Que opções restam
para oposição na Venezuela após posse de Maduro
A jornada recente
da oposição venezuelana se assemelha
ao trajeto de uma montanha-russa. As subidas são muitas vezes sucedidas por
quedas vertiginosas e com fortes curvas.
A maior ascendente
provavelmente ocorreu durante as eleições
presidenciais do último dia 28 de julho.
As atas publicadas pela oposição
indicam que o candidato oposicionista, Edmundo González, obteve quase 70%
dos votos, contra 30% de Nicolás Maduro, que buscava sua
permanência no poder e, apesar dos resultados, declarou vitória.
Os documentos foram
confirmados por estudos independentes e pelo Centro Carter, dos Estados Unidos,
que enviou uma missão de
observação internacional ao país.
Diante do cenário,
dezenas de governos estrangeiros decidiram não reconhecer a reeleição de
Maduro, destacando que o Conselho Nacional Eleitoral nunca publicou os
resultados pormenorizados da votação nem permitiu que uma auditoria
internacional e independente pudesse verificar os números.
Se as atas
eleitorais que confirmam o triunfo de González estiverem certas, a oposição
obteve uma vitória esmagadora nas eleições, que deveria ter aberto o caminho
para uma transição política na Venezuela no último 10 de janeiro.
Mas não foi o que
aconteceu. Nesse dia, Maduro tomou posse e deu início a seu terceiro mandato
como presidente da Venezuela.
González permaneceu
no exterior, onde se encontra desde setembro passado. Existe na Venezuela uma
ordem de prisão contra ele, emitida pela Procuradoria-Geral da República,
ligada ao governo.
Com isso, a
expectativa de mudanças políticas na Venezuela caiu vertiginosamente – uma
queda que já havia iniciado com a repressão aos protestos da oposição após as
eleições.
O governo declarou
que mais de 2 mil pessoas foram detidas durante as manifestações, incluindo
menores de idade.
O processo
continuou com o exílio de González e foi recentemente marcado pela detenção
política de 83 pessoas nos 12 primeiros dias de janeiro, segundo a ONG Foro
Penal.
As autoridades
venezuelanas não admitem que todas essas pessoas se encontram detidas e, quando
o fazem, costumam alegar que os prisioneiros estavam vinculados a algum tipo de
plano para desestabilizar o país.
Ante este cenário,
quais são as opções que restam para a oposição na Venezuela?
·
Fim
das grandes manifestações?
Benigno Alarcón é o
diretor do Centro de Estudos Políticos e Governamentais da Universidade
Católica Andrés Bello, no Chile. Ele explica que, segundo as teorias políticas,
os processos de transição ocorrem quando existem níveis de pressão que tornam
muito difícil para o governo se manter no poder.
"Se analisarmos
a teoria, não haverá transição política enquanto os níveis de pressão não
fizerem o governo considerar que a melhor solução, por assim dizer, seria
negociar sua saída e tentar obter garantias, anistia ou o que for possível
obter, do que se manter no poder", afirma.
"Normalmente,
um governo negocia sua saída porque sente, de alguma forma, que não tem
condições de sustentar o poder e é exatamente o que não aconteceu na
Venezuela."
À BBC News Mundo,
serviço de notícias em espanhol da BBC, Alarcón explica que, seguindo este
ponto de vista teórico, talvez a opção que resta à oposição seja continuar o
que já vinha fazendo: tentar mobilizar internamente a população para gerar
pressões, ao mesmo tempo em que procura coordenar a comunidade internacional,
para que também exerça pressão do exterior.
Mas o caminho da
teoria até a prática não está livre de obstáculos.
Neste caso
concreto, muitos analistas destacaram nos últimos meses que a oposição pode
enfrentar dificuldades para exercer pressão interna com grandes manifestações
nas ruas como as do passado – entre outros motivos, devido ao medo de sair às
ruas em protesto, sobretudo após a repressão pós-eleitoral.
De fato, durante os
últimos meses, muitos venezuelanos adotaram a prática de apagar constantemente
suas mensagens no WhatsApp e nas redes sociais, mesmo que não pratiquem nenhum
tipo de ativismo político.
Sua intenção é
evitar a possibilidade de que funcionários dos órgãos de segurança os abordem
nas ruas e eles acabem sendo detidos por algum conteúdo político considerado
inadequado eventualmente encontrado em seus celulares.
Some-se a estes
fatores a detenção de jornalistas e defensores dos direitos humanos, como o
diretor da ONG Espacio Público, Carlos Correa.
Carmen Beatriz
Fernández, analista da consultoria DatastrategIA e doutora em comunicação
pública pela Universidade de Navarra, na Espanha, acredita que as grandes
manifestações de rua já não têm tanto sentido na Venezuela.
"Acredito que
o 10 de janeiro marca uma lógica distinta na ação política para a oposição",
explica ela. "Agora, eles precisam se cuidar mais."
"Começam a
fazer sentido ações menores, realizadas por organizações menos verticais, menos
visíveis, em escala micro e semi-independente, como modelo de organização de
ações políticas."
A professora de
ciências sociais Colette Capriles, da Universidade Simón Bolívar, na Venezuela,
indica que, neste momento, a oposição provavelmente irá cuidar principalmente
da preservação dos partidos e de todas as lideranças.
·
Reconstrução
da capacidade política
Após a posse de
Maduro no dia 10 de janeiro, o desânimo se espalhou entre parte da oposição. Em
alguns casos, circularam mensagens chegando a questionar os próprios esforços
realizados frente às eleições de 28 de julho.
Capriles indica que
o pleito foi um evento muito importante, como expressão clara da vontade do
povo venezuelano. Ela considera que talvez seja conveniente que a oposição faça
um balanço dos pontos positivos que ainda tem à sua disposição.
"A vontade das
pessoas para irem votar e, depois, defender seu voto e participar de um
trabalho colaborativo para ter esse capital político é algo que precisa ser
sempre considerado", destaca ela. "Este é o grande capital para
começar."
Capriles acredita
que, na Venezuela, os partidos políticos e, de forma geral, os participantes da
política estão mais uma vez frente ao dilema de reconstruir sua capacidade e
suas relações com as bases e com os cidadãos.
"Também irá
provavelmente ocupar um lugar importante neste processo a capacidade da própria
sociedade civil, dos movimentos sociais", ressalta a professora. Ela
acredita que o momento atual exige novas estratégias e forte liderança por
parte da oposição.
"Liderar não é
publicar mensagens nas redes sociais. Isso faz parte, mas acredito que as
pessoas também querem ser ouvidas e terem certeza de que nem tudo está
perdido."
"Existe agora
um momento emocional, mas, depois dele, vem a vida cotidiana, e é ali que as
pessoas enfrentam aquilo que as fez votar contra Maduro."
Capriles explica
que a oposição precisaria entender o que levou as pessoas a votar.
"As pessoas
votam contra o estado atual das coisas. Por isso, a oposição tem a
possibilidade de capitalizar, valorizar e fortalecer o desejo de mudança."
·
Reunir
os descontentes
Há vários anos, a
visão predominante entre a oposição venezuelana é que seria preciso debilitar a
coesão entre os apoiadores de Nicolás Maduro.
Este foi um
elemento fundamental da política de sanções aplicada durante o primeiro governo
Donald Trump nos Estados Unidos.
Com seu discurso de
que "todas as opções estão na mesa", ele procurava criar fissuras
entre os apoiadores do governo.
"Acredito que
a oposição poderia apostar na coesão dos que formam a maioria, não no desmonte
da coalizão dominante", opina Capriles.
"O trabalho é
o contrário. Conseguir a coesão para fazer com que as pessoas entendam que não
é que haja um plano que ninguém conhece, mas que o plano é que as próprias
pessoas tomem ações e se organizem na sua comunidade, reivindicando seus
direitos. Ou seja, é outro tipo de trabalho."
Ela adverte que
este enfoque exige muito esforço, muita liderança e uma relação diferente até
mesmo com a opinião pública. Talvez o trabalho não precise ser realizado
simplesmente com declarações públicas, mas com a vinculação cotidiana com as
pessoas.
"Tudo isso
implica o abandono de uma promessa de mudanças imediatas", destaca a
professora.
"Talvez este
seja o preço mais alto que a oposição precisaria pagar. Parte do entusiasmo das
pessoas talvez fosse contemplar a vitória muito próxima e, agora, ela se distanciou."
·
Desafios
imediatos
Além de decepcionar
aqueles que buscavam mudanças políticas na Venezuela, a posse de Maduro trouxe
novos e urgentes desafios para a oposição.
O governante
venezuelano anunciou uma reforma constitucional e a convocação de três eleições
em 2025: para prefeitos, governadores e para a Assembleia Nacional.
Com isso, Maduro
tomou a iniciativa política e colocou a oposição em um difícil dilema.
"A intenção do
governo ao convocar eleições é incentivar a divisão da oposição", destaca Benigno
Alarcón.
"Quando você
convoca uma eleição de governadores e prefeitos, começa o grande debate entre
os partidos, entre os que desejam ir às urnas e os que não querem
participar."
"O problema
dos partidos de oposição é que, depois do que ocorreu nas eleições de 28 de
julho, as pessoas não têm mais incentivo para votar", explica ele.
"Ir a uma
eleição quando você já foi às urnas, ganhou por larga vantagem e o resultado
não foi respeitado faz com que seja muito pouco provável que, na próxima
eleição, as pessoas saiam para votar e apoiar você."
Por outro lado,
Carmen Beatriz Fernández alerta sobre a possibilidade de que não sejam
realizadas outras eleições na Venezuela como as que ocorreram até 28 de julho,
com um sistema eleitoral automatizado e muitos pontos de auditoria do processo,
considerando as irregularidades denunciadas pela oposição nos últimos pleitos.
"É provável
que estas novas eleições sejam mais parecidas com as realizadas para escolher
juízes de paz, que foram manuais e muito arbitrárias", segundo ela.
"Não digo que
a oposição deva ou não participar. É preciso avaliar cada situação e cada
convocação separadamente."
Para Fernández, é
possível que as eleições futuras no seu país "sejam mais parecidas com o
sistema de Cuba, onde as pessoas votam permanentemente, mas não elegem".
·
O
olhar do exterior
Um dos pontos
fortes da oposição, segundo Carmen Beatriz Fernández, é a sintonia formada
entre os venezuelanos que moram no país e no exterior.
Dados das Nações
Unidas indicam que cerca de 7,89 milhões de venezuelanos emigraram do país na
ultima década.
"Algo que a
oposição poderia continuar fazendo seria a integração entre a Venezuela de fora
e a Venezuela interna", afirma Fernández.
"Existem
sociedades que sofreram forte diáspora, que gerou animosidade entre o país de
dentro e o país de fora. No caso venezuelano, não foi o que ocorreu, o que
favorece a oposição. Sua luta fica consolidada e fortalecida quando a Venezuela
interna e a Venezuela de fora trabalham unidas como um só país."
Outro elemento externo
a ser destacado é o regresso de Donald Trump à Casa Branca. Sua eleição gerou
alguma incerteza, devido à força com que o presidente eleito lidou com a crise
política venezuelana no seu primeiro mandato.
Muitos especulam se
Trump irá buscar uma negociação pragmática com Maduro ou se retomará o caminho
das fortes sanções.
Os especialistas
consultados pela BBC News Mundo destacam que as dúvidas sobre a legitimidade de
Maduro apresentadas por parte considerável da comunidade internacional podem
ajudar a oposição na sua busca por mudanças políticas.
Mas isso não é
garantia. Em 2019, cerca de 60 governos internacionais apoiaram o opositor Juan
Guaidó quando se declarou presidente interino da Venezuela, enquanto Maduro
continuava governando o país.
Colette Capriles
acredita que a leitura internacional sobre a crise venezuelana pode ajudar a
resolver o conflito político.
"Isso poderia
ajudar a pressionar e voltar a construir um espaço de negociação", segundo
ela.
"Será preciso
construir novamente um espaço onde possa haver um mínimo de consenso – o que
funcionou no passado e permitiu a realização das primárias da oposição e das
eleições de 28 de julho."
"É importante
destacar este ponto quando dizem que as negociações não tiveram
resultado", destaca Capriles.
"As
negociações serviram para o seu propósito: conseguir realizar uma eleição que
mostrou de forma inequívoca a vontade de mudança da população. Cedo ou tarde,
será necessário algum tipo de negociação que reconheça essa vontade de mudança
e estabeleça um caminho para a transição política."
Enquanto isso, a
montanha-russa da oposição venezuelana mantém seu trajeto em ritmo acelerado.
¨ A direita pode! Vice-presidente do Equador denuncia
impedimento para exercer suas funções
A vice-presidente
do Equador, Verónica Abad, denunciou nesta quinta-feira (16) que ela continua
impedida de acessar seu local de trabalho na sede do governo, que permanece
militarizada, apesar da decisão judicial que ordenou sua restituição no cargo.
"Continuam
negando meu acesso ao meu gabinete da vice-presidência, com sentença escrita e
notificações entregues à Presidência, Forças Armadas, Assembleia Nacional,
Controladoria Geral do Estado, Defensoria do Povo, Conselho Nacional Eleitoral
e Tribunal Contencioso Eleitoral", afirmou em sua conta na rede social X.
Companheira de
chapa do presidente Daniel Noboa, que se afastou para concorrer à reeleição,
Abad foi penalizada por não ter se transferido de Tel Aviv (Israel) para
Ancara (Turquia), conforme determinado por um decreto presidencial.
Noboa realiza
campanha eleitoral sem cumprir a normativa vigente da licença sem
remuneração para estas atividades, qual é o motivo de exigências e denúncias
por parte de candidatos e organizações políticas.
Abad indicou que
a ministra do Trabalho, Ivonne Núñez, continua em desacato ao determinar
que os servidores da vice-presidência trabalhassem de forma remota, alegando
que essa decisão não é da sua competência.
"Tive que
consultar, a partir do meu e-mail pessoal, a secretária Cynthia Gellibert para
que me explicasse: quais ações foram realizadas pela vice-presidência para
cumprir essa disposição inconstitucional e discriminatória? E até hoje não
tenho resposta", revelou.
Após a decisão da
juíza Nubia Vera, de 23 de dezembro, Abad, que havia sido suspensa por 150
dias sem direito à remuneração, foi habilitada para exercer o cargo. A
justiça também determinou que a vice voltasse a receber a remuneração e
que Nuñez declarasse desculpas públicas por ter agido sem base legal para
definir o tempo de suspensão das funções da vice.
Apesa da decisão
favorável, Noboa
assinou um novo decreto presidencial para designar a vice-presidente como
colaboradora para as relações comerciais do Equador com a Turquia,
estabelecendo que ela deveria se deslocar a Ancara até o dia 27 de
dezembro.
Abad havia
informado que tiraria férias até o dia 3 de janeiro e, posteriormente, cumpriria
sua missão dentro de um prazo de 30 dias, conforme a legislação vigente. Nesse
interim, o presidente designou, por meio de outro decreto, a secretária de
Planejamento, Sariha Moya, como a nova
vice-presidente do Equador.
De
acordo com Noboa,
Abad tem como objetivo afastá-lo da campanha eleitoral. Ele afirmou
ainda que a oposição está tentando organizar um golpe de Estado contra ele.
Fonte: BBC News
Mundo/Sputnik Brasil
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