Ex-mulher
de Rodrigo Constantino trava batalha judicial pelo direito de ver o filho
Carolina
Foglietti, ex-esposa do economista, jornalista e ideólogo de extrema direita
Rodrigo Constantino, vive há três anos um drama judicial: tenta voltar a
conviver com o filho mais novo, de sete anos, que vive sob a guarda do pai nos
Estados Unidos, mas é impedida pelo ex-marido, segundo decisão judicial emitida
por um tribunal da Flórida. Ela o acusa de violência psicológica, violência
vicária – quando um filho é usado como instrumento para ferir a mulher – e de
tentar interná-la compulsoriamente.
O casal
se divorciou em 2019. Na época, firmou um acordo de guarda e convivência nos
Estados Unidos, onde vivia, que depois foi homologado no Brasil. Entre outros
pontos, o acordo previa que Foglietti teria os mesmos direitos de guarda que o
ex-marido.
Pouco
depois do divórcio, o casal decidiu dar uma nova chance para a relação e voltou
a morar junto. Foglietti diz que foi um período turbulento, de muitas brigas,
em que ela “adoeceu emocionalmente” e começou a fazer tratamento para
transtorno de déficit de atenção (TDAH) e ansiedade.
Neste
período, Constantino teria exigido a inclusão de uma cláusula no acordo de
divórcio para permitir que, se Foglietti apresentasse problemas mentais, ele
teria o poder de tomar decisões sobre a sua saúde. Ela aceitou e a cláusula foi
incorporada.
Na
época, ela trabalhava como produtora do marido, marcando entrevistas e
organizando agenda, e em uma seguradora. A companhia a convidou para participar
de um congresso de seguros em São Paulo. Ela pediu permissão ao marido, que
comprou a passagem. Combinaram de, na volta, os dois entrarem em uma terapia de
casal.
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Por que isso importa?
• Ex-mulher do jornalista e ideólogo de
extrema direita, Rodrigo Constantino, o acusa de impedir que ela visite o filho
de sete anos, nos Estados Unidos;
• Decisão de um tribunal norte-americano
impede Foglietti de ver a criança; ela tenta reverter a situação na Justiça
brasileira.
Poucos
dias antes do embarque, porém, Foglietti diz que Constantino a convenceu a ir a
um hospital para ter uma segunda opinião sobre o seu tratamento. Quando chegou
lá, descobriu que havia um pedido para que ela fosse internada pela Baker Act,
uma lei estadual da Flórida que autoriza internação involuntária por problemas
de saúde mental a pessoas que ofereçam risco a si mesmo ou a outras pessoas.
A
internação involuntária é citada na decisão sobre o caso, que aconteceu em um
tribunal na Flórida. Foglietti diz que passou três horas numa ala psiquiátrica
do hospital. “Me colocaram em um quarto acolchoado, fiz exames de sangue e de
drogas. Psiquiatras vinham me perguntar se eu queria me matar ou matar alguém.
Eu dizia que não”, afirma. Ela relatou à reportagem que foi liberada depois dos
testes e foi informada de que o pedido de internação teria sido feito por
Constantino. Fragilizada, ela desmarcou a viagem.
“Comecei
a ficar com medo. Depois disso teve um outro episódio em que ele tentou me
levar à força, dizendo que ia me internar”, diz. “Passei por um esgotamento
nervoso. Estava péssima. Eu precisava sair de lá.”
Segundo
ela, a única maneira que teria de escapar da situação seria falar que iria para
o Brasil trabalhar e fazer o tratamento com um médico de confiança. “A condição
era de eu ir de avião junto com os pais dele e, no Rio de Janeiro, ficar
hospedada com os meus pais. Ficaria por três meses e depois voltaria”, diz.
Foglietti
afirma que foi ao psiquiatra assim que chegou no Brasil e o profissional disse
que ela estava em boas condições de saúde, e não via motivo para que ela fosse
internada. De acordo com ela, Constantino ficou contrariado com a recusa do
médico brasileiro e, como vingança, começou a restringir os contatos da mulher
com o filho, que na época tinha quatro anos.
Perto
do fim da viagem, Foglietti contou ter recebido a notícia de que o ex-marido
havia obtido uma decisão na Justiça norte-americana que impedia totalmente o
contato dela com o filho. Para retomar a convivência, ela teria que se submeter
a um tratamento psicológico – obrigatoriamente com um profissional escolhido
pelo ex-marido – e passar por uma terapia de reconexão com a criança, chamada
de “reunificação familiar”.
Uma
audiência do caso ocorreu em 6 de junho de 2022, no Tribunal da 17ª Vara da
Flórida, sem a presença de Foglietti. Ela foi notificada em um e-mail que não
costumava acessar, e só viu depois de passada a audiência. Portanto, sequer foi
ouvida. Ele alegou no processo que a ex-mulher seria emocionalmente instável,
teria “abandonado” o filho ao sair de casa e ameaçado de levar o filho dos
Estados Unidos. A decisão, que modifica o acordo de divórcio, não foi
homologada no Brasil.
Para
Foglietti, ele usou a cláusula que lhe dá poder sobre a sua saúde para
colocá-la com a imagem de que seria uma má influência ao menino. “Nunca fiz mal
para os meus filhos, pelo contrário. E agora estou vivendo esse pesadelo”, diz.
Para
ela, as ações do ex-marido são uma punição por ela não ter aceitado mais viver
sob as regras dele. “Tenho certeza que, se eu não tivesse saído de casa, a
minha sanidade mental não teria sido questionada.”
Ainda
segundo ela, o pedido teria sido feito para inviabilizar na prática o seu
direito como mãe, porque ordena que ela pague pela terapia de reunificação, que
deve ser feita nos Estados Unidos e tem um alto custo. “Ele sabe que eu não
tenho condições financeiras. No casamento, ele controlava o dinheiro da casa”,
diz.
Segundo
Foglietti, em conversas, Constantino disse que ela iria gastar dinheiro à toa,
caso tentasse ir aos EUA. Ela teria dito a ele que iria a Miami em agosto de
2022, para ver o filho, mas ele teria respondido que falaria apenas com os
advogados da ex-mulher e que se ela embarcasse quebraria a cara.
Foglietti
entrou na Justiça brasileira para restabelecer o contato mínimo com o filho
ainda em 2022. Ela diz que não pede pela guarda total ou pensão, nem quer
afastar o filho do convívio com o pai. Ainda não houve decisão no processo, que
corre em segredo na Justiça do Rio de Janeiro.
A
advogada de Foglietti, Tamy Zuzarte, diz que o Brasil tem jurisdição para
analisar os pedidos porque a criança tem dupla cidadania e o acordo original
foi homologado pelo Superior Tribunal de Justiça, portanto tem validade aqui.
Segundo ela, a lei brasileira se aplica porque a decisão que cortou a
convivência, por sua vez, não foi homologada no país e tratados internacionais
ratificados pelos dois países garantem o direito da criança à convivência com
ambos os genitores, salvo risco concreto.
“Trata-se
de tema de relevância social, especialmente para mães brasileiras em contextos
internacionais, sobre o direito de convivência entre mãe e filhos, quando estes
residirem fora do país”, afirma a advogada. “Também mostra como a desigualdade
entre as partes, o uso desproporcional de recursos e a morosidade do Judiciário
podem ser usados contra um vínculo materno fundamental.”
“Eu não
estou pedindo a guarda, não estou pedindo nada demais. Não quero tirar ele de
lá. Sei que ele está indo bem na escola e tem melhores condições de vida do que
teria comigo. Mas eu não quero esperar que ele fique maior de idade para poder
tratá-lo como filho”, diz Foglietti.
“Vivo
uma dor que enlouquece e arranca a vontade de viver. Sobrevivo a cada dia
rezando para a noite chegar logo, para ter um alívio de algumas horas ao menos,
mas aí o dia seguinte chega e não estou com meu filho. Não posso abraçar,
sentir seu cheiro, ouvir a risada, dar carinho. Ser mãe”, diz. “É uma dor que
não desejo ao meu pior inimigo. Nada do que aconteceu justifica o que me foi
imposto.”
A
mulher afirma que tentou solucionar o caso por outras vias que não a judicial,
mas não teve sucesso por resistência do ex-marido.
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Divergências com Constantino interferiram no relacionamento, diz Foglietti
Constantino
e Foglietti ficaram juntos por mais de 20 anos e tiveram dois filhos, que hoje
têm sete e 23 anos. O namoro começou no fim da adolescência – bem antes dele se
tornar um dos principais porta-vozes da direita brasileira, e um dos alvos do
ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes no inquérito das fake
news.
Conservador,
Constantino costuma defender a tradição do matrimônio e, antes da separação,
não poupava elogios à esposa. Em uma coluna sobre o aniversário de 15 anos de
casamento, a chamou de “companheira de lutas, parceira de sonhos, porto-seguro
nos momentos difíceis”.
Mas, de
acordo com Foglietti, as coisas mudaram quando ela começou a expressar
divergências. “Não vou entrar no mérito do que é certo ou errado e nem quero
descredibilizar ele. A gente vive em uma democracia, graças a Deus. Mas quando
você não tem espaço, liberdade de expressão dentro da sua casa, ao longo de
anos, vivendo em outro país, sem família, sem amigos, você acaba vivendo em uma
prisão intelectual”, ela diz.
“Ele
tem uma visão geralmente machista. Não admite que uma mulher queira trabalhar
fora de casa, por exemplo. Então, quando eu comecei a querer sair daquele
espaço e ter o meu próprio trabalho, minha própria fonte de renda, as coisas
começaram a ficar ruins”, afirma.
“Os
últimos 10 anos de casamento aniquilaram qualquer possibilidade de eu ser uma
mulher que pensasse por conta própria, que tivesse interesses particulares. Eu
fiquei mal, mas não sou louca. Não tenho medo de dizer, passo por qualquer
avaliação psiquiátrica. Vivi uma violência psicológica grande, porque ele tem
um pensamento muito binário.”
“Quando
eu fazia alguma coisa que ele não gostava, por exemplo, ele não me dava
dinheiro no mês. Eu fiquei muito tempo calada, porém chegou uma hora que
comecei a discordar de certas coisas. E eu queria debater, eu trabalhava com
ele”, continua.
Em uma
coluna de 2017, Constantino escreveu sobre a importância de ouvir relatos de
ex-mulheres. “Eu prefiro observar o que as ex-mulheres têm a dizer sobre
políticos, pois elas conheceram seus maridos sem as máscaras criadas pelos
marqueteiros ou jornalistas.”
Em
2020, Constantino foi demitido dos veículos que trabalhava após fazer um
comentário em que culpou uma vítima pelo estupro que sofreu. Ele foi
recontratado pela Jovem Pan dois meses depois. Foi desligado de novo em 2023,
quando a emissora começou a ser investigada por veicular conteúdo golpista.
Atualmente,
Constantino escreve e faz vídeos com comentários políticos para canais de
extrema direita, mas enfrenta limitações no uso de redes sociais no país, que
foram bloqueadas por ordem de Alexandre de Moraes. Recentemente, o ministro
também mandou bloquear seu perfil no Rumble, do presidente norte-americano
Donald Trump, que recorreu da decisão, acentuando a crise entre os países.
Constantino
também chegou a ter as contas bancárias bloqueadas e o passaporte cancelado.
Ele faz tratamento para um câncer em Miami, onde está internado.
Depois
que a Pública procurou Constantino para ouvir a sua versão, ele não respondeu
diretamente a reportagem, mas fez uma postagem no X. “Fui procurado hoje pela
jornalista esquerdista Amanda Audi alegando que está trabalhando numa ‘matéria’
sobre um processo judicial da minha ex-mulher para ‘voltar a ter contato com o
filho’”, diz um trecho. Na postagem, ele confirma que a ex-mulher não vê a
criança desde 2022 e que “há uma decisão judicial americana de que ela [a
ex-mulher] precisa passar por um processo de reunificação com um psiquiatra
para poder vê-lo, o que é do melhor interesse dele.” Ele ainda afirma que pode
“apenas lamentar que a mãe resolveu fazer um circo da situação,” e que “o que
vier do Brasil será apenas ignorado”.
Fonte:
Por Amanda Audi, da Agencia Pública

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