Por que a direita
radical alemã odeia arquitetura modernista
Em um momento
de tensão política na Alemanha, a Bauhaus — uma das
escolas de arquitetura, arte e design mais
influentes do mundo — se tornou alvo de ataques da direita radical.
Hans-Thomas
Tillschneider, membro do partido de direita radical Alternativa para Alemanha
(AfD), e membro do parlamento regional da Saxônia-Anhalt, no leste do país,
culpou o modernismo da Bauhaus pelos problemas econômicos da sua região.
Seu diagnóstico
improvável surgiu em resposta à campanha "pense moderno" do governo
regional conservador do partido União Democrata Cristã (CDU), que busca atrair
investimentos para a região, e cita o movimento Bauhaus como um exemplo de
excelência produzida localmente.
Tillschneider
afirma que, para resolver a estagnação econômica da região, "não
precisamos pensar de forma moderna, precisamos pensar de forma
conservadora". Ele rejeita as ideias da Bauhaus como sendo difundidas pela
ideologia comunista. Com estes ataques, Tillschneider deu início praticamente à
reencenação de uma guerra cultural histórica sobre a identidade nacional e as
ansiedades sociais alemãs.
Fundada em 1919
pelo arquiteto Walter Gropius na cidade alemã de Weimar, a escola de Bauhaus e
sua equipe compartilhavam um programa de utopismo material. Isso era expresso
por meio de um conceito de oficina exploratória que se afastava dos modos
tradicionais de ensino.
Estas práticas de
vanguarda levaram a escola de Bauhaus politicamente para a esquerda, o que a
deixaria vulnerável a ataques ideológicos durante toda a República de Weimar, a
primeira (e fracassada) democracia da Alemanha.
No controverso
debate sobre a identidade nacional que se seguiu ao fim da monarquia em 1918,
os artistas da Bauhaus ocupavam uma posição desconfortável entre duas escolas
de pensamento da elite instruída.
Um lado havia se
aberto para a estética moderna (como o impressionismo e o expressionismo). O
outro — dos conservadores — havia abraçado um nacionalismo artístico que se
manifestou com a unificação alemã em 1871.
Eles viam a
"verdadeira arte" como algo que vinha do povo e que, por sua vez, os
educava como cidadãos leais. Esteticamente, os conservadores encontraram estes
valores expressos no classicismo de Weimar. Curiosamente, dada a ênfase na arte
do povo, esta era uma forma de literatura, teatro e artes visuais bastante
exclusiva e sofisticada.
·
Ambiente
político
As ideias da
Bauhaus, por outro lado, eram antiburguesas, vanguardistas e experimentais, ao
mesmo tempo em que postulavam a importância de criar arte para que todos
pudessem ter acesso e apreciar.
Essa democratização
do estilo, no entanto, foi difícil de ser alcançada, e a maior parte do que a
Bauhaus produziu permaneceu inacessível para as massas. No entanto, essas
visões conflitantes politizaram a cultura durante os
anos entre guerras.
Em 1925, a escola
teve que se mudar de Weimar para Dessau (em Saxônia-Anhalt) depois de perder
seu financiamento. Isso foi consequência de uma disputa com os partidos
políticos conservadores que governavam a cidade na época.
Em Dessau, os
professores da Bauhaus construíram um prédio para ensino que seguia seus
princípios estéticos modernos.
Apesar das
repetidas tentativas de Gropius de despolitizar a Bauhaus apontando para seu
pluralismo estético, os debates internos sobre o lugar da arquitetura na sociedade e na política continuaram.
O ponto de
discórdia foi o conceito de Nova Objetividade (Neue Sachlichkeit), que
encontrou sua forma de expressão na Neues Bauen: construção modulada que
introduziu a pré-fabricação industrializada de partes da construção,
afastando-se do ofício artesanal tradicional.
Por fim, Gropius
deixou a Bauhaus e, no lugar dele, entrou o arquiteto abertamente socialista
Hannes Meyer. Depois de assumir o cargo de diretor em 1928, ele repolitizou a
escola, e a levou de volta para a esquerda.
No ambiente
político efervescente do final da República de Weimar, a Bauhaus se deparou com
uma nova ameaça existencial. Quando os nazistas assumiram o poder nas eleições
locais de 1931, eles solicitaram a destruição da escola de Bauhaus.
A Bauhaus se mudou
novamente em 1932, desta vez para Berlim, onde continuou como uma instituição
privada para evitar novos conflitos com os nazistas, cada vez mais poderosos.
No entanto, quando Adolf Hitler tomou o poder no início de 1933, a escola e sua
equipe foram vítimas das medidas antissocialistas dos nazistas.
A escola Bauhaus
fechou em 20 de julho de 1933, e sua equipe se dispersou, inclusive para
lugares distantes.
Muitos foram para
os Estados Unidos, onde deram continuidade ao legado do "espírito da
Bauhaus", unindo-se ao movimento modernista internacional que se tornou a
estética ocidental definidora na década de 1950.
Embora as
influências e expressões artísticas tenham permanecido diversificadas ao longo
da trajetória da escola, o discurso do pós-guerra a simplificou para formas
geométricas simples, uma preferência pelas cores branca, azul, vermelha e
amarela, e uma ênfase em linhas horizontais e perspectivas.
Os nazistas
rotularam a estética da Bauhaus como "degenerada". Na época da Guerra Fria, o governo
socialista da Alemanha Oriental classificou o modernismo da Bauhaus e seus
discípulos como cosmopolitas no sentido pejorativo.
Eles foram acusados
de abandonar o patrimônio nacional alemão em prol do "formalismo"
internacional, colocando a forma — no que diz respeito à função — acima do
conteúdo cultural.
Tillschneider
colocou a questão de maneira ainda mais provocativa: "Eles negaram a
conexão do homem com a terra e suas raízes culturais". Embora representem
um enorme exagero interpretativo, essas declarações não são uma surpresa.
Este ano marca o
centenário da mudança para Dessau, onde o prédio da escola ainda se ergue
orgulhosamente como patrimônio mundial da Unesco. Tillschneider aproveitou este
momento para perpetuar a guerra cultural pela qual o AfD se tornou conhecido na
última década.
Ele está
equiparando o CDU a uma representação simplificada do legado da Bauhaus — que é
antiartesanal, antiburguesa e internacionalista —, e insinua que seus
adversários políticos são contra a tradição e a cultura alemãs.
Esses são os
sentimentos nativistas que alimentam o AfD. É uma estratégia de vitórias
baratas às custas das ansiedades do eleitorado em relação à identidade cultural
e nacional da Alemanha.
Fonte: Por Katrin
Schreiter, para The Conversation
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