quinta-feira, 31 de julho de 2025

Maria Luiza Falcão: Trump recua. Chickens out. Mas o Brasil segue sob ataque

Donald Trump acaba de recuar. A tarifa de 50% sobre as exportações brasileiras, anunciada com estardalhaço no início de junho e prevista para entrar em vigor em 1º de agosto, foi suspensa. O motivo alegado? “Avaliação técnica em curso sobre impactos para o consumidor americano.” A verdade? Trump chickened out. Amarelou. Recuou sob pressão.

Desde o início, o tarifaço soava mais como chantagem política do que como uma medida econômica racional. Carnes, café, frutas tropicais, suco de laranja e até aeronaves brasileiras foram alvos não por ineficiência, mas por excelência. O pretexto era “defesa da indústria americana”, mas o real motivo era político: retaliação contra decisões soberanas do Brasil, incluindo a postura firme do Supremo Tribunal Federal e do governo Lula em defesa da democracia.

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A adesão da extrema direita brasileira a Trump, com Eduardo Bolsonaro e aliados buscando sanções para favorecer Jair Bolsonaro, só tornou tudo mais surreal. Era o Brasil sendo alvejado por sua própria extrema direita, agora com assento informal na Casa Branca.

<><> O recuo: pressão de dentro e de fora

A verdade é que o tarifaço encontrou forte resistência nos EUA. Empresários da Flórida e do Texas alertaram para o aumento de preços de alimentos. Restaurantes, cafeterias, supermercados e a poderosa indústria de fast food protestaram contra a medida. O café brasileiro, que chega fresco e barato, ameaçava virar artigo de luxo. A carne também sofreria encarecimento imediato para consumidores já afetados por inflação alimentar.

No plano internacional, a medida isolava ainda mais os EUA em relação ao BRICS+ e ao Sul Global. O Itamaraty, mesmo com discrição, costurava apoios nos bastidores. Até mesmo alguns aliados europeus de Trump consideraram a ação “exagerada”.

Trump tentou rugir, mas teve que miar. A imagem de homem forte da economia começa a desmoronar quando os próprios consumidores americanos reagem à alta de preços nos supermercados, e quando os lobbies comerciais batem à porta da Casa Branca.

<><> Vitória brasileira? Sim. Mas o ataque mudou de forma

O Brasil teve uma vitória parcial. Mostrou que tem aliados, que a chantagem tem limite e que a dignidade econômica e diplomática ainda resiste. Mas é cedo para baixar a guarda. O recuo pode ser momentâneo, um recálculo político. Soa como uma forma de desviar a atenção do desastre do tarifaço.

O ataque mudou de forma. Com o fracasso do tarifaço, Trump mirou diretamente o coração da democracia brasileira, a Suprema Corte. O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) que enfrentou os golpistas de 8 de janeiro e resistiu às pressões de setores autoritários ligados ao bolsonarismo foi o alvo.

A sanção imposta a Alexandre de Moraes foi feita com base na chamada Global Magnitsky Act, uma legislação dos Estados Unidos criada originalmente para punir indivíduos estrangeiros acusados de corrupção ou violações graves de direitos humanos. Inspirada no caso do advogado russo Sergei Magnitsky, morto sob custódia após denunciar corrupção estatal, a lei permite que o governo dos EUA congele ativos e negue vistos a pessoas que considerar envolvidas em abusos. O problema é que, no caso brasileiro, essa legislação foi usada de forma distorcida e politicamente motivada: não há crime, não há violação de direitos. O que há é um juiz constitucional defendendo a democracia contra ataques golpistas. Usar a Magnitsky Act contra Moraes é uma aberração jurídica e uma grave afronta à soberania do Brasil.

A ofensiva, disfarçada de ato administrativo, é, na prática, uma tentativa de intimidar as instituições brasileiras e favorecer seus aliados internos. É mais do que um ataque pessoal. É um ataque à soberania jurídica do Brasil.

<><> A soberania está em jogo

Trump chickened out, mas não desistiu. Se o ataque econômico falhou, agora a tática é institucional. Quando não se pode dobrar o país pela tarifa, tenta-se desmoralizar suas instituições, seus juízes, suas leis, sua democracia. O Brasil precisa entender a gravidade desse novo estágio.

O que está em jogo não é apenas o comércio de café ou carne bovina. É o respeito à soberania brasileira. É a capacidade de dizer não à chantagem, venha ela em forma de tarifa ou de sanção.

Trump mostrou que recua quando encontra resistência. Mas também mostrou que não tem limites quando sente espaço. O Brasil venceu uma batalha, mas a guerra pela autonomia e pelo respeito está longe de acabar.

¨      Trump abre quase 700 exceções

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou nesta quarta-feira (30/7) uma ordem executiva que oficializa a tarifa de 50% a produtos importados do Brasil. A decisão foi justificada como resposta a ações do governo brasileiro que, segundo a Casa Branca, representam uma ameaça “incomum e extraordinária” à segurança nacional, à política externa e à economia norte-americana.

O tarifaço estava marcado para começar na sexta-feira (1º/8). No entanto, a ordem executiva define para o dia 6 de agosto o início da vigência para mercadorias inseridas para consumo, ou retiradas do depósito para consumo.

Apesar da ordem executiva, Trump deixou quase 700 itens de fora do tarifaço, como produtos aeronáuticos civis (o que interessa à Embraer), suco e derivados de laranja (suco e polpa), minério de ferro, aço e combustíveis, por exemplo.

A medida se baseia na Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional (Ieepa, na sigla em inglês), de 1977, e declara a instauração de uma nova emergência nacional nos EUA em relação ao Brasil. O texto da ordem executiva acusa o governo brasileiro de perseguir, intimidar, censurar e processar politicamente o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus apoiadores, o que, na visão do governo Trump, configuraria violações graves dos direitos humanos e um enfraquecimento do Estado de Direito.

“O presidente Trump tem reafirmado consistentemente seu compromisso de defender a segurança nacional, a política externa e a economia dos Estados Unidos contra ameaças estrangeiras, inclusive salvaguardando a liberdade de expressão e responsabilizando violadores de direitos humanos por seu comportamento ilegal”, diz comunicado oficial.

<><> Agosto

  • Donald Trump reiterou, também nesta quarta (30/7), que o tarifaço comercial imposto pelo governo norte-americano a diversos países, entre os quais o Brasil, entrará mesmo em vigor na próxima sexta-feira (1º/8), sem possibilidade de prorrogação.
  • As declarações de Trump foram dadas em mensagens publicadas em sua própria rede social, a Truth Social, a apenas dois dias do fim do prazo estipulado pela Casa Branca para que os países atingidos pelas tarifas negociem eventual redução das taxas com os EUA.
  • “O prazo de 1º de agosto é o prazo de 1º de agosto. Ele continua firme e não será prorrogado. Um grande dia para a América!”, escreveu Trump.
  • No entanto, a ordem executiva assinada pelo próprio presidente define para o dia 6/8 o prazo para mercadorias inseridas para consumo, ou retiradas do depósito para consumo.

<><> Censura e coação contra empresas dos EUA

Segundo o documento, membros do governo brasileiro adotaram “medidas sem precedentes” para coagir empresas norte-americanas de tecnologia a censurar discursos políticos, remover usuários, entregar dados sensíveis ou mudar políticas de moderação sob ameaça de sanções severas, como multas extraordinárias, processos criminais, congelamento de ativos ou exclusão do mercado brasileiro.

“O presidente Trump está defendendo empresas americanas da extorsão, protegendo cidadãos americanos da perseguição política, salvaguardando a liberdade de expressão americana da censura e salvando a economia americana de ficar sujeita aos decretos arbitrários de um juiz estrangeiro tirânico”, afirma a Casa Branca.

A ordem executiva cita nominalmente o ministro Alexandre de Moraes, acusado de abusar de sua autoridade ao emitir centenas de ordens de censura contra críticos políticos. De acordo com o texto, quando empresas norte-americanas se recusaram a cumprir as determinações, Moraes teria imposto multas elevadas, ameaçado executivos com processos criminais, congelado ativos e até removido empresas do mercado digital brasileiro.

Além disso, a Casa Branca menciona o caso do jornalista e youtuber bolsonarista Paulo Figueiredo, residente nos EUA, que estaria sendo processado no Brasil por discursos realizados em solo americano, o que Washington avalia como violação direta à liberdade de expressão protegida pela Constituição dos Estados Unidos.

<><> Suspensão de vistos

A medida tarifária está inserida em uma estratégia mais ampla da política externa adotada por Trump, sob a diretriz “América em Primeiro Lugar”. No mesmo contexto, o presidente ordenou, no último dia 18 de julho, a revogação dos vistos de entrada nos EUA de Alexandre de Moraes, de seus aliados no STF e de seus familiares diretos. A medida foi implementada pelo secretário de Estado, Marco Rubio, como parte de uma política anunciada em maio para negar vistos a estrangeiros envolvidos em atos de censura contra cidadãos americanos.

A Casa Branca alega que a política externa dos EUA prioriza os interesses nacionais e protege seus valores fundamentais, como a liberdade de expressão e a defesa de eleições livres. Para o governo Trump, as ações do Judiciário e do Executivo brasileiro não apenas ferem esses princípios, como também configuram ameaças diretas à estabilidade de empresas americanas que operam no país.

“Preservar e proteger os direitos de liberdade de expressão de todos os americanos e defender as empresas americanas da censura forçada permanecerão na vanguarda da estratégia de política externa do presidente Trump”, diz a nota oficial.

¨      Oliveiros Marques: Tarifaço é luta ideológica

Com a assinatura da ordem executiva por Trump, o tarifaço imposto ao Brasil pelo governo norte-americano confirmou ser o que já parecia: a economia mundial sendo utilizada como arma em uma guerra ideológica. A extrema-direita busca se impor por meio de barreiras tarifárias, numa tentativa desesperada de conter países soberanos que buscam se fortalecer no cenário global e oferecer melhores condições de vida ao seu povo.

Confesso que errei feio. Trump é tão aloprado quanto os seus assessores e aqueles que os influenciam.

A família Bolsonaro, organização criminosa lesa-pátria, responsável pela facção brasileira na articulação dessas medidas, mostra mais uma vez sua disposição de sabotar o próprio país. Incapaz de impor sua vontade por tanques invadindo as instituições brasileiras, recorre agora aos aliados nos Estados Unidos para promover um verdadeiro ataque à soberania e à economia nacional - tudo em nome da defesa de seus próprios interesses. Ataques que colocam em risco setores econômicos inteiros e milhares de empregos.

Pode até soar irresponsável o que direi nas próximas linhas - e penso que seja mesmo -, mas não é possível enfrentar uma guerra ideológica dessa magnitude fora do campo político. Tratar esse tipo de agressão como se fosse apenas uma questão econômico-comercial pode se constituir em um grande erro. Não há espaço, neste estágio, para negociações produto por produto, setor por setor. Não haverá convescote por telefone, nem pedido de bênção no Salão Oval que resolva o problema criado pela família Bolsonaro.

Se o governo brasileiro não falar grosso agora, em 2026 Trump - com todo o seu aparato de inteligência e poder financeiro - tentará nomear o próximo presidente do Brasil. A ausência de justificativa econômica no texto da ordem executiva, assim como os recuos em produtos mais sensíveis à economia norte-americana, deixa evidente que estamos diante de um movimento político-ideológico orquestrado pela extrema-direita que se articula ao redor do globo. Nem é preciso mencionar a sanção ao ministro Alexandre de Moraes, imposta sob a chamada Lei Magnitsky.

Mas, em meio a essa desgraça, algo de positivo se revela: agora está muito claro para o país quem são os vendilhões do templo. Resta saber quem caminhará com eles - e quem ficará com o Brasil.

¨      Soberania e democracia são inseparáveis. Por Emir Sader

Em resposta ao ataque do governo norte-americano, Lula resgatou uma categoria que repousava no esquecimento ou mesmo no museu: a categoria de soberania.

Soberania remete ao discurso do nacionalismo, de defesa da nação diante dos interesses externos. Um país soberano é o que defende e preserva seus interesses nacionais diante dos ataques do imperialismo.

Um país soberano é o que preserva seus interesses próprios. No Brasil, o governo de João Goulart era um governo nacionalista, que colocava em prática o que se denominava de reformas de base. Reforma agrária, limitação da remessa de lucros das empresas estrangeiras, entre outras.

O golpe militar de 1964 liquidou, ao mesmo tempo, a democracia no Brasil e a política de soberania nacional. A ditadura militarizou o Estado brasileiro, terminando com a democracia, que havia sido conquistada duas décadas antes. E, simultaneamente, promoveu uma política de  subordinação aos interesses externos, a ponto que o primeiro ministro de Relações Exteriores da ditadura militar afirmou, nada mais, nada menos, que “O que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”.

Nada mais antagônico à soberania do que a política colocada em prática pelos governos da ditadura militar. O país foi caracterizado então como subimperialista, de tal forma ele representava na região os interesses dos Estados Unidos e reproduzia sua política a nível regional.

Desapareciam a democracia e a soberania. Quando foi restabelecida a democracia, mais de duas décadas depois, o país seguiu sendo o mais desigual do continente mais desigual do mundo.

Como se poderia caracterizar o governo como democrático, se tão desigual? Como poderiam conviver a igualdade diante da lei e a desigualdade profunda na realidade concreta? 

O país carrega essa contradição até hoje. A eleição, pela primeira vez, de um líder sindical, nordestino, de um partido de esquerda, à presidência da República, só aprofunda as contradições que caracterizam a história brasileira.

Quando Lula retoma a categoria de soberania, reafirma a decisão do seu governo de ter uma política externa independente, soberana. Porém, ao mesmo tempo, apesar das políticas antineoliberais dos governos do PT, o capital financeiro, de caráter especulativo, segue sendo hegemônico no plano econômico.

Para passar do antineoliberalismo ao pós-neoliberalismo, isto é, superando a etapa histórica atual, seria necessário consolidar a democracia política e estendê-la ao plano social. Seria indispensável, ao mesmo tempo, fazer da soberania a referência central da política externa, em relação aos interesses externos, e da política interna, promovendo os interesses da grande maioria da população como os determinantes de todas as políticas do governo.

Que o governo tenha não apenas a soberania, mas a democracia, sua irmã gêmea, como seus eixos fundamentais. Não apenas da democracia formal, mas da democracia real, aquela que faz com que todos sejamos iguais não somente perante a lei, mas na realidade concreta.

¨      Trump esgarça relações que Lula tenta tecer. Por Denise Assis

Como tenho dito desde o início da chantagem imposta ao Brasil, mais do que econômica, trata-se de uma questão política. Quando Donald Trump escreve em letras maiúsculas que a “caça às bruxas” contra Jair Bolsonaro deve cessar “IMEDIATAMENTE”, o que ele faz é lançar um ultimato. E isso não se faz a um país soberano, com poderes autônomos e leis próprias.

A decisão do governo dos Estados Unidos de aplicar a Lei Magnitsky, impondo sanções ao ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, representa um sinal muito forte de que, na sexta-feira (01/08), quando se encerra o prazo prometido por Trump para anunciar sanções contra o Brasil — incluindo uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros exportados para os EUA —, ele não recuará.

Desta vez, ele pretende enterrar o rótulo de “TACO” que o acompanha desde o início de seu governo, termo usado para apontar que, após cada ameaça ou medida mais dura contra um país, ele voltava atrás. Isso levou os norte-americanos a enxergarem em Trump um sinal claro de que costuma “amarelar”.

Ofendido e amuado como uma criança contrariada — traços que exibe frequentemente em sua personalidade —, Trump quer desfazer essa imagem às custas do Brasil. Ele ignora os 201 anos de relações bilaterais e o impacto que medidas desse tipo têm sobre produtos manufaturados brasileiros importados pelos Estados Unidos. Desde que saia bem na foto, não se importa com as consequências.

Além de ser uma enorme afronta ao país, o presidente norte-americano deixa evidente sua disposição de continuar impondo ao Brasil uma política de opressão. Justamente ele, que alega que nossa pátria é “uma ditadura”. Palavras ocas, repetidas a partir do discurso de um deputado fujão: Eduardo Bolsonaro. Preocupado apenas em salvar a pele do pai, sem chances de escapar de uma pesada condenação por cinco crimes — entre eles, tentativa de golpe de Estado —, o filho de Jair tem conseguido prejudicar uma nação inteira e, de quebra, o consumidor médio dos EUA, que passará a pagar muito mais caro pelo café da manhã ou terá de abrir mão do tradicional suco de laranja e do cafezinho. Eduardo não mediu consequências, pensando apenas em interesses próprios e familiares. Merece punição exemplar.

Trump viu na situação uma oportunidade para dinamitar o bloco dos BRICS, ferindo o Brasil por meio de sua economia. A medida tomada hoje mostra que ele leu cedo o New York Times. Melhor assim. Se leu, entendeu que Lula não vai ceder aos seus caprichos.

 

Fonte: Jornal GGN/Metrópoles/Brasil 247

 

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