segunda-feira, 14 de julho de 2025

João Filho: Tarifaço de Trump é estratégia mafiosa e golpista

O novo tarifaço que Trump impôs ao Brasil é essencialmente golpista. Não está sustentado por qualquer motivo econômico ou político legítimo. É só mais uma arruaça golpista de uma extrema direita internacional articulada. O país mais rico do mundo hoje é governado por um delinquente golpista que atua no cenário geopolítico como um chimpanzé bêbado portando uma metralhadora. 

A carta pública do presidente dos EUA para Lula é um ataque inédito à soberania brasileira. Todos os motivos que foram elencados para justificar a taxação em 50% dos produtos brasileiros estão baseados em mentiras grosseiras. Trump simplesmente inventou que os EUA têm um déficit comercial com o Brasil, sendo que é justamente o inverso o que ocorre há pelo menos 15 anos. 

Ele falseou um dado que é amplamente conhecido, registrado inclusive pelo governo americano, colocou numa carta pública endereçada a um país que é um aliado histórico e que se dane. A verdade não importa. A mentira é a plataforma de comunicação da nova extrema direita internacional. 

A carta de Trump segue mentindo quando reforça a ladainha bolsonarista de que as eleições livres estão sendo atacadas e que Jair Bolsonaro está sendo perseguido pela justiça no Brasil. Em tom de exigência, ele ainda pede para que o seu julgamento seja interrompido “imediatamente”. Trata-se de uma violação de princípios básicos do direito internacional e um ataque direto e violento contra a Constituição brasileira e os poderes judiciário e executivo. 

Diferente do que aconteceu no debate sobre aumento do IOF, a burguesia nacional não se alinhou ao bolsonarismo. Claro, os EUA são o nosso segundo maior parceiro comercial, e muitos setores produtivos serão profundamente abalados com o tarifaço. Essa é uma pauta exclusiva da família Bolsonaro e do núcleo golpista que a cerca.

Amedrontada com a possibilidade iminente de ir para a cadeia, o bolsonarismo decidiu usar parte da elite nacional como uma espécie de escudo humano. Nossos patriotas não pensaram duas vezes antes de colocar o rabo do setor agropecuário — o mais prejudicado com o tarifaço — na reta. O agro foi um dos principais financiadores da trama golpista, mas acabou se tornando mais um dos companheiros golpistas que foram largados feridos na estrada. 

taxação dos mais ricos no Brasil e criticando tarifaço dos EUA (Foto: Allison Sales/Folhapress)

Já a grande imprensa decidiu se alinhar em defesa da soberania nacional. Claro, os barões da imprensa sempre representarão os interesses das elites nacionais que, neste caso, convergem com os interesses do país e do povo brasileiro. 

Em editorial, o Estadão chamou a ofensiva de Trump de “coisa de mafiosos”. Mais que isso: convocou os “verdadeiramente brasileiros” a não serem “sabujos de um presidente americano que envergonha a democracia”. A aventura bolsonarista é antidemocrática até para os padrões historicamente frouxos do jornal da família Mesquita. Nessa briga, a família Bolsonaro ficará sozinha, contando no máximo com a meia dúzia de vira-latas golpistas que integram o seu núcleo duro.  

A definição escolhida pelo Estadão  — “coisa de mafiosos”— é precisa. É exatamente do que se trata. A extrema direita internacional se articula como uma máfia: agredindo as instituições de poder, chantageando governos e atuando à margem da democracia. Tudo neste episódio cheira à máfia.

Vejamos: o deputado federal licenciado e fujão Eduardo Bolsonaro e seu assecla Paulo Figueiredo — o neto de ditador que já foi preso em Miami por participar de esquema de propina —  fizeram questão de se apresentar como os coautores dessa intimidação à soberania e à democracia brasileira. E, de fato, o são. 

Financiado pelo papai e por dinheiro público, Eduardo passou os últimos meses ao lado de Figueiredo nos EUA fazendo um intenso lobby na Casa Branca em favor do golpismo no Brasil. Após o anúncio do tarifaço, ambos escreveram uma nota que soa como um grupo de terroristas fazendo exigências para soltar reféns. 

“Uma hora a conta chega”, começa o texto, que segue amontoando uma série de mentiras. Ao fim, a dupla golpista detalha quais são as exigências para evitar um mal maior para o Brasil: “Apelamos para que as autoridades brasileiras evitem escalar o conflito e adotem uma saída institucional que restaure as liberdades. Cabe ao Congresso liderar esse processo, começando com uma anistia ampla, geral e irrestrita, seguida de uma nova legislação que garanta a liberdade de expressão — especialmente online — e a responsabilização dos agentes públicos que abusaram do poder. Sem essas medidas urgentes, a situação tende a se agravar — especialmente para certos indivíduos e seus sustentadores. Restam três semanas para evitar um desastre.” 

Ou seja, um deputado e um militante bolsonarista denunciado por participar de trama golpista no Brasil estão atuando como coautores e porta-vozes de um governo estrangeiro que nos ameaça e chantageia. Haja patriotismo para os nossos patriotas.

Steve Bannon, outro integrante da máfia e que já foi preso por participar de um esquema de fraude em favor de Trump, foi ainda mais direto que Bolsonaro. Em entrevista ao UOL, o criminoso foi claro na chantagem: “Derrubem o processo contra Bolsonaro, que nós derrubamos as tarifas”. 

Bannon nem cargo tem no governo Trump, mas se sente à vontade para fazer esse tipo de ameaça a uma nação amiga dos EUA. O chefe da máfia autoriza que o criminoso atue como porta-voz informal do seu governo. Uma máfia não segue regras e formalidades. 

Mas a coisa ficou mais mafiosa ainda quando o senador Flávio Bolsonaro entrou em cena. Em uma entrevista para a CNN, ele avisou que chegou a hora de dar uma segurada nessa história de patriotismo. Segundo ele, o Japão quis bancar o patriota na Segunda Guerra Mundial e acabou levando duas bombas atômicas.

“Como é que sai dessa enrascada agora? A gente vai continuar com o nosso orgulho, né? ‘Somos brasileiros’? Todos nós temos orgulho de ser brasileiros, mas como é que resolve essa situação? Se você olhar para a Segunda Guerra Mundial, o que os Estados Unidos fez [sic] com o Japão? Lançou uma bomba atômica em Hiroshima para demonstrar força. Qual foi a reação do Japão naquela época? Falou: ‘Olha, nós aqui somos patriotas; isso é uma interferência dos Estados Unidos aqui no nosso país; nós aqui vamos resistir; fora ianques’. Qual foi a consequência três dias depois? Uma segunda bomba atômica em Nagasaki”. 

Trocando em miúdos: o Brasil capitula ou será atropelado pelos EUA. Como nos filmes de máfia, Flávio coloca a imagem da bomba atômica sobre a mesa para tornar tudo ainda mais ameaçador. Ele continua: “Não estamos em condições normais de exigir nada. Ele vai fazer o que ele quiser, independente da nossa vontade. Cabe a nós termos a responsabilidade de evitar que caiam duas bombas atômicas no Brasil, para depois anunciar que vamos fazer anistia”.

Ou seja, temos um senador brasileiro nos fazendo uma proposta irrecusável: obedecemos os EUA ou sofreremos consequências terríveis, inclusive bélicas. Isso é coisa de máfia ou não é? 

Com a ajuda da máfia trumpista, a máfia bolsonarista sequestrou parte da economia brasileira para chantagear os poderes constituídos, tentar derrubar o presidente eleito e livrar Bolsonaro da cadeia para colocá-lo nas urnas na próxima eleição. É o golpismo em estado bruto. 

Por outro lado, Lula agora tem a oportunidade de surfar uma onda nacionalista e chegar forte em 2026. Não há dúvidas de que o tarifaço prejudicará a economia, mas não chega a ser um bicho-papão. Segundo a avaliação de economistas da XP, as tarifas devem reduzir o PIB em 0,3 ponto em 2025. É uma briga que dá para comprar, e Lula já sinalizou que responderá com reciprocidade. 

Em todos os países em que Trump meteu o bedelho, o candidato alinhado a ele perdeu a eleição. Foi assim no Canadá e na Austrália. Enquanto Tarcísio de Freitas veste o boné do MAGA e continua caninamente alinhado ao bolsonarismo, Lula poderá encarnar a defesa dos interesses brasileiros. 

Depois do IOF, o petista ganhou mais um mote eleitoral. Já o bolsonarismo terá de lidar com a pecha de entreguista, que sacrificou empregos brasileiros para tentar livrar Bolsonaro da prisão.

¨      Além de absurda, trama de Eduardo Bolsonaro pode configurar crimes de coação e traição à pátria

O programa TVGGN 20H da última sexta-feira (12) contou com a participação do desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo Marcelo Semer, para comentar os efeitos jurídicos da tentativa de intervenção do Judiciário brasileiro do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e também da possível responsabilização do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL) pela trama.

O desembargador iniciou a entrevista afirmando que esta tentativa de intervenção foi absurda e imperialista, que apesar de outras formas explicitas de dominar países (na cultura, comércio, guerra ou no digital), agora chegou ao Judiciário.

“Não imaginávamos que podia ter uma questão tão explícita como essa de dizer não sei se estão fazendo errado, soltam o Bolsonaro e deixam ele livre e coisa e tal. É muito difícil você ,mensurar isso porque apesar de ser o Trump, a gente não esperava que chegasse nesse ponto de uma coisa tão grotesca, tão explícita”, pontua Semer.

O desembargador pontuou ainda que, obviamente, a compra da briga do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), investigado pela tentativa de golpe de Estado e outros crimes, tem interesses geopolíticos e que prefere que o Trump ameace o país a iniciar um novo conflito armado.

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“Mas o que é mais inimaginável é que ele tem uma sorte de apoiadores aqui no Brasil que batiam palma, que pediam isso e que batem palma depois mesmo sabendo que a gente pode perder, sei lá, 100 mil empregos, pouco importa. Pouco importa, as pessoas não estão se importando com o país, mas estão se importando com o Bolsonaro, com a liberdade do Bolsonaro, enfim. Com a sobrevivência do projeto político da extrema direita, eu até acho isso muito grave”, continua o convidado.

De acordo com um ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos, o que a família Bolsonaro fez ao enviar Eduardo aos Estados Unidos para intermediar sanções ao país devido às investigações contra o pai, Jair, pode ser qualificado como traição à pátria.

Consequentemente, o desembargador não tem sugestões de como o governo deveria reagir, tendo em vista que o fim das investigações e, consequentemente, a responsabilização de Jair Bolsonaro pela tentativa de golpe não está em discussão. Nem mesmo o governo federal teria poder para interferir na decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

“Mas veja, nós temos hoje o governador do Estado de São Paulo sugerindo aos ministros do Supremo, não sei como, se por telefone, por conversa, não deu para saber porque essa foi uma informação que veio assim de bastidor, sugerindo que liberasse o Bolsonaro para a ilha dos Estados Unidos”, revelou Semer. “Eu confesso que ainda não caiu a ficha para mim porque o que o Trump fez, ele praticamente ofereceu um asilo ao Bolsonaro. Agora vem outro e fala assim: ‘Vamos levar o Bolsonaro lá ver o que acontece?'”, emendou.

O anúncio do aumento das tarifas sobre produtos brasileiros importados aos Estados Unidos em até 50% evidenciou que o clã Bolsonaro só está preocupado com a salvação do patriarca.

“O que me deixou muito atônito é que o Eduardo Bolsonaro, que é o filho e deputado federal, abriu mão praticamente do seu cargo, foi lá aos Estados Unidos e fala, há meses que ele fala que está plantando exatamente isso. Eu não sei se ele é muito bom articulador ou o Trump quis aproveitar essa oportunidade, pouco importa. Ele está lá financiado pelo pai, pai já falou que mandou R$ 2 milhões para que ele pudesse se manter, etc. E basicamente o que eles estão fazendo tentar boicotar o processo por fora. A gente chama de coação no curso do processo”, explica Semer.

Para o desembargador, Eduardo pode ter cometido os crimes de coação, crime contra a democracia e contra a pátria, além de obstrução de Justiça.

¨      Uma nova espécie de patriota. Por Urariano Mota

Há que ser procurada uma nova definição para a palavra traidor. No Dicionário Aulete, encontramos:

1. Aquele que comete traição [+ a, de traidor à /da pátria.]

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2. Que comete traição [Nas acp. 1 e 2, sin.: desleal, infiel, pérfido; ant.: fiel, leal.]

3. Que é perigoso mas não o aparenta; ENGANADOR” No Dicionário Houaiss, temos: “1 que compromete; comprometedor ‘apesar do disfarce, foi denunciado pela voz t’

2 perigoso sem o parecer

3 que ou aquele que atraiçoa; traiçoeiro”

O terrível é que essas definições não encontram abrigo no Brasil de hoje, depois da adesão da direita à insultuosa carta de Trump para o nosso presidente Lula. Em lugar da palavra cuja personificação era o Cabo Anselmo, aquele que entregou Soledad Barrett, companheira grávida para a morte, tal infâmia recebeu novo significado político.

Se não, olhem os fatos, ou vísceras de animal expostas nesta semana:

Em documento, as centrais sindicais denunciaram que, além de lembrar a atuação americana na ditadura militar no Brasil, a medida trumpista seria uma “reação hostil” às decisões dos ministros do STF:

“Trata-se, ainda, de um conluio com o bolsonarismo, que insiste em alimentar polarizações e estimular grupos de extrema-direita a traírem os interesses nacionais”.

Mais, dos fatos: nas primeiras reações do governador de São Paulo Tarcísio de Freitas, quando Trump publicou um texto em defesa de Bolsonaro, Tarcísio rapidamente reverberou a mensagem, tratando a iniciativa como uma vitória do bolsonarismo e atacando a legitimidade do STF para julgar o processo criminal contra o inelegível. Em vídeo postado em seu próprio perfil, Tarcísio aparece colocando um boné vermelho com o slogan trumpista “Make America Great Again” (faça a América grande novamente) e diz, sorrindo, “grande dia”.

O deputado Lindbergh Farias denunciou que a medida arbitrária de Trump é consequência direta da atuação do deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e das forças de extrema-direita brasileiras, que agem nos EUA de forma antinacional para tentar pressionar o Supremo Tribunal Federal a livrar a pele do ex-presidente Jair Bolsonaro, em julgamento por articular um golpe de Estado entre 2022 e 8 de janeiro de 2023.  

Em resumo. O novo significado para a palavra traidor é ser bolsonarista, ou de modo mais preciso, ser um patriota entre aspas: “patriota”. Sua mais recente definição é, por acréscimo: aquele que defende a terra dos outros em prejuízo da própria, nativa e desprezada pátria.

Para o caso dessa nova espécie, transformo em paródia um lindo poema de Frei Caneca. Que o histórico e verdadeiro patriota, herói do Brasil, me perdoe esta adulteração:

“Entre Senhor Trump e a pátria
Coloquei meu coração:
O Trump roubou-me todo;
A Pátria que chore em vão”.

 

Fonte: The Intercept/Jornal GGN

 

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