O
prato está vazio? Que comam ultraprocessados
O que
você faria se visse seu filho ou sua filha sofrendo com a privação de alimento
em um nível que poderia significar a morte dele ou dela? Arriscaria a sua
própria vida para conseguir comida? Seria capaz de cometer um crime? Aceitaria
receber migalhas de qualquer tipo, mesmo que sejam “dadas” justamente por
pessoas ou instituições responsáveis pela imposição da fome que vocês
vivenciam?
Desde
criança, ainda muito pequena, eu me fiz esse tipo de pergunta. E, só em pensar
em uma delas, eu já sofria tanto, que terminava sempre por concentrar meus
esforços em encontrar caminhos que pudessem impedir que seres humanos chegassem
a esse ponto de desespero. Mas se, como eu, muita gente resolveu dedicar suas
energias para que a fome extrema não se instalasse – e levasse as pessoas que
dela estão sofrendo a tomarem atitudes que comprometam sua segurança e sua
dignidade –, há quem atue sob uma lógica totalmente diferente.
Há
milênios, métodos de destruição das condições materiais e imateriais que
garantem a reprodução da vida de um determinado grupo populacional vem sendo
ferramentas habilidosamente manipuladas por quem almeja o poder
político-econômico. E essas ferramentas vão se complexificando com o avanço do
desenvolvimento tecnológico e o aumento do conhecimento sobre o funcionamento
do corpo e do comportamento humanos, bem como dos demais elementos e dinâmicas
da natureza. Já na antiguidade, não era tão incomum testemunhar o envenenamento
das águas de um poço como uma forma de enfraquecimento das condições de luta de
uma comunidade considerada inimiga.
Sem
água, fica-se sem produção agrícola, sem criação de animais, sem comida na
barriga: quem teria forças para resistir aos ataques de um oponente nessa
situação? Muitas outras maneiras de gerar fome e sede foram utilizadas, ao
longo da história humana, para a conquista de territórios de povos que se
buscava dominar. Desvio de cursos d’água, incêndios de ecossistemas e
plantações, bloqueio de rotas de abastecimento, roubo de rebanhos, dizimação
dos animais selvagens que eram comumente caçados ou pescados para servirem de
alimento, destruição de armazéns, de cozinhas, de ferramentas… A coleção de
táticas é grande e podemos dizer que seu uso contribuiu decisivamente para que
muitos povoados sucumbissem.
Se
apossar do controle de fontes de matéria prima pode ser considerado um objetivo
em si, já que poderia representar a conquista de melhores condições de vida e o
aumento de poder de um grupo humano sobre o outro. Mas também pode ser visto
como um método para obter apenas este próprio poder (quando ele era o que
diretamente se almejava), e os bens materiais implicados na conquista não eram
assim tão essenciais ou atraentes para os supostos conquistadores.
As
relações de conflito em torno dos chamados “recursos” naturais não passavam (e
seguem não passando) somente pela disputa de quem vai ficar com eles, mas
podem, também, incluir a busca intencional pela sua destruição, de modo a não
ficarem mais disponíveis para ninguém. Ou seja, se eu passo bem sem esses
recursos e meu inimigo não, posso perfeitamente acabar com eles, mesmo que abra
mão de riquezas em potencial, considerando que o mais importante seria a
conquista do poder sobre o território em questão ou sobre o povo que o habita.
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Na linha de (des) montagem
Antes
da implantação de um sistema industrial de produção de alimentos, havia
basicamente duas possibilidades em relação à saudabilidade de um item
comestível: ele estava apropriado para o consumo ou ele não estava. No caso de
não estar, poderia ser por um processo de deterioração biológica, seja natural
ou induzida, ou por estar contaminado com algum tipo de veneno, seja por um ato
intencional ou não. Mas tudo complicou bastante quando, ao invés de você e eu
cultivarmos, colhermos e cozinharmos um determinado cereal ou tubérculo, por
exemplo, nós passamos a adquirir um produto derivado deles, que passou por
várias etapas de processamento e muitas e muitas mãos (ou máquinas), antes de
chegar ao nosso prato.
Estamos
falando de circuitos longos, complexos e lineares de produção (tanto
agropecuária como industrial), circulação, comercialização, consumo e
destinação de resíduos de alimentos. Dentro desse sistema, as pessoas que
plantam e as pessoas que comem não fazem ideia de tudo o que acontece entre
essas duas ações, nem do que virá na sequência – o modo como se dará o
encaminhamento da matéria orgânica restante e seus efeitos no ambiente.
Da
terra ao aterro, a comida nos dias de hoje costuma percorrer um caminho finito,
em que o que é retirado da natureza não volta para ela. Quebra-se, assim, o
ciclo de fertilidade do solo e a percepção de que tudo está interligado, o que
leva à destruição da capacidade de cada comunidade de entender o processo em
sua totalidade e decidir o que será ou não produzido e ingerido. Ou seja, adeus
soberania alimentar.
E, nas
esteiras de montagem que caracterizam esse modelo produtivo, desmontam-se
também os laços ancestrais mantidos pelos povos entre seus integrantes, destes
com os ecossistemas em que vivem, bem como com as tradições culturais que foram
sendo gestadas através de gerações e gerações – e que, em sua grande maioria,
estavam vinculadas ao plano da espiritualidade, conferindo ao alimento uma
dimensão sagrada. Pois tudo isso acaba por submergir e dar lugar ao
alimento-mercadoria, que pode chegar em praticamente qualquer lugar do planeta,
desde que alguém pague e alguém ganhe com ele. Um detalhe importante: há muito
mais gente que paga (de diferentes maneiras, não só com dinheiro) do que gente
que ganha, sendo esta última uma minoria da minoria da população planetária.
Quando
quem decide o que vamos comer é uma rede corporativa, cujo objetivo principal é
a maximização dos lucros, ficamos sujeitas e sujeitos a só ter acesso ao que,
para ela, é mais lucrativo ser produzido e comercializado. E, cada vez mais, o
que traz polpudos rendimentos a essa indústria é a cadeia de alimentos
ultraprocessados, os chamados UPPs.
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A comida (não só a falta dela) como arma
A
engrenagem produtiva dos UPPs começa com as sementes geneticamente modificadas
em laboratórios; passa pelas monoculturas mecanizadas cheias de agrotóxicos e
fertilizantes químicos; pela criação confinada (e sádica) de animais; pelas
diferentes categorias de indústrias de produtos comestíveis; pela circulação de
mega frotas de caminhões (responsáveis pela distribuição em locais muitas vezes
distantes milhares de quilômetros da origem) e pela venda em grandes redes
atacadistas e varejistas.
Vai
descambar, enfim, na geração de montanhas de resíduos sólidos, que podem ser de
dois tipos: orgânicos e não orgânicos. A maior parte dos resíduos orgânicos –
incluindo uma quantidade considerável de alimentos que ainda poderiam ser
aproveitados – provavelmente jamais será compostada. Por sua vez, os resíduos
não orgânicos (e aqui vale destacar que não é por acaso que a Coca-Cola, a
PepsiCo e a Danone sejam as empresas recordistas da poluição “plástica”
mundial) têm apenas uma pequena chance de serem reciclados. O mais provável é
que se juntem ao volume monumental de materiais não biodegradáveis que já
invadiram os ambientes naturais e os nossos corpos.
E já
que mencionamos os corpos humanos, chegamos ao momento de refletir sobre os
efeitos do alto consumo desses produtos alimentícios ultraprocessados no nosso
organismo. Sobre isso, existem pesquisas científicas suficientes para
afirmarmos que são devastadores. Uma delas relaciona sua ingestão frequente com
a morte precoce e o desenvolvimento de 32 tipos de doenças, que vão desde
diabetes a câncer, percorrendo todo o abecedário do que denominamos DCNTs –
Doenças Crônicas Não Transmissíveis – responsáveis pela maior parte da atual
crise na saúde pública global.
Já
escrevi sobre as relações de dependência que nosso cérebro desenvolve com o
consumo de produtos lotados de açúcar, gordura, sal e aditivos – cuidadosamente
misturados para gerar prazer imediato a quem os devora. No artigo Big Techs e
Big Foods, um casamento lucrativo, discuto como, com o advento das redes
sociais digitais, igualmente viciantes, houve uma captura ainda maior da
capacidade de resistirmos a esse consumo doentio.
Nosso
impulso tem sido, cada vez mais, trocar o velho prato de arroz-feijão por um
pacote de qualquer coisa feita com farinha refinada, óleo vegetal transgênico,
adoçante (seja derivado da cana-de-açúcar ou artificialmente sintetizado em
laboratório) e um mix de aromatizantes, corantes, flavorizantes,
emulsificantes, estabilizantes e outras substâncias sobre as quais não temos o
menor conhecimento.
Uma vez
que as análises de resíduos de agrotóxicos são feitas apenas em amostras de
produtos in natura, há um grande desconhecimento sobre a presença deles nos
alimentos ultraprocessados. Porém o levantamento Tem Veneno nesse Pacote, feito
pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), traz resultados
consistentes de que eles estão, sim, presentes nesses produtos, somando-se à
mistura de substâncias sintéticas prejudiciais ao organismo que já descrevemos
acima.
É nesse
ponto que a “comida” deixa de ser algo que promove a saúde e passa a ser um
indutor de doença – e de morte. Sim, estamos falando de sua utilização como
arma. Agora não é só a restrição do acesso ao alimento que pode ser uma
ferramenta mortal, numa luta pelo poder político e financeiro. A oferta
seletiva, caprichando no que eu chamo de ultraprocessados e ultraenvenenados,
pode ser igualmente esmagadora.
Em
tempo: contra o ultra-envenenamento, os movimentos sociais brasileiros acabamos
de vencer uma batalha importante nesse cabo de guerra com as corporações
agroquímicas. Finalmente, o decreto que oficializa o PRONARA – Programa
Nacional de Redução de Agrotóxicos – foi assinado pelo presidente Lula, após
uma mobilização que se estendeu desde 2014 até agora. A assinatura, conquista
histórica da sociedade, ocorreu na ocasião do lançamento do Plano Safra para a
Agricultura Familiar, no dia 30 de junho.
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O obesogênico way of life estadunidense
Hoje,
um habitante dos EUA costuma consumir, em média, 3.868 calorias ao dia. Olhando
mais detalhadamente, uma porcentagem considerável delas provém de carboidratos
pobres em nutrientes, gorduras não saudáveis e produtos de origem animal
industrializados, como carnes embutidas. Não é à toa que mais de 200 milhões de
estadunidenses apresentam ocorrência de obesidade ou de sobrepeso. Essa é a
parte mais visível do problema, mas ele se estende para o adoecimento físico e
mental em diferentes modalidades e impulsiona um outro setor dos negócios, além
do agroalimentar: o da indústria farmacêutica.
Apesar
do drama gerado por essa parceria lucrativa e macabra entre essas elites
econômicas gananciosas, ainda é veiculada aos quatro ventos a ideia de que o
tal “modo de vida americano”, com seus supermercados abarrotados de UPPs
[ultraprocessados], é o paraíso na Terra e deve ser almejado por toda a
população planetária.
Já
sabemos como os governos e as big empresas dos EUA infestam o planeta com as
armas produzidas por sua insaciável indústria bélica – fomentando guerras
infindáveis em territórios que, a princípio, nada teriam a ver com eles. O que
não podemos esquecer é que eles também impõem seus padrões “anti-comida” mundo
afora: um instrumento de destruição menos sangrento, mas extremamente potente.
As
consequências desse tipo de canto da sereia, entoado por uma rede de
marquetagem tão robusta quanto a estrutura militar, são dramáticas e estão na
base da crise sistêmica que o mundo vive hoje – chamada de Sindemia Global. É o
colapso conjunto do ambiente, do clima e da saúde pública (para ficarmos por
aí), que podemos ver se desenvolvendo de modo cada vez mais acelerado.
E,
assim como o processo de dominação imperialista é em si materialmente violento,
lançando mão de suas armas militares, agroalimentares, farmacêuticas… para
destruir a resistência dos povos (a serem) dominados, ele exerce um tipo de
violência que transcende a materialidade. Através da ilusão de que a felicidade
pode ser gerada pelo consumo proporcionado por um modelo neoliberal de vida,
ele visa destruir qualquer outra possibilidade de estrutura social imaginada.
É desse
modo, que pessoas famintas em decorrência do extermínio de seus meios de
obtenção de comida – sejam africanas, asiáticas ou latino americanas – passam a
sonhar com hambúrgueres, biscoitos recheados e refrigerantes, ao invés de seus
pratos tradicionais saudáveis, responsáveis por nutrir gerações sem esgotar os
tais “recursos” naturais. E é assim, também, que a indústria alimentícia,
aliada aos demais setores corporativos aqui mencionados, consegue ter domínio
sobre os elementos da natureza nos territórios.
Um
exemplo gritante é a apropriação que ela vem fazendo das fontes de água das
comunidades, sugando-as vorazmente para produzir suas bebidas artificiais, ao
mesmo tempo em que repete seu mantra onipotente: tá com sede? Beba cola.
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Arapucas e carapaças
Quando
é mais fácil, mais barato e mais sedutor tomar um refrigerante, ao invés de um
copo de suco natural, de leite ou até mesmo de água, já que uma complexa teia
de benesses e manipulações garante esse cenário, significa que, na prática, se
exterminou a possibilidade de escolha por parte dos que são chamados de
“consumidores”. Em relação às guloseimas sólidas ultraprocessadas, como as tais
balas mencionadas (com duplo sentido) no título deste artigo, também podemos
seguir esse raciocínio.
Desse
modo, um troço qualquer, feito com corantes, aromatizantes e (muito) açúcar, ou
com milho e soja transgênicos, embalado em um pacote reluzente, acaba sendo
mais acessível e desejado do que uma fatia de cuscuz ou uma porção de tutu de
feijão. E esse tipo de pacote chega até a lua, se necessário, como podemos
constatar em relação às barcas que percorrem a Amazônia, transformando as
relações que os povos locais têm com o alimento e a própria natureza.
O que
fazer se o modelo produtivo capetalista causou a seca e a contaminação de seus
rios e vocês não têm mais peixe para pescar nem água para cultivar a roça? Pois
tomem e comam nossos deliciosos UPPs – devidamente subsidiados pelo poder
público – e sejam (in) felizes para sempre!
Aos
poucos, pessoas de todo o planeta foram caindo nessa arapuca, armada pela rede
corporativa globalizada, para que seja esta última a responsável por definir
quem passa fome e quem come o quê, nos lugares onde se infiltra. E as múltiplas
formas de violência, incluindo a militar, policial ou miliciana, amplificam
desigualdades e insuflam conflitos locais, regionais e nacionais.
Nesse
sentido, podemos mencionar os cercos promovidos por organizações armadas, como
o grupo Invasão Zero, aos povos campesinos e originários que tentam criar ou
manter seus modos de produzir e consumir comida. Também podemos citar a
exploração brutal feita por plataformas de aplicativos de entrega de alimentos,
como o Ifood, sobre as populações das periferias urbanas, sujeitas à engolir às
pressas um cachorro quente e um refrigerante entre uma viagem e outra, sendo
alvos recorrentes das batidas policiais. E, ainda, podemos falar do assédio que
setores ligados à especulação imobiliária fazem a organizações e lideranças,
como o Padre Júlio Lancellotti, por alimentarem pessoas “indesejáveis” em zonas
centrais das cidades… As balas, não apenas as comestíveis, estão
indubitavelmente presentes.
Quem
sente fome se coloca numa situação de intensa vulnerabilidade. Cair numa
arapuca, mesmo que seja anunciada previamente, é quase inevitável. Talvez o
caso mais emblemático dessa constatação seja o do povo que vive hoje em Gaza,
sobre o qual já escrevi anteriormente. Depois de tantos massacres, em que as
condições mínimas para a sobrevivência se romperam, deixar de ir até um raro e
esporádico local de distribuição de comida e água, por saber que as
metralhadoras da indústria bélica internacionalizada estão de prontidão para
dispararem, não é uma opção.
Quem
não nem comida no prato, acaba se expondo mortalmente e ajudando a engordar os
lucros trilionários dos senhores da guerra, sempre revestidos de sólidas
carapaças e localizados a dezenas de milhares de quilômetros de distância das
regiões em que balas e bombas põem um ponto final à fome de quem insistia em
sobreviver, quando sua existência havia se tornado um incômodo para os
dominadores.
Se
alguém ainda precisa de mais uma prova das relações dramáticas que existem
entre armas e comida, pode dar uma olhada no Relatório que a Rede Global contra
Crises Alimentares (GNAFC) lançou recentemente. Aqui vai um resumo: na raiz da
fome extrema, vivenciada no planeta em 2025, o que pode ser apontado – sem
sombra de dúvida – são mesmo as ações militarizadas.
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Fogueiras nutritivas
Estamos
no período junino-julino. É tempo dos arraiás! As noites de muitos povoados
brasileiros se iluminam com as fogueiras crepitando. Os estalos são da madeira
queimada pelos adultos ou dos embrulhinhos de pólvora jogados no chão pelas
crianças. As quadrilhas são de dançarinos e dançarinas. A cadeia é só um faz de
conta, uma forma de cutucar afetos e desafetos. O líquido vermelho é do vinho
quente ou da calda da maçã do amor. A trilha sonora traz canções que falam da
cultura caipira, da devoção aos santos, de romances e aventuras. Nada de
sirenes apitando ou mísseis silvando pelo céu.
É fato
que os produtos alimentícios industrializados – como as salsichas fornecidas
pela cruel rede frigorífica de embutidos, e as cervejas oriundas das mega
companhias de bebidas, ambas repletas de ingredientes impactados pela
transgenia – estejam ganhando espaço nesses festejos tradicionais. Mas ainda há
lugares em que o forte mesmo são as receitas feitas com milho crioulo, com
mandioca, com amendoim, com gengibre… preparadas de modo caseiro pela
comunidade, algumas vezes de forma coletiva.
Foi
essa rede de coletividade, composta por cozinheiros e cozinheiras ativistas,
que garantiu os quitutes servidos no dia 14 de junho no Arraiá do Espaço
Cultural Elza Soares, mantido pelo MST na região central de São Paulo. Enquanto
choviam balas e projéteis em diversas regiões do mundo – sejam regiões onde há
guerras declaradas ou onde há guerras não assumidas -, a Cozinha-escola Pra
Brilhar Dona Ilda Martins, assim como outras milhares de cozinhas comunitárias,
inundava os ares com aromas de caldos, farofas, curais e outros mexidos
suculentos feitos com alimentos agroecológicos de assentamentos da Reforma
Agrária.
Nessas
cozinhanças, ficaram de fora os venenos agrícolas, os grãos transgênicos, as
carnes maltratadas vindas das granjas das empresas do Agribusiness, os aditivos
viciantes oriundos dos laboratórios da indústria alimentícia, a opressão
militarizada dos conflitos agrários e urbanos. Ficaram de fora as balas, sejam
as que são disparadas por exércitos ou por milícias, sejam as que lotam os
mercadinhos de doces industrializados que se espalham aos quatro ventos nas
periferias. Ficaram de fora as armas, sejam em forma de metralhadoras ou em
forma de UPPs.
Que os
bolos caipiras – de milho, coco, pinhão, mandioca, fubá, laranja, aipim –
possam encher os ares com os perfumes da culinária da terra. Que as fogueiras
juninas e julinas dos arraiás agroecológicos sigam aquecendo os corpos,
irradiando esperanças e nutrindo a luta. As guerras são muitas, mas as formas
de resistência também são e as relações estabelecidas com o alimento
transpassam a essência de ambas. Sigamos cultivando a vida nos campos, cidades
e florestas, cozinhando comunitariamente nossas receitas milenares, alimentando
nossas almas.
Viva
nossos bolos caseiros! Basta de balas e colas!
Fonte:
Por Susana Prizendt, em Outras Palavras

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