terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

7 vezes em que potências negociaram o futuro de países e territórios sem contar com as populações afetadas

A Ucrânia não foi convidada para a reunião-chave entre autoridades dos Estados Unidos e da Rússia na Arábia Saudita na semana passada para decidir como poderia ser a paz no país.

O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, afirmou que a Ucrânia "nunca aceitará" qualquer decisão sem sua participação nas negociações para encerrar a guerra com a Rússia.

A decisão de negociar a soberania dos ucranianos sem eles – assim como a tentativa notoriamente desproporcional do presidente dos EUA, Donald Trump, de reivindicar metade da riqueza de minerais raros da Ucrânia como preço pelo contínuo apoio americano – revela muito sobre como Trump vê a Ucrânia e a Europa.

Mas esta não é a primeira vez que grandes potências conspiram para negociar novas fronteiras ou esferas de influência sem a participação das pessoas que vivem nesses territórios.

Essa política de poder autoritária raramente termina bem para os afetados, como mostram estes sete exemplos históricos:

>>> 1. A partilha da África

No inverno de 1884-1885, o líder alemão Otto von Bismarck convidou as potências europeias a Berlim para uma conferência onde seria formalizada a divisão de todo o continente africano entre elas.

Nenhum africano esteve presente na conferência, que ficaria conhecida como "A Partilha da África".

Entre outras consequências, a conferência levou à criação do Estado Livre do Congo, sob controle da Bélgica, onde ocorreram terríveis atrocidades coloniais e milhões de pessoas morreram.

A Alemanha também estabeleceu a colônia do Sudoeste Africano (atual Namíbia), onde mais tarde foi perpetrado o primeiro genocídio do século 20 contra povos colonizados.

>>> 2. Divisão da Samoa

Não foi apenas a África que foi dividida dessa maneira. Em 1899, a Alemanha e os Estados Unidos realizaram uma conferência e forçaram os samoanos a aceitar um acordo que dividia suas ilhas no Pacífico entre as duas potências.

Isso aconteceu apesar de os samoanos terem expressado seu desejo de autogoverno ou de uma confederação de Estados do Pacífico com o Havaí.

Como "compensação" por não ter obtido Samoa, o Reino Unido recebeu o controle de Tonga, hoje um país independente.

A Samoa Alemã ficou sob domínio da Nova Zelândia após a Primeira Guerra Mundial e permaneceu assim até 1962, quando se tornou independente. Já a Samoa Americana (assim como outras ilhas do Pacífico) continua sendo um território dos Estados Unidos até os dias de hoje.

>>> 3. Fim do Império Otomano

Durante o auge da Primeira Guerra Mundial, representantes britânicos e franceses se reuniram para decidir como dividiriam o Império Otomano, com sede na atual Turquia, após o fim do conflito.

Como potência inimiga, os otomanos não foram convidados para as negociações.

O diplomata britânico Mark Sykes e o francês François Georges-Picot redesenharam as fronteiras do Oriente Médio com base nos interesses de seus respectivos países.

Os franceses ficariam com o Líbano e a Síria, enquanto os britânicos assumiriam o controle do Iraque e da Palestina.

Acordo Sykes-Picot contrariava compromissos assumidos pelo Reino Unido na correspondência Hussein-McMahon, na qual prometia apoiar a independência árabe do domínio turco.

Além disso, o acordo também entrava em conflito com as promessas britânicas feitas na Declaração de Balfour, que apoiava os sionistas na criação de uma pátria judaica na Palestina otomana.

O Acordo Sykes-Picot se tornou a origem de décadas de conflitos e má gestão colonial no Oriente Médio, cujas consequências ainda são sentidas hoje.

>>> 4. O acordo da Tchecoslováquia

Em setembro de 1938, o primeiro-ministro britânico, Neville Chamberlain, e o primeiro-ministro francês, Édouard Daladier, se reuniram com o ditador fascista italiano Benito Mussolini e com o alemão Adolf Hitler para assinar o que ficaria conhecido como o Acordo de Munique.

Os líderes tentaram evitar a propagação da guerra por toda a Europa depois que os nazistas de Hitler fomentaram um levante e começaram a atacar as áreas de fala alemã da então Tchecoslováquia (hoje dividida entre República Tcheca e Eslováquia) conhecidas como os Sudetos. Fizeram isso com o pretexto de proteger as minorias alemãs.

Nenhum tchecoslovaco foi convidado para a reunião.

Muitos ainda consideram a reunião como a "traição de Munique", um exemplo clássico de uma tentativa falha de apaziguar uma potência beligerante com a falsa esperança de evitar a guerra.

>>> 5. Judeus na Europa

Em 1938, 32 países se reuniram em Évian-les-Bains, França, para decidir o que fazer com os refugiados judeus que fugiam da perseguição na Alemanha nazista.

Antes de a conferência começar, Reino Unido e Estados Unidos haviam acordado não pressionar um ao outro para aumentar a cota de judeus que aceitariam em solo americano ou na Palestina britânica.

Embora Golda Meir (a futura líder israelense) tenha participado da conferência como observadora, nem ela nem qualquer outro representante do povo judeu foram autorizados a participar das negociações.

Os participantes em grande parte não conseguiram chegar a um acordo sobre a aceitação de refugiados judeus, com exceção da República Dominicana. E a maioria dos judeus na Alemanha não pôde sair antes que o nazismo desse início ao Holocausto.

>>> 6. O pacto entre URSS e Alemanha

Enquanto Hitler planejava sua invasão da Europa Oriental, ficou claro que seu principal obstáculo era a União Soviética. Sua resposta foi assinar um tratado improvável de não agressão com a URSS.

O tratado, que leva o nome de Vyacheslav Molotov e Joachim von Ribbentrop (os ministros de Relações Exteriores soviético e alemão), garantiu que a União Soviética não reagiria quando Hitler invadisse a Polônia.

Ele também dividiu a Europa em esferas nazista e soviética. Isso permitiu que os soviéticos se expandissem para a Romênia e os Estados Bálticos, atacassem a Finlândia e tomassem sua própria parte do território polonês.

Não é de se surpreender que alguns vejam as atuais conversas entre Estados Unidos e Rússia sobre o futuro da Ucrânia como o renascimento desse tipo de diplomacia secreta que dividiu as nações menores da Europa entre as grandes potências na Segunda Guerra Mundial.

>>> 7. Conferência de Yalta

Com a iminente derrota da Alemanha nazista, o primeiro-ministro britânico Winston Churchill, o ditador soviético Josef Stalin e o presidente dos Estados Unidos Franklin D. Roosevelt se reuniram em 1945 para decidir o destino da Europa pós-guerra.

Essa reunião ficou conhecida como a Conferência de Yalta.

Juntamente com a Conferência de Potsdam, alguns meses depois, Yalta criou a arquitetura política que levaria à divisão da Europa durante a Guerra Fria.

Em Yalta, na península da Crimeia - território ucraniano anexado pela Rússia em 2014 - os "três grandes" decidiram a divisão da Alemanha, enquanto a Stalin também foi oferecida uma esfera de interesse na Europa Oriental.

Isso assumiu a forma de uma série de Estados-tampão controlados politicamente pela URSS na Europa Oriental, um modelo que alguns acreditam que Putin pretende emular hoje.

¨      Quais os planos do mundo árabe para a reconstrução da Faixa de Gaza?

O Egito e vários países árabes estão trabalhando em propostas de reconstrução para a Faixa de Gaza, buscando garantir que o povo palestino permaneça na região sem ser deslocado e estabelecer um mecanismo de governança sem o envolvimento do Hamas.

O trabalho em torno das propostas é uma resposta ao plano apresentado pelo presidente dos EUA, Donald Trump, que inclui realocar palestinos para o Egito, Jordânia e possivelmente outros países, bem como assumir o controle de Gaza, transformando-a no que ele chamou de "Riviera do Oriente Médio".

Segundo a agência de notícias Reuters, pelo menos quatro propostas foram elaboradas. Mas o plano egípcio é atualmente a base para o esforço árabe de oferecer uma alternativa às ideias de Trump.

De acordo com fontes da BBC, Cairo está perto de finalizar os detalhes técnicos do plano, que envolve limpar os escombros, reconstruir Gaza, determinar como os palestinos viverão durante esse período e elaborar os mecanismos de governança após a guerra.

No entanto, o futuro das facções armadas em Gaza, particularmente o Hamas e a Jihad Islâmica, continua em discussão.

O Egito disse que o plano será desenvolvido em cooperação com a administração dos EUA.

Fontes egípcias também disseram à BBC que a Organização das Nações Unidas (ONU) e a União Europeia (UE) desempenharão um papel no plano.

O Egito consultou vários países árabes, incluindo Jordânia e Arábia Saudita, sobre os detalhes do plano em preparação para uma reunião regional em Riad em 21 de fevereiro.

Esta reunião deve ser seguida por uma cúpula árabe de emergência no Cairo. O encontro estava inicialmente marcado para 27 de fevereiro, mas foi adiado, supostamente por razões logísticas, sem que uma nova data fosse definida.

<><> Como o plano funcionará sem deslocamento em massa?

Uma fonte egípcia disse à BBC que as consultas árabes já começaram para preparar uma futura conferência sobre a reconstrução de Gaza com ampla participação europeia.

A fonte acrescentou que o plano egípcio está focado principalmente na reconstrução da Faixa de Gaza e na divisão da região em três zonas humanitárias, cada uma com 20 grandes acampamentos para os residentes viverem, com o fornecimento de necessidades básicas, como água e eletricidade.

De acordo com o plano, dezenas de milhares de casas móveis e estruturas semelhantes a tendas serão introduzidas em áreas seguras para acomodação por seis meses, juntamente com a remoção dos escombros causados pela guerra.

No entanto, essas ações não são atualmente permitidas pelos israelenses, segundo a fase inicial do acordo de cessar-fogo negociado entre o governo de Benjamin Netanyahu e o Hamas.

O plano egípcio também enfatizará a necessidade de permitir regularmente que combustível e materiais de reconstrução entrem em Gaza.

De acordo com o projeto, a reconstrução será financiada por doadores árabes e internacionais, com cerca de 50 empresas multinacionais especializadas em construção fornecendo unidades habitacionais seguras dentro de 18 meses nas três zonas propostas de Gaza.

E o financiamento será administrado por um comitê composto por representantes árabes e internacionais.

A proposta também inclui a criação de uma zona tampão e uma barreira para obstruir a escavação de túneis ao longo da fronteira de Gaza com o Egito, seguida pela remoção de entulho e o estabelecimento de 20 áreas habitacionais temporárias nas áreas norte, centro e sul da faixa.

Tarek al-Nabarawi, presidente do Sindicato dos Engenheiros Egípcios, disse à BBC que o plano pode levar de três a cinco anos para ser concluído, considerando o número de partes envolvidas e o custo.

No entanto, em 15 de fevereiro, o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu anunciou que não permitiria casas móveis e equipamentos de construção na Faixa de Gaza, citando questões de segurança. A condição também é uma disposição do recente acordo de cessar-fogo.

<><> O futuro do Hamas

Mas uma fonte egípcia disse à BBC que a questão pendente mais significativa é o futuro do Hamas e de outros grupos armados na Faixa de Gaza.

A fonte explicou que uma proposta do plano do Cairo envolve o desarmamento desses grupos assim que um Estado palestino for declarado dentro das fronteiras que existiam antes da Guerra dos Seis Dias.

Jerusalém Oriental será a capital desse Estado e haverá uma zona tampão — cuja localização ainda não foi determinada — para garantir a Israel que nenhuma ameaça emanará de Gaza.

Nesse ínterim, a proposta também envolve a formação de um comitê palestino para governar Gaza sem a participação do Hamas.

As forças árabes e internacionais ajudariam temporariamente o comitê na gestão da Faixa de Gaza.

O Hamas declarou anteriormente que estava disposto a ceder a governança de Gaza a um comitê nacional, mas queria ter um papel na escolha de seus membros e não aceitaria o envio de nenhuma força terrestre sem seu consentimento.

A fonte egípcia também enfatizou que, de acordo com o plano, os países árabes apoiariam a Autoridade Palestina no treinamento de seu pessoal em colaboração com a UE.

<><> E o plano de Trump?

O presidente dos EUA declarou repetidamente seu plano de realocar palestinos de Gaza, justificando isso como uma oportunidade de transformar a terra em uma área de investimento turístico e como um benefício para os próprios palestinos, já que eles não estariam mais vivendo em meio a escombros.

Trump até ameaçou interromper a ajuda ao Egito e à Jordânia se eles não acolhessem palestinos.

Dan Perry, ex-editor para o Oriente Médio da Associated Press no Cairo, escreveu em um artigo para o Israeli Jerusalem Post que o plano de Trump para realocar os palestinos de Gaza é uma forma de pressionar os países árabes e os palestinos em Gaza a remover o Hamas do poder.

Também visa interromper o apoio financeiro ao Hamas de países árabes, especialmente do Catar.

Depois de uma recente reunião em Washington entre Trump e o rei Abdullah II da Jordânia, a porta-voz do presidente dos EUA, Caroline Levitt, disse que o rei Abdullah deixou claro para Trump que prefere que os palestinos permaneçam em Gaza durante o processo de reconstrução.

Oficialmente, Trump ainda prefere realocar os palestinos para fora de Gaza.

Perry acredita que Trump pode concordar com a permanência dos palestinos em Gaza em troca de bilhões de dólares pela reconstrução de Gaza e da remoção do Hamas.

Perry também acredita que um governo civil de tecnocratas poderia ser formado em Gaza, vinculado à Autoridade Palestina na Cisjordânia e cooperando com o Egito e os países do Golfo.

<><> Que vantagem o mundo árabe tem em relação a Trump?

Mubarak Al-Ati, analista político saudita, acredita que qualquer envolvimento dos EUA levará em conta seus interesses significativos na região, particularmente na Arábia Saudita e no Egito.

Ele acrescentou que as relações pessoais entre os governantes do Egito, dos EUA e da Arábia Saudita permitiriam que eles encontrassem um terreno comum, especialmente com a próxima visita de Trump à Arábia Saudita, que moldará as futuras relações árabe-americanas.

Hassan Mneimneh, analista político de Washington, acredita que se Trump cortar a ajuda militar e econômica ao Egito e à Jordânia em resposta a qualquer plano árabe, esses países devem responder.

A Arábia Saudita, por exemplo, pode interromper seus investimentos nos EUA, abrindo assim as portas para o engajamento econômico com a China, a Rússia, a UE, a África e a América do Sul.

Al-Ati destacou o apelo para os EUA da oferta da Arábia Saudita de normalizar relações com Israel, que tem sido usada por Riad como uma tática de negociação para pressionar pelo estabelecimento de um Estado palestino com fronteiras de 1967.

A fonte egípcia observa que a recente sugestão do Cairo de cancelar o tratado de paz de Camp David com Israel, assinado em 1979, também pode ser eficaz contra Washington se Trump rejeitar qualquer plano árabe futuro.

 

Fonte: Por Matt Fitzpatrick, para The Conversation /BBC News

 

 

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