Putin, sem dúvida, está muito feliz por ser tratado com respeito
por Trump. Mas sem que essas outras exigências sejam atendidas, ele não terá
alcançado seus objetivos de guerra [...] Assim, à medida que as equipes de
negociação começam a se engajar, Putin precisa decidir se pode se afastar de
suas exigências maximalistas. Talvez ele possa concordar com um cessar-fogo,
mas somente com um cronograma de negociação rigoroso para um acordo final e
algum alívio antecipado nas sanções; talvez ele possa conceder à Ucrânia a
adesão à UE. Mas se a Ucrânia permanecer independente e armada, ele terá
fracassado. Se Putin acabar sendo responsabilizado pelo fracasso desse grande
esforço pela paz, ele poderá descobrir que até mesmo Trump está pronto para
aumentar o apoio a Kiev e impor mais sanções à Rússia”.
Nenhum cenário está fechado para o conflito,
e está longe de ser simples uma negociação de cessar-fogo encabeçada por
interlocutores tão volúveis quanto Trump e Putin. Os contornos gerais de um
pacto de cessar-fogo, aliás, estão desenhados há algum tempo, e são muito
parecidos com o armistício que interrompeu a Guerra da Coreia em 1953. Mas o
que parece ser certo é que a posição da Europa se enfraquece consideravelmente.
Trump está completando à medida de pauladas diplomáticas o movimento de
subordinação do continente europeu já acelerado na administração Biden. A
política do capitalismo europeu não tem piloto e entrega o leme à força para
Trump, para além dos arroubos de indignação no
Palácio do Eliseu.
A combinação de todos esses fatores
críticos e o fato de que, aconteça o que acontecer na Ucrânia, são os europeus
que arcarão com o peso da guerra, podem-se acelerar as tendências centrífugas
da União Europeia. Como debatemos em múltiplas ocasiões no Esquerda Diário,
toda posição de esquerda ou anti-imperialista deve repudiar aberta e
enfaticamente a ocupação decidida pelo governo autocrático de Putin e exigir a
retirada imediata das forças militares russas de todo o território ucraniano.
Ao mesmo tempo, deve alentar entre a população ucraniana o surgimento de uma
posição independente do governo pró-imperialista de Zelensky - que agora
negocia com Trump a entrega dos recursos minerais do país - e das diferentes
forças nacionalistas reacionárias, subordinadas às potências da OTAN. Deve
incluir no seu programa o direito à auto-determinação para as populações de
Donetsk e Luhansk, sem o qual é impossível superar a atual divisão da
população, presa de direções burguesas rivais que disputam entre si a subordinação
a Putin ou aos imperialismos ocidentais. Nas repúblicas separatistas do Leste
ucraniano, também é necessário se opor à ocupação russa, enfrentando a
demagogia de Putin que utiliza as justas demandas da população de origem russa
para seus interesses. Para isso, a única saída é a luta por uma Ucrânia
socialista, operária e independente. O movimento de trabalhadores europeus e
internacionais deve se preparar para lutar contra as futuras tendências de
militarização no continente.
A burguesia europeia e seus governos estão
em posição de choque e certa paralisia diante do período de renovação da
competição entre grandes potências. Trump faz questão de sublinhar esse fato. O
continente europeu é um dos epicentros da crise política internacional. Diante
disso, fica mais evidente o fracasso das distintas variantes (anti)estratégicas
do neorreformismo, que quiseram governar o capital europeu em coalizão com
forças tradicionais dos regimes imperialistas, como o caso do Podemos no Estado
espanhol (em aliança com o neoliberal PSOE), ou como o Syriza da Grécia, que
passou rapidamente de um discurso "antiausteridade" (sem
anticapitalismo) para a aplicação dos principais ataques exigidos pela Alemanha
e o Banco Central Europeu. Mesmo o Die Linke, apesar de certa recuperação de
caudal eleitoral, teve um enfraquecimento nos últimos anos por sua integração à
ordem, incluindo cargos de governo no Estado imperialista alemão. Tais
modalidades da conciliação de classes se puseram estritamente contrárias ao
desenvolvimento da luta de classes independente dos trabalhadores, aplicaram
ataques em favor dos empresários quando governaram, e levaram ao fortalecimento
das forças da direita nos seus respectivos países.
A greve geral dos
trabalhadores belgas contra os ajustes do governo de extrema direita em
Bruxelas mostra
uma grande reserva da luta de classes, que estourou na França contra a reforma
das aposentadorias em 2023, e na Alemanha diante das mobilizações dos
trabalhadores dos transportes. É fundamental que os trabalhadores, no rechaço
aos distintos governos imperialistas e às forças de extrema direita,
desenvolvam um internacionalismo orgânico, em defesa dos imigrantes e dos povos
oprimidos pelas burguesias continentais em todo o mundo. É o que os grupos da
Fração Trotskista pela Quarta Internacional vem fazendo nos diversos países
europeus em que está presente, como na campanha dos companheiros do Klasse Gegen Klasse
nas eleições alemãs,
com uma política anti-imperialista e de independência de classe vinculada
ao combate ao governo e à
extrema direita da AfD nas manifestações antirracistas, e o que nossos
companheiros do Révolution Permanente
debateram em seu primeiro Congresso, avançando as posições do trotskismo na
extrema esquerda francesa.
Nesse contexto, é essencial que a classe
trabalhadora tenha uma posição independente de todos os governos capitalistas
do continente, fomentadores da extrema direita e amplificadores da política
militarista dos Estados Unidos. Como dizia León Trotsky a respeito,
em 1929, tomando o problema da fragmentação da Europa capitalista diante da
potência em ascensão dos Estados Unidos: “A essência de nossa época está
no fato de que as forças produtivas definitivamente ultrapassaram as estruturas
do estado nacional e, principalmente na Europa e na América do Norte, assumiram
proporções em parte continentais, em parte globais. A guerra imperialista
surgiu como produto da contradição entre as forças produtivas e as fronteiras
nacionais. E a paz de Versalhes, que encerrou a guerra, agravou ainda mais essa
contradição. Em outras palavras: devido ao desenvolvimento das forças
produtivas, o capitalismo há muito tempo perdeu a capacidade de existir em um
só país. O socialismo, por outro lado, estará baseado em forças produtivas
muito mais desenvolvidas; caso contrário, não significaria progresso, mas
regressão em relação ao capitalismo. Em 1914, escrevi: ‘Se o problema do
socialismo fosse compatível com os limites de um estado nacional, ele também
seria compatível com a defesa nacional’. A fórmula Estados Unidos soviéticos da
Europa é precisamente a expressão política da ideia de que o socialismo é
impossível em um só país. O socialismo não pode alcançar seu pleno
desenvolvimento nem mesmo dentro dos limites de um só continente. Os Estados
Unidos Socialistas da Europa são a consigna histórica no caminho para uma
federação socialista mundial”. Nesse mesmo sentido, os socialistas
revolucionários devem multiplicar a propaganda em favor dos Estados Unidos socialistas
da Europa, não apenas como uma arma contra a Europa do capital, mas também
contra todo o veneno nacionalista carregado pela extrema direita dentro da
União Europeia ou por potências reacionárias como a Rússia.
Fonte: Esquerda
Diário
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