'Tarifaço'
de Trump pode aumentar vinda de produtos chineses para o Brasil e impactar
indústria
As ameaças de Donald Trump de impor
tarifas a produtos importados tem deixado a indústria brasileira
preocupada. Não
apenas pela taxação em si, mas também porque essas medidas alteram a dinâmica
do comércio global.
Um exemplo é a possível guerra comercial entre EUA
e China, que voltou a ganhar força desde que Trump indicou que pretende impor um tarifaço sob a justificativa de proteger a indústria americana.
Em janeiro, o presidente americano anunciou uma
tarifa adicional de 10% sobre produtos chineses. Em resposta, a China também anunciou taxas mais altas para produtos americanos.
Já nesta semana, Trump afirmou que um novo acordo comercial com a China "é
possível".
Segundo especialistas e representantes da indústria
consultados pelo g1, o crescente
atrito entre as duas potências pode abrir espaço para que o gigante asiático
intensifique sua relação comercial com outros países — o Brasil, por exemplo.
O movimento nem seria novidade. Segundo Marcos
Jank, professor sênior e coordenador do centro Agro Global do Insper, a China
já se preparava para uma segunda guerra comercial com os EUA e agora adota uma
visão mais estratégica, cautelosa e seletiva sobre o comércio mundial.
“Nos últimos anos, a China diversificou bastante
suas exportações, já sendo bem menos dependente dos EUA do que era em 2017. E
ela tem buscado também uma maior aproximação dos emergentes”, afirma.
Caso o movimento se concretize, a presença de
produtos chineses no mundo deve crescer bastante. Em 2024, por exemplo, a China
respondeu por 24,2% das importações brasileiras. Aumentando demais esse número,
a economia e a indústria nacional precisarão reagir.
·
Impactos para a indústria
Por um lado e em um prazo mais curto, a indicação
de especialistas é que a maior presença da China no Brasil pode diminuir os
custos para os consumidores. Isso porque a chegada de produtos chineses mais
baratos obriga a indústria brasileira a baixar os preços para manter a
competitividade no mercado.
“O que acontece na prática é que a China já vem
praticando preços muito abaixo dos preços de mercado em diversos segmentos.
Vemos um ‘dumping’ de produtos chineses no Brasil, mas isso tem prejudicado a
produção local”, diz o presidente da Federação das Indústrias do Estado de
Minas Gerais (FIEMG), Flávio Roscoe.
Nesse sentido, apesar dos produtos mais baratos
para os consumidores em um primeiro momento, representantes da indústria
sinalizam que os efeitos na economia e nas cadeias produtivas podem ser mais
negativos no país no médio e longo prazo.
Esses efeitos negativos viriam principalmente entre
os setores de maior investimento por parte da China, como:
·
indústria de máquinas e equipamentos;
·
indústria têxtil e de confecção; e
·
indústria automobilística.
Segundo o presidente-executivo da Associação
Brasileira da indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), José Velloso, o
movimento já começa a ter efeitos no faturamento e no crescimento da indústria
brasileira.
No setor de máquinas e equipamentos, por exemplo, o
executivo explica que houve uma queda de mais de 8%
do faturamento em 2024, enquanto o volume de importações cresceu 10% no mesmo
período. E entre os importados, houve ainda um aumento de 33%
dos produtos chineses vindos para o país.
“Esses já são os efeitos da guerra comercial
entre Estados Unidos e China. E, nesse
caso, o aumento das importações não são um bom sinal para a produtividade
porque o consumo do setor também caiu”, explica Velloso, indicando que esse
quadro também indica uma piora das vendas de produtos brasileiros.
Esse cenário também é visto nos outros dois
setores, que já estendem a briga por um ambiente com regras claras de
competitividade no país há algum tempo. O exemplo mais recente foi a discussão
sobre o que ficou chamado de “imposto das blusinhas”.
A cobrança de um imposto de importação de 20% para compras de até US$ 50 feitas no exterior começou em agosto do ano passado, após mais de um ano
de negociações no governo.
A medida era amplamente defendida pelo setor
têxtil, que pleiteava uma isonomia tributária e regulatória, em meio ao ganho
da força de sites e aplicativos como Shein, Shoppee e AliExpress.
Para o presidente da Associação Brasileira da
Indústria Têxtil e de Confecção, Fernando Pimentel, o aumento de tarifas por
parte dos Estados Unidos volta a acender o alerta para o setor de uma possível
“concorrência desleal”.
“Estamos sempre trabalhando em conjunto com os
órgãos de controle das nossas fronteiras, e não só para importações
convencionais, mas também para exportações que vêm pelas plataformas digitais
internacionais, para garantir que todos estejam pagando os devidos impostos,
assim como nós”, diz.
·
Impacto na taxa de câmbio
Além dos impactos vindos da China, representantes
da indústria também destacam os efeitos de um dólar mais forte em meio à imposição de tarifas por parte de Trump.
Essas medidas podem tanto deixar a produção mais
cara para as indústrias que importam matérias-primas, como podem acabar
encarecendo as taxas de juros no país e também afetar as indústrias que
dependem do acesso que os consumidores têm ao crédito – como é o caso da indústria automobilística, por exemplo.
De maneira geral, a leitura de especialistas é que
a imposição de tarifas por parte do governo dos Estados Unidos pode acabar
encarecendo os produtos no país e pressionar a inflação, forçando o Federal
Reserve (Fed, o banco central norte-americano) a subir os juros por lá.
Esse cenário tende a fortalecer o dólar frente a
outras moedas e, nesse sentido, pode pressionar a inflação brasileira – o que
também forçaria o Comitê de Política Monetária (Copom) a ser mais duro na condução dos juros por aqui.
Esse cenário também já é sentido por aqui. Segundo
o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Marcio de Lima Leite, as vendas financiadas do setor chegaram a cair
para 30% em 2023 e encerraram o ano passado em 45% do total.
“Esse ano temos um grande desafio que é fazer o
mercado crescer sabendo que a taxa de juros e o custo de financiamento serão
impactados. Além disso, ainda há muita insegurança e falta de previsibilidade
nos acordos comerciais. O que acontecerão com os acordos? Serão mantidos, estreitados,
alterados ou redirecionados?”, disse Leite durante apresentação do resultado
consolidado do setor de 2024.
·
Impacto macroeconômico
Os especialistas e representantes do setor
consultados pelo g1 ainda
destacam que o possível aumento no volume de produtos chineses do país também
pode trazer efeitos macroeconômicos no longo prazo.
“A primeira consequência disso tudo é a
desindustrialização, porque se há produtos mais baratos vindos da China, eu vou
importar. E isso já está acontecendo agora, com várias empresas anunciando
grandes números de demissões”, afirma Velloso, da Abimaq.
Nesse caso, além da perda de faturamento de
diversos setores da economia brasileira, há também o risco de um aumento na taxa de
desemprego e de uma redução dos investimentos no país.
Um exemplo desse cenário é o setor de fabricação de
geradores eólicos. O segmento, que chegou a ter sete fabricantes no país, hoje
tem apenas três.
Nesse sentido, parte das exigências feitas
atualmente pelos representantes da indústria brasileira é a construção de uma
agenda voltada para aumentar a competitividade brasileira no exterior.
“A verdade é que nós não temos que ter apenas uma
agenda contra aqueles que usam de mecanismos inadequados, mas também precisamos
cuidar da nossa agenda de competitividade, para que também possamos aumentar
nossa presença nos mercados internacionais”, diz Pimentel, presidente da Abit.
·
O que esperar para os próximos meses?
Com uma série de medidas anunciadas pelo presidente
dos Estados Unidos, a leitura dos executivos consultados pelo g1 é que os
próximos meses ainda guardam muita incerteza, principalmente sobre eventuais
impactos diretos e indiretos no Brasil.
“Há um risco de desaceleração mundial da economia,
muita instabilidade e insegurança que podem acabar impactando diretamente o
mercado brasileiro”, diz Leite, da Anfavea.
Ele destaca, no entanto, que o país também tem
grandes oportunidades pela frente, que podem acabar sendo positivas para a
indústria.
“O Brasil tem uma oportunidade muito grande de
estreitar a relação com os principais países, podendo aproveitar esse momento
para ter mais competitividade nas nossas exportações. É momento de ter calma,
serenidade e entender as mudanças que estão acontecendo”, completa o executivo.
·
Marcas chinesas de smartphones
expandem mercado no Oriente Médio e Sudeste Asiático
Os fabricantes chineses de
smartphones têm conquistado cada vez mais espaço no Oriente Médio e no Sudeste
Asiático, com um crescimento notável nas remessas de aparelhos em 2024,
conforme relatado pela Canalys.
O aumento da presença dessas
marcas ocorre em meio à crescente concorrência nos mercados emergentes, com
destaque para os resultados recentes na região do Oriente Médio, excluindo a
Turquia.
Entre as marcas que mais se
destacaram na região estão a Transsion, Xiaomi e Honor. A Transsion, fabricante
de aparelhos de baixo custo com sede em Shenzhen e tradicionalmente forte no
mercado africano, viu suas remessas crescerem 9% no Oriente Médio, alcançando
8,3 milhões de unidades em 2024.
Com isso, a marca deteve 17%
de participação no mercado, superando ligeiramente a Xiaomi, que registrou um
aumento de 33% nas remessas, totalizando 8,1 milhões de unidades e mantendo uma
fatia similar de 17%.
A Honor, que surgiu como uma
marca derivada da Huawei Technologies, foi a que teve o maior crescimento. A
empresa, também com sede em Shenzhen, experimentou um aumento de 67% nas
remessas de smartphones no Oriente Médio, alcançando 3,2 milhões de unidades em
2024.
Esse crescimento foi
impulsionado por lançamentos de produtos e pela expansão regional da marca, que
incluiu a abertura de sete novas lojas de experiência nos Emirados Árabes
Unidos, além da entrada nos mercados de Omã e Catar.
Segundo Manish Pravinkumar,
analista da Canalys, a Honor se beneficiou de uma expansão agressiva tanto em
termos de produtos quanto em presença física na região, o que contribuiu
significativamente para o aumento de sua participação no mercado.
No panorama geral, o mercado
de smartphones do Oriente Médio apresentou um crescimento de 14% em 2024, o
dobro da taxa de crescimento global.
Apesar da ascensão das
marcas chinesas, a Samsung Electronics manteve-se como a principal fornecedora
na região, com 14,1 milhões de unidades enviadas, correspondendo a 30% do
mercado.
Embora tenha visto sua
participação cair de 34% em 2023 para 30% no ano seguinte, as remessas da
Samsung na região permaneceram estáveis.
O relatório da Canalys
reflete a crescente competição no mercado de smartphones no Oriente Médio, onde
as marcas chinesas, com suas ofertas agressivas de preço e produtos, estão cada
vez mais desafiando a posição das líderes tradicionais do setor.
A Samsung, apesar da queda
em sua participação de mercado, ainda domina a região em termos de volume de
remessas, mas as marcas chinesas estão ganhando rapidamente espaço,
especialmente com a expansão em mercados emergentes e o lançamento de
dispositivos com melhores custos-benefícios.
À medida que o mercado de
smartphones na região continua a crescer, as fabricantes chinesas, com suas
estratégias de inovação e expansão, devem continuar a competir de perto com
gigantes globais como a Samsung.
¨ China está
substituindo soja dos EUA pela do Brasil, mais barata e sem Trump no meio
Processadores
chineses continuam priorizando a compra de soja brasileira, deixando de lado
oleaginosas norte-americanas, diante da perspectiva de que o governo de Donald
Trump imponha novas tarifas sobre produtos da China. Desde que Trump reassumiu
a presidência dos Estados Unidos, as tensões comerciais voltaram ao centro do
debate, levando importadores chineses a reforçar estoques e diversificar
fornecedores.
A
preferência pela soja brasileira no primeiro trimestre já era uma tendência nos
últimos anos, mas a incerteza sobre novas medidas protecionistas nos EUA
acelerou esse movimento. Processadores chineses asseguraram praticamente todas
as suas cargas do Brasil para embarque no início de 2025, segundo três fontes
do setor.
No
ano passado, o Brasil já era o principal fornecedor de soja para a China no
primeiro trimestre, representando 54% das importações chinesas, enquanto os EUA
responderam por 38%. Agora, traders apontam para uma mudança ainda mais
significativa.
“Os
trituradores chineses estão reservando cargas brasileiras para embarque em
fevereiro e março”, afirmou um trader em Cingapura. “Tanto empresas estatais
quanto privadas estão adquirindo grãos do Brasil. Basicamente, houve uma
migração total para a soja brasileira.”
<><>
Impacto das políticas de Trump
O
governo Trump já sinalizou sua intenção de elevar tarifas sobre produtos
chineses em uma faixa entre 10% e 60%. Caso isso ocorra, Pequim deverá
retaliar, impactando setores como o de produtos agrícolas norte-americanos, que
dependem do mercado chinês.
Durante
a primeira presidência de Trump, os embates tarifários com Pequim levaram a uma
reconfiguração no comércio global de soja, com a China reduzindo
significativamente sua dependência dos EUA. Em 2016, os EUA respondiam por 40%
da soja importada pela China, número que caiu para 18% nos primeiros 11 meses
de 2024, enquanto a participação do Brasil subiu de 46% para 74%, segundo dados
da alfândega chinesa.
A
oferta sul-americana de soja, colhida no início do ano, normalmente domina o comércio
global até que os estoques dos EUA entrem no mercado em agosto. No entanto, as
compras chinesas de grãos brasileiros aumentaram mais cedo e em maior volume do
que o habitual, afetando diretamente as exportações norte-americanas.
Essa
tendência deve resultar em um excedente significativo de soja nos EUA. O
Departamento de Agricultura dos Estados Unidos estima que o país encerrará o
ano comercial 2024/25, em agosto, com um estoque de 10,34 milhões de toneladas
métricas — o maior volume dos últimos cinco anos.
<><>
Soja brasileira se mantém mais competitiva
Além
das tensões comerciais, o preço competitivo da soja brasileira tem sido um
fator decisivo para os compradores chineses.
Noroeste
dos EUA estão na faixa de US$ 451 por tonelada.
<><>
Demanda chinesa e estoques elevados
Mesmo
com o aumento das compras de soja brasileira, analistas preveem uma leve
redução nas importações totais da China no primeiro trimestre, devido ao alto
volume adquirido em 2024. As importações devem cair para algo entre 17,3 e 18
milhões de toneladas métricas, contra 18,58 milhões no mesmo período do ano
anterior.
“O
principal fator é o excesso de oferta de soja importada em 2024. Agora, o
mercado aguarda a chegada da nova safra brasileira”, afirmou um analista de
Xangai que preferiu não se identificar.
Em
2024, a China importou um volume recorde de 105,03 milhões de toneladas
métricas de soja, consolidando sua posição como o maior comprador global.
Enquanto empresas privadas intensificam as compras do Brasil, a armazenadora
estatal Sinograin continua adquirindo soja dos EUA, preferida para estocagem
devido ao seu maior teor de óleo.
A
decisão de Pequim sobre futuras compras dependerá do desenrolar das relações
comerciais com os EUA nos próximos meses. Mas, por enquanto, os grãos brasileiros
seguem dominando o mercado chinês.
Fonte: g1/O Cafezinho
Nenhum comentário:
Postar um comentário