terça-feira, 25 de fevereiro de 2025


Quais são os minerais raros da Ucrânia – e por que Trump está de olho neles?

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, havia dito que não iria "vender nosso Estado" após rejeitar uma proposta de Donald Trump para dar aos EUA acesso às vastas reservas minerais do país.

Neste domingo (23/2), porém, Zelensky recuou no tom e disse "estar pronto para conversar sobre minerais" com os americanos. "Estamos prontos para compartilhar", disse.

A Ucrânia possui enormes depósitos das chamadas "terras raras" e minerais estratégicos, mas muitos estão em áreas controladas por tropas russas.

Trump afirmou que esses recursos deveriam ser trocados pelo contínuo apoio dos EUA à Ucrânia na guerra contra a Rússia.

"Eu disse [à Ucrânia] que quero o equivalente a, tipo, US$ 500 bilhões [cerca de R$ 2,9 trilhões] em terras raras, e eles essencialmente concordaram em fazer isso", disse Trump ao repórter da Fox News, Bret Baier, em 10 de fevereiro.

A proposta de Trump destacou a importância desses minerais para os EUA, mas para que eles servem e o que podem oferecer ao país?

·        O que são os minerais de terras raras?

"Terras raras" é um termo coletivo para 17 elementos quimicamente semelhantes amplamente utilizados na tecnologia e na indústria modernas.

Esses elementos são cruciais para a produção de smartphones, computadores, equipamentos médicos e vários outros produtos.

Eles incluem: Sc – escândio, Y – ítrio, La – lantânio, Ce – cério, Pr – praseodímio, Nd – neodímio, Pm – promécio, Sm – samário, Eu – európio, Gd – gadolínio, Tb – térbio, Dy – disprósio, Ho – hólmio, Er – érbio, Tm – túlio, Yb – itérbio, Lu – lutécio.

Os minerais são chamados de "raros" porque é muito incomum encontrá-los em forma pura, embora existam depósitos de alguns deles em várias partes do mundo.

No entanto, as terras raras frequentemente ocorrem junto a elementos radioativos, como tório e urânio, e separá-los exige o uso de muitos produtos químicos tóxicos, tornando o processo de extração às vezes difícil e caro.

·        Quais minerais a Ucrânia tem?

A Ucrânia possui 21 das 30 substâncias que a União Europeia define como "materiais brutos essenciais", representando cerca de 5% das reservas mundiais.

Muitas das áreas que contêm esses elementos estão localizadas no sul do Escudo Cristalino Ucraniano (grande área de rochas), principalmente sob o Mar de Azov. A maioria desses territórios está atualmente ocupada pela Rússia.

No entanto, ainda há projetos promissores na região do rio Bug, no oeste do país, assim como nas regiões de Kiev, Vinítsia e Jitomir.

Especialistas afirmam que, embora centenas de locais geológicos promissores tenham sido identificados, apenas alguns deles podem se tornar depósitos viáveis, caso seu desenvolvimento seja considerado economicamente factível.

"As estimativas divulgadas são, de fato, apenas estimativas", diz Adam Webb, chefe de Materiais Brutos para Baterias na Benchmark Mineral Intelligence, uma agência de informações especializadas sobre esse mercado.

"É necessário muito mais trabalho para transformar esses depósitos minerais em reservas economicamente exploráveis."

Quanto a outros recursos minerais importantes da Ucrânia, segundo a Forbes Ucrânia, cerca de 70% deles estão localizados nas regiões de Donetsk, Dnipro e Luhansk. Portanto, muitos estão em territórios invadidos e ainda ocupados pela Rússia.

Além dos minerais raros, a Ucrânia também possui o que são conhecidos como "minerais críticos" — ou estratégicos —, como o lítio.

De acordo com o governo da Ucrânia, o país possui cerca de 450 mil toneladas de reservas de lítio. No entanto, ainda não está sendo extraído, embora haja planos para que a mineração comece em breve.

A Rússia ocupou pelo menos dois depósitos de lítio: Shevchenkivske, na região de Donetsk, e o complexo de minério de Kruta Balka, na região de Berdyansk.

Os depósitos de minério de lítio na região de Kirovohrad permanecem sob controle ucraniano.

·        O que Trump quer com esses minerais?

O interesse dos EUA em controlar a produção de terras raras e, possivelmente, minerais críticos, deve-se em grande parte à competição com a China, que atualmente domina o fornecimento global.

Nas últimas décadas, a China se tornou líder tanto na mineração quanto no processamento de minerais raros, respondendo por 60% a 70% da produção mundial e quase 90% da capacidade de processamento.

A dependência dos EUA em relação à China nesse aspecto provavelmente é preocupante para a administração Trump – tanto em termos de segurança nacional quanto economicamente.

Esses materiais são necessários para tecnologias altamente sofisticadas – desde carros elétricos até equipamentos militares.

·        Análise: 'um paradoxo'

Por Navin Singh Khadka, repórter de Meio Ambiente do Serviço Mundial da BBC

À primeira vista, parece um paradoxo.

Trump ordenou a expansão da produção de combustíveis fósseis, abandonando as políticas de energias renováveis.

Mas, ao mesmo tempo, ele quer garantir os minerais críticos – que são essenciais para a transição para uma energia limpa – de onde seja possível.

No entanto, esses minerais também são os blocos fundamentais para produtos eletrônicos de consumo, equipamentos militares e de navegação, e – mais importante ainda – centros de dados de inteligência artificial (IA).

Trump anunciou uma grande iniciativa para expandir a infraestrutura de IA em seu país. Isso exigirá um enorme fornecimento de minerais críticos – principalmente cobre, silício, paládio e elementos de terras raras.

E o fornecimento desses minerais já começou a declinar, tornando-se uma das principais causas do desaceleramento do crescimento global das energias limpas.

Especialistas afirmam que a dominância chinesa dos minerais críticos, incluindo elementos de terras raras, é o principal fator para o desejo de Trump, devido à disputa geopolítica entre os EUA e a China.

Após décadas aperfeiçoando tecnologias de processamento e expertise, a China atualmente controla 100% do fornecimento refinado de grafite natural e disprósio, 70% de cobalto e quase 60% de todo o lítio e manganês processados, de acordo com a Agência Internacional de Energia Renovável.

A potência asiática também produz predominantemente elementos de terras raras e mantém um controle rigoroso sobre metais-chave ao redor do mundo, com a posse de grandes minas na África, Ásia e América do Sul.

"Para combater o crescente domínio da China sobre a cadeia de suprimentos global", disse o Comitê de Serviços Armados da Câmara dos Representantes dos EUA durante a administração de Biden, "é essencial que os EUA assegurem seu próprio fornecimento inovador de minerais críticos e estratégicos."

A administração Trump parece ver locais como a Ucrânia e a Groenlândia como áreas para utilizar métodos inovadores a fim de adicionar à sua cadeia de suprimentos.

<><> Elon Musk nega que vá cortar sinal da Starlink na Ucrânia se país não aceitar acordo sobre minérios

Elon Musk afirmou neste sábado (22) que é falso que o sinal de internet da Starlink será cortado caso não haja acordo sobre minérios da Ucrânia.

O empresário compartilhou a declaração no X após uma reportagem publicada pela agência de notícias Reuters relatar que foi cogitada a possibilidade de cortar o serviço se um acordo sobre recursos minerais ucranianos não for firmado com os Estados Unidos.

"Isto é falso. A Reuters está mentindo. Eles só perdem para a AP (Associated Press) como mentirosos da mídia tradicional.'

A reportagem da Reuters dizia que três fontes informaram sobre a possibilidade de corte do acesso ao serviço foi levantada durante discussões entre autoridades norte-americanas e ucranianas depois que Volodymyr Zelensky, presidente ucraniano, recusou uma proposta inicial dos EUA.

Segundo uma das fontes ouvidas, a Ucrânia "funciona com a Starlink. Eles a consideram sua estrela do norte. (...) Perder a Starlink (...) seria um grande golpe".

¨      Paz na Ucrânia pode tornar petróleo barato demais

Um dos aliados mais próximos do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, na Europa, o primeiro-ministro húngaro Viktor Orbán, afirmou em fevereiro que os EUA poderiam encerrar a guerra na Ucrânia em menos de seis meses. Segundo o Middle East Eye, a tentativa acelerada dos EUA de retomar as relações com a Rússia e pôr fim ao conflito deixou a Europa em estado de choque.

O Golfo Árabe está de olho no que isso pode significar para os preços da energia e o comércio de petróleo.

Os países do Golfo, ricos em petróleo, foram diretamente afetados pela decisão dos EUA e da União Europeia de impor sanções à Rússia, que, junto com a Arábia Saudita, lidera uma aliança de produtores de petróleo conhecida como Opep+.

Um fim rápido para a guerra na Ucrânia poderia resultar em commodities mais baratas, desde petróleo até metais e outros produtos, como fertilizantes, que dependem do gás natural para sua produção.

“A normalização das relações com a Rússia é um grande impulso para obter qualquer commodity a um preço mais baixo do que antes. Grandes partes do mercado de commodities estarão facilmente disponíveis novamente”, disse Viktor Katona, chefe de análise de petróleo da empresa de inteligência Kpler, ao Middle East Eye.

É claro que isso depende de os EUA suspenderem as sanções à Rússia. O governo Trump tem sido bastante transparente desde que iniciou as negociações com a Rússia na Arábia Saudita nesta semana, afirmando que, como parte de um amplo acordo para encerrar a guerra na Ucrânia, as sanções dos EUA serão suspensas.

“As sanções foram resultado desse conflito. Para encerrar qualquer conflito, todas as partes precisam fazer concessões”, disse o secretário de Estado, Marco Rubio.

Agora, vamos ao petróleo.

<><> ‘Negativo para os preços’

Em uma nota esta semana, analistas do Bank of America disseram que um acordo de paz na Ucrânia poderia resultar em uma queda de US$ 5 a US$ 10 no preço do barril de Brent. Essa é uma queda significativa, considerando os preços atuais.

Na tarde de sexta-feira, o Brent estava sendo negociado com uma queda de 2%, a US$ 74,96 por barril.

Katona afirmou que o fim da guerra na Ucrânia é “negativo para os preços”.

“Os russos não vão produzir mais petróleo porque não têm muita capacidade ociosa, mas o sistema se tornará mais previsível. O preço do petróleo será mais barato no final de 2025 do que é agora”, disse ele.

Para os países do Golfo, especialmente a Arábia Saudita, isso é uma má notícia.

O FMI afirma que a Arábia Saudita precisa que o preço do petróleo esteja em torno de US$ 96 por barril para equilibrar seu orçamento. Esse número aumentou à medida que o reino tenta reduzir a oferta para elevar os preços.

A Arábia Saudita tem um preço de equilíbrio mais alto do que seu “frenemy” na Opep, e cada vez mais rival geopolítico, os Emirados Árabes Unidos (EAU).

O reino está investindo bilhões de dólares da receita do petróleo em megaprojetos caros, projetados para reduzir sua dependência de energia no futuro e diversificar sua economia.

Riad teve que reduzir alguns projetos, como Neom, a megacidade futurística. Em vez de 1,5 milhão de pessoas vivendo lá até 2030, autoridades sauditas agora esperam menos de 300 mil residentes.

Uma cidade linear de 170 km, conforme planejada, deve atingir apenas 2,4 km até 2030.

<><> Limite de preço do Ocidente à Rússia fracassou

O governo Biden ressentiu-se da decisão da Arábia Saudita de não liberar mais petróleo durante a guerra na Ucrânia. Um ex-alto funcionário da inteligência dos EUA ecoou muitos colegas ao dizer ao MEE que Riad havia “ficado contra nós (os EUA) e sustentado a economia da Rússia”.

Até Trump, que mantém bons laços com o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman e defendeu a cooperação econômica com a Rússia uma vez que a guerra na Ucrânia termine, pediu que a Arábia Saudita inundasse o mercado em janeiro.

“Se o preço caísse, a guerra Rússia-Ucrânia terminaria imediatamente. Agora, o preço está alto o suficiente para que a guerra continue – é preciso reduzir o preço do petróleo”, disse Trump.

Logicamente, o reino não tinha interesse em derrubar o preço de sua principal exportação em prol dos interesses políticos dos EUA.

Independentemente disso, Trump está buscando um acordo de paz na Ucrânia com os preços do petróleo praticamente nos mesmos níveis de janeiro, quando fez esses comentários.

Os preços do petróleo, que começaram 2022 sendo negociados em torno de US$ 76 por barril, dispararam para mais de US$ 100 quando a Rússia invadiu a Ucrânia, mas caíram mais de 20% nos últimos três anos. A Rússia invadiu a Ucrânia em 24 de fevereiro de 2022.

Gregg Priddy, consultor de energia da Spout Run Advisory, sediada em Washington, disse ao MEE que o fim da guerra na Ucrânia pode ser neutro para os preços do petróleo.

Como o fornecimento russo não caiu substancialmente, o fim das sanções à Rússia não significará uma inundação de petróleo no mercado para deprimir os preços.

“Não houve uma grande redução no volume russo no mercado. Apenas foi deslocado. O limite de preço não funcionou muito bem”, disse ele, acrescentando que China e Índia absorveram o petróleo russo.

<><> Por que a Índia compra petróleo russo em dirhams dos Emirados?

Aqueles que têm mais a perder com o fim das sanções são os proprietários de navios, que se beneficiaram ao repassar prêmios de risco de guerra para a Rússia. Como o petróleo russo está percorrendo rotas indiretas para chegar aos destinos, os navios-tanque estão em falta e as taxas aumentaram.

“As sanções ocidentais tornaram o mercado de navios-tanque, que já estava saturado, mais apertado. Então, isso é ruim se você é um proprietário de navios”, disse Priddy.

Houve uma série de efeitos colaterais devido às sanções do Ocidente.

Os EUA expulsaram a Rússia do Swift, o sistema global de mensagens financeiras dominado pelo dólar americano. Em resposta, a Rússia se moveu para se isolar do sistema de comércio baseado no dólar.

O petróleo russo destinado à China atravessa sua fronteira no extremo leste. Esse comércio já migrou para o yuan. Analistas dizem que a China não tem motivação para trazer esse comércio de volta ao dólar.

Com outros clientes, a Rússia usou proxies para o dólar. Os EAU foram grandes beneficiários. Eles se tornaram um centro de comércio de petróleo russo. Por exemplo, a Índia começou a comprar petróleo russo em dirhams dos Emirados, que são atrelados ao dólar para estabilidade.

A ascensão do dirham como um proxy do dólar no comércio de petróleo russo ajudou a trazer bilhões de dólares para os bancos dos Emirados.

O status de Dubai como a “nova Genebra” para o comércio de petróleo russo pode ser afetado se os EUA abrirem as portas para a Rússia retornar ao sistema baseado no dólar.

O governo Trump e seus aliados na mídia estão constantemente destacando a ameaça que acreditam que as sanções representam para o status do dólar como moeda de reserva global.

“Devemos implantar sanções com cuidado… e, crucialmente, garantir que o dólar americano permaneça a moeda de reserva mundial”, disse o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, em sua audiência de confirmação no Senado.

<><> A Arábia Saudita espera recuperar participação de mercado na China

A Arábia Saudita espera que o fim das sanções dos EUA permita que ela recupere participação de mercado na China. Em 2024, as exportações russas para a China atingiram um recorde histórico, enquanto as compras chinesas de petróleo saudita caíram 9%.

Mas analistas dizem que isso é improvável de acontecer.

Katona disse que o petróleo russo está sendo negociado com um desconto de US$ 4 por barril em relação ao petróleo saudita. Se os EUA suspenderem as sanções, os russos poderão reduzir os preços e ainda assim serem mais baratos que a Arábia Saudita. A China também tem o benefício adicional de negociar em yuan com a Rússia.

<><> A Turquia poderia enviar petróleo russo para a Europa?

Outro grande fator determinante é a Europa. A União Europeia ainda importa algum gás russo, mas proibiu totalmente a importação de petróleo bruto e produtos refinados russos transportados por mar.

“A Europa não vai comprar petróleo russo novamente”, disse Katona.

Priddy disse que podemos ver uma divisão entre a União Europeia e os EUA.

“A Europa e os Estados Unidos podem seguir caminhos diferentes em relação às sanções. Não acho que a União Europeia voltará a comprar petróleo russo”, afirmou.

Claro, há outras maneiras pelos quais os estados da UE poderiam importar petróleo russo. Se os EUA aliviarem as sanções, isso permitiria que a Turquia importasse petróleo russo com mais liberdade, refinasse e revendesse para estados europeus.

Isso já está sendo feito com o gás russo através do gasoduto Turkstream. O fornecimento de gás russo para a Europa através do Turkstream atingiu um recorde histórico em janeiro.

<><> A Arábia Saudita depende da China

A Arábia Saudita depende das refinarias chinesas para comprar seu petróleo. Ela também investiu em produção downstream lá. Mas a economia chinesa está desacelerando, e analistas questionam se ela já atingiu o pico de demanda por petróleo. Se a Arábia Saudita não conseguir expulsar a Rússia da China, resta um outro concorrente: a República Islâmica do Irã.

Trump prometeu retomar uma campanha de “pressão máxima” contra o Irã. No mês passado, a Reuters informou que o grupo estatal chinês Shandong Port Group decidiu começar a bloquear navios-tanque sob sanções dos EUA. Isso é um grande golpe para o Irã, cuja frota clandestina envelhecida transporta a maior parte de seu petróleo para a China.

“[A Arábia Saudita] tem a chance de os EUA eliminarem as exportações de petróleo do Irã. Essa é uma oportunidade brilhante”, disse Katona.

 

Fonte: BBC News Mundo/O Cafezinho

 


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