Governo Trump acusa
Brasil de violar 'valores democráticos' em referência a ações de Moraes
Em uma nota
divulgada em sua conta oficial
no X,
o Departamento de Estado dos EUA acusou o Brasil de tomar medidas
"incompatíveis com valores democráticos" em referência a recentes
decisões judiciais do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal
(STF), de remover conteúdos de usuários de algumas redes sociais e de aplicar
multas e bloqueios por descumprimentos das ordens.
"O respeito à
soberania é uma via de mão dupla com todos os parceiros dos EUA, incluindo o
Brasil. Bloquear o acesso à informação e impor multas a empresas sediadas nos
EUA por se recusarem a censurar indivíduos que lá vivem é incompatível com os
valores democráticos, incluindo a liberdade de expressão", diz a nota
divulgada pela diplomacia americana, que não cita
Moraes.
É a primeira vez
que a gestão do presidente Donald
Trump se
manifesta sobre o assunto. A liberdade de expressão irrestrita, como prevista
na Primeira Emenda da Constituição dos EUA, é uma das bandeiras do republicano
e as chamadas big techs são tidas como apoiadoras da Casa Branca.
Na semana passada,
o bilionário Elon Musk, dono do X e chefe do Departamento de Eficiência
Governamental (DOGE), teve sua rede social multada em R$8 milhões por
desrespeitar decisões do ministro do STF Alexandre de Moraes de retirar do ar
conteúdos considerados como desinformação.
E na sexta-feira
passada, a rede Rumble foi bloqueada em território brasileiro por se recusar a
constituir representação legal no país e não cumprir com ordens de excluir
páginas de usuários da direita brasileira, como o blogueiro bolsonarista Allan
dos Santos, radicado nos EUA.
Além de não citar
Moraes, a nota do Departamento de Estado não cita explicitamente as duas
empresas, mas faz alusão aos dois casos.
A manifestação
acontece depois que o deputado federal Eduardo Bolsonaro foi recebido em uma
série de reuniões no Departamento de Estado, em Washington, na última
sexta-feira (21/2).
O ministro do
Supremo, que está sendo processado na Flórida pela Rumble e pela empresa de
mídia de Trump (controladora da Truth Social), nega motivação política em sua
atuação e sustenta - nos autos e em palestras - atuar em defesa da legislação e
da democracia do Brasil.
Procurado
sucessivas vezes pela reportagem via STF, ele não comentou a ofensiva.
Esta semana, em
comentários no próprio X, Musk sugeriu que Moraes pode ser alvo de sanções no
país. Em comentário a uma postagem, Musk pergunta: "Moraes não tem
propriedades nos EUA?"
"Eu não sei se
o Alexandre de Moraes ficou mal acostumado a trocar farpas com Elon Musk quando
ele era só um empresário, mas agora ele é praticamente ministro do governo
Trump, a situação é diferente", disse o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP)
à BBC News Brasil.
"Não esperem
que o Trump vai receber com naturalidade se o governo do Brasil ficar chutando
o X, tratando assim. Ele é um businessman", diz Eduardo, relembrando
que a primeira-dama Janja da Silva proferiu insulto público ao bilionário
durante reuniões do G-20 no Rio de Janeiro no ano passado.
Campanha
bolsonarista e projeto contra Moraes
Como a BBC News
Brasil revelou, Eduardo Bolsonaro esteve com o embaixador americano Michael
Kozak, alta autoridade do Escritório de Hemisfério Ocidental do Departamento de
Estado, de onde partiu a nota divulgada nesta quarta-feira.
Consultado
oficialmente na última sexta-feira pela BBC News Brasil, o Departamento de
Estado se recusou a detalhar o que foi tratado nas reuniões com Eduardo Bolsonaro.
Em entrevista à BBC News Brasil, o deputado federal disse que não divulga suas
agendas com o Executivo dos EUA.
Desde a posse de
Trump, em 20 de janeiro, Eduardo já esteve no país três vezes. A quarta viagem
está marcada para a semana que vem. Ele tem se encontrado com uma dezena de
parlamentares além de expoentes da direita americana.
Também nesta
quarta, a Comissão de Justiça da Câmara dos Representantes aprovou um projeto
de lei criado para atingir Moraes. Batizado de ''No Censors on our Shores Act'',
ou algo como "Lei Sem Censores dentro de nossas Fronteiras", o
projeto de lei prevê a deportação e inadmissibilidade em território americano
de autoridades estrangeiras que tenham infringido a Primeira Emenda da
Constituição dos EUA sobre liberdade de expressão.
Foi inicialmente
proposto pelo deputado republicano Darrell Issa no fim do ano passado, quando
Moraes havia bloqueado o X em território brasileiro, depois que Musk se recusou
a cumprir ordens da Corte e estabelecer representantes legais no país. Mais
tarde, Musk recuou. O projeto de lei agora vai ao plenário da Câmara, onde
republicanos têm ligeira maioria.
O périplo de
Eduardo nos EUA foi intensificado após denúncia da Procuradoria Geral da
República (PGR) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, apontado como líder de
suposta organização criminosa com o objetivo de dar um golpe de Estado - o
ex-presidente nega todas as acusações.
O deputado federal
reconhece que a iniciativa visa fortalecer a posição do grupo para as eleições
de 2026 e obter sanções econômicas e de viagem contra o ministro Alexandre de
Moraes.
Até esta quarta,
26/1, porém a Casa Branca e seus departamentos não tinham entrado na disputa.
Questionado sobre o silêncio do Executivo até então, Eduardo afirmou que
"ele [Trump] precisa entender tudo certinho. O mais comum é que as coisas
[vindas do Executivo] aconteçam de maneira mais silenciosa".
O deputado, no
entanto, demonstrou confiança de que a Casa Branca possa intervir para garantir
seu pai, Jair Bolsonaro, na urna eletrônica em 2026. Bolsonaro está inelegível
até 2030 por decisão do Tribunal Superior Eleitoral.
"Ele [Trump]
mais do que ninguém sabe como funciona o 'lawfare', então a gente tem que
vocalizar, mostra que o problema não é de toda a Suprema Corte, é do Alexandre
de Moraes, e já temos argumentos de sobra pra provar que ele merece receber
sanções OFAC", diz Eduardo.
em referência aos
múltiplos processos judiciais de Trump, que o então presidenciável sempre disse
serem perseguição política e a exclusão dele de múltiplas plataformas após os
ataques de 6 de janeiro ao Capitólio.
OFAC é a sigla em
inglês para Escritório de Controle de Propriedades Estrangeiras, órgão
responsável por impor sanção econômica e de viagem a estrangeiros e ligado ao
Departamento de Tesouro dos EUA.
A nota desta quarta
também é uma inflexão ao que o próprio Departamento de Estado declarou sobre a
contenda do X com o Judiciário do Brasil em ocasiões anteriores.
"Estamos
acompanhando a situação. O X, como uma empresa privada com negócios em muitos
países, tem que conduzir seus negócios independemente. Não é algo em que o
governo americano se envolva", afirmou à BBC News Brasil a porta-voz do
órgão Amanda Roberson há apenas quatro meses.
O Itamaraty tem
acompanhado de perto as movimentações da gestão Trump em relação ao Brasil e a
Moraes. Consultado pela BBC News Brasil, o órgão não informou se haverá
resposta pública da diplomacia brasileira.
Reservadamente, um
embaixador com conhecimento da relação dos dois países disse que "a nota
do departamento de Estado desrespeita princípios da relação bilateral entre
Brasil e EUA". A chancelaria brasileira ainda delibera se e qual será a
resposta pública do país.
¨ Funcionários
federais de tecnologia renunciam em vez de ajudar Musk e DOGE
O presidente Donald Trump defendeu a exigência de Elon Musk por e-mail
aos funcionários federais, dizendo-lhes para explicar suas realizações recentes
ou correr o risco de serem demitidos, mesmo quando funcionários de agências
governamentais foram informados de que o cumprimento do decreto de Musk era
voluntário.
Mais de 20 funcionários públicos pediram demissão na terça-feira do
Departamento de Eficiência Governamental do conselheiro bilionário de Trump,
Elon Musk, dizendo que se recusavam a usar sua expertise técnica para
“desmantelar serviços públicos essenciais”.
“Juramos servir o povo americano e manter nosso juramento à Constituição
em todas as administrações presidenciais”, escreveram os 21 funcionários em uma
carta de renúncia conjunta, uma cópia da qual foi obtida pela The Associated
Press. “No entanto, ficou claro que não podemos mais honrar esses
compromissos.”
Os funcionários também alertaram que muitos dos recrutados por Musk para
ajudá-lo a reduzir o tamanho do governo federal sob a administração do
presidente Donald Trump eram ideólogos políticos que não tinham as habilidades
ou experiência necessárias para a tarefa que tinham pela frente.
A renúncia em massa de engenheiros, cientistas de dados, designers e
gerentes de produtos é um revés temporário para Musk e o expurgo tecnológico da
força de trabalho federal do presidente republicano. Ela ocorre em meio a uma
onda de contestações judiciais que buscaram paralisar, interromper ou desfazer
seus esforços para demitir ou coagir milhares de funcionários do governo a
deixarem seus empregos.
Em uma declaração, a secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline
Leavitt, rejeitou a renúncia em massa.
“Qualquer um que pense que protestos, processos e guerras jurídicas
deterão o presidente Trump deve ter dormido debaixo de uma pedra nos últimos
anos”, disse Leavitt. “O presidente Trump não será dissuadido de cumprir as
promessas que fez para tornar nosso governo federal mais eficiente e mais
responsável perante os trabalhadores contribuintes americanos.”
Musk tem condições de assumir contrato para consertar sistema de
comunicação de tráfego aéreo
Musk postou em seu site de mídia social X que a história era uma
“notícia falsa” e sugeriu que os funcionários eram “remanescentes políticos
democratas” que “teriam sido demitidos se não tivessem renunciado”.
Os funcionários que pediram demissão trabalharam para o United States
Digital Service, mas disseram que suas funções estavam sendo integradas ao
DOGE. Seu antigo escritório, o USDS, foi estabelecido sob o presidente Barack
Obama após o lançamento malfeito do Healthcare.gov, o portal da web que milhões
de americanos usam para se inscrever em planos de seguro por meio da lei de
assistência médica assinada pelo democrata.
Todos ocuparam cargos de liderança em empresas de tecnologia como Google
e Amazon e escreveram em sua carta de demissão que ingressaram no governo por
um senso de dever para com o serviço público.
O empoderamento de Musk por Trump virou isso de cabeça para baixo. No
dia seguinte à posse de Trump, os funcionários escreveram que foram chamados
para uma série de entrevistas que prenunciaram o trabalho secreto e perturbador
do Departamento de Eficiência Governamental de Musk, ou DOGE.
De acordo com os funcionários, pessoas usando crachás de visitantes da
Casa Branca, algumas das quais não deram seus nomes, interrogaram os
funcionários apartidários sobre suas qualificações e política. Alguns fizeram
declarações que indicavam que tinham um entendimento técnico limitado. Muitos
eram jovens e pareciam guiados pela ideologia e fandom de Musk — não por
melhorar a tecnologia do governo.
“Vários desses entrevistadores se recusaram a se identificar, fizeram
perguntas sobre lealdade política, tentaram colocar colegas uns contra os
outros e demonstraram capacidade técnica limitada”, escreveram os funcionários
em sua carta. “Esse processo criou riscos de segurança significativos.”
No início deste mês, cerca de 40 funcionários do escritório foram
demitidos. As demissões representaram um golpe devastador na capacidade do
governo de administrar e proteger sua própria pegada tecnológica, eles
escreveram.
“Esses servidores públicos altamente qualificados estavam trabalhando
para modernizar a Previdência Social, serviços para veteranos, declaração de
impostos, assistência médica, assistência a desastres, auxílio estudantil e
outros serviços essenciais”, afirma a carta de demissão. “Sua remoção coloca em
risco milhões de americanos que dependem desses serviços todos os dias. A perda
repentina de sua expertise em tecnologia torna os sistemas essenciais e os dados
dos americanos menos seguros.”
Cerca de um terço dos 65 funcionários que permaneceram no USDS pediram
demissão na terça-feira em vez de assumir novas funções no DOGE.
“Não usaremos nossas habilidades como tecnólogos para comprometer
sistemas governamentais essenciais, colocar em risco dados sensíveis dos
americanos ou desmantelar serviços públicos críticos”, escreveram. “Não
emprestaremos nossa expertise para executar ou legitimar as ações do DOGE.”
O esforço de corte e queima que Musk está liderando diverge do que foi
inicialmente delineado por Trump durante a campanha presidencial de 2024. DOGE,
uma referência à criptomoeda meme favorita de Musk, foi inicialmente
apresentada como uma comissão de alto nível que existiria fora do governo.
Após a eleição, no entanto, Musk deu a entender que havia mais por vir,
postando em seu site de mídia social, X, “Ameaça à democracia? Não, ameaça à
BUROCRACIA!!!” Ele se inclinou agressivamente para o papel desde então.
Na semana passada, ele subiu ao palco da Conferência de Ação Política
Conservadora, nos arredores de Washington, onde se gabou de suas façanhas e
ergueu acima da cabeça uma motosserra chinesa enfeitada, presenteada pelo
presidente argentino Javier Milei.
“Esta é a motosserra da burocracia”, Musk gritou do palco.
Ainda assim, Musk tentou manter os talentos técnicos, com a maior parte
das demissões no escritório de Serviços Digitais concentradas em pessoas em
funções como designers, gerentes de produto, recursos humanos e equipe
contratada, de acordo com entrevistas com funcionários atuais e antigos.
Das 40 pessoas demitidas no início deste mês, apenas uma era engenheiro
— um funcionário franco e politicamente ativo chamado Jonathan Kamens, que
disse em uma entrevista à AP que acredita ter sido demitido por apoiar
publicamente a vice-presidente Kamala Harris, uma democrata, em seu blog
pessoal e por criticar Musk em conversas com colegas.
“Eu acredito que Elon Musk não está fazendo nada de bom. E eu acredito
que quaisquer dados aos quais ele tenha acesso serão usados para propósitos inapropriados e prejudiciais aos americanos”, disse
Kamens.
Veteranos do US Digital Service, que falaram sob condição de anonimato
por medo de represálias, lembraram de ter experimentado um tipo semelhante de
choque sobre como os processos governamentais funcionavam, que Musk e sua
equipe estão descobrindo. Com o tempo, muitos desenvolveram uma apreciação pelo
motivo pelo qual certas coisas no governo tinham que ser tratadas com mais
cuidado do que no setor privado.
“’Mova-se rápido e quebre coisas’ pode ser aceitável para alguém que
possui um negócio e assume o risco. E se as coisas não vão bem, o dano é
compartimentado. Mas quando você quebra coisas no governo, você está quebrando
coisas que pertencem a pessoas que não assinaram para isso”, disse Cordell
Schachter, que até o mês passado era o diretor de informação do Departamento de
Transporte dos EUA.
O USDS foi criado há mais de uma década para fazer coisas como melhorar
serviços para veteranos, e ajudou a criar um portal gratuito administrado pelo
governo para que os contribuintes não precisassem passar por terceiros como o
TurboTax. Ele também criou sistemas para melhorar a maneira como o governo
federal comprava tecnologia.
Ela se envolveu em sua cota justa de brigas burocráticas e guerras
territoriais de agências com diretores de informação em todo o governo que se
ressentiam de intrusos pisando nos sistemas de suas agências. O poder do USDS
em todo o governo derivou da forma de agir em nome da Casa Branca e sua missão
fundadora de melhorar o serviço para o povo americano.
Leavitt, o secretário de imprensa da Casa Branca, é um dos três
funcionários do governo que enfrentam um processo da The Associated Press com
base na primeira e quinta emendas. A AP diz que os três estão punindo a agência
de notícias por decisões editoriais às quais se opõem. A Casa Branca diz que a
AP não está seguindo uma ordem executiva para se referir ao Golfo do México
como Golfo da América.
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