terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

O que mudou na Ucrânia após três anos de guerra

O presidente dos EUA, Donald Trump, faz pressão por um fim rápido para a guerra na Ucrânia e, no início desta semana, as principais autoridades americanas e russas se encontraram para negociações de paz na Arábia Saudita — sem nenhum representante ucraniano presente.

A Ucrânia e seus aliados europeus estão preocupados e lutando para se adaptar à nova abordagem dos Estados Unidos.

Nos três anos desde que a Rússia lançou sua invasão em larga escala, a Ucrânia perdeu faixas de terra, conseguindo recuperar algumas graças à ajuda militar de seus aliados ocidentais. Milhões de ucranianos foram deslocados, com milhares mortos ou feridos.

>>>> Entenda o que mudou nos últimos três anos de guerra:

<>< Ucrânia perdeu 11% de suas terras desde 2022

No início da guerra, a Ucrânia reteve tropas de sua capital, Kiev, e mais tarde garantiu vitórias em partes do nordeste de Kharkiv e regiões do sul de Kherson. Mas também sofreu grandes perdas em áreas orientais ao redor de Donetsk e Bakhmut.

Desde a invasão de 2022, a Ucrânia perdeu o controle de cerca de 11% de suas terras, conforme análise da CNN de dados do Institute for the Study of War, um monitor de conflitos sediado nos EUA.

Ao levar em conta as terras já perdidas para a Rússia e os separatistas apoiados pelos russos desde o início do conflito em 2014, o total de terras que a Ucrânia perdeu para Moscou desde então é de cerca de 18%, segundo cálculos da CNN.

Em 2014, as forças russas anexaram ilegalmente a Crimeia da Ucrânia, logo após os eventos da Revolução Maidan terem desencadeado turbulência política em Kiev.

Mais tarde naquele ano, separatistas patrocinados pela Rússia assumiram o controle de partes da região de Donbas, ganhos que permaneceram nas mãos dos russos até os dias atuais.

Quando a Rússia lançou sua invasão em grande escala em 24 de fevereiro de 2022, o presidente russo Vladimir Putin esperava tomar toda a Ucrânia em questão de dias, segundo o Instituto para o Estudo da Guerra.

O que aconteceu em vez disso foram três anos de intensos combates, graças às contraofensivas da Ucrânia armadas por parcelas de ajuda vindas de seus aliados ocidentais.

<><> Maior fonte de ajuda ameaçada

Os Estados Unidos têm sido o maior contribuinte individual de financiamento para a Ucrânia desde o início da guerra em 2022, dando cerca de US$ 95 bilhões em ajuda militar, humanitária e financeira — aporte que pode estar em perigo sob a administração Trump.

Trump, que prometeu acabar com a guerra na Ucrânia rapidamente, criticou os fundos dos EUA enviados à Ucrânia durante sua campanha de 2024.

Recentemente, ele sugeriu adotar uma abordagem transacional para ajudar, afirmando que o governo americano deveria receber acesso a minerais de terras raras em troca, o que o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky rejeitou.

<><> Milhões de ucranianos deslocados

Milhões de ucranianos fugiram de suas casas, seja para outras partes da Ucrânia ou outros países, desde que a Rússia começou a tomar terras e após a invasão.

Pouco mais de 6,8 milhões de refugiados ucranianos estão vivendo na Europa, incluindo cerca de 1,2 milhão na Alemanha, quase 1 milhão na Polônia e 390 mil na República Tcheca, conforme dados até o final de 2024 da agência de refugiados da ONU.

Havia 1,2 milhão de refugiados ucranianos vivendo na Federação Russa, segundo última estimativa da ONU em junho de 2024.

<><> Milhares de civis morreram

Mais de 40 mil civis foram mortos ou feridos na Ucrânia durante o conflito, com muitas das mortes causadas por armas explosivas, conforme o Escritório de Direitos Humanos da ONU.

Pelo menos metade dos mortos (6.203) eram homens adultos e 669 eram crianças.

¨      Três anos de guerra na Ucrânia mudaram garantias da Europa

Em uma guerra dominada pelo inesperado, poucos imaginaram que o quarto ano de guerra da Ucrânia questionaria tão firmemente a segurança de toda a Europa.

Os princípios mais básicos ruíram na guerra.

O status de superpotência militar da Rússia enfraqueceu, e o círculo interno do Kremlin superou uma revolta. Os drones alteraram a guerra permanentemente e tornaram os depósitos de tanques quase inúteis.

Os Estados Unidos passaram de financiadores a cobradores dos recursos de Kiev. O presidente da Ucrânia sobreviveu fisicamente, mas agora deve lidar com uma versão revisionista do aporte fornecido por uma Casa Branca que há pouco mais de um mês era sua firme apoiadora.

Por mais irreverente ou espontâneo que tenha sido, a observação do Secretário de Defesa dos EUA, Peter Hegseth, em Bruxelas, de que os EUA não eram mais o garantidor da segurança europeia, anulando oitenta anos de normas no continente.

Talvez tenha sido um blefe para aumentar os gastos europeus com segurança, mas não se pode blefar em segurança nuclear.

O Kremlin deve ter ouvido falar sobre a fraqueza na aliança transatlântica e estará conspirando de acordo.

A Europa tomou as garantias de segurança americanas como certas por décadas e agora está se esforçando para imaginar um mundo sem elas, enquanto parece firmemente atrás da Ucrânia e insiste que qualquer paz seja justa.

A chefe de política externa da União Europeia, Kaja Kallas, disse à CNN no domingo (23) que correr para um acordo ruim “só serviria para encorajar tiranos em todo o mundo”.

Ela afirmou que a filiação à OTAN era “a garantia de segurança mais forte e mais barata” e que “a ajuda à Ucrânia não é caridade, é um investimento em nossa segurança”.

Com a Rússia presa na Ucrânia, a segurança da Europa em geral é, por enquanto, um debate político etéreo – uma distração indesejada quando contrastada com a luta real.

<><> Campo de batalha

Um comandante de companhia ucraniano servindo na região de Kursk, na Rússia, apontou que seus homens tinham que cavar regularmente novas posições no solo congelado, pois eram alvos muito precisos de ondas de drones russos.

“Eu realmente não acredito em um fim rápido para a guerra ou na paz em geral”, expressou ele após três anos de luta. “Estou muito exausto, assim como todos aqui. Declarações políticas não mudam nada para nós.”

A narrativa paralela da Rússia — de que foi forçada a agir para impedir a expansão da OTAN e que a Ucrânia deve ser desnazificada — foi esmagada pelo peso absoluto de sua fragilidade nas linhas de frente e isolamento.

No entanto, de repente ganhou um novo sopro de vida, repetido em parte pelo homem mais poderoso do mundo e seu círculo íntimo.

É um sinal potente de como a guerra continua a virar normas básicas de cabeça para baixo, que uma questão urgente em seu terceiro aniversário seja: “Quem está alimentando Trump com esses pontos de discussão do Kremlin?”

<><> Ocidente, Rússia e EUA

A unidade ocidental foi um caso isolado durante a guerra: as nações europeias frequentemente divergiam em quão instintivamente desconfiavam da Rússia, mas falavam como uma só desde a invasão total de Moscou.

No entanto, agora enfrentam a potência preeminente do mundo de alguma forma convencida de que a Rússia pode ser uma aliada em potencial, e os europeus é quem são o problema.

É ingênuo para qualquer um em Washington imaginar um futuro em que Moscou abandone seu principal financiador e vizinho, a China, em favor de uma aliança com os americanos.

No domingo, Zelensky declarou que se afastaria do cargo de presidente se isso significasse paz para a Ucrânia. O fato é que seu relacionamento tenso com Trump arrisca se tornar um obstáculo para quase tudo.

No entanto, a alternativa é ainda pior. Uma eleição em tempo de guerra ou a entrega a um sucessor aumentaria as falsas alegações de ilegitimidade do líder ucraniano.

A dicotomia da posição da Casa Branca é evidente novamente nos números inflados de baixas que eles alegam ser a razão pela qual a guerra deve terminar (milhões não morreram, como Trump sugere, mas possivelmente centenas de milhares).

Este ônus de preservar a vida não é compatível com um acordo de paz que enfraquece a defesa da Ucrânia e corre o risco de a Rússia se reequipar e voltar para mais terreno no próximo ano.

A verdade deste momento também precisa ser dita em voz alta para que a Europa possa estar pronta. A evidência é que, enquanto a maior guerra na Europa desde os anos quarenta se arrasta para seu quarto ano, Trump favorece Putin.

¨      Trump e a aliança russa contra a Ucrânia

Ao longo das últimas semanas, manifestações públicas de Donald Trump trouxeram novas incertezas quanto ao rumo do apoio norte-americano à Ucrânia.

Em campanha, o republicano já demonstrava certa admiração por Putin e não escondia sua intenção de rever ou mesmo cortar drasticamente a assistência militar a Kiev.

Para Volodymyr Zelensky, essa não era apenas mais uma troca de governo em Washington—era uma potencial guinada que poderia alterar os rumos do conflito de forma irreversível.

Diante desse cenário, aliados do ucraniano apontavam para, ao menos, três possíveis tipos de desdobramentos.

O primeiro (e mais temido) seria um corte profundo na ajuda e uma pressão direta para que Kiev aceitasse um acordo de paz desfavorável, legitimando parte das conquistas territoriais russas.

Nesse, que poderíamos chamar de Cenário Um, Trump, coerente com seu discurso de “América First”, deixaria claro que não financiará “guerras de terceiros” e que cabe aos europeus assumir a dianteira.

Isso forçaria Zelensky a enfrentar a Rússia praticamente sozinho ou com um respaldo ocidental muito mais tímido.

O segundo desfecho aventado — aqui designado Cenário Dois — seria um apoio condicional, sujeito a intensas negociações no Congresso dos Estados Unidos e a exigências de maiores contribuições europeias. Nesse contexto, haveria ainda algum nível de aprovação de verbas, mas sempre com restrições, prazos e cobranças por reformas em Kiev.

A pressão bipartidária no Capitólio, aliada ao lobby da indústria de defesa, manteria um fluxo de ajuda limitado à Ucrânia, ao mesmo tempo, em que se buscaria garantir uma participação mais ativa dos países da Otan.

Embora incômoda, essa seria uma saída “menos ruim” para Zelensky, pois ainda lhe daria condições de resistir, mesmo que a ajuda fosse menor e mais imprevisível.

Contudo, o presidente ucraniano torcia de fato pelo Cenário Três — no qual, apesar da retórica agressiva e pró-Putin de Trump, a máquina governamental norte-americana (Pentágono, agências de inteligência e uma parcela do Congresso) conseguiria manter alguma forma de assistência militar.

Nesse quadro, o apoio não seria cortado de uma hora para outra e ainda haveria espaço para negociações internas que freassem os impulsos mais isolacionistas do novo presidente.

Zelensky, ciente da burocracia institucional dos Estados Unidos e das vozes republicanas tradicionalmente mais duras em relação à Rússia, via nesse cenário a melhor das hipóteses, pois, na prática, preservaria canais mínimos de cooperação.

Após pouco mais de um mês do novo governo, o que se desenha é justamente a tendência ao primeiro cenário.

Os discursos do presidente, cada vez mais enfáticos sobre “não gastar dinheiro com terceiros enquanto os Estados Unidos têm problemas internos”, somados às manifestações de simpatia para com Putin, indicam que as promessas de campanha de Trump se transformam em atos de governo.

Auxiliado por assessores que compartilham de sua visão mais isolacionista, o presidente já fez declarações contundentes sobre a necessidade de se chegar a um “acordo rápido” na Ucrânia — com ou sem a anuência de Kiev.

Assim, Zelensky assiste à formação de um quadro em que o Cenário Um deixa de ser um risco e se aproxima de uma realidade.

Se isso se confirmar, o governo ucraniano terá de buscar reforços urgentemente em outras frentes, seja por meio de acordos bilaterais com países europeus ou via articulação mais ampla na União Europeia.

O desafio principal será sustentar a resistência em campo ao mesmo tempo que enfrenta a pressão externa para aceitar termos de um “cessar-fogo” que podem ser mais benéficos à Rússia do que à Ucrânia.

No balanço geral, a reeleição de Trump e sua posse redirecionam a política externa dos Estados Unidos para longe do alinhamento total com Kiev, criando um abismo entre os interesses da Casa Branca e as necessidades vitais de segurança da Ucrânia.

O que Zelensky esperava ver (um cenário de retórica dura, mas manutenção parcial do apoio) dá lugar ao pior dos cenários para ele: o de um corte drástico nos repasses e a iminência de um acordo imposto por Moscou.

No xadrez internacional, o líder ucraniano agora terá dificuldades de preservar a soberania do país e, acima de tudo, convencer o Ocidente de que a liberdade de seu povo não deveria ser objeto de um “condominium” entre Estados Unidos e Rússia.

¨      Zelensky parabeniza Ucrânia em três anos de guerra por “heroísmo absoluto”

O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky parabenizou nesta segunda-feira (24) o “heroísmo absoluto” da Ucrânia ao marcar o terceiro aniversário da invasão em larga escala de Moscou, e quando os líderes europeus começaram a chegar à capital Kiev em uma demonstração de apoio ao país.

“Três anos de resistência. Três anos de gratidão. Três anos de heroísmo absoluto dos ucranianos. Estou orgulhoso da Ucrânia!” Zelensky escreveu na rede social X, ao lado de um vídeo mostrando cenas da linha de frente e civis ucranianos apoiando os esforços de guerra durante o conflito.

Ele continuou, “agradeço a todos que a defendem e apoiam. A todos que trabalham pela Ucrânia. E que a memória de todos os que deram as vidas por nosso Estado e povo seja eterna.”

O aniversário acontece com a Ucrânia enfrentando grande incerteza sobre seu futuro depois que o presidente dos EUA, Donald Trump, se voltou para a Rússia e autoridades dos EUA insistem que a Europa não pode mais contar com Washington para sua defesa.

Líderes europeus chegaram à Ucrânia nesta segunda-feira (24), de acordo com postagens de mídia social e imagens mostradas pela emissora pública ucraniana Suspilne.

Algumas estradas no centro de Kiev, capital do país, foram bloqueadas e policiais foram mobilizados.

“No 3º aniversário da invasão brutal da Rússia, a Europa está em Kiev”, afirmou a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, em um post no X, ao lado de um vídeo que a mostrou encontrando autoridades em uma estação ferroviária com o presidente do Conselho Europeu, Antonio Costa.

Ela continuou dizendo que, “estamos em Kiev hoje, porque a Ucrânia é a Europa”, ressaltou. “Nesta luta pela sobrevivência, não é apenas o destino da Ucrânia que está em jogo.”

Imagens postadas pela emissora em seu canal do Telegram mostraram o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, também desembarcando de um trem e cumprimentando autoridades.

<><> Conflito continua

Enquanto isso, a Rússia lançou outra barragem de drones de ataque pela Ucrânia durante a noite, segundo a Força Aérea da Ucrânia.

Moscou lançou 185 drones de ataque na Ucrânia, dos quais 113 foram abatidos e outros 71 desapareceram do radar após serem bloqueados, pontuou a autoridade ucraniana nesta segunda-feira (24).

O ataque “afetou” as regiões de Dnipropetrovsk, Odesa, Kiev e Khmelnytsky, informou no Telegram, sem dizer se causou danos ou vítimas.

A ofensiva acontece um dia depois que a Ucrânia enfrentou seu maior ataque de drones desde a invasão da Rússia, com 267 dispositivos lançados, dos quais 138 foram interceptados, conforme autoridades ucranianas no domingo.

O comandante-chefe das forças armadas da Ucrânia, Oleksandr Syrskyi, também saudou suas tropas no aniversário da invasão.

“O mundo não acreditava que sobreviveríamos, mas o povo ucraniano resistiu aos ataques do inimigo com dignidade”, escreveu no Telegram.

<><> Zelensky diz que está disposto a deixar presidência se isso trouxer paz

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, disse neste domingo (23) que está disposto a renunciar a seu cargo de presidente se isso significar a paz na Ucrânia, afirmando que poderia trocar sua saída pela entrada do país na Otan.

Zelensky também pontuou que queria ver o presidente dos EUA, Donald Trump, como um parceiro da Ucrânia e mais do que um simples mediador entre Kiev e Moscou.

“Eu realmente quero que seja mais do que apenas mediação… isso não é suficiente”, exclamou ele durante uma coletiva de imprensa.


Fonte: CNN Brasil

 

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