Por que o preço dos alimentos está subindo tanto?
O preço dos alimentos disparou. Quem
frequenta os supermercados brasileiros sabe que o assunto nos seus corredores é
um samba de uma nota só: tá tudo caro.
O tema anda tão em alta que possivelmente é um dos
elementos que mais influencia na sucessiva queda de popularidade do governo
Lula, acendendo um sinal de alerta – muito embora o aumento no preço dos alimentos
tenha sido muito menor no primeiro biênio do governo Lula do que durante o
governo Bolsonaro.
O IPCA do grupo alimentos e bebidas acumulou uma alta
de 21,4% no biênio 2019-2020; 20,5% em 2021-2022 e apenas 8,8% em 2023-2024. O
que parece assustar mais, no entanto, é a velocidade da subida.
Ao contrário do cenário atual, em 2023 os alimentos
foram os responsáveis por reduzir a inflação média, garantindo que ela ficasse
na meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional, o CMN. A alta acumulada
dos alimentos em 2023 foi de apenas 1,03%, terminando o ano com a segunda menor
alta de todos os nove grupos medidos pelo IPCA.
Diferente do que dizem os oportunistas de plantão, que
usam a inflação mais elevada para bradar que tudo que se resolveria com cortes
de gastos públicos e com austeridade fiscal, os reais motivos para a alta dos
preços dos alimentos encontram explicação em um cenário muito mais complexo e
envolve diversas causas. Nenhuma delas é o desequilíbrio fiscal.
Em primeiro lugar, há um problema grave de oferta de
alimentos. Como os alimentos são produtos padronizados, sem grande agregação de
valor e diferenciação de marca, seus preços no mercado estão submetidos à lei
da oferta e da procura. Portanto, se a oferta se reduz, o preço aumenta.
Os eventos climáticos extremos como as chuvas
intensas, especialmente no sul do país, as secas e a
atual onda de calor têm forte impacto sobre a oferta de alimentos,
especialmente de hortaliças que já têm redução de oferta nos meses de verão.
Para um dos vilões do momento, o café, há uma projeção de redução de 4,4% na
safra brasileira de 2025, como decorrência direta da estiagem de 2024.
Segundo um estudo da revista Nature de 2024, o
calor é o extremo climático mais perigoso para a agricultura. Para cada 1ºC de
aumento nas temperaturas, a inflação no preço dos alimentos é impactada em
0,2%. Até 2035 a expectativa da publicação é que o preço dos alimentos acumule,
no mundo, uma alta de 3%.
Outro elemento que impacta o preço doméstico dos
alimentos é o preço internacional das commodities, que sofre variações
conjunturais a depender de oferta e procura e de eventos externos tais como
guerras, crises econômicas e desorganização das cadeias de suprimento e
transporte.
Os produtos que são atrelados ao mercado internacional
são alguns dos que mais pressionam os preços domésticos. No caso do café, a
redução da produção em países como Vietnã e Indonésia tem forte impacto no
preço que pagamos nas prateleiras do mercado.
Um terceiro motivo que explica o aumento dos preços é a
valorização que o dólar sofreu perante o real nos meses finais de 2024. O
efeito da desvalorização cambial é duplo: por um lado, se o preço internacional
continua o mesmo, medido em dólar, por outro ele é majorado em reais.
Além da relação estreita entre o preço das commodities
negociadas em bolsa de valores e os custos domésticos, há ainda o impacto dos
componentes agrícolas que são importados. Por exemplo, com o encarecimento do
dólar frente ao real, aumenta o preço dos fertilizantes, das máquinas, da
aquisição de tecnologia e eles são repassados para o consumidor final.
O segundo efeito é que os produtos agrícolas
brasileiros ficam mais competitivos lá fora. Isso explica o porquê o Brasil
enviou 50,5 milhões de sacas de café ao exterior em 2024, totalizando nada
menos que 28,8% a mais do que o total exportado do produto em 2023.
O mesmo ocorreu com a carne. Há uma tempestade perfeita
que ameaça deixar o preço dessa proteína ainda elevado para os brasileira. A
Companhia Nacional de Abastecimento, a Conab, projeta uma redução de 8,5% na disponibilidade
de carne bovina em 2025.
Soma-se a isso a prioridade que o agronegócio
brasileiro confere a maximização da sua taxa de lucro, aproveitando-se do
cenário cambial favorável para exportar a carne bovina, impactando ainda mais
no preço doméstico.
Em relação a 2023 a carne bovina teve um aumento de
24,73% no total exportado. Aliás, a exportação de carne bovina atingiu, em 2023
e 2024, nada menos que o máximo da série histórica.
É bom lembrar que a inflação de alimentos está superior
à média nacional e quanto mais pobre é o brasileiro, mais o preço dos alimentos
impacta na sua renda.
O governo Lula está operando em diversas dimensões para
reduzir o impacto do preço dos alimentos no bolso dos brasileiros. Há
iniciativas, por exemplo, como a expansão dos incentivos à agricultura
familiar, os créditos suplementares previstos para o próximo Plano Safra, o
incentivo à produção de fertilizantes e bionsumos; a expansão da infraestrutura
logística; isenção de tarifas para importação e a desoneração dos produtos da
cesta básica, no âmbito da reforma tributária. Mas a questão do preço dos
alimentos ainda demanda políticas emergenciais de curto, médio e longo
prazo.
Uma das principais medidas, urgente pelo lado da
questão social e, sobretudo, econômica, é a reforma agrária radical, envolvendo
a desapropriação, o assentamento de famílias, o acesso ao crédito e políticas
de assistência técnica e extensão rural. Somente a agricultura familiar pode
equacionar a questão produtiva, de custos e de preservação ambiental,
possibilitando ampla oferta de alimentos saudáveis e acessíveis à população
brasileira.
¨ Quem lucra enquanto o mundo queima?
Por Marina do MST
Janeiro de 2025 entrou para a história como o mês mais
quente já registrado, sucedendo o ano mais quente da história. O planeta está
fervendo, e os responsáveis por essa catástrofe continuam lucrando com a crise
climática. O modelo predatório do setor agro-hidro-mineral, sustentado pelo
capitalismo financeirista, nos empurra década após década para o ponto de não
retorno.
Enquanto a concentração de terras e a destruição
ambiental avançam, vemos crescer os extremos climáticos: enchentes
devastadoras, secas prolongadas e queimadas que reduzem nossa biodiversidade a
cinzas. Esse cenário compromete a produção de alimentos, provoca alta nos
preços e agrava ainda mais a insegurança alimentar.
A crise climática não é um fenômeno isolado. Ela é
resultado de um sistema econômico que privilegia poucos em detrimento de
muitos. E no Brasil, isso se reflete diretamente no modelo agrícola dominante:
enquanto pequenos produtores agroecológicos lutam para produzir alimentos
saudáveis e sustentáveis, o agronegócio segue desmatando, envenenando a terra
com agrotóxicos e concentrando terras para monoculturas que não alimentam a população.
A cada momento, novos estudos descortinam os riscos e
perigos da destruição planetária: oncologistas apontam a relação entre o
aumento da exposição ao calor extremo, à poluição do ar e aos raios
ultravioleta e a escalada de casos de alguns tipos de câncer.
É urgente que o estado do Rio de Janeiro e todo o
Brasil adotem medidas concretas para enfrentar essa crise. Isso passa por
cumprir e fortalecer leis ambientais já existentes, como a Política Estadual de
Adaptação Climática e o Inventário de Emissões, que seguem ignorados.
Mas não basta apenas mitigar danos. Precisamos de uma
transformação estrutural no campo, e a resposta está na reforma agrária e na
agroecologia. Enquanto o latifúndio monocultor causa secas, a agroecologia não
só protege o meio ambiente e a biodiversidade, mas também regenera o solo,
combate a crise climática e garante segurança alimentar para a população. Ela
demonstra, na prática, que o “agro pop” não é sinônimo de progresso, mas de
desigualdade, crise e morte.
Sem uma mudança radical no modelo agrícola, seguiremos
condenados a tragédias ambientais e sociais cada vez mais intensas. É hora de
fazer escolhas políticas que coloquem a vida acima do lucro.
Por Juliane Furno,
em Th Intercept/Brasil de Fato
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