terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

Aquiles Lins: O golpe era real e foi despachado com o presidente

Os novos áudios revelados pela Polícia Federal sobre a tentativa de golpe de Estado após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições de 2022 tornam cada vez mais difícil negar a existência de uma trama golpista articulada por integrantes das Forças Armadas e do governo Bolsonaro. As gravações, divulgadas pelo programa "Fantástico", da TV Globo, mostram conversas entre militares e civis que discutiam abertamente estratégias para reverter o resultado eleitoral e deslegitimar o processo democrático.

A gravidade das falas reforça a tese apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao Supremo Tribunal Federal (STF) na denúncia contra Jair Bolsonaro e outras 33 pessoas pelos crimes de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa. Entre os denunciados, estão figuras-chave como Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e da Defesa, e Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. Se a Primeira Turma do STF aceitar a denúncia, todos se tornarão réus e passarão a responder criminalmente pelos atos.

Os áudios reforçam a participação ativa de membros das Forças Armadas na incitação dos acampamentos golpistas que culminaram nos atos violentos de 8 de janeiro de 2023. Em uma das gravações, Mauro Cid revela a infiltração de agentes aliados em diversas frentes para monitorar e instigar as manifestações: "A gente tem cara infiltrado em todo lugar, monitorando e passando para a gente as informações, refutando ou ajudando a instigar, digamos assim."

O general da reserva Mario Fernandes aparece em dois momentos-chave. Em um áudio, ele sugere que um decreto golpista teria sido "despachado ontem com o presidente". Em outro, ele relata que Bolsonaro considerava qualquer momento até 31 de dezembro de 2022 válido para agir contra a diplomação de Lula: "Durante a conversa que eu tive com o presidente, ele citou que, pô, o dia 12, pela diplomação do vagabundo, não seria uma restrição, que qualquer ação nossa pode acontecer até 31 de dezembro."

O tenente-coronel Guilherme Marques de Almeida expõe a estratégia de tentar justificar um possível golpe como resposta a supostas irregularidades cometidas por seus adversários: "Os caras estão desde cedo armando várias coisas. [...] O Exército fez alguma? Pô, tá cometendo ilegalidades? As Forças Armadas? Pô, os caras tão fazendo desde o início. [...] Vai ter uma hora que a gente vai ter que sair [das quatro linhas] ou então eles vão continuar dominando a gente."

Carlos Cesar Moretzsohn Rocha, engenheiro e dono do Instituto Voto Legal, tenta sustentar a tese de fraude nas urnas por meio de suposições estatísticas questionáveis, sugerindo manipulação na distribuição das urnas eletrônicas: "Eu descobri que tem mais informação lá que eu estava ignorando no dado original do TSE. [...] Eu fui ver se existem locais de votação mistos. [...] Isso realmente enfraquece a crença de ter fraude e o TSE ter cometido o erro de misturar urnas honestas e desonestas dentro do processo eleitoral."

As falas demonstram que a tentativa de ruptura institucional não foi uma ideia isolada de radicais inconsequentes, mas um plano articulado dentro do governo Bolsonaro, envolvendo militares de alta patente e figuras influentes. Cada nova prova dificulta ainda mais a defesa dos envolvidos e evidencia a gravidade do que ocorreu: uma tentativa de golpe contra o Estado Democrático de Direito. O julgamento do STF será decisivo para mostrar se o Brasil será capaz de responsabilizar aqueles que atentaram contra sua democracia ou se deixará impune, como no passado, abrindo margem para novas ameaças no futuro.

¨      Áudios detalham discussão sobre tentativa de golpe envolvendo militares no governo Bolsonaro

Áudios obtidos pela Polícia Federal revelam diálogos entre militares e aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro sobre uma tentativa de golpe para mantê-lo no poder. O material, divulgado pelo programa Fantástico, da TV Globo, expõe a participação de oficiais do Exército na incitação de manifestantes acampados em frente ao Quartel-General da Força, em Brasília, que culminou na invasão das sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023.

Um dos áudios mais reveladores foi enviado pelo tenente-coronel Guilherme Marques de Almeida, então lotado no Comando de Operações Terrestres do Exército (Coter). Na mensagem de voz, ele estimula os acampados a se dirigirem ao Congresso, prevendo que a mobilização em massa impediria qualquer contenção policial. “Eu acho que o pessoal poderia fazer essa descida. E ir atravancando mesmo. Porque a massa humana chegando lá, não tem PM que segure. Vai atropelar a grade e vai invadir. Depois não tira mais”, declarou o militar, que está entre os 34 indiciados pela Procuradoria-Geral da República por tentativa de golpe e abolição violenta do Estado democrático de direito.

Outro áudio apreendido pela PF mostra o general Mario Fernandes, então número 2 da Secretaria-Geral da Presidência, pedindo ao tenente-coronel Mauro Cid – ajudante de ordens de Bolsonaro – que intercedesse junto ao ex-presidente para evitar operações da Polícia Federal contra os manifestantes no QG do Exército. “Se o presidente pudesse dar um input ali para o Ministério da Justiça, para segurar a PF… Estou tentando agir diretamente junto às Forças, mas se tu pudesse pedir para o presidente ou para o gabinete do presidente atuar...”, disse Fernandes a Cid.

A pressão também foi exercida sobre o general Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e candidato a vice de Bolsonaro em 2022. Em outra gravação, Fernandes pede que ele interceda diretamente com Bolsonaro e o então ministro da Justiça, Anderson Torres. “Se o senhor puder intervir junto ao presidente, falar com o ministro Anderson. Segurar a PF, para esse cumprimento de ordem. Ou com o Comandante do Exército, para a gente segurar, proteger esses caras ali”, afirmou.

Além disso, Fernandes teria alertado sobre a necessidade de “blindar” Bolsonaro contra qualquer influência que o fizesse recuar da trama golpista. “Kid preto, algumas fontes sinalizaram que o Comandante da Força foi ao Alvorada para sinalizar ao presidente que ele podia dar a ordem. Se o senhor está com o presidente agora e ouvir a tempo, blinda ele contra qualquer desestímulo. Isso é importante, kid preto. Força.”

A defesa de Fernandes nega qualquer envolvimento em conspirações golpistas e afirmou ao Fantástico que não teve acesso completo ao conteúdo das quebras de sigilo. Segundo os advogados, os áudios divulgados foram editados e apresentados de forma desconexa.

Outro áudio relevante é de Mauro Cid, que fechou um acordo de delação premiada e confirmou que Bolsonaro editou uma minuta golpista. “Ele entende as consequências do que pode acontecer. Hoje ele mexeu naquele decreto, ele reduziu bastante, fez algo mais direto, objetivo e curto. E limitado, né?”, disse o ex-ajudante de ordens.

A denúncia da PGR aponta que Bolsonaro cometeu os crimes de organização criminosa armada, tentativa de golpe de Estado, abolição do Estado democrático de direito e dano qualificado por violência contra patrimônio da União. As investigações indicam que Bolsonaro analisou e solicitou mudanças na minuta golpista, que previa a prisão de ministros do Supremo Tribunal Federal, como Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, além do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O ex-presidente teria pedido a exclusão dos nomes de Gilmar e Pacheco do texto.

¨      Áudios revelam que plano golpista de Bolsonaro tinha "cara infiltrado em tudo que é lugar", diz Mauro Cid

O tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), afirmou que o plano para dar um golpe de Estado contava com "cara infiltrado em tudo quanto é lugar". No entanto, segundo ele, não foi encontrada nenhuma evidência que justificasse a abertura de uma investigação sobre fraudes nas urnas eletrônicas. Cid detalhou que especialistas em tecnologia foram mobilizados para tentar identificar supostas falhas no sistema eleitoral, mas nenhuma prova concreta foi obtida.

As declarações de Cid corroboram seu depoimento à Justiça, em novembro de 2024, no qual ele afirmou que, apesar da "busca incessante", não foram encontradas provas de fraude nas urnas, destaca o Uol. Segundo ele, Bolsonaro não aceitou o resultado das eleições e pressionou o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, para alterar o relatório final do Ministério da Defesa, que não confirmou irregularidades. O relatório das Forças Armadas enviado ao TSE em 2022 afirmou que "não é possível afirmar" que o sistema eletrônico de votação está isento de falhas, mas as urnas são auditáveis e nunca tiveram fraudes comprovadas desde sua implementação em 1996.

Em outro trecho dos áudios, Cid revelou que Bolsonaro editou pessoalmente o rascunho de um decreto para instituir um golpe de Estado. A versão inicial do documento previa a prisão de ministros do STF e do presidente do Senado, mas Bolsonaro teria feito alterações, limitando as ações a uma nova eleição e à prisão do ministro Alexandre de Moraes. "Ele entende as consequências do que pode acontecer", disse Cid, em conversa com o então comandante do Exército, general Freire Gomes.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) apontou a edição do decreto como uma das evidências da participação direta de Bolsonaro no plano golpista. A defesa do ex-presidente nega as acusações e classificou a denúncia como "precária" e "incoerente". Os áudios reforçam as investigações sobre o suposto golpe e destacam o papel central de Bolsonaro e de seus aliados na tentativa de deslegitimar as eleições de 2022.

¨      Forças Armadas devem ficar em silêncio sobre denúncia contra golpistas até que processo seja aceito pelo STF

O silêncio das Forças Armadas após a denúncia do procurador-geral da República contra os envolvidos na trama golpista que culminou nos ataques de 8 de janeiro, que envolve 23 militares,  juntamente com Jair Bolsonaro (PL), faz parte de um estratégia para esperar até que a denúncia seja aceita pelo Supremo Tribunal Federal – um processo que pode levar algumas semanas. Segundo a coluna da jornalista Malu Gaspar, de O Globo, o fechamento de novos procedimentos disciplinares por parte dos generais reflete o corporativismo da instituição, mas também a preocupação em não intensificar a tensão na caserna. 

Conforme relatado por um general que acompanha de perto os desdobramentos do caso, “a situação administrativa dos militares só muda após a aceitação das denúncias”. Assim, mesmo diante dos indiciamentos pela Polícia Federal e da denúncia formalizada pelo procurador Paulo Gonet, os acusados permanecem sem novas sanções, embora fiquem impedidos de serem promovidos ou transferidos até que o processo siga seu curso.

Ainda de acordo com a reportagem, a expectativa é de que o relator, ministro Alexandre de Moraes, acelere os trâmites para que a denúncia seja levada à Primeira Turma do STF até abril. Nesta fase, os magistrados avaliarão a existência de indícios suficientes para a abertura de uma ação penal, permitindo a coleta de mais provas e depoimentos que possam aprofundar a apuração dos supostos crimes. Na prática, essa análise colocará os militares no banco dos réus, pavimentando um caminho que pode culminar em condenações futuras.

No caso específico do tenente-coronel Mauro Cid, ex‑ajudante de ordens de Bolsonaro, as cláusulas do acordo de colaboração premiada – que fundamentou a denúncia contra Bolsonaro, Walter Braga Netto e outras 32 pessoas por golpe de Estado – oferecem uma proteção significativa. Entre os benefícios, destaca-se a possibilidade de perdão judicial ou a aplicação de uma pena privativa de liberdade que não ultrapasse dois anos. Como ressaltado por um ministro do Superior Tribunal Militar (STM), “Cid não será julgado para perda do posto. Seria se a pena fosse superior a dois anos”.

Após a condenação, com o trânsito em julgado, o caso seguirá para o Conselho de Justificação, composto por três oficiais da ativa. Esse conselho terá a responsabilidade de elaborar um relatório que será encaminhado ao comandante do Exército, o qual disporá de 20 dias para decidir se arquiva o caso ou o encaminha ao STM – uma medida que pode, na prática, preservar a patente do oficial, mesmo diante de uma condenação.

¨      Mauro Cid diz que buscou o PL, de Costa Neto, para financiar a intentona golpista

A delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid revelou novos detalhes sobre a articulação para o financiamento de manifestantes que viajaram a Brasília em atos contra o resultado das eleições de 2022. Segundo Cid, o general Walter Braga Netto orientou que ele verificasse com o Partido Liberal (PL) a possibilidade de custear deslocamento e hospedagem para essas pessoas.

Em seu depoimento, Cid afirmou que buscou um "coronel responsável pelo partido", cujo nome ele não se recorda, para discutir o financiamento. O oficial teria analisado um documento impresso contendo detalhes da logística e informado que o partido não poderia utilizar recursos para esse fim.

Após receber a negativa do PL, Cid relatou que voltou a falar com Braga Netto, que garantiu: "Vou dar um jeito, vou seguir por outros caminhos." Pouco tempo depois, o general entregou a Cid uma sacola de vinho contendo dinheiro em espécie, mencionando que os recursos vieram do agronegócio. Cid então repassou os valores ao major Rafael de Oliveira no Palácio da Alvorada.

Fontes ligadas à investigação suspeitam que o "coronel responsável pelo partido" mencionado por Cid seja o coronel Flávio Botelho Peregrino. Peregrino, que foi assessor e braço-direito de Braga Netto, foi um dos alvos da Polícia Federal (PF) na Operação Contragolpe, deflagrada no final de 2024, que investigou a tentativa de subversão da ordem democrática.

O arquivo denominado "Copa 2022", citado por Cid em sua delação, continha um plano detalhado dos custos operacionais, incluindo deslocamento aéreo, locomoção terrestre, alimentação e eventuais gastos com celulares. Segundo o ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, ele acessou o arquivo apenas uma vez e não se recorda da senha para fornecê-la às autoridades.

A Operação Contragolpe revelou um esquema maior de financiamento e articulação que envolvia diversos setores políticos e econômicos. Investigações apontam que recursos privados foram utilizados para custear o transporte e manutenção de manifestantes, além de apoio logístico para ações que buscavam questionar o resultado eleitoral e gerar instabilidade política. A atuação de militares da reserva e aliados políticos indica uma possível coordenação estratégica entre grupos que se recusavam a aceitar a transição democrática.

Os investigadores avaliam se Braga Netto teve apoio de empresários do setor do agronegócio para financiar a operação, conforme sugerido por Cid em seu depoimento. A Polícia Federal segue rastreando movimentações financeiras que possam confirmar essa versão. Relatórios preliminares apontam que valores em espécie foram movimentados por intermediários, dificultando o rastreamento dos recursos.

Sobre a possibilidade de responsabilização do PL pelo conhecimento da articulação, o professor de direito eleitoral da FGV/SP, Fernando Neisser, avaliou que o partido dificilmente enfrentaria sanções legais. Segundo ele, "não existe um dever geral imposto a todas as pessoas, ainda que dirigentes de partidos, de relatar qualquer crime de que tenham conhecimento e do qual não façam parte." Neisser explicou que essa obrigação só se aplica a alguns servidores públicos em situações específicas, o que não se enquadraria no caso do PL.

A defesa de Braga Netto ainda não se pronunciou oficialmente sobre o caso. O PL, por sua vez, também não comentou as alegações de que o partido foi sondado para financiar a operação. A investigação continua em andamento no Supremo Tribunal Federal sob relatoria do ministro Alexandre de Moraes.

Paralelamente, setores políticos monitoram os desdobramentos do caso, considerando a possibilidade de impacto em futuras eleições. A influência de militares na política e a utilização de recursos privados para fins políticos seguem como pontos centrais do debate sobre a estabilidade democrática. O desenrolar das investigações pode abrir novas frentes de apuração, incluindo possíveis conexões internacionais no financiamento de ações voltadas à desestabilização do processo eleitoral.

¨      Alckmin: “fomos instrumentos do povo para salvar a democracia brasileira”

O vice-presidente e ministro da Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin (PSB), comentou nesta segunda-feira (24) sobre a trama golpista que previa os assassinatos dele, do presidente Lula (PT) e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo Alckmin, ele e Lula foram “instrumentos do povo” para salvar a democracia brasileira em 2022.

“Duas palavras. A primeira: nós fomos instrumentos do povo para salvar a democracia brasileira. E graças a Deus estamos vivos”, disse Alckmin.

Na sequência, o vice-presidente destacou a recuperação da indústria brasileira nos últimos anos, ressaltando a importância de iniciativas como o programa Nova Indústria Brasil (NIB). “A segunda palavra é destacar a recuperação da indústria, a Nova Indústria Brasil. No ano passado,a  indústria de transformação cresceu 3,7%, e a indústria de alta tecnologia cresceu 5,5%. No mundo, a indústria de alta tecnologia cresceu 2,7%. No Brasil cresceu o dobro da média mundial”, afirmou.

Alckmin também falou sobre a importância da recuperação da indústria naval. “E sempre que eu encontrava com o presidente Lula ele dizia ‘indústria naval, indústria naval, receba o [Alexandre] Lindenmeyer, deputado federal’. E aí fizemos um conjunto de medidas, e quero aqui destacar boas notícias: primeiro, depreciação acelerada. A indústria naval entrou no grande programa para modernização e renovação do seu parque industrial. Depois, conteúdo local foi incluído. Depois, Fundo de Marinha Mercante, com juros menores. Depois, TR de 4% ano ano, juros real zero, para inovação”, destacou.

O vice-presidente concluiu sua fala destacando a importância da reforma tributária para a indústria. “E a reforma tributária, que vai incentivar investimentos no Brasil e exportação. E vemos aqui a indústria naval, que é soberania nacional, tecnologia, inovação, logística dando uma resposta maravilhosa. E milhares e milhares de empregos. Ao encerrar, Michel Foucault: ‘em civilizações sem barcos, os sonhos secam’. Parabéns, presidente Lula, por transformar sonhos em realidade”, completou.

 

Fonte: Brasil 247/Fórum

 

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