Danilo Paris:
Interrogantes sobre os ciclos de governo do PT
Este
artigo tem como objetivo traçar hipóteses e cenários para os rumos políticos do
país, considerando tendências que se prolongam para além de 2025. A reflexão
abrange aspectos internacionais e nacionais para analisar se há elementos
indicando um fim de ciclo dos governos do PT ou um início desse processo. Está
em questão se o governo de Frente Ampla pode reverter essas tendências ou se
sinais de esgotamento podem se aprofundar. Também está em debate o tema sobre a
viabilidade de Lula concorrer e governar em um quarto mandato, aos 79 anos, e
após o seu acidente doméstico o tema ganhou ainda mais repercussão.
· Os ciclos políticos
Um ciclo político é caracterizado pela
continuidade no poder dentro de um determinado regime político, sendo moldado
por fatores econômicos, sociais e institucionais, além das percepções da
população e da relação entre as classes sociais. Os projetos políticos possuem
seus próprios ciclos, incluindo gestação, ascensão, declínio e fim. No Brasil,
desde os anos 1990, desenvolveu-se um ciclo político com os governos de FHC,
seguido pelo ciclo dos governos do PT a partir dos anos 2000. Esse ciclo, longe
de ser homogêneo, apresentou momentos distintos de mudança e continuidade. Com
o início do mandato de Lula em 2003, o Brasil se beneficiou da crise do ciclo
anterior, alinhando-se ao fenômeno dos governos "pós-neoliberais" na
América Latina. Apesar de manter políticas macroeconômicas neoliberais,
prometeu inclusão social e distribuição de renda. Após um primeiro mandato com
dificuldades, Lula consolidou o fenômeno que viria a ser chamado de lulismo, em
um contexto econômico favorável e de passivização da luta de classes. A força
do lulismo se estendeu para além do seu próprio mandato, legando a Dilma parte
importante desse fenômeno sui generis.
A sucessão de Lula por Dilma foi impactada
por mudanças na realidade internacional e pela crise capitalista, culminando em
uma ruptura que teve em junho de 2013 um marco, expressando uma forte crise
orgânica, conforme o conceito desenvolvido por Gramsci. Esse período revelou
crescente insatisfação social, expressa em greves e mobilizações, como as dos
operários da construção civil. No entanto, após os primeiros anos de fortes
mobilizações da juventude e que foram seguidas de grandes greves, a falta de
uma alternativa de esquerda, o que inclui a própria atuação do PT em atuar
contra esses processos, foi abrindo um momento no qual forças de direita
buscaram responder à crise orgânica com seu programa, tendo a Lava Jato como
principal catalisador. Esse momento pavimentou o caminho para o golpe
institucional de 2016 que interrompeu uma importante experiência de setores de
massa com os governos petistas, e contraditoriamente, preservou o PT do
desgaste dos ajustes em curso. A prisão de Lula e a ascensão de Bolsonaro
intensificaram esse processo, transformando o PT de partido da ordem e da
austeridade em opositor. A situação reacionária que avançou nos governos Temer
e Bolsonaro, marcados por ataques estruturais aos direitos sociais e pelo
fortalecimento da extrema direita, consolidou um longo período de instabilidade
política, aos quais serviram para dar uma nova forma de legitimidade ao PT.
· Os primeiros sinais de
esgotamento do terceiro mandato de Lula
A volta de Lula ao governo, com a
restituição de seus direitos políticos e a conformação da Frente Ampla,
representa, em certo sentido, uma retomada do ciclo anterior interrompido
durante o governo Dilma, ainda que com uma morfologia distinta. Essa retomada
apresenta um aspecto de continuidade, uma vez que o PT está novamente à frente
do governo, criando expectativas populares vinculadas ao ciclo anterior. No
entanto, as formas de governar e a realidade social, política e econômica são
profundamente diferentes, com mudanças significativas na relação com o
Congresso, no poder do Judiciário e na intensidade da polarização social. A
própria incorporação de Geraldo Alckmin, um ex-líder do PSDB, é emblemática das
transformações ocorridas no regime político.
O ciclo dos governos do PT, portanto, não
foi e não será homogêneo ou linear. Transformações políticas e econômicas
alteraram as alianças do PT, sua relação com a classe trabalhadora e os sindicatos,
bem como as formas de governo. A própria volta de Lula ao poder resgatou
expectativas e simbolismos dos governos anteriores, reafirmando sua conexão
histórica com o ciclo petista. No entanto, esse retorno ocorre sob o que
denominamos "lulismo senil", conceito que não se refere à idade
biológica de Lula, mas à tentativa de restaurar uma hegemonia que outrora foi
forte, mas que hoje encontra dificuldades para se sustentar. Embora sua idade
avançada e seu recente problema de saúde levantem questões sobre sua sucessão,
o principal obstáculo para o restabelecimento do lulismo são as bases
estruturais do país, que impedem a repetição dos fatores que possibilitaram sua
ascensão anterior. Existem elementos iniciais na realidade política e econômica
que indicam um aprofundamento das contradições, o que pode levar não apenas ao
fim do ciclo dos governos do PT, mas também a uma crise do lulismo senil. O
retorno de Lula ao poder só foi possível devido ao prestígio social acumulado
pelo lulismo, que permitiu a reedição de um projeto político, ainda que em
bases mais frágeis. No entanto, o contexto atual é muito diferente daquele dos
anos 2000. A crise capitalista iniciada em 2008, a ascensão da extrema-direita
e de governos bonapartistas, o protecionismo econômico e os conflitos militares
transformaram radicalmente o cenário internacional. No plano interno, a
precarização do trabalho, as mudanças na estrutura sindical, a polarização
social, a atuação do Judiciário e a nova configuração do presidencialismo são
fatores que marcam um período de instabilidade e tensão.
O lulismo senil se caracteriza, assim, por
uma instabilidade inerente, que dificulta sua própria consolidação e
permanência. Desse modo, quando analisamos os elementos iniciais que podem
culminar em um fim de ciclo não estamos tratando meramente da possibilidade de
uma mudança de governo. Ainda que isso seja parte integrante e fundamental,
estamos falando de algo mais profundo. Agora, há sinais de crise do próprio
lulismo senil, e isso é uma parte integrante da hipótese que o ciclo de
governos do PT pode estar chegando em um limite. No entanto, isso não significa
que esse processo seja irreversível. O governo e Lula podem ainda encontrar
formas de recomposição, prolongando a existência desse ciclo, mesmo que de
forma instável e repleta de contradições. Além disso, a possibilidade de um
quarto mandato de Lula permanece em aberto, ainda que envolto em incertezas e
desafios cada vez maiores.
· Aceleramento do desgaste com
governo de Frente Ampla por fatores à direita e à esquerda
O atual cenário político e econômico
brasileiro é marcado por mudanças significativas que impactam por fatores de
diferentes naturezas. A coletiva de imprensa convocada por Lula reflete esse
momento, após a queda na aprovação de seu governo, que segundo ele próprio
ocorreu porque o governo não entregou o que prometeu.
Os dados da pesquisa Genial/Quaest revelam,
pela primeira vez no atual mandato, um índice de reprovação superior ao de
aprovação, sendo particularmente alarmante a queda de dez pontos no Nordeste e
de sete pontos entre as faixas de renda mais baixas. A avaliação negativa gerou
reações dentro do próprio partido, como o artigo escrito por José Dirceu na
Folha de São Paulo, que classificou a situação como um "tombo
histórico". Embora a popularidade tenha caído, diante do quadro da
polarização do país, Lula ainda mantém uma base de apoio relevante e não
podemos descartar que reverta esse quadro. Agora o DataFolha divulgado no dia
14 de fevereiro confirma que o tombo não foi tropeço. A aprovação de Lula caiu
11 pontos em dois meses, de 35% para 24%, chegando ao pior patamar entre todos
os governos dele. Mais baixo que até mesmo o período do mensalão. A reprovação
também é recorde, passando de 34% para 41%. Na parcela dos que ganham até dois
salários mínimos, onde Lula reservava nicho importante, a aprovação caiu de 44%
para 29%. Mesmo em seu principal reduto eleitoral, o Nordeste, reduto por
excelência do petismo, houve uma grande queda, com o ótimo/bom caindo de 49%
para 33%.
Esse cenário coloca interrogantes sobre a
relação de Lula com a classe trabalhadora e, especialmente, com os setores mais
precarizados. Enquanto ele mantém algum apoio entre aqueles que ganham até dois
salários mínimos, embora esses números tenham caído, sua aprovação despenca na
faixa de dois a cinco salários. Essa insatisfação está diretamente ligada ao
aumento do custo de vida e às condições gerais do mercado de trabalho,
motivando o governo a buscar medidas de alívio, como a proposta de isenção do
Imposto de Renda e também da ampliação do crédito consignado para o setor
privado. Apesar de não ter ocorrido uma crise governamental imediata,
fragilidades do governo foram expostas, como o recuo na regulamentação do PIX,
que demonstrou fraqueza diante da extrema direita. Além disso, as recentes
medidas econômicas anunciadas por Haddad, voltadas para a manutenção do
arcabouço fiscal, foram mal recebidas pelo setor financeiro, aumentando a
pressão por uma política de equilíbrio fiscal. O grande fenômeno sobre a escala
6x1 e o grande repúdio à violência policial, que colocaram a questão do
trabalho e do racismo no centro das discussões nacionais, também são
importantes expressões de descontentamento de um país estruturalmente agressivo
contra a vida das maiorias populares, e que não mudou na administração Lula.
· A questão sucessória
A crise sucessória de Lula se intensifica
em meio a um cenário de incertezas e tensões crescentes. Figura central na
trajetória do PT e no fenômeno do lulismo, Lula continua sendo central no regime
político. Seu recente acidente doméstico e subsequente cirurgia trouxeram à
tona a possibilidade de sua reeleição, especialmente considerando sua idade
avançada. A possibilidade de que ele não concorra, pode abrir um novo patamar
de disputas e conflitos no PT e na esquerda. A própria relação de Lula com as
centrais sindicais é uma peça chave no arranjo de forças e na relação entre as
classes no Brasil, e uma eventual saída de cena impactaria estruturalmente essa
relação. Do mesmo modo, o desgaste do governo em alguns temas, como a política
fiscal, também gera disputas maiores. No PSOL, expressou-se uma grande crise
que dividiu sua bancada parlamentar. O debate se iniciou pela demissão de um
assessor parlamentar crítico ao Arcabouço Fiscal, com uma ala encabeçada por
Guilherme Boulos defendendo essa medida e outra, por Glauber Braga, denunciando
a supressão da democracia interna do partido. Uma das principais crises do
PSOL, se não a maior, no atual mandato de Lula no que ainda terá novos
episódios, e que se relaciona com o atual momento do país.
Seja por desgaste político ou por questões
de saúde, a eventual ausência de Lula na disputa presidencial representaria um
evento histórico, alterando o panorama de mais de 40 anos da política nacional.
Seria um verdadeiro cataclisma político, que deverá ser analisado em seu
momento. Ainda que a decisão final sobre sua candidatura permaneça incerta, as
dúvidas já geram movimentações. No entanto, seria precipitado descartar a
possibilidade de que ele se recomponha e decida concorrer novamente. Ele ainda
detém um capital político significativo e enfrenta uma oposição fragmentada e
sem liderança clara. Com Bolsonaro inelegível, diversas figuras tentam ocupar
esse espaço, como o empresário Pablo Marçal e o cantor sertanejo Gusttavo Lima,
cujas movimentações geraram conflitos na extrema-direita. Essa fragmentação da
oposição de direita é algo que conta a favor de Lula, mesmo que mais
desgastado. Por fim, o governo de Frente Ampla entra em seu terceiro ano, e
suas contradições estão cada vez maiores. A política de ajustes econômicos pode
levar a novas medidas impopulares, especialmente diante da incerteza global. O
governo, agora mais cauteloso com suas ações, já demonstrou que prioriza a
manutenção do arcabouço fiscal e a estabilização da dívida - mecanismos que
perpetuam a necessidade de ajustes contínuos. Isso tensiona ainda mais a
situação social e pode levar a novas crises.
· Novos processos de mobilização
A luta dos indígenas e professores do Pará
e a mobilização na Petrobrás são novos processos de mobilização que devem ser
observados com atenção. Eles também são parte dos acontecimentos que, se
amplificados para novos setores, podem impactar a situação política e social, e
na própria relação de importantes setores da classe trabalhadora e dos
movimentos sociais com o governo Lula.
No setor administrativo da Petrobrás, que
historicamente tem menor tradição de mobilização, essa luta ganha força,
especialmente no Rio de Janeiro, e se expande nacionalmente. O nível de
engajamento nesses setores administrativos é comparável à histórica greve
petroleira de 1995. Como uma das categorias mais estratégicas do país, essa
mobilização pode influenciar outros segmentos do funcionalismo federal e da
classe trabalhadora. Outro exemplo relevante é o movimento grevista e de
ocupação protagonizado por trabalhadores da educação e povos indígenas no Pará.
A luta contra a substituição do ensino indígena presencial pelo ensino à
distância demonstrou um alto nível de resistência e independência frente ao
governo de Frente Ampla. A mobilização foi fundamental para barrar ataques
articulados por figuras como Rossieli Soares, ex-ministro da Educação no
governo Temer e um dos principais responsáveis pela Reforma do Ensino Médio. Essa
luta revelou uma forte unidade entre professores e povos indígenas, uma
combinação que mostrou um enorme potencial. Também a proximidade da COP30
impactou esse processo. O governo Lula quer manter uma imagem internacional de
preocupação com o meio ambiente, o que a luta em si mesma impactaria com
prejuízos muitos grandes - ainda que Lula também sabe se utilizar da nova
situação mundial para avançar em sentido extrativista, como se vê no tema da
exploração de petróleo na Margem Equatorial.
· A situação internacional como
um grande ponto de tensão e incerteza
No atual cenário global, um dos pontos de
maior tensão é a situação internacional. Historicamente, o contexto externo tem
sido decisivo para o apogeu e o declínio de ciclos políticos, não apenas no
aspecto econômico — embora este seja crucial —, mas também no que se refere à
luta de classes. O ciclo de protestos de junho de 2013, por exemplo, ocorreu em
um contexto global marcado por grandes revoltas e mobilizações populares. O
retorno de Trump ao poder modifica substancialmente as coordenadas
internacionais, impactando diretamente o Brasil. Nos primeiros anos do governo
Lula, a presença do PD nos EUA serviu de suporte político. Apesar da dupla
dependência do Brasil em relação às potências globais — incluindo a China —, a
boa relação entre Lula e Biden ofereceu um fator de estabilidade. Agora, com a
volta de Trump, o cenário se transforma drasticamente. Ainda nas primeiras
semanas de governo, sinais de hostilidade já surgiram, como declarações de
Trump minimizando a importância do Brasil, críticas de Mark Zuckerberg ao
Judiciário brasileiro e posicionamentos de Steve Bannon contra o governo Lula.
Elon Musk está via X alentando a mobilização convocada pela extrema direita
para o dia 16/3. Além disso, medidas protecionistas começaram a ser adotadas
pelos EUA, incluindo taxas sobre a China e possíveis barreiras comerciais que
afetariam diretamente o Brasil, ampliando incertezas econômicas e
inflacionárias.
A resposta de Lula, sinalizando desejo de
uma relação pragmática com Trump, revela a fragilidade do governo brasileiro
frente a essa nova realidade. Embora o Brasil não seja uma prioridade
estratégica dos EUA, a histórica influência norte-americana na região, somada à
ascensão de governos aliados como o de Javier Milei na Argentina, pode
intensificar as contradições para o governo Lula. Por outro lado, a visita de
Lula a Putin indica um reposicionamento geopolítico, utilizando a aproximação
com a Rússia e a China como ferramenta de barganha frente à agressividade
comercial dos EUA. A União Europeia, igualmente ameaçada por tarifas de Trump,
também busca alternativas, cogitando estreitar laços comerciais com o Mercosul.
Ainda assim, essas manobras diplomáticas e comerciais não são suficientes para
neutralizar os impactos estruturais das mudanças na política externa
norte-americana. Um exemplo concreto é a possível taxação sobre o aço e o
alumínio brasileiros. Sendo o segundo maior fornecedor desses produtos para os
EUA, com 16% das importações, o Brasil enfrentaria grandes dificuldades econômicas
caso a medida se concretizasse. Agora, o etanol brasileiro também poderá ser
taxado, impactando frontalmente diversos setores do agronegócio.
No campo político, os impactos da eleição
de Trump ainda são incertos, inclusive sobre a inelegibilidade de Bolsonaro. O
avanço do PL da anistia, favorecido pela eleição de Hugo Motta na Câmara dos
Deputados, sugere que o tema pode ganhar força. A eleição de Trump também
revigora o bolsonarismo e sua base social, que vinha sofrendo revezes. Gestos
como a saudação nazista de Elon Musk fazem parte de um movimento para
rearticular essa base radicalizada. Nacionalmente, muitas figuras atuam para
amplificar essa influência. Governadores como Tarcísio de Freitas, Cláudio
Castro, Romeu Zema e Jorginho de Melo exibiram publicamente bonés do MAGA (Make
America Great Again), evidenciando um alinhamento com a extrema-direita
norte-americana e a tentativa de se inserir como parte desse fenômeno
internacional.
· Incertezas econômicas
A economia brasileira apresenta distintas determinações
e complexidades. Nos dois primeiros anos do governo Lula 3, o crescimento
econômico acumulou mais de 6%, e em 2024, o Brasil figurou como a sexta
economia que mais cresceu no mundo. Apesar disso, a percepção popular não
reflete necessariamente esse avanço, uma vez que fatores como precarização do
trabalho e a elevação dos preços de alimentos e combustíveis têm impactado
diretamente a qualidade de vida da população. O crescimento econômico, ainda
que não expressivo em termos históricos, supera os índices registrados durante
o governo Bolsonaro. No entanto, a sensação de estagnação ou dificuldades se
explica pela deterioração dos serviços públicos e pela falta de perspectivas
para melhorias substanciais nas condições de vida. Diferentes segmentos da
burguesia têm sentido os efeitos desse crescimento, beneficiados por injeções
de investimentos tanto na indústria, através do programa Nova Indústria Brasil,
quanto na agricultura, por meio do Plano Safra bilionário oferecido pelo
governo ao agronegócio. Esse contexto faz com que os representantes do capital
financeiro adotem uma postura de "cautela" em vez de considerar a
situação como "dramática", revelando um desejo por mais ajustes
fiscais.
As projeções de crescimento do PIB indicam
uma possível desaceleração da atividade econômica, embora as previsões
anteriores tenham sido mais pessimistas do que os resultados efetivamente
obtidos. Para 2024, estima-se um crescimento mediano, o que impõe limites à
possibilidade de uma recuperação mais robusta. Dentro desse cenário, os fatores
que mais preocupam o governo são os preços dos alimentos, dos combustíveis e a
inflação. Medidas estão sendo estudadas para conter a escalada dos preços, mas
trata-se de um desafio complexo, que envolve variáveis climáticas, flutuações
cambiais e fatores internacionais. Esse é o ponto mais sensível da
"economia sentida", uma vez que impacta diretamente a vida da
população, gerando dificuldades perceptíveis no cotidiano. No que diz respeito
à inflação dos alimentos, há previsões otimistas apontando que "o pior já
passou". Espera-se uma safra de grãos superior às anteriores, além da
valorização do real em relação ao dólar, o que poderia contribuir para conter
os aumentos. Entretanto, os preços já se encontram elevados devido à inflação
acumulada, e uma reversão significativa torna-se difícil. Além disso, a
dinâmica das secas e cheias, agravada pelas mudanças climáticas, afeta a
produção agrícola de maneira imprevisível, adicionando mais incertezas ao
cenário econômico. No que concerne ao desemprego, os índices registrados estão
baixos, situando-se em 6,6% em 2024. No entanto, a qualidade dos empregos
gerados continua sendo uma questão central. O debate sobre a jornada de
trabalho e os direitos trabalhistas - com o fenômeno contrário à escala 6x1 -
emergiu como um dos principais temas da agenda nacional, evidenciando a
precarização das condições de trabalho. Por outro lado, o cenário de baixa taxa
de desemprego também pode estimular movimentos reivindicatórios, incluindo
greves por melhores condições e direitos, que já começam a ocorrer em algumas
regiões do país. A economia brasileira permanece suscetível a fatores externos,
estando exposta aos solavancos do cenário internacional. A volatilidade dos
mercados globais e as dinâmicas geopolíticas continuarão a ser pontos de tensão
constantes, podendo marcar novos momentos de inflexão.
· Conclusão
O atual governo de Frente Ampla liderado
por Lula enfrenta grandes contradições em um cenário político e econômico
marcado por instabilidades, nacional e internacionalmente. Se, por um lado, há
esforços para retomar alguma forma de hegemonia, ainda que débil, por outro, a
situação atual impõe obstáculos estruturais que tornam essa tarefa mais
complexa. As dificuldades do lulismo senil, evidenciada pela queda de
popularidade, pelos dilemas econômicos e pela dificuldade em articular uma base
política coesa, indica que o ciclo dos governos do PT pode estar se aproximando
de um limite. No entanto, o desfecho desse processo ainda não está definido. O
governo pode buscar recomposições que prolonguem seu ciclo, ao mesmo tempo em
que enfrenta uma oposição fragmentada. A interrogante sucessória e as mudanças
no cenário internacional adicionam novos elementos de incerteza, tornando o
futuro político do país ainda mais imprevisível.
Diante desse quadro, a instabilidade segue
como característica central do período. A possibilidade de novas mobilizações
sociais, a relação do governo com os setores mais precarizados e as
transformações na economia global serão fatores determinantes para definir os
rumos da política brasileira nos próximos anos. O que está em jogo não é apenas
a permanência do PT no poder, mas a própria reconfiguração das forças políticas
do regime político brasileiro.
Fonte: Esquerda
Diário
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