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professora potiguar que desafiou a Justiça e conquistou o direito de voto,
cinco anos antes de virar lei
Nesta segunda-feira (24), celebra-se os 93 anos da conquista do voto das
mulheres no Brasil. Tão importante quanto esta data, é um
acontecimento de quatro anos antes, quando, no Rio Grande do Norte, uma
professora conseguiu o direito de participar das eleições.
Celina Guimarães Viana nasceu em Natal, em 1980, onde se formou professora
e foi exercer a profissão em Mossoró, no interior do estado.
Neste período, ela recebeu a visita de uma das mais importantes
sufragistas da história do país, Bertha Lutz, feminista e bióloga, seguindo a jornada do pai, Adolfo Lutz,
reconhecido cientista brasileiro.
A promotora Érica Canuto, que atua no Ministério Público do Rio Grande
do Norte, conhece bem essa história. Ela é pós-doutora em democracia e direitos
humanos e estuda especialmente o combate à violência contra mulher.
Segundo Canuto, o encontro das duas mulheres fez parte de uma jornada de
Bertha Lutz por todo estado potiguar mobilizando pela luta do direito ao voto.
Nesta jornada, outro encontro importante de Lutz foi com um homem, na época
deputado, mas que depois viria a ser governador do estado, Juvenal Lamartine.
“Ela convenceu Juvenal a fazer uma lei, caso ele fosse eleito
governador, que garantisse o voto feminino”, lembra Canuto em entrevista
ao programa
Bem Viver desta segunda.
Após a publicação do decreto, Lutz incentivou Celina Guimarães a ir à
Justiça em busca de seu direito, que de fato foi conquistado, abrindo espaço
para mais 14 mulheres do estado que votaram naquela eleição de 1928.
O auge desta história é que foi neste pleito que o Rio Grande do Norte,
o Brasil e a América Latina viram, pela primeira vez, uma mulher ser eleita
prefeita, Alzira Soriano, em Lages.
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Confira a entrevista
·
A que se deve o fato das
mulheres terem sido excluídas das primeiras votações no Brasil?
O afastamento das mulheres, apagamento, da história, da participação da
história política, da narrativa histórica… A gente estuda nos livros de
história e ninguém escuta uma palavra sobre uma mulher, a existência das
mulheres. Então é como se ela não tivesse lá.
O tempo todo a mulher esteve presente, só que ela foi foi retirada,
afastada da participação política. Foram muitas tentativas para que a mulher
conseguisse votar, mas quando chegava lá no Congresso, dizia-se sempre: não,
mulher não.
Existe uma potiguar, uma pioneira nas letras de mulheres ocupando
espaço, Nísia Floresta, que dizia que “por que não temos direitos políticos?
Porque não temos cargos públicos. Por que não temos cargos públicos? Porque não
é nos dada instrução”. Ela dizia como um ciclo vicioso.
Durante muito tempo, as mulheres foram retiradas por uma questão mesmo
de disputa de poder. Há uma autora chamada Joan Scott, estadunidense, que
escreve sobre isso, ela diz que gênero é a primeira forma de articular disputa
de poder, articular poder na sociedade.
·
Como Celina Guimarães
conquistou o direito ao voto?
Celina Guimarães é uma potiguar da cidade de Mossoró. Era uma professora
casada com um advogado.
Ela foi a pioneira na conquista do voto, mas não foi a primeira a
iniciar essa luta. O primeiro registro é de 1824. Houve tentativas de legislar
o voto feminino 100 anos antes, mas foram várias tentativas frustradas.
Existia uma brasileira chamada Bertha Lutz, uma sufragista, uma mulher
que depois também foi eleita deputada federal e que lutou muito.
Bertha Lutz teve muito contato com o deputado federal, que é aqui do meu
estado, chamado Juvenal Lamartine, que depois se tornou governador. Ela
convenceu Juvenal a fazer uma lei, caso ele fosse eleito governador, que
garantisse o voto feminino.
Depois desse convencimento, Bertha Lutz, andou o estado todo do Rio
Grande do Norte. Mulheres que aqui foram inscritas como eleitoras, antes de
qualquer outra, se deu em razão desta luta, desta mulher, chamada Bertha Lutz,
que andou o estado todo, andou nos alpendres das fazendas, convocando mulheres,
chamando.
Chamou, por exemplo, Alzira Soriano, em Lages. Alzira Soriano era uma
mulher viúva e que estava lá no alpendre, administrando uma fazenda e Bertha
disse: “Você dá pra ser uma prefeita”. E de fato Alzira Soriano foi eleita a
primeira prefeita da América Latina, não só do Brasil.
Foi Bertha Lutz que convenceu Celina Guimarães a se inscrever, junto com
mais outras 20 mulheres.
O processo que foi despachado, primeiro, foi o de Celina Guimarães. Quer
dizer, só ia ser eleitora se o juiz dissesse sim. Então esse juiz disse sim,
primeiro, para o processo dela.
Então ela se tornou a primeira eleitora do Brasil. Ela tem esse mérito
de ser inscrita como a primeira eleitora do Brasil.
Nessas eleições de 1928, de 15 de abril de 1928, votaram 15 mulheres em
diversas cidades aqui do Rio Grande do Norte. As fotos são maravilhosas, são
lindas: a mulher votando em meio a um monte de homem.
E quando isso aconteceu em 1928, o Brasil todo polvoroso, começou uma
pressão intensa contra o Congresso Nacional. Então, depois de quatro anos que o
Rio Grande do Norte votou, houve a aprovação do voto feminino.
Embora ,depois de algum tempo, esses votos foram considerados
inaceitáveis, foram anulados e veio esse voto censitário, trazendo uma série de
impossibilidades. Só depois que fomos ter, de fato, o voto universal.
·
Podemos atribuir a esse
pioneirismo potiguar o fato do estado ser quase o único a ter uma governadora?
Eu acho que sim. Essa representatividade orgulha muito os potiguares.
Representatividade em relação ao que aconteceu com Celina Guimarães, com Alzira
Soriano…
Aqui a gente já teve três governadoras mulheres e que tiveram mais de um
mandato. E muitas prefeitas, então acho que tem a ver com isso mesmo.
·
Como a senhora avalia a lei
publicada no primeiro ano deste governo sobre paridade de salários entre homens
e mulheres que exercem o mesmo cargo?
Essa medida é muito importante. Se a gente for olhar, a gente tem um
avançar dessas políticas públicas de igualdade, a exemplo da Lei Maria da
Penha.
Essa política de igualdade salarial é uma das mais estruturadas que a
gente tem.
Porque, se existe uma coisa que faz com que mulheres permaneçam ainda em
relações violentas é a ausência desse cumprimento da igualdade salarial,
igualdade de oportunidades para também ela ter direito a um cargo de gerência,
diretoria, um cargo comissionado.
E não ser olhada nessa linha de “mas ela tem filho, ela vai faltar, porque
ela está com filha”…
Na semana passada, também, o presidente Lula assinou um parecer da AGU
[Advocacia-Geral da União], dizendo assim, que toda mulher que sofre qualquer
tipo de violência pode ser uma série [de violências], uma importunação, pode
ser violência doméstica, e ela é servidora pública, ela pode ser transferida.
Às vezes o cara a persegue, vai lá ficar importunando, fica fazendo
escândalo lá na recepção, esperando ela no estacionamento, então ela não
consegue trabalhar. Então é mais uma garantia para o campo do trabalho. O
trabalho significa o chão, significa uma grande possibilidade para que uma
mulher consiga sair da violência.
Eu percebo como o trabalho tem um significado de resgate de
possibilidade, de chance para aquela mulher dar a volta por cima, virar a
página e viver a vida dela. Então garantir que esse local seja um local seguro
para ela e que ela vai ganhar igual ao homem, significa dar dignidade a essa
mulher.
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General acusado por morte de Rubens Paiva é alvo de
escracho no RJ
O Levante Popular da Juventude realizou uma manifestação na Zona Sul do
Rio de Janeiro, na manhã desta segunda-feira (24), na frente da casa de José
Antônio Nogueira Belham, general da ditadura militar envolvido na tortura,
desaparecimento e morte do ex-deputado federal Rubens Paiva. O movimento também relembra os 29 anos desde o reconhecimento
formal do óbito de Paiva, que por sua vez ocorreu após 25 anos de espera.
A manifestação reuniu cerca de 100 jovens, com faixas, cartazes e
intervenções artísticas, por volta das 7h da manhã. A forma de protesto
utilizada foi o escracho, um formato utilizado para fazer denúncias públicas
contra pessoas acusadas de cometerem violação dos direitos humanos.
Belham é ex-general reformado do exército brasileiro, liderou o DOI-Codi
do 1º Exército, no Rio de Janeiro, entre novembro de 1970 e maio de 1971. Ele é
acusado de associação criminosa, fraude processual, tortura, homicídio
triplamente qualificado e ocultação de cadáver no caso envolvendo o
desaparecimento de Paiva. A partir da Comissão Nacional da Verdade (CNV),
Belham e outros quatro militares foram indiciados pelo Ministério Público
Federal (MPF) pelo homicídio e desaparecimento do ex-deputado. Agora, o
processo aguarda a análise sobre a aplicação
da Lei da Anistia para avançar.
“Hoje nós estivemos na casa de José Antônio Belham,
pedindo justiça por Rubens Paiva e reivindicando que nós ainda estamos aqui”,
afirma Daiane Araújo, militante do Levante e vice-presidente da União Nacional
dos Estudantes (UNE), ao Brasil de Fato.
“Em 2012, nós estivemos nesse mesmo endereço, quando o
Levante realizou uma rodada nacional de escracho, denunciando os torturadores
da ditadura militar e pedido a instalação da Comissão Nacional da Verdade”,
relembra.
“Hoje, nós pedimos que a Lei da Anistia não se aplique aos
casos de tortura, desaparecimento forçado e assassinato das vítimas da
ditadura. Nós também exigimos que os militares vinculados aos crimes da
ditadura e aos ataques golpistas percam seus títulos, direitos e benefícios das
Forças Armadas. A justiça é a memória do nosso povo”, completa.
Rubens Paiva foi levado da casa dele, no Rio de Janeiro,
por agentes do Centro de Informações da Aeronáutica (Cisa), no feriado de 20 de
janeiro de 1971 (dia de São Sebastião), há 54 anos.
No quartel da Força Aérea Brasileira (FAB), ele começou a
ser violentado. Depois, foi entregue a militares do Exército nos porões do
DOI-CODI, onde também foi torturado e assassinado naquela mesma noite ou nos
dias seguintes, segundo registros da Comissão Nacional da Verdade, em 2014.
Eunice Paiva, sua esposa, somente obteve o atestado de óbito em fevereiro de
1996.
Fonte: Brasil de
Fato
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