‘Patriota’ Eduardo
Bolsonaro lidera campanha contra Moraes nos EUA
Desde a posse
de Donald Trump como o novo
presidente dos Estados Unidos, há 35 dias, o deputado federal Eduardo Bolsonaro
já fez três viagens ao país em uma campanha de apoio ao ex-presidente Jair
Bolsonaro e de ofensiva contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF)
Alexandre de Moraes, que acusa de agir politicamente motivado contra seu pai.
E a próxima visita
ao país, a quarta desde a posse, ocorrerá semana que vem. "Vou pular
carnaval nos EUA", diz Eduardo à BBC News Brasil, se esquivando de contar
os motivos da nova viagem.
Em suas andanças na
capital americana Washington, Eduardo se encontrou com quase uma dezena de
parlamentares, integrantes do Executivo e expoentes da direita do país, como o
ideólogo Steve Bannon, em uma estratégia que prevê múltiplas frentes de ação. Se
tem os trunfos de obter muitos acessos, Eduardo, porém, ainda não conseguiu o
embarque da Casa Branca à sua estratégia.
"Eu não peço
sanção ao povo brasileiro, nada sobre tarifas (comerciais). Mas no caso do
Alexandre de Moraes, acho que ele se enquadra para sofrer 'sanções OFAC', como
aconteceu com o pessoal do Tribunal Penal Internacional (TPI)", explicou
Eduardo Bolsonaro à BBC News Brasil, mencionando as sanções econômicas e de
viagem impostas a promotores do TPI pelo presidente Trump.
OFAC é a sigla em
inglês para Escritório de Controle de Propriedades Estrangeiras, órgão
responsável por impor esse tipo de punição a estrangeiros e ligado ao
Departamento de Tesouro dos EUA.
"Você acha que
o Trump vai deixar que o Brasil copie a Venezuela e mantenha inelegível um dos
principais opositores de um governo de esquerda?", questiona Eduardo, sem
explicar de que maneira Trump poderia reabilitar Bolsonaro na urna eletrônica
em 2026, já que o ex-presidente está inelegível até 2030 por decisão do
Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Alexandre de Moraes
nega qualquer decisão política e afirma, em declarações recentes e nos autos,
que tem atuado para proteger a legislação e a democracia brasileiras. Procurado
pela BBC News Brasil, ele não quis comentar o assunto.
Ex-sócio de Trump
em um empreendimento hoteleiro no Rio de Janeiro, o ex-comentarista da Jovem
Pan Paulo Figueiredo é um dos artífices da estratégia política do grupo de
Bolsonaro nos EUA.
As ações têm
seguido a cartilha dos próprios trumpistas de "flood the zone", algo
como promover uma "enxurrada" de atos simultâneos para dificultar a
resistência dos oponentes. Radicado na Flórida, Figueiredo costuma acompanhar
Eduardo em boa parte das agendas políticas.
"Virá de todos
os lados: (Elon) Musk, Senado (dos EUA), Câmara (dos EUA), Judiciário (dos
EUA). E por fim a Casa Branca vai agir", afirma Figueiredo, denunciado
pela Procuradoria Geral da República por envolvimento em atos golpistas, o que
ele nega.
<><>
Enxurrada
Os primeiros sinais
concretos de resultado desta ofensiva começaram a surgir na semana passada,
quando Alexandre de
Moraes passou a ser processado pessoalmente pela empresa de mídia de Trump, a
Trump Media & Technology Group (TMTG), em associação com a rede Rumble,
recém-bloqueada no Brasil por ordem de Moraes. A ação, movida na Flórida,
questiona o poder do ministro para tomar decisões sobre conteúdos postados na
Rumble e sobre a monetização destes conteúdos.
O processo foi
iniciado apenas algumas horas depois da denúncia da PGR apontar Bolsonaro como
suposto líder de uma organização criminosa que teria planejado a ruptura
democrática do Brasil após as eleições de 2022. O advogado da empresa de Trump,
Martin de Luca, tem atuado também como conselheiro de Bolsonaro, de acordo com
o jornal New York Times.
Nesta terça, a
juíza do caso, Mary S. Scriven, negou um pedido de liminar para assegurar às
empresas proteção contra as decisões de Moraes. Segundo a juíza, como Moraes
não utilizou os tratados internacionais ou a Convenção de Haia para acionar as
duas empresas (que não tem representação legal no Brasil) e notificá-las de
qualquer decisão, suas ordens são inválidas.
Scriven também
disse não ver evidências de que Moraes ou qualquer outro agente estivesse
forçando as empresas a aplicarem tais decisões em território americano, caso em
que ela afirma que teria concedido a liminar - e reafirma que o juiz brasileiro
não tem autoridade sobre a jurisdição americana. O mérito da ação ainda não foi
julgado.
Mas não parou aí.
Na próxima quarta-feira, 26/2, o Comitê Judiciário da Câmara dos Representantes
dos EUA avaliará um projeto de lei batizado de ''No Censors on our Shores
Act'', ou algo como "Lei Sem Censores dentro de nossas Fronteiras".
O projeto, que
prevê a deportação e inadmissibilidade em território americano de autoridades
estrangeiras que tenham infringido a Primeira Emenda da Constituição dos EUA
sobre liberdade de expressão, foi proposta inicialmente no fim do ano passado
tendo como alvo, em particular, Alexandre de Moraes. À época, Moraes havia
bloqueado em território brasileiro o X, antigo Twitter, do bilionário trumpista
Elon Musk no Brasil, depois que o empresário se recusou a cumprir ordens da
Corte e estabelecer representantes legais no país. Mais tarde, Musk recuou.
"O juiz do
Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes é a vanguarda de um ataque
internacional à liberdade de expressão contra cidadãos americanos como Elon
Musk", afirmou à BBC News Brasil a congressista Maria Elvira Salazar, uma
das entusiastas do projeto de lei que mira Moraes, nesta terça (25/2). Segundo
Salazar, "os aplicadores da censura não são bem-vindos na terra da
liberdade, os Estados Unidos."
Salazar,
republicana da Flórida, foi uma das que recebeu visita de Eduardo Bolsonaro e
de Paulo Figueiredo na capital americana na última semana. Outro deputado
visitado pelo brasileiro foi Jim Jordan, presidente da Comissão de Justiça da
Câmara, de quem Eduardo ouviu que o projeto deve ser aprovado com facilidade na
Comissão e de lá seguir ao Plenário, onde os republicanos têm uma diminuta
maioria.
Eduardo esteve
ainda, na semana passada, no gabinete do deputado republicano Rich McCormich,
da Geórgia, que na noite desta segunda (24/2) marcou o presidente dos EUA em um
post no X em que acusava Moraes de estar "usando o judiciário como arma
para fraudar as eleições de 2026, silenciando a oposição e protegendo o
presidente Lula". Bolsonaro está inelegível até 2030 por decisão do
colegiado do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
McCormich dizia
ainda que "a denúncia (da PGR) a Jair Bolsonaro não é justiça – é
perseguição política, tal como o que foi feito ao Presidente Trump" e
chamava Moraes de "ameaça aos EUA". "Exorto a administração
Trump e o Congresso a imporem sanções Magnitsky, proibições de vistos e sanções
econômicas. Os EUA devem defender a democracia, a liberdade de expressão e o
Estado de direito – antes que seja tarde demais". Sanções Magnitsky,
criadas em 2012, preveem que o alvo está proibido de entrar nos EUA ou usar seu
sistema bancário. Segundo Eduardo, McCormich e os demais deputados, como o
republicano Chris Smith, enviarão essa semana cartas individuais ao National
Security Council da Casa Branca pedindo sanções a Moraes.
Pouco depois da
postagem de McCormich, o senador republicano Mike Lee, também visitado nos
últimos dias por Eduardo e Figueiredo, repostou a mensagem do colega de
partido, repetiu acusações sem provas de que Alexandre de Moraes usou a justiça
eleitoral politicamente e anunciou que fará uma viagem ao Brasil ainda este ano
com uma delegação de senadores para "fazer algumas perguntas difíceis
sobre o juiz Alexandre de Moraes e o alegado uso político do sistema judicial
brasileiro".
Ato contínuo, Musk
entrou no fio comentando: "Bom". Ele também interagiu com uma
postagem em inglês de um influencer que relatava trechos de um discurso de
Moraes na Faculdade de Direito da USP nesta segunda, 24/2, na qual o ministro
citou as big techs e afirmou que "estamos começando a entender como se deu
esse processo de transformar as redes sociais em instrumentos de uma ideologia
nefasta, o fascismo, disseminando discursos de ódio, misoginia, homofobia e até
ideias nazistas".
Em comentário à
postagem, Musk pergunta: "Moraes não tem propriedades nos EUA?" Na
sequência, Paulo Figueiredo responde dizendo que não era preciso que o ministro
brasileiro tivesse qualquer propriedade no país para que fosse alvo de sanções
desde que fosse incluído na Specially Designated Nationals (SDN) list, uma
lista de indivíduos e entidades alvos de sanção dos EUA, o que potencialmente
congelaria ativos e transações feitas com instituições financeiras que se
relacionam com os EUA. É um instrumento frequentemente usado contra figuras de
regimes adversários dos EUA, como o russo e o chinês. Musk, então respondeu:
"interessante".
"Eu não sei se
o Alexandre de Moraes ficou mal acostumado a trocar farpas com Elon Musk quando
ele era só um empresário, mas agora ele é praticamente ministro do governo
Trump, a situação é diferente", diz Eduardo.
<><> Sem
a caneta de Trump
Mas até agora
Donald Trump não usou a Casa Branca ou departamentos do governo americano para
promover Bolsonaro ou punir Moraes.
Apoiadores do
ex-presidente nutriam a expectativa de que o ministro brasileiro tivesse o
visto americano cassado por Ordem Executiva de Trump assinada ainda no dia da
posse, 20/1. A esperança se baseava no fato de que o nomeado do Republicano
para o Departamento de Estado, o então senador Marco Rubio, havia endossado
esse tipo de ideia no ano passado.
Mas Trump não agiu.
À época, um alto conselheiro de Trump disse à BBC News Brasil que o republicano
estava focado nas questões prioritárias de seu próprio país - o que não parece
ter mudado pouco mais de um mês depois.
E apesar de
reiterados pedidos, Eduardo ainda não obteve uma reunião com o secretário de
Estado Rubio. Na semana passada, a BBC News Brasil apurou que ele foi recebido
no Departamento de Estado pelo Embaixador Michael Kozak, um alto funcionário do
Escritório de Assuntos Ocidentais do Departamento.
A reunião, que não
foi divulgada pelo Departamento de Estado nem pelo deputado, levou Eduardo a
alterar, de última hora, o horário de seu discurso no Cpac, a conferência
conservadora que projetou Trump e cuja edição de 2025 aconteceu em Washington,
na última semana. Quando falou, Eduardo defendeu que Jair Bolsonaro tem sido
vítima da politização do Judiciário, encarnado por Alexandre de Moraes, e
comparou a situação com a atuação de juízes americanos que têm bloqueado Ordens
Executivas de Trump potencialmente inconstitucionais. Foi aplaudido.
O clima no evento
era francamente favorável aos Bolsonaro. Pelos corredores, Bannon se recusou a
responder perguntas e se limitou a dizer à BBC News Brasil, em inglês:
"Bolsonaro Livre". Já um influencer de direita que recém entrevistou
Bolsonaro no Brasil arrancou vaias a Moraes e impressionou a plateia ao
descrever sua visita ao Brasil como a um lugar perigoso, pro qual ele foi tendo
"um advogado internacional contratado", "um veículo
blindado" e "uma equipe de nove pessoas", por segurança. Já o
presidente argentino Javier Milei citou de passagem "fraudes eleitorais no
Brasil", sem explicar ao que se referia.
No último dia do
evento, Eduardo, que não se encontrou com Trump privadamente desde a posse
apesar das três visitas recentes, posicionou-se nas fileiras da frente e foi a
última autoridade estrangeira a ser citada pelo republicano em seu discurso.
Trump o chamou de "meu amigo", elogiou a família e mandou "um
oi" a seu pai, o ex-presidente. Não fez, porém, qualquer menção à denúncia
da PGR ou aos problemas de Bolsonaro na Justiça.
Questionado sobre o
assunto, Eduardo relembrou o convite a seu pai para participar da posse de
Trump (Bolsonaro não teve a viagem autorizada pelo STF) como mostra de ação do
presidente americano e contemporizou: "O Trump tem que entender tudo
direitinho primeiro. E é normal que o governo aja silenciosamente".
São sinais que têm
sido observados com atenção pelo governo brasileiro.
A BBC News Brasil
apurou que o Itamaraty monitora os acontecimentos, mas não vê, até agora,
razões para se posicionar pública e oficialmente. Um embaixador com
conhecimento das relações com os americanos afirmou que "em todas as
ocasiões" os diplomatas do Brasil repetem sobre a importância do STF na
defesa da democracia do Brasil.
Em termos práticos,
até agora Trump prometeu tarifas sobre o aço, o alumínio e o etanol
brasileiros. Embora evite conversas que peçam sanções econômicas ao Brasil - o
que tem sido feito por outros bolsonaristas - Eduardo Bolsonaro diz não ter feito
movimentos para tentar aliviar o risco a esses setores produtivos.
"Isso é (um
assunto) de relação governo a governo. Quem tem que consertar isso é o Lula e
seus ministros", afirmou Eduardo, relembrando que seu pai também teve que
negociar tarifas com Trump e criticando o que chamou de "falta de
canal" entre o atual Planalto e a Casa Branca.
Dentro da gestão
Lula, a Advocacia Geral da União (AGU) chegou a adotar uma postura pró-ativa
para defender o ministro, o que mudou nos últimos dias. Agora, a ordem é
esperar que o ministro peça formalmente para ser defendido pelo órgão.
Alexandre de Moraes ainda não foi citado no processo nos EUA e tampouco teve
defesa constituída para o processo na Flórida. Procurado via STF, o ministro
não quis comentar a ofensiva a ele nos EUA.
¨ ‘Patriota’ Bolsonarista Marcos do Val pede 'pelo amor
de Deus que os EUA invadam o Brasil'
O senador
bolsonarista Marcos do Val (Podemos-ES) defendeu que tropas norte-americanas
iniciem uma invasão ao Brasil e cutucou o ministro do Supremo Tribunal Federal
(STF) Alexandre de Moraes, relator do inquérito do plano golpista na
Corte.
“Pedir pelo amor de
Deus que os EUA invadam o Brasil para recuperar a nossa democracia. O que vamos
fazer? Alexandre (de Moraes) está rindo”, disse o parlamentar, de acordo com um
vídeo que circula nas redes sociais.
Os ataques dos
bolsonaristas a Moraes e à soberania brasileira foram divulgados em um contexto
no qual Jair Bolsonaro (PL) e mais de 33 pessoas foram denunciadas pela
Procuradoria-Geral da República (PGR) na investigação da trama golpista. O STF
analisa o caso e pode condenar o político da extrema-direita à prisão.
As articulações
entre bolsonaristas e os EUA não acontecem por acaso. Críticas ao Judiciário
são uma estratégia do norte-americano Steve Bannon, de 69 anos, que tentou na
última década fazer partidos de direita chegarem ao poder nos Estados Unidos e
em outros países.
O estrategista do
atual presidente norte-americano, Donald Trump, teve um encontro com o deputado
federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) nos EUA após o segundo turno da eleição no
Brasil e aconselhou o parlamentar a questionar o resultado.
Em janeiro de 2021,
quando Donald Trump perdeu a eleição, vários apoiadores invadiram o Legislativo
e acusaram o sistema eleitoral de ser fraudulento.
Durante seu
governo, Jair Bolsonaro tentou passar para a população a ideia de que o
Judiciário atrapalhava a gestão. O ex-mandatário defendeu a participação das
Forças Armadas na apuração do resultado da eleição em 2022. Em novembro daquele
ano, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) multou o PL em R$ 22,9 milhões após o
partido questionar a confiança das urnas eletrônicas.
Em janeiro de 2023,
bolsonaristas realizaram atos golpistas e invadiram a Praça dos Três Poderes,
em Brasília (DF), resultando em mais de 370 condenações emitidas pelo STF.
Novos julgamentos acontecerão.
Também em 2023, o
TSE tornou Bolsonaro inelegível por declarações golpistas no ano anterior,
quando ele afirmou a embaixadores, em Brasília, que o sistema eleitoral
brasileiro não tem segurança contra fraudes.
Fonte: BBC News
Brasil
Nenhum comentário:
Postar um comentário