quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Danilo Paris: Interrogantes sobre os ciclos de governo do PT

Este artigo tem como objetivo traçar hipóteses e cenários para os rumos políticos do país, considerando tendências que se prolongam para além de 2025. A reflexão abrange aspectos internacionais e nacionais para analisar se há elementos indicando um fim de ciclo dos governos do PT ou um início desse processo. Está em questão se o governo de Frente Ampla pode reverter essas tendências ou se sinais de esgotamento podem se aprofundar. Também está em debate o tema sobre a viabilidade de Lula concorrer e governar em um quarto mandato, aos 79 anos, e após o seu acidente doméstico o tema ganhou ainda mais repercussão.

·       Os ciclos políticos

Um ciclo político é caracterizado pela continuidade no poder dentro de um determinado regime político, sendo moldado por fatores econômicos, sociais e institucionais, além das percepções da população e da relação entre as classes sociais. Os projetos políticos possuem seus próprios ciclos, incluindo gestação, ascensão, declínio e fim. No Brasil, desde os anos 1990, desenvolveu-se um ciclo político com os governos de FHC, seguido pelo ciclo dos governos do PT a partir dos anos 2000. Esse ciclo, longe de ser homogêneo, apresentou momentos distintos de mudança e continuidade. Com o início do mandato de Lula em 2003, o Brasil se beneficiou da crise do ciclo anterior, alinhando-se ao fenômeno dos governos "pós-neoliberais" na América Latina. Apesar de manter políticas macroeconômicas neoliberais, prometeu inclusão social e distribuição de renda. Após um primeiro mandato com dificuldades, Lula consolidou o fenômeno que viria a ser chamado de lulismo, em um contexto econômico favorável e de passivização da luta de classes. A força do lulismo se estendeu para além do seu próprio mandato, legando a Dilma parte importante desse fenômeno sui generis.

A sucessão de Lula por Dilma foi impactada por mudanças na realidade internacional e pela crise capitalista, culminando em uma ruptura que teve em junho de 2013 um marco, expressando uma forte crise orgânica, conforme o conceito desenvolvido por Gramsci. Esse período revelou crescente insatisfação social, expressa em greves e mobilizações, como as dos operários da construção civil. No entanto, após os primeiros anos de fortes mobilizações da juventude e que foram seguidas de grandes greves, a falta de uma alternativa de esquerda, o que inclui a própria atuação do PT em atuar contra esses processos, foi abrindo um momento no qual forças de direita buscaram responder à crise orgânica com seu programa, tendo a Lava Jato como principal catalisador. Esse momento pavimentou o caminho para o golpe institucional de 2016 que interrompeu uma importante experiência de setores de massa com os governos petistas, e contraditoriamente, preservou o PT do desgaste dos ajustes em curso. A prisão de Lula e a ascensão de Bolsonaro intensificaram esse processo, transformando o PT de partido da ordem e da austeridade em opositor. A situação reacionária que avançou nos governos Temer e Bolsonaro, marcados por ataques estruturais aos direitos sociais e pelo fortalecimento da extrema direita, consolidou um longo período de instabilidade política, aos quais serviram para dar uma nova forma de legitimidade ao PT.

·       Os primeiros sinais de esgotamento do terceiro mandato de Lula

A volta de Lula ao governo, com a restituição de seus direitos políticos e a conformação da Frente Ampla, representa, em certo sentido, uma retomada do ciclo anterior interrompido durante o governo Dilma, ainda que com uma morfologia distinta. Essa retomada apresenta um aspecto de continuidade, uma vez que o PT está novamente à frente do governo, criando expectativas populares vinculadas ao ciclo anterior. No entanto, as formas de governar e a realidade social, política e econômica são profundamente diferentes, com mudanças significativas na relação com o Congresso, no poder do Judiciário e na intensidade da polarização social. A própria incorporação de Geraldo Alckmin, um ex-líder do PSDB, é emblemática das transformações ocorridas no regime político.

O ciclo dos governos do PT, portanto, não foi e não será homogêneo ou linear. Transformações políticas e econômicas alteraram as alianças do PT, sua relação com a classe trabalhadora e os sindicatos, bem como as formas de governo. A própria volta de Lula ao poder resgatou expectativas e simbolismos dos governos anteriores, reafirmando sua conexão histórica com o ciclo petista. No entanto, esse retorno ocorre sob o que denominamos "lulismo senil", conceito que não se refere à idade biológica de Lula, mas à tentativa de restaurar uma hegemonia que outrora foi forte, mas que hoje encontra dificuldades para se sustentar. Embora sua idade avançada e seu recente problema de saúde levantem questões sobre sua sucessão, o principal obstáculo para o restabelecimento do lulismo são as bases estruturais do país, que impedem a repetição dos fatores que possibilitaram sua ascensão anterior. Existem elementos iniciais na realidade política e econômica que indicam um aprofundamento das contradições, o que pode levar não apenas ao fim do ciclo dos governos do PT, mas também a uma crise do lulismo senil. O retorno de Lula ao poder só foi possível devido ao prestígio social acumulado pelo lulismo, que permitiu a reedição de um projeto político, ainda que em bases mais frágeis. No entanto, o contexto atual é muito diferente daquele dos anos 2000. A crise capitalista iniciada em 2008, a ascensão da extrema-direita e de governos bonapartistas, o protecionismo econômico e os conflitos militares transformaram radicalmente o cenário internacional. No plano interno, a precarização do trabalho, as mudanças na estrutura sindical, a polarização social, a atuação do Judiciário e a nova configuração do presidencialismo são fatores que marcam um período de instabilidade e tensão.

O lulismo senil se caracteriza, assim, por uma instabilidade inerente, que dificulta sua própria consolidação e permanência. Desse modo, quando analisamos os elementos iniciais que podem culminar em um fim de ciclo não estamos tratando meramente da possibilidade de uma mudança de governo. Ainda que isso seja parte integrante e fundamental, estamos falando de algo mais profundo. Agora, há sinais de crise do próprio lulismo senil, e isso é uma parte integrante da hipótese que o ciclo de governos do PT pode estar chegando em um limite. No entanto, isso não significa que esse processo seja irreversível. O governo e Lula podem ainda encontrar formas de recomposição, prolongando a existência desse ciclo, mesmo que de forma instável e repleta de contradições. Além disso, a possibilidade de um quarto mandato de Lula permanece em aberto, ainda que envolto em incertezas e desafios cada vez maiores.

·       Aceleramento do desgaste com governo de Frente Ampla por fatores à direita e à esquerda

O atual cenário político e econômico brasileiro é marcado por mudanças significativas que impactam por fatores de diferentes naturezas. A coletiva de imprensa convocada por Lula reflete esse momento, após a queda na aprovação de seu governo, que segundo ele próprio ocorreu porque o governo não entregou o que prometeu.

Os dados da pesquisa Genial/Quaest revelam, pela primeira vez no atual mandato, um índice de reprovação superior ao de aprovação, sendo particularmente alarmante a queda de dez pontos no Nordeste e de sete pontos entre as faixas de renda mais baixas. A avaliação negativa gerou reações dentro do próprio partido, como o artigo escrito por José Dirceu na Folha de São Paulo, que classificou a situação como um "tombo histórico". Embora a popularidade tenha caído, diante do quadro da polarização do país, Lula ainda mantém uma base de apoio relevante e não podemos descartar que reverta esse quadro. Agora o DataFolha divulgado no dia 14 de fevereiro confirma que o tombo não foi tropeço. A aprovação de Lula caiu 11 pontos em dois meses, de 35% para 24%, chegando ao pior patamar entre todos os governos dele. Mais baixo que até mesmo o período do mensalão. A reprovação também é recorde, passando de 34% para 41%. Na parcela dos que ganham até dois salários mínimos, onde Lula reservava nicho importante, a aprovação caiu de 44% para 29%. Mesmo em seu principal reduto eleitoral, o Nordeste, reduto por excelência do petismo, houve uma grande queda, com o ótimo/bom caindo de 49% para 33%.

Esse cenário coloca interrogantes sobre a relação de Lula com a classe trabalhadora e, especialmente, com os setores mais precarizados. Enquanto ele mantém algum apoio entre aqueles que ganham até dois salários mínimos, embora esses números tenham caído, sua aprovação despenca na faixa de dois a cinco salários. Essa insatisfação está diretamente ligada ao aumento do custo de vida e às condições gerais do mercado de trabalho, motivando o governo a buscar medidas de alívio, como a proposta de isenção do Imposto de Renda e também da ampliação do crédito consignado para o setor privado. Apesar de não ter ocorrido uma crise governamental imediata, fragilidades do governo foram expostas, como o recuo na regulamentação do PIX, que demonstrou fraqueza diante da extrema direita. Além disso, as recentes medidas econômicas anunciadas por Haddad, voltadas para a manutenção do arcabouço fiscal, foram mal recebidas pelo setor financeiro, aumentando a pressão por uma política de equilíbrio fiscal. O grande fenômeno sobre a escala 6x1 e o grande repúdio à violência policial, que colocaram a questão do trabalho e do racismo no centro das discussões nacionais, também são importantes expressões de descontentamento de um país estruturalmente agressivo contra a vida das maiorias populares, e que não mudou na administração Lula.

·       A questão sucessória

A crise sucessória de Lula se intensifica em meio a um cenário de incertezas e tensões crescentes. Figura central na trajetória do PT e no fenômeno do lulismo, Lula continua sendo central no regime político. Seu recente acidente doméstico e subsequente cirurgia trouxeram à tona a possibilidade de sua reeleição, especialmente considerando sua idade avançada. A possibilidade de que ele não concorra, pode abrir um novo patamar de disputas e conflitos no PT e na esquerda. A própria relação de Lula com as centrais sindicais é uma peça chave no arranjo de forças e na relação entre as classes no Brasil, e uma eventual saída de cena impactaria estruturalmente essa relação. Do mesmo modo, o desgaste do governo em alguns temas, como a política fiscal, também gera disputas maiores. No PSOL, expressou-se uma grande crise que dividiu sua bancada parlamentar. O debate se iniciou pela demissão de um assessor parlamentar crítico ao Arcabouço Fiscal, com uma ala encabeçada por Guilherme Boulos defendendo essa medida e outra, por Glauber Braga, denunciando a supressão da democracia interna do partido. Uma das principais crises do PSOL, se não a maior, no atual mandato de Lula no que ainda terá novos episódios, e que se relaciona com o atual momento do país.

Seja por desgaste político ou por questões de saúde, a eventual ausência de Lula na disputa presidencial representaria um evento histórico, alterando o panorama de mais de 40 anos da política nacional. Seria um verdadeiro cataclisma político, que deverá ser analisado em seu momento. Ainda que a decisão final sobre sua candidatura permaneça incerta, as dúvidas já geram movimentações. No entanto, seria precipitado descartar a possibilidade de que ele se recomponha e decida concorrer novamente. Ele ainda detém um capital político significativo e enfrenta uma oposição fragmentada e sem liderança clara. Com Bolsonaro inelegível, diversas figuras tentam ocupar esse espaço, como o empresário Pablo Marçal e o cantor sertanejo Gusttavo Lima, cujas movimentações geraram conflitos na extrema-direita. Essa fragmentação da oposição de direita é algo que conta a favor de Lula, mesmo que mais desgastado. Por fim, o governo de Frente Ampla entra em seu terceiro ano, e suas contradições estão cada vez maiores. A política de ajustes econômicos pode levar a novas medidas impopulares, especialmente diante da incerteza global. O governo, agora mais cauteloso com suas ações, já demonstrou que prioriza a manutenção do arcabouço fiscal e a estabilização da dívida - mecanismos que perpetuam a necessidade de ajustes contínuos. Isso tensiona ainda mais a situação social e pode levar a novas crises.

·       Novos processos de mobilização

A luta dos indígenas e professores do Pará e a mobilização na Petrobrás são novos processos de mobilização que devem ser observados com atenção. Eles também são parte dos acontecimentos que, se amplificados para novos setores, podem impactar a situação política e social, e na própria relação de importantes setores da classe trabalhadora e dos movimentos sociais com o governo Lula.

No setor administrativo da Petrobrás, que historicamente tem menor tradição de mobilização, essa luta ganha força, especialmente no Rio de Janeiro, e se expande nacionalmente. O nível de engajamento nesses setores administrativos é comparável à histórica greve petroleira de 1995. Como uma das categorias mais estratégicas do país, essa mobilização pode influenciar outros segmentos do funcionalismo federal e da classe trabalhadora. Outro exemplo relevante é o movimento grevista e de ocupação protagonizado por trabalhadores da educação e povos indígenas no Pará. A luta contra a substituição do ensino indígena presencial pelo ensino à distância demonstrou um alto nível de resistência e independência frente ao governo de Frente Ampla. A mobilização foi fundamental para barrar ataques articulados por figuras como Rossieli Soares, ex-ministro da Educação no governo Temer e um dos principais responsáveis pela Reforma do Ensino Médio. Essa luta revelou uma forte unidade entre professores e povos indígenas, uma combinação que mostrou um enorme potencial. Também a proximidade da COP30 impactou esse processo. O governo Lula quer manter uma imagem internacional de preocupação com o meio ambiente, o que a luta em si mesma impactaria com prejuízos muitos grandes - ainda que Lula também sabe se utilizar da nova situação mundial para avançar em sentido extrativista, como se vê no tema da exploração de petróleo na Margem Equatorial.

·       A situação internacional como um grande ponto de tensão e incerteza

No atual cenário global, um dos pontos de maior tensão é a situação internacional. Historicamente, o contexto externo tem sido decisivo para o apogeu e o declínio de ciclos políticos, não apenas no aspecto econômico — embora este seja crucial —, mas também no que se refere à luta de classes. O ciclo de protestos de junho de 2013, por exemplo, ocorreu em um contexto global marcado por grandes revoltas e mobilizações populares. O retorno de Trump ao poder modifica substancialmente as coordenadas internacionais, impactando diretamente o Brasil. Nos primeiros anos do governo Lula, a presença do PD nos EUA serviu de suporte político. Apesar da dupla dependência do Brasil em relação às potências globais — incluindo a China —, a boa relação entre Lula e Biden ofereceu um fator de estabilidade. Agora, com a volta de Trump, o cenário se transforma drasticamente. Ainda nas primeiras semanas de governo, sinais de hostilidade já surgiram, como declarações de Trump minimizando a importância do Brasil, críticas de Mark Zuckerberg ao Judiciário brasileiro e posicionamentos de Steve Bannon contra o governo Lula. Elon Musk está via X alentando a mobilização convocada pela extrema direita para o dia 16/3. Além disso, medidas protecionistas começaram a ser adotadas pelos EUA, incluindo taxas sobre a China e possíveis barreiras comerciais que afetariam diretamente o Brasil, ampliando incertezas econômicas e inflacionárias.

A resposta de Lula, sinalizando desejo de uma relação pragmática com Trump, revela a fragilidade do governo brasileiro frente a essa nova realidade. Embora o Brasil não seja uma prioridade estratégica dos EUA, a histórica influência norte-americana na região, somada à ascensão de governos aliados como o de Javier Milei na Argentina, pode intensificar as contradições para o governo Lula. Por outro lado, a visita de Lula a Putin indica um reposicionamento geopolítico, utilizando a aproximação com a Rússia e a China como ferramenta de barganha frente à agressividade comercial dos EUA. A União Europeia, igualmente ameaçada por tarifas de Trump, também busca alternativas, cogitando estreitar laços comerciais com o Mercosul. Ainda assim, essas manobras diplomáticas e comerciais não são suficientes para neutralizar os impactos estruturais das mudanças na política externa norte-americana. Um exemplo concreto é a possível taxação sobre o aço e o alumínio brasileiros. Sendo o segundo maior fornecedor desses produtos para os EUA, com 16% das importações, o Brasil enfrentaria grandes dificuldades econômicas caso a medida se concretizasse. Agora, o etanol brasileiro também poderá ser taxado, impactando frontalmente diversos setores do agronegócio.

No campo político, os impactos da eleição de Trump ainda são incertos, inclusive sobre a inelegibilidade de Bolsonaro. O avanço do PL da anistia, favorecido pela eleição de Hugo Motta na Câmara dos Deputados, sugere que o tema pode ganhar força. A eleição de Trump também revigora o bolsonarismo e sua base social, que vinha sofrendo revezes. Gestos como a saudação nazista de Elon Musk fazem parte de um movimento para rearticular essa base radicalizada. Nacionalmente, muitas figuras atuam para amplificar essa influência. Governadores como Tarcísio de Freitas, Cláudio Castro, Romeu Zema e Jorginho de Melo exibiram publicamente bonés do MAGA (Make America Great Again), evidenciando um alinhamento com a extrema-direita norte-americana e a tentativa de se inserir como parte desse fenômeno internacional.

·       Incertezas econômicas

A economia brasileira apresenta distintas determinações e complexidades. Nos dois primeiros anos do governo Lula 3, o crescimento econômico acumulou mais de 6%, e em 2024, o Brasil figurou como a sexta economia que mais cresceu no mundo. Apesar disso, a percepção popular não reflete necessariamente esse avanço, uma vez que fatores como precarização do trabalho e a elevação dos preços de alimentos e combustíveis têm impactado diretamente a qualidade de vida da população. O crescimento econômico, ainda que não expressivo em termos históricos, supera os índices registrados durante o governo Bolsonaro. No entanto, a sensação de estagnação ou dificuldades se explica pela deterioração dos serviços públicos e pela falta de perspectivas para melhorias substanciais nas condições de vida. Diferentes segmentos da burguesia têm sentido os efeitos desse crescimento, beneficiados por injeções de investimentos tanto na indústria, através do programa Nova Indústria Brasil, quanto na agricultura, por meio do Plano Safra bilionário oferecido pelo governo ao agronegócio. Esse contexto faz com que os representantes do capital financeiro adotem uma postura de "cautela" em vez de considerar a situação como "dramática", revelando um desejo por mais ajustes fiscais.

As projeções de crescimento do PIB indicam uma possível desaceleração da atividade econômica, embora as previsões anteriores tenham sido mais pessimistas do que os resultados efetivamente obtidos. Para 2024, estima-se um crescimento mediano, o que impõe limites à possibilidade de uma recuperação mais robusta. Dentro desse cenário, os fatores que mais preocupam o governo são os preços dos alimentos, dos combustíveis e a inflação. Medidas estão sendo estudadas para conter a escalada dos preços, mas trata-se de um desafio complexo, que envolve variáveis climáticas, flutuações cambiais e fatores internacionais. Esse é o ponto mais sensível da "economia sentida", uma vez que impacta diretamente a vida da população, gerando dificuldades perceptíveis no cotidiano. No que diz respeito à inflação dos alimentos, há previsões otimistas apontando que "o pior já passou". Espera-se uma safra de grãos superior às anteriores, além da valorização do real em relação ao dólar, o que poderia contribuir para conter os aumentos. Entretanto, os preços já se encontram elevados devido à inflação acumulada, e uma reversão significativa torna-se difícil. Além disso, a dinâmica das secas e cheias, agravada pelas mudanças climáticas, afeta a produção agrícola de maneira imprevisível, adicionando mais incertezas ao cenário econômico. No que concerne ao desemprego, os índices registrados estão baixos, situando-se em 6,6% em 2024. No entanto, a qualidade dos empregos gerados continua sendo uma questão central. O debate sobre a jornada de trabalho e os direitos trabalhistas - com o fenômeno contrário à escala 6x1 - emergiu como um dos principais temas da agenda nacional, evidenciando a precarização das condições de trabalho. Por outro lado, o cenário de baixa taxa de desemprego também pode estimular movimentos reivindicatórios, incluindo greves por melhores condições e direitos, que já começam a ocorrer em algumas regiões do país. A economia brasileira permanece suscetível a fatores externos, estando exposta aos solavancos do cenário internacional. A volatilidade dos mercados globais e as dinâmicas geopolíticas continuarão a ser pontos de tensão constantes, podendo marcar novos momentos de inflexão.

·       Conclusão

O atual governo de Frente Ampla liderado por Lula enfrenta grandes contradições em um cenário político e econômico marcado por instabilidades, nacional e internacionalmente. Se, por um lado, há esforços para retomar alguma forma de hegemonia, ainda que débil, por outro, a situação atual impõe obstáculos estruturais que tornam essa tarefa mais complexa. As dificuldades do lulismo senil, evidenciada pela queda de popularidade, pelos dilemas econômicos e pela dificuldade em articular uma base política coesa, indica que o ciclo dos governos do PT pode estar se aproximando de um limite. No entanto, o desfecho desse processo ainda não está definido. O governo pode buscar recomposições que prolonguem seu ciclo, ao mesmo tempo em que enfrenta uma oposição fragmentada. A interrogante sucessória e as mudanças no cenário internacional adicionam novos elementos de incerteza, tornando o futuro político do país ainda mais imprevisível.

Diante desse quadro, a instabilidade segue como característica central do período. A possibilidade de novas mobilizações sociais, a relação do governo com os setores mais precarizados e as transformações na economia global serão fatores determinantes para definir os rumos da política brasileira nos próximos anos. O que está em jogo não é apenas a permanência do PT no poder, mas a própria reconfiguração das forças políticas do regime político brasileiro.

 

Fonte: Esquerda Diário

 

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