terça-feira, 29 de julho de 2025

Moisés Mendes: O que vai sobrar da autofagia da extrema direita no Brasil

Muitos, e não só os alcançados por Alexandre de Moraes, vão tombar na extrema direita antes e durante a campanha eleitoral de 2026. Serão os comidos pelo processo de autofagia do fascismo, em meio aos ataques de Trump e às tensões internas pela sucessão de Bolsonaro.

Alguns comerão, outros serão comidos, na reacomodação das estruturas de comando, dos quadros intermediários, dos mandatos e das bases bolsonaristas. O líder dessa reacomodação forçada, que não se orienta por nenhuma racionalidade, é o deputado foragido Eduardo Bolsonaro.

Eduardo atira em Tarcísio de Freitas, por temer de que o extremista moderado possa liderar o bolsonarismo sem Bolsonaro. Atira em Nikolas pela inveja da radicalidade de resultados do transfóbico da peruca. E desqualifica Zema e Caiado por enxergá-los pelo que são, como oportunistas sem berço bolsonarista.

Outros, mesmo que não sejam alvos de Eduardo, tombarão na disputa de espaços na extrema direita raiz. Porque muitos, sem essa base que vem de 2018, não irão prosperar em 2026.

O ônibus do fascismo, considerando-se também a reacomodação do eleitorado depois da crise provocada por Trump, pode estar lotado demais. Há muita gente do bolsonarismo exacerbado num espaço que deve ser redimensionado, com a perda de alguns latifúndios.

O movimento feito pelo deputado Helio Lopes, tentando rearmar barracas em Brasília, como fizeram em 2022 e 2023, estava no contexto dessa reacomodação. É preciso, desesperadamente, fidelizar e acordar a base mais inflexível através do resgate da memória dos acampamentos. Mas quem é Helio Lopes no teatro da extrema direita?

A bancada do PL de Lopes saltou de 76 deputados em 2018 para 99 em 2022, pelo vínculo do partido ao arrendatário que tentava a reeleição. Bancadas da extrema direita cresceram em Assembleias e Câmaras de Vereadores de todo o país. Em São Paulo, o bolsonarismo engoliu o tucanismo.

A depuração resultará do acúmulo de crises, desde a derrota na eleição de 2022, do golpe fracassado e, agora, das invertidas que o bolsonarismo levou com as chantagens de Trump. É também uma crise de autoestima.

Com a dispersão de referências na direita, com o grande número de postulantes à missão de enfrentar Lula e com os rachas daí decorrentes, o bolsonarismo enfrenta o drama das grandes facções da política, do tráfico e da bandidagem em geral.

Não se sabe hoje, e se saberá menos ainda nos próximos meses, quem irá assumir o lugar do chefão que estará fora do jogo no meio da primavera. A bandidagem miúda já está em guerra pelo ponto.

As engrenagens da direita poderão estar, a partir da condenação e prisão de Bolsonaro, muito mais nas mãos acomodadoras dos espertalhões pragmáticos, começando pelos que comandam o Congresso – Davi Alcolumbre e Hugo Motta, como aprendiz e como professor –, e passando pelos rebanhos sob a liderança de Gilberto Kassab, do que nas mãos e sob a gritaria do bolsonarismo.

O centrão pode se libertar das más influências, a direita que ainda finge ser de centro pode voltar ao seu leito natural, como se fosse a velha Arena, e a extrema direita talvez se veja bem menor do que já foi desde a chegada de Bolsonaro ao poder.

O bolsonarismo só não sairá alquebrado dessa sequência de desastres, se Trump conseguir fazer com a ajuda dos Bolsonaros o que os Bolsonaros tentaram e fracassaram com a ajuda dos manés no 8 de janeiro. E se Lula estiver muito fraco.

Se a família Bolsonaro for para Trump o que os manés não conseguiram ser para eles e os generais, e disseminarem o caos na economia, com desdobramentos políticos graves, a extrema direita segue em frente. 

Se Trump sobreviver ao cerco da própria base  fascista e intensificar e ampliar os ataques ao Brasil. Se Lula se enredar na tentativa de reação. E se os brasileiros assistirem tudo de longe, como fizeram quando do golpe contra Dilma e quando do encarceramento de Dilma, aí tudo pode acontecer. Até um golpe liderado pelo deputado Helio Lopes.

Mas aí, se esse for o cenário, poderemos desistir de tudo e pedir desculpas a Alexandre de Moraes e a Lula pela covardia de um país que os deixou lutando sozinhos.

Vamos pensar e agir positivamente e fazer o possível para que o fascismo se fracione, se disperse e, numa autofagia radical, coma o que ainda resta da própria cabeça.

•        João Cezar de Castro Rocha: "Brasil é o principal alvo da extrema direita mundial"

Em entrevista ao programa Boa Noite 247, o historiador e escritor João Cezar de Castro Rocha alertou para o papel central do Brasil no projeto da extrema direita global, classificando o país como "o principal alvo da extrema direita mundial". Segundo ele, a atual conjuntura política brasileira repete estratégias articuladas historicamente por interesses internacionais, sobretudo dos Estados Unidos, com o objetivo de impedir a consolidação de um projeto nacional soberano.

<><> Golpes híbridos e desestabilização internacional

Para João Cezar, a atual ofensiva contra o governo de Luiz Inácio Lula da Silva faz parte de uma longa tradição de intervenções norte-americanas na América Latina. Ele comparou o momento político atual ao período entre 1961 e 1964, que precedeu o golpe militar, destacando a atuação de instituições como o IBAD e o IPES, financiadas por capital estrangeiro para desestabilizar governos nacionalistas.

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"Entre 61 e 64 este país viveu um típico golpe de Estado planejado pela CIA", afirmou. Segundo ele, a atuação da extrema direita hoje retoma essa mesma lógica: "O que está em jogo no Brasil hoje é um processo permanente de tentativa de desestabilização do governo Lula".

João Cezar também lembrou que a CIA financiou greves de caminhoneiros no Chile antes do golpe de 1973. Em sua avaliação, há semelhanças com o incentivo atual à paralisação de caminhoneiros no Brasil por setores bolsonaristas. "Já começou uma nova postagem: ‘se os caminhoneiros pararem, você apoia?’”, relatou, associando a movimentação ao histórico de ações desestabilizadoras.

<><> A atuação de Donald Trump e o papel da soberania nacional

O historiador apontou que o governo brasileiro tem reagido de forma eficaz diante dessas ameaças, como ao acionar a Organização Mundial do Comércio (OMC) para denunciar a tentativa de ingerência externa por parte dos Estados Unidos, sob a presidência de Donald Trump.

“É indispensável que o Brasil consiga apoio na comunidade internacional para resistir à pressão que virá”, afirmou. Para ele, o governo Lula tem adotado a postura correta ao manter um discurso forte: “Historicamente, a única forma de enfrentar um valentão com a psicologia do Trump é encará-lo. Se você baixar a cabeça, acabou”.

João Cezar citou uma fala recente de Lula à jornalista Christiane Amanpour, da CNN, como exemplo dessa firmeza: “Se o presidente Trump estivesse no Brasil e tivesse tentado o Capitólio, ele estaria preso no Brasil”.

<><> Entreguismo, militarização da Amazônia e ataque à identidade nacional

Na avaliação do historiador, a extrema direita bolsonarista tem se comprometido com interesses estrangeiros e abandonado completamente qualquer ideal nacionalista. “Não pode haver patriotismo na terra estrangeira”, disse, ao comentar manifestações de apoio explícito de parlamentares bolsonaristas a Donald Trump, com uso da bandeira dos EUA no Congresso Nacional.

Ele também destacou o papel de Elon Musk no apoio ao bolsonarismo e seu interesse pela Amazônia. “O Elon Musk tem hoje mapeado todos os recursos militares da Amazônia melhor do que o governo brasileiro, porque a Amazônia só está conectada pelo satélite da Starlink”, alertou.

<><> O bolsonarismo em crise de identidade

João Cezar sustenta que o bolsonarismo está enfraquecido ao trair sua suposta ideia-força: o patriotismo. “O bolsonarismo comprometeu seu principal capital político. Eles puseram boné, bateram continência pra bandeira dos Estados Unidos”, criticou.

Para ele, enquanto o lulismo tem uma ideia-força clara — inclusão social e soberania nacional —, o bolsonarismo se revela incapaz de sustentar um projeto de país. “Se amanhã o Lula dissesse que apoia a escala 6 por 1 ou é contra taxar os bilionários, o lulismo acabaria. Porque estaria contrariando sua ideia-força”, explicou.

<><> Defesa da soberania como eixo de resistência

Ao final da entrevista, João Cezar defendeu a necessidade de união nacional para proteger a soberania brasileira diante do ataque articulado da extrema direita transnacional. “Do que se trata agora é de unir forças para defender o governo, unir forças para defender a soberania nacional e não hesitar na denúncia do comportamento absolutamente asqueroso desses deputados”, concluiu.

•        Paulo Nogueira Batista: "Trump socorre Bolsonaro porque quer um Brasil vassalo"

"Trump socorre Bolsonaro porque quer um Brasil vassalo", afirmou o economista Paulo Nogueira Batista Jr., em entrevista ao programa Brasil Agora, transmitido pela TV 247 no YouTube. Segundo ele, o apoio do presidente norte-americano ao ex-mandatário brasileiro está diretamente relacionado ao papel geopolítico do Brasil dentro do grupo BRICS, e ao temor dos Estados Unidos de perder o domínio financeiro global.

Durante a entrevista, Paulo Nogueira analisou a recente intensificação do confronto entre os Estados Unidos e o grupo BRICS — formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul —, especialmente após a cúpula realizada no Rio de Janeiro, no segundo mandato do presidente Lula. Para ele, a reação de Donald Trump ao grupo está diretamente ligada à ameaça que representa ao papel do dólar como moeda hegemônica mundial.

“O Trump tem sido preciso ao se opor à criação de uma nova moeda que possa ameaçar o status do dólar como moeda de reserva”, declarou o economista. Ele também destacou que o próprio Lula, ao defender uma moeda alternativa para transações internacionais, “colocou bem o problema, fez isso publicamente”.

<><> Brasil sob pressão e o retorno de Bolsonaro

Ao comentar as sanções impostas por Trump a autoridades brasileiras e ameaças relacionadas à política externa do país, Nogueira foi categórico: “A melhor maneira de solapar a participação do Brasil nos BRICS é promover a volta de Jair Bolsonaro, porque Bolsonaro disse que, caso voltasse a ser presidente, ele sairia dos BRICS”.

Ele reforçou que os Estados Unidos enxergam no atual governo brasileiro um obstáculo à submissão geopolítica. “No Lula eles não encontram vassalo, encontram alguém que tem pretensões de independência”, afirmou. Por isso, na avaliação do economista, Trump tenta favorecer Bolsonaro com vistas a realinhar o Brasil aos interesses de Washington.

<><> Críticas à grande imprensa brasileira

Nogueira também criticou o editorial recente do Estado de S. Paulo, que sugeriu que o Brasil abandonasse os BRICS. “É uma peça de vassalagem, não tem dúvida. Repete o que Bolsonaro já havia dito antes, pedindo a saída do Brasil do grupo”, disse. Para ele, há um equívoco na percepção de que os BRICS seriam dominados pela China ou alinhados a Rússia: “Os BRICS não são e nunca foram uma aliança política, um bloco. É um mecanismo de cooperação, como o G7 ou o G20”.

Ele lembrou que, no Novo Banco de Desenvolvimento, sediado em Xangai, os países fundadores — incluindo o Brasil — têm igual poder de voto, com 20% cada. “Ali é paritário. A China tem influência, claro, mas não controla o banco nem a formação política dos BRICS”, explicou.

<><> Risco de ruptura e o futuro geopolítico

Sobre a possibilidade de o Brasil deixar os BRICS em caso de novo governo de extrema direita, Nogueira alertou: “Se for o Bolsonaro, um filho dele ou a Michelle, o risco seria muito alto”. Já sobre Tarcísio de Freitas, atual governador de São Paulo e possível presidenciável, o economista considerou que “parece um pouco menos irracional”, embora também represente um risco.

Para Nogueira, abandonar os BRICS seria uma atitude “irracional”, ainda mais em um cenário internacional marcado por maior confrontação entre Estados Unidos e os países do Sul Global.

<><> Diversificação das reservas e soberania monetária

O economista também chamou atenção para a concentração das reservas cambiais brasileiras em dólares e títulos do Tesouro dos EUA. “O Brasil está excessivamente concentrado em dólares. Deveria ter comprado ouro, outros metais preciosos, armazenados aqui”, defendeu. Ele citou o caso da Venezuela, que teve reservas em ouro confiscadas em Londres, como exemplo dos riscos de depender do sistema financeiro ocidental.

Segundo ele, diversificar as reservas é uma necessidade cada vez mais urgente diante das posturas de Trump. “Não estou dizendo que é provável que os Estados Unidos façam alguma violência com os ativos brasileiros. Mas é possível. E como a mudança da composição das reservas é um processo lento, já deveria ter começado.”

•        Medidas cautelares. Por Marcelo Aith

Em nova decisão proferida nesta quinta-feira (24), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), manteve as medidas cautelares impostas ao ex-presidente Jair Bolsonaro e rejeitou os embargos de declaração apresentados por sua defesa. Embora tenha negado o recurso, Alexandre de Moraes reforçou os limites da proibição de uso de redes sociais, esclarecendo que entrevistas e discursos públicos não podem ser usados como meio indireto de divulgação digital por terceiros.

A defesa do ex-presidente havia protocolado embargos em 22 de julho, pedindo que a decisão anterior, de 17 de julho, fosse esclarecida quanto à possibilidade de Jair Bolsonaro conceder entrevistas. Segundo os advogados, o ex-presidente se comprometeria a não se manifestar publicamente até a definição do alcance da proibição.

No entanto, o ministro já havia sinalizado, em 21 de julho, que a vedação à presença nas redes sociais incluía também “transmissões, retransmissões ou veiculação de áudios, vídeos ou transcrições de entrevistas em qualquer das plataformas digitais, inclusive de terceiros”. O objetivo seria impedir o uso indireto dessas mídias para burlar a ordem judicial, sob pena de revogação das medidas cautelares e eventual decretação de prisão preventiva.

Na decisão de ontem, Alexandre de Moraes destacou que, dias antes, foram publicadas postagens nas redes sociais com imagens do ex-presidente exibindo o equipamento de monitoramento eletrônico e realizando discurso direcionado ao público digital. Diante do possível descumprimento, a defesa foi intimada a prestar esclarecimentos em 24 horas.

A resposta dos advogados argumentou que Jair Bolsonaro não poderia ser responsabilizado por conteúdos republicados por terceiros, dada a lógica imprevisível da comunicação digital. Alexandre de Moraes, no entanto, rejeitou essa justificativa e afirmou que há elementos que demonstram coordenação prévia entre o ex-presidente e seus apoiadores para a publicação do material. Essa conduta, segundo ele, revela a intenção de “embaraçar a ação penal” e reproduz um modus operandi já identificado em investigações sobre as chamadas “milícias digitais”.

O ministro mencionou ainda que essas práticas buscariam instigar até mesmo chefes de Estado estrangeiros a interferir em investigações em curso no Brasil, o que poderia configurar atentado à soberania nacional. Entre os possíveis crimes associados, Alexandre de Moraes cita coação no curso do processo (art. 344 do Código Penal), obstrução de investigação de organização criminosa (Lei 12.850/13) e atentado à soberania (art. 359-I do Código Penal).

Um ponto central da decisão é a reafirmação de que Bolsonaro não está proibido de conceder entrevistas ou fazer discursos, desde que respeitados os horários e limites impostos pelas medidas restritivas. O problema, segundo Moraes, está na “instrumentalização” dessas falas para criar conteúdo voltado à circulação digital, com o claro propósito de burlar as restrições às redes sociais.

A Corte entende que a replicação sistemática de discursos por perfis coordenados – ainda que não controlados diretamente por Jair Bolsonaro – poderá levar à conversão das cautelares em prisão preventiva. “Não seria lógico e razoável permitir a utilização do mesmo modus operandi criminoso com diversas postagens nas redes sociais de terceiros”, escreveu Alexandre de Moraes, citando a atuação de “milícias digitais” já alvo de investigações.

Um episódio citado na decisão ocorreu na Câmara dos Deputados, quando Bolsonaro discursou e, logo depois, a íntegra da fala foi publicada nas redes do deputado Eduardo Bolsonaro, também investigado. O ministro considerou esse episódio uma irregularidade isolada e não decretou a prisão do ex-presidente, mas fez uma advertência clara: “se houver novo descumprimento, a conversão será imediata”.

A decisão mantém a linha dura adotada por Alexandre de Moraes nos inquéritos que envolvem o ex-presidente, mas levanta discussões sobre a viabilidade prática da medida. A ressalva feita pelo ministro – de que entrevistas são permitidas, desde que não resultem em conteúdos para redes sociais – parece, na prática, de difícil execução. Na era da comunicação instantânea, é improvável que qualquer manifestação pública não seja filmada, compartilhada e difundida por apoiadores.

Essa limitação, embora juridicamente válida, pode representar uma armadilha jurídica para o investigado. A cada fala pública, o risco de “descumprimento reflexo” da cautelar se renova, independentemente de sua intenção direta. E, embora Alexandre de Moraes ressalte que a Justiça “é cega mas não é tola”, há dúvidas sobre como distinguir ações deliberadas de burlas acidentais ou espontâneas, quando a viralização ocorre por iniciativa alheia.

O cerco jurídico se fecha, mas a complexidade operacional do caso acende alerta. Prender o ex-presidente por atos de terceiros, neste momento, geraria um tumulto político e jurídico de grande escala. Em vez disso, uma flexibilização prudente da cautelar – com ênfase no monitoramento do conteúdo e na prova da intenção dolosa – poderia preservar o equilíbrio entre o devido processo legal e a liberdade de expressão.

 

Fonte: Brasil 247/A Terra é Redonda

 

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