Como A
Esquerda dobrou a intenção de voto com o TikTok na Alemanha
O partido político A
Esquerda está vivenciando nas pesquisas para a eleição do Bundestag em 23 de fevereiro um crescimento que pode ser determinante para seu futuro. Se em
meados de dezembro a agremiação alcançava meros 3% das intenções de voto, dois
meses depois o resultado dobrou, variando entre 6% e 7%, dependendo do
levantamento. Pode parecer pouco, mas é decisivo: na Alemanha, um partido só
tem bancada no parlamento se obtiver mais de 5% dos votos. Às vésperas da
eleição, há fortes sinais de que a sigla – que muitos davam
como liquidada depois da debandada de uma ala
liderada pela política Sahra Wagenknecht, em outubro de 2023 – terá
uma bancada parlamentar. Algo em que quase ninguém mais acreditava, depois
de uma série de derrotas, incluindo as eleições europeias e as três eleições
estaduais alemãs de 2024.
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Candidata jovem e carismática
Entre os poucos que jamais
perderam a confiança no partido está Heidi Reichinnek, que, ao lado de Jan van
Aken, forma a dupla de candidatos esquerdistas cabeça de chapa na eleição para
o Bundestag. Essa política de 36 anos incorpora muito daquilo que faltou ao
próprio partido nos anos mais recentes: frescor, carisma, otimismo. Mas sua
característica mais marcante é a forte presença nas redes sociais: ela
tem mais de meio milhão de seguidores no TikTok. Suas postagens alcançam
um público predominantemente jovem, que até há pouco achava A Esquerda um
partido sonolento e ultrapassado. Para Reichinnek estava claro como mudar essa
má imagem: com uma ofensiva nas redes sociais. Ela já havia anunciado isso em
março de 2024 para os poucos jornalistas que então ainda se interessavam pela
sigla.
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Perto do fim
Em outubro de 2023, uma ala
em torno da ex-líder de bancada Sahra Wagenknecht havia deixado o partido para
fundar o seu próprio, a Aliança Sahra Wagenknecht (BSW). A Esquerda era vista
como uma legenda em extinção, o que o péssimo resultado nas eleições
europeias de junho de 2024 parecia confirmar. E depois vieram ainda as três
derrotas nos estados da Saxônia, da Turíngia e de Brandemburgo – estados do
Leste Alemão que historicamente sempre deram bons resultados ao partido, em
parte originário do antigo partido comunista da Alemanha Oriental. A Turíngia é
o único estado em que A Esquerda elegeu um governador, Bodo Ramelow, o
qual permaneceu no cargo por dez anos, ou dois mandatos, com uma
pequena interrupção de algumas semanas. Diante dos maus resultados, a liderança
partidária anunciou sua renúncia, deixando para
outros a tarefa de tentar reverter essa tendência descendente sem
precedentes.
·
Oportunidade com o fim da coalizão de governo
Ninguém dentro da sigla
tinha uma concepção. Ao fim, a reviravolta repentina resultou de uma combinação
da renovação no comando e da estratégia eleitoral, com uma inesperada
ajuda do destino. O fim antecipado da coalizão que sustentava o governo do
chanceler federal Olaf Scholz acabou sendo uma oportunidade para A Esquerda
renovar seu perfil. Na campanha eleitoral, o partido optou por priorizar
questões que preocupam muitos cidadãos e que, em meio ao debate sobre a
imigração, foram deixadas de lado pelos demais concorrentes: moradia e pobreza.
São temas que preocupam
principalmente os jovens alemães. Muitos estudam em escolas com condições
precárias ou em universidades superlotadas, e penam com o constante aumento dos
aluguéis nas grandes cidades e centros universitários. A esses temores somam-se
ainda os causados pela mudança climática e pela guerra na Ucrânia. A Esquerda
parece ter acertado em cheio nas preocupações desse grupo, com propostas
eleitorais como um teto máximo para os aluguéis, um salário mínimo (que na
Alemanha é por hora trabalhada) mais alto e o imposto sobre fortunas.
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Mais votado entre os menores de 18 anos
E os vídeos de Reichinnek no
TikTok parecem ser o meio certo para atingir esse público. Um sinal disso é foi
A Esquerda ser o partido mais votado, com quase 21% dos votos, numa
eleição simulada pelo Deutscher Bundesjugendring, uma associação de
organizações juvenis que representa os interesses desse público perante
governos. Na iniciativa que fomenta a educação política, mais de 166 mil
jovens depositaram seu voto em 1.800 postos por toda a
Alemanha. Apenas menores de 18 podiam participar. Mesmo que não
se trate de uma pesquisa representativa, o resultado chama a atenção pelo
contraste com as consultas de intenção de voto, e indica que A Esquerda tem uma
forte aceitação entre esse público.
A diretoria ficou, claro,
eufórica com o resultado. "A Esquerda não é apenas o partido do momento,
mas também o partido do futuro", comentou o secretário-geral Janis Ehling.
Ele aproveitou para destacar o ingresso "sem precedentes” de novos
filiados: somente desde a convenção partidária de janeiro, foram mais de 20
mil, totalizando agora o recorde de 81 mil membros. Os novos filiados têm
em média 28 anos, reduzindo a idade média para 43. Durante a campanha
eleitoral, até meados de fevereiro os correligionários bateram em mais de meio
milhão de portas, relatou a copresidente Ines Schwerdtner. Com tamanha
determinação, o que há até bem pouco tempo parecia improvável hoje é
praticamente certo: A Esquerda vai ter uma bancada no Bundestag.
¨ O que dizem
programas de governo dos partidos alemães
Raramente os partidos
tiveram tão pouco tempo para uma campanha eleitoral como nas eleições
parlamentares antecipadas de 23 de fevereiro na Alemanha. E raramente eles
tiveram tão pouco tempo para escrever seus programas de governo, que são algo
como a lista de desejos dos partidos. Mas, se eles forem mesmo governar, isso
só será possível numa coalizão. E coalizão significa compromisso, ou seja,
fazer concessões às situações ideais descritas nos programas de governo. Um
detalhe logo chama a atenção: é surpreendente que os programas de governo não
expliquem como os partidos pretendem financiar suas promessas, algumas das
quais requerem bilhões de euros.
A Universidade de Hohenheim
analisou os programas dos dez partidos que têm representração em todos os 16
estados da Alemanha. Os pesquisadores descobriram que esses programas são
mais curtos do que o usual e difíceis de entender. Termos técnicos, frases
repetidas e palavras mirabolantes são encontrados com muita frequência. Segundo
os pesquisadores, o programa de governo mais compreensível é o da aliança
conservadora formada pelos partidos União Democrata Cristã e União Social Cristã (CDU/CSU),
e o mais incompreensível, o da ultradireitista Alternativa
para a Alemanha (AfD).
A DW apresenta a seguir um
resumo dos programas de governo dos sete partidos representados no Bundestag, o
parlamento alemão. A ordem é baseada na força atual dos partidos, medida pelas
pesquisas eleitorais.
<><>
Conservadores da CDU e CSU
O programa eleitoral
conjunto da CDU e do partido conservador da Baviera, a CSU, é
intitulado Mudança política para a
Alemanha. O bloco CDU/CSU, do líder e candidato à chefia de
governo Friedrich Merz, quer voltar ao
poder. Ele é hoje a maior força da oposição. Seu programa é caracterizado
por posições conservadoras, liberais e sociais-cristãs. A imigração se tornou o
tópico mais importante da campanha eleitoral. A aliança CDU/CSU quer limitar a
imigração irregular. "Aceleraremos os procedimentos de refúgio e as
repatriações", afirma o texto. O fortalecimento da economia é igualmente
fundamental. A CDU/CSU promete aos empresários: "Reduziremos a carga
tributária das empresas para um máximo de 25%". Os benefícios sociais
devem ser revisados e possivelmente cortados. Mais dinheiro deverá ser
disponibilizado para a defesa.
<><>
Ultradireitista AfD
Tempo para
a Alemanha é o título do programa eleitoral da AfD,
partido radical de direita. O tema da imigração é proeminente no programa. O
"paraíso dos refúgios na Alemanha" deve ser fechado, diz o texto. O
termo "remigração" desempenha um papel importante no partido da líder
e candidata a chanceler Alice Weidel. Fala-se em "devolução dos
estrangeiros obrigados a deixarem o país para suas nações de origem". O
fenômeno da "imigração em massa" deve ser revertido, e a
naturalização deve ser dificultada. A AfD não quer mais participar da política
europeia de refúgio. A sigla rejeita a UE em sua forma atual e quer uma
"comunidade europeia econômica e de interesses". O marco alemão deve
ser reintroduzido, e as sanções econômicas contra a Rússia devem ser
canceladas.
<><>
Social-democratas, de Scholz
O Partido
Social-Democrata (SPD) é otimista,
apresentando logo um programa de governo, sob o lema Mais para você. Melhor para a Alemanha.
Para os social-democratas, as questões sociais são o tema central. Sob o
comando do chanceler federal alemão, Olaf Scholz, o SPD quer que "a vida permaneça acessível – com um salário
mínimo mais alto" e redução de impostos para aqueles que ganham pouco. Os
cidadãos com renda muito alta devem pagar mais impostos e a economia deve
ser fortalecida. O SPD também promete aposentadorias estáveis. Em termos de
política de migração, o partido é a favor de procedimentos mais rápidos para
concessão de refúgio. A sigla rejeita procedimentos de refúgio realizados fora
da UE. O SPD quer continuar a apoiar a Ucrânia, mas não quer enviar mísseis de cruzeiro Taurus, de fabricação alemã, para o país.
<><> Partido
Verde
Crescer unidos é o nome do programa do Partido Verde. Os
ambientalistas também o chamam a peça de "nosso programa de governo".
O texto afirma: "Dizemos como podemos tornar a vida mais acessível, como
podemos proteger a natureza e o clima. Como podemos fortalecer a economia e
renovar nossa prosperidade de forma climaticamente neutra". O ministro da
Economia, Robert Habeck, está se concentrando em investir no futuro por meio de
um "Fundo da Alemanha". O objetivo é reformar completamente a
infraestrutura alemã, que se encontra em parte defasada. As moradias devem se
tornar acessíveis e a mobilidade por transporte público mais barata. Assim como
o SPD, os verdes também são a favor de cortes de impostos para pessoas de baixa
e média renda e de um salário mínimo mais alto. O foco também está no clima e
na energia. O partido quer expandir as energias renováveis e desativar as
usinas elétricas movidas a carvão o mais rápido possível.
<><> Socialistas
do A Esquerda
Todos
querem governar. Nós queremos mudar é o título
do programa do partido A Esquerda. No subtítulo: Compartilhar riqueza. Reduzir preços. Uns para os
outros. A legenda se estabeleceu no sistema partidário desde 2005,
mas tem repetidamente tido dificuldade para atingir o limite de 5% para entrar
no Bundestag. A Esquerda se vê como uma alternativa socialista crítica ao
capitalismo. Em termos de política de imigração, é provavelmente o partido com
o programa mais liberal: "Todas as pessoas devem ter os mesmos direitos e
oportunidades, independentemente de seu passaporte e origem". Eles querem
se engajar pelos mais pobres, custos mais baixos de eletricidade e calefação,
um teto para os aluguéis e salários mais altos. As pessoas mais ricas devem ser
mais tributadas. A Esquerda se vê como um "partido pacifista" e
condena a guerra contra a Ucrânia como ilegal pelo direito internacional.
<><> Liberais do
FDP
"Tudo pode ser
mudado" é o slogan dos pôsteres do Partido Liberal Democrático (FDP) em todo o país. E esse também é o título do programa
eleitoral da sigla. Ao longo da história da República Federal da Alemanha, o
FDP sempre foi o fiel da balança em coalizões, fazendo pender para um lado ou
para o outro. Embora seu programa tenha mudado, o âmago liberal continua o
mesmo, sob o comando do líder do partido, Christian Lindner: aliviar a carga
sobre os cidadãos e as empresas, menos governo, menos burocracia, mais
responsabilidade pessoal, mais oportunidades educacionais, uma economia forte e
direitos civis. O FDP "não quer e não pode aceitar que a migração
irregular ainda não esteja suficientemente sob controle" e "que os
empregos e a prosperidade estejam em risco". Não está claro se o partido
conseguirá voltar ao Bundestag, por ser incerto se a legenda alcançará a cota
mínima de 5%.
<><> Populistas
de esquerda do BSW
Nosso país
merece mais é o slogan do programa da Aliança Sahra Wagenknecht (BSW). O partido da co-líder Sahra Wagenknecht ainda é jovem e tem
apenas alguns membros. O programa eleitoral da BSW deixa claro que a sigla é
difícil de ser categorizada ideologicamente: tem política econômica e de saúde
de esquerda com regras rígidas na política de asilo. "A imigração não é a
solução para o problema da pobreza em nosso mundo", diz o programa, que
afirma ser necessário que ela seja "limitada". Fala-se em
"fluxos de refugiados" e que a BSW quer "acabar com a imigração
descontrolada". O primeiro ponto do programa é intitulado Paz. O programa tende a ser pró-Rússia e
antiamericano. Os EUA são uma "superpotência em declínio", segundo o
texto. Com relação à guerra da Rússia contra a Ucrânia, o programa afirma:
"Não queremos que mais dinheiro dos contribuintes alemães seja usado para
prolongar essa guerra sem sentido".
¨ Quem são os
imigrantes que votam na ultradireita alemã?
O partido alemão de
ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD) não esconde suas opiniões
sobre os imigrantes em seu programa partidário. "A AfD vê a ideologia do
multiculturalismo como uma séria ameaça à paz social e à existência contínua da
nação como uma entidade cultural", diz o texto. Ainda assim, o
multiculturalismo não parece ser uma ameaça para a própria AfD. Nos últimos
meses, cada vez mais as mensagens da ultradireita têm sido direcionadas aos
eleitores das muitas comunidades de imigrantes da Alemanha – com algum sucesso.
Isso acontece apesar de membros do partido promoverem abertamente a deportação de imigrantes e distribuir panfletos imitando "bilhetes aéreos" para a repatriação de imigrantes, com algumas alas da legenda
defendendo ainda a deportação de migrantes que possuem cidadania alemã.
Nascido na Turquia, Ismet
Var, de 55 anos, vive no país desde sua infância e adquiriu a cidadania alemã
em 1994. Ele apoia a AfD desde sua fundação, em 2013. O entregador de Berlim
teve seu trabalho diretamente afetado pelo aumento dos preços dos combustíveis
após a invasão da Rússia na Ucrânia em 2022. Var não consegue entender por que
tanto dinheiro está sendo "jogado fora" em ajuda econômica e militar
para a Ucrânia. Ele deseja corte de impostos e a deportação de "imigrantes
criminosos". Mas isso já está acontecendo – as últimas estatísticas
mostram que o governo de centro-esquerda do chanceler federal da Alemanha, Olaf
Scholz, vem aumentando as deportações. "Agora, somente agora eles estão
deportando pessoas", diz Var. "Mas eles não costumavam fazer
isso." Ele acredita que foi necessária a intervenção do partido de ultradireita no
cenário político alemão para que o governo agisse.
<><> Política
migratória ganha centralidade
A política migratória
alemã ganhou completa centralidade na campanha eleitoral para as eleições gerais do país,
que acontecem em 23 de fevereiro. Scholz foi duramente cobrado pela oposição após
o país sofrer uma série de ataques perpetrados por imigrantes. Em agosto de
2024, um ataque terrorista na cidade de Solingen matou três e deixou oito feridos. Três meses depois, um homem
avançou com um carro sobre uma multidão em um mercado de Natal em Magdeburg, matando 5 e ferindo centenas. Na semana passada, em Munique, duas
pessoas morreram após serem atropeladas intencionalmente por um homem, agora investigado por vínculo com o Estado Islâmico. Tais situações
não apenas pressionaram o governo de Scholz mas também endureceram
drasticamente o discurso da oposição no Bundestag, a câmara baixa do Parlamento
alemão. O movimento chegou a fazer com que uma moção anti-imigração do partido
conservador União Democrata Cristã (CDU) fosse aprovada com a ajuda da ultradireita, algo que não acontecia na Alemanha desde a Segunda Guerra Mundial.
Na opinião de Var, a
Alemanha se tornou tolerante demais com o que ele chama de "muçulmanos
rigorosos". "Não tenho nada contra eles quando rezam em casa, mas
quando fazem propaganda, então sou contra", disse ele. Var sofreu racismo
como recém-chegado à Alemanha na década de 1970. Ele se lembra de um zelador de
seu prédio lhe dizendo que ele e sua família não estariam lá se Hitler ainda
estivesse no poder. "Mas isso não me incomodou. Eu era pequeno", diz
ele.
Anna Nguyen também sofreu
muito com o racismo na Alemanha. Nascida perto de Kassel em 1990, filha de
refugiados vietnamitas, ela agora é representante da AfD no parlamento estadual
de Hessen. No entanto, ela insiste, não são os alemães que são racistas com
ela, mas as pessoas que ela acredita que sejam árabes. "Durante
a pandemia de covid, sempre foram imigrantes, presumivelmente árabes, que
gritavam 'corona, corona' atrás de mim e do meu amigo chinês", disse ela.
"É verdade que na internet sou inundada por comentários racistas, mas da
esquerda, mesmo que eles se digam antirracistas." Nguyen insiste que seu
partido, enquanto isso, é indiferente à raça e não está buscando
estrategicamente eleitores como ela. "Não se trata de origem imigrante",
diz ela. "Trata-se do fato de que todos os sensatos deste país querem
evitar essa loucura ideológica verde. É uma questão de: posso ter uma vida boa?
Ela é segura? Temos um fornecimento de eletricidade seguro?"
<><> Visando
novos eleitores
Os eleitores com histórico
migratório são uma realidade demográfica na Alemanha. As estatísticas oficiais
de 2023 mostram que cerca de 12% do eleitorado alemão tem origem não alemã –
cerca de 7,1 milhões de pessoas. Em 2016, cerca de 40% dos eleitores de origem
imigrante votaram no Partido Social Democrata (SPD), de centro-esquerda, e
outros 28% na CDU, de centro-direita. Mas essa lealdade parece ter se
desgastado. De acordo com o Centro Alemão de Pesquisa sobre Integração e
Migração (DeZIM), que divulgou um estudo sobre os hábitos de voto entre os
migrantes no final de janeiro, há pouca diferença entre o comportamento de voto
com ou sem histórico migratório. Nas eleições gerais de 2017, 35% dos turcos
alemães votaram no SPD, enquanto 0% votaram no AfD. Agora, de acordo com o
DeZIM, não há mais diferença entre alemães e eleitores com raízes migratórias.
Jannes Jacobsen, do DeZIM,
coautor do relatório, disse que a AfD parece estar se tornando mais atraente
para pessoas de diferentes origens. Ele também destacou que esses eleitores são
cidadãos alemães – e se consideram alemães. "Portanto, talvez não seja uma
surpresa tão grande o fato de essas pessoas não votarem de forma muito
diferente do que daqueles que não têm histórico de imigração",
acrescentou. Em 2023, Robert Lambrou, também parlamentar estadual da AfD em
Hessen, fundou uma organização chamada "Com histórico migratório para a
Alemanha" destinada a apoiadores imigrantes da AfD. O site da organização
diz que ela tem 137 membros de mais de 30 países e que está aberta a qualquer
pessoa "que professa sua crença na cultura alemã como a cultura dominante
e trabalha pela existência contínua da nação como uma entidade cultural".
"Minha experiência com
a AfD é que não faz diferença se a pessoa tem origem migratória ou não",
disse Lambrou, de 55 anos, cujo pai era grego. "Não vejo o partido como
xenófobo – queremos uma política de migração sensata." Mas é difícil
conciliar isso com declarações como a do deputado da AfD no Bundestag René
Springer, que, após revelações no início do ano passado de que políticos da
sigla participaram de uma reunião que planejava a "remigração" em
massa de imigrantes e alemães não brancos, escreveu no X: "Mandaremos os
estrangeiros de volta para seus países de origem. Aos milhões. Isso não é um
plano secreto. Isso é uma promessa." Lambrou concordou que algumas
declarações são contraprodutivas se não estiverem devidamente fundamentadas em
fatos ou se não expressarem nuances importantes. "Quando percebemos
declarações de membros do partido que não consideramos corretas, tentamos
buscar um diálogo interno na legenda", disse.
<><> Nenhum
problema com o racismo?
No entanto, parece haver cada
vez mais vídeos pró-AfD no TikTok feitos por pessoas não brancas nos últimos
meses. Özgür Özvatan, CEO da consultoria política Transformakers, disse que a
AfD tem buscado ativamente a atenção dos eleitores imigrantes pelo menos no
último ano – especialmente entre descendentes de russos e turcos –
principalmente porque essas comunidades têm maior probabilidade de ter direito
a voto. De acordo com as estatísticas oficiais da Alemanha, há mais de 2,9
milhões de pessoas de origem turca na Alemanha, das quais cerca de 1,6 milhão
têm cidadania alemã. A diáspora pós-soviética, por sua vez, também chega a
milhões e inclui várias nacionalidades e etnias, inclusive a alemã. É provável
que muitos também se sintam atraídos pela postura pró-Rússia da AfD em relação
à guerra na Ucrânia.
Özvatan argumenta que tudo
isso faz parte da estratégia do partido para expandir sua base de eleitores.
"Seus eleitores potenciais no cenário dos não imigrantes são, obviamente,
finitos", observou. "Eles podem ter uma participação potencial de
votos de cerca de 20-25%, mas se quiserem chegar a 30-35%, precisam expandir
seu portfólio, e isso significa criar conteúdo e prometer políticas para as
comunidades de imigrantes." O especialista pontua ainda que imigrantes
podem ter posições anti-imigração. Nguyen insiste que os eleitores imigrantes
não são dissuadidos pelo racismo e pelas contradições "porque eles sabem a
quem se referem. São os imigrantes ilegais, especialmente os que vieram a
partir de 2015. São aqueles que são criminosos e pessoas de origem migratória
sofrem tanto com isso quanto qualquer outro". O termo "imigrante
ilegal", apesar de defendido por membros do partido, é amplamente
rechaçado por organizações de defesa dos direitos humanos. Özvatan acredita que
muitos eleitores imigrantes simplesmente não estão cientes das declarações
racistas dos membros do partido e, mesmo quando ouvem um comentário
racista explícito, rapidamente o descartam como algo secundário em relação
à sua principal percepção da AfD. "O sentimento principal é: 'eles são
amigáveis conosco'", disse, "e a AfD tenta promover esse
sentimento".
Fonte: DW Brasil
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