Bullying
e dificuldade de fazer amigos afetam saúde mental de adolescentes
Um
estudo internacional publicado no Journal of Child Psychology and Psychiatry
investigou o impacto de fatores de conexão social na saúde mental de
adolescentes no Brasil e no Reino Unido e constatou que viver em um arranjo
familiar “não convencional” ("non-intact family structures") –
convivência com meios-irmãos ou pais separados –, mudar de endereço, ter
dificuldades para fazer amigos ou ser vítima de (ou praticar) bullying estão
consistentemente associados a problemas de saúde mental em ambos os países.
Bullying
é o termo em inglês que se popularizou para indicar intimidação sistemática,
com violência física ou psicológica, envolvendo atos de humilhação ou
discriminação por meio de insultos, ameaças ou comentários/apelidos
pejorativos.
Acompanhados
por três anos, 11.756 jovens foram avaliados (2.010 do Brasil e 9.746 do Reino
Unido) para verificar associações entre potenciais fatores geradores e sintomas
internalizantes (emocionais) e externalizantes (comportamentais) de adoecimento
mental. Os internalizantes são reações que se expressam em relação ao próprio
indivíduo, como ansiedade e depressão. Os externalizantes manifestam-se em
direção a outras pessoas, como agredir, mentir ou roubar.
“Foram
feitas reuniões com jovens para examinar quais fatores sociais eles acreditavam
ser importantes e que poderiam impactar na sua saúde mental. Em seguida, os
pesquisadores identificaram variáveis semelhantes entre os dois grupos [de
adolescentes do Brasil e do Reino Unido]. Após essa harmonização de dados,
foram utilizadas técnicas para garantir que eram comparáveis e a partir daí
foram feitas as análises”, explica Maurício Scopel Hoffmann, chefe do
Departamento de Neuropsiquiatria da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM),
um dos autores da pesquisa e integrante do Centro Nacional de Ciência e
Inovação em Saúde Mental (CISM), que é apoiado pela Fapesp.
Ao
longo da investigação, foram observadas algumas diferenças entre os grupos de
adolescentes estudados nos dois países. Enquanto os jovens do Reino Unido
apresentaram maiores impactos na saúde mental associados ao bullying, no Brasil
o tamanho da família pareceu ser um fator de risco para problemas
internalizantes.
Os
fatores analisados foram:
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Conexão social estrutural
• Tamanho da família/domicílio;
• Número de irmãos ou meios-irmãos no
domicílio;
• Estado civil da mãe: casada ou vivendo
com o pai biológico; separada vivendo com outra pessoa; separada; mãe solteira;
viúva e outros;
• Autorrelato de “ter um bom amigo”
(sim/não);
• Morte de pai / mãe ou cuidador
(não/sim);
• Mudança de endereço desde a última
entrevista (não/sim);
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Conexão social funcional
• Bullying sofrido relatado pelo próprio
(nunca/alguma vez);
• Bullying praticado relatado pelo próprio
(nunca/alguma vez);
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Conexão social de qualidade
• Relatado pelos pais que “se dá bem com
os amigos” (sem dificuldades/com dificuldades);
• Relacionamento cuidador principal-criança
(próximo/não próximo);
“Os
resultados indicam que existem fatores sociais gerais e específicos que
impactam a saúde mental de jovens de diferentes países”, diz Hoffmann. “E
também reforçam a importância de se levar em consideração esses fatores para o
desenho de políticas públicas que promovam ambientes sociais saudáveis para os
jovens, adaptadas às necessidades de diferentes populações.”
Entre
os autores do paper estão outros membros do CISM: Eurípedes Constantino Miguel,
chefe do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade
de São Paulo (FM-USP) e coordenador-geral do centro, Luis Augusto Rohde,
vice-coordenador, e Giovanni Abrahão Salum, pesquisador.
• Como disputa por guarda de uma criança
afeta a saúde mental? Entenda
De
acordo com a psicóloga clínica Tatiane Paula, a disputa pela guarda de uma
criança ultrapassa a questão jurídica e toca em pontos importantes e sensíveis
do emocional do adulto, principalmente dentro do papel parental.
"Quando
os responsáveis entram em conflito sobre quem vai ficar com uma criança, o que
está em jogo, muitas vezes, não é apenas a questão da guarda física, mas também
sentimentos profundos de pertencimento, sensação de culpa, medo do afastamento
e, até mesmo, a sensação de perda de identidade como pai e mãe", afirma
Tatiane à CNN.
A
psicóloga explica, ainda, que a perda da guarda -- em casos de disputa por
guarda unilateral -- pode acarretar um sentimento de luto. "É um tipo de
luto invisível, mas bastante real, já que a pessoa perde a relação com o filho
no cotidiano e a rotina afetiva", analisa.
Além
disso, segundo a especialista, a disputa pela guarda pode gerar distorções
cognitivas de pensamento. "A pessoa pode pensar: 'Se eu não tiver a
guarda, eu sou um fracasso. Meu filho pode me esquecer'. Esse é um exemplo de
distorção cognitiva que intensifica esse sofrimento emocional, podendo evoluir
para quadros de ansiedade, depressão, exaustão emocional e até prejuízo no
desempenho profissional", afirma.
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Impactos também são sentidos pelas crianças
Os
impactos na saúde mental gerados pela disputa judicial pela guarda de uma
criança não afetam apenas os responsáveis envolvidos, mas também os filhos,
podendo levar ao desencadeamento de quadros como o Transtorno de Estresse
Pós-Traumático, de acordo com a psicóloga Sirlene Ferreira.
"Todo
estresse afeta a criança e o ambiente ao redor dela. Mesmo que os adultos
tentem poupá-la dos detalhes, a criança percebe que algo está errado. Ela sente
que os adultos estão chateados e, pior, entende que o motivo do conflito está
relacionado a ela", explica à CNN.
Os
prejuízos à saúde mental da criança podem ser observados, principalmente, em
casos de guarda compartilhada quando uma das partes não cumpre com as suas
responsabilidades, sejam elas afetivas, emocionais ou práticas.
"A
guarda compartilhada exige comprometimento de ambos os responsáveis. Quando há
ausência de afeto, desorganização ou falta de presença real, a criança sente e
pode ser prejudicada", afirma Sirlene.
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Como reduzir os impactos?
A
comunicação e o diálogo aberto são fundamentais para reduzir os impactos
emocionais durante uma disputa pela guarda de um filho. Quando necessário, é
válido contar com a ajuda de um profissional capacitado para fazer a mediação
familiar.
"A
terapia cognitivo-comportamental ajuda o adulto envolvido nesse processo não só
a reconhecer a situação problemática, mas a reestruturar pensamentos
disfuncionais, ressignificando esse papel parental", sugere Tatiane.
"Outro ponto essencial é garantir que o vínculo com a criança continue
sendo nutrido mesmo à distância", completa.
Já para
as crianças, é importante buscar estratégias para realizar a transição da
guarda, se ocorrer, utilizando linguagem acessível para ela e contando, sempre
que possível, com o apoio de uma psicóloga para acompanhar o processo.
"Se
houver planejamento e acolhimento adequados, não necessariamente haverá
sequelas. Mas, quando a transição ocorre sem preparo, as chances de a criança
desenvolver transtornos psicológicos aumentam — como ansiedade, baixa
autoestima e até mesmo o Transtorno de Estresse Pós-Traumático. Nesses casos, a
ajuda profissional é fundamental", afirma Sirlene.
• Ansiedade e infecções: como mudanças
climáticas afetam as crianças?
Eventos
climáticos extremos, como secas, enchentes, queimadas e ondas de calor, têm
sido cada vez mais frequentes no Brasil e no mundo. Entre as populações em
maior risco de ter problemas de saúde relacionados às mudanças climáticas estão
as crianças. Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), cerca
de 40 milhões de crianças e adolescentes brasileiros estão expostos a um ou
mais riscos climáticos.
Para
alertar sobre o assunto, a organização Médicos pelo Clima lançou uma cartilha
voltada para pais e cuidadores, abordando os impactos físicos e mentais na
infância de eventos extremos relacionados às mudanças climáticas. O documento
foi desenvolvido com revisão técnica da Sociedade Brasileira de Pediatria
(SBP).
"As
mudanças climáticas afetam diretamente a saúde das crianças: comprometem a
saúde respiratória, influenciam a nutrição pela privação de alimentos e
impactam a segurança alimentar. Também favorecem a proliferação de mosquitos
transmissores de doenças como febre amarela, dengue, chikungunya e outras
arboviroses", afirma Renato Kfouri, infectologista pediatra e um dos
colaboradores da cartilha.
"Informar
a população sobre formas de cuidado e prevenção é fundamental. A comunidade
médica tem um papel central nesse processo — o médico ainda é a principal fonte
de informação confiável e de qualidade para as famílias no que diz respeito à
prevenção e ao controle de doenças", completa.
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Principais riscos à saúde mental e física das crianças
Para o
desenvolvimento da cartilha, os especialistas selecionaram cinco eventos
climáticos que têm sido frequentes em cada uma das regiões do Brasil:
inundações no Sul, chuvas intensas e altas temperaturas no Sudeste, ondas de
calor intenso no Centro-Oeste, secas prolongadas no Nordeste e queimadas na
Amazônia.
Segundo
a cartilha, os impactos das inundações estão, principalmente, relacionados à
saúde mental de crianças e adolescentes, como transtorno de estresse
pós-traumático (TEPT), além de sintomas como comportamentos agressivos,
isolamento social, dependência excessiva, ansiedade e depressão.
Além
dos efeitos mentais, as inundações favorecem o aumento dos riscos de infecções
transmitidas pelo ar, por feridas na pele expostas e pela água contaminada,
como a leptospirose. Ela é causada pela contaminação da água por urina de
animais infectados, principalmente ratos.
As
chuvas intensas também aumentam o risco de arboviroses, como a dengue. Em 2024,
o Brasil atingiu o recorde de mais de 6 milhões de casos registrados e 5 mil
mortes pela doença.
Já em
relação às ondas de calor, o principal risco é a hipertermia, ou seja, o
aumento da temperatura corporal, podendo levar a sintomas como pele quente e
vermelha, confusão mental, vômitos e queda do nível de consciência. Em casos
graves, as ondas de calor podem levar à sobrecarga do coração, cansaço e
indisposição.
Por
fim, as secas aumentam o risco de desnutrição infantil e de doenças infecciosas
devido à falta de acesso à água tratada. Enquanto as queimadas podem
desencadear ou agravar doenças respiratórias, como asma, rinite, conjuntivite
alérgica e dermatite atópica.
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Como proteger as crianças?
A
cartilha também elenca os principais cuidados para proteger as crianças dos
riscos associados a eventos extremos. As dicas são divididas de acordo com o
evento e a região brasileira. Em geral, os cuidados incluem:
• Vacinação;
• Medidas de controle ambiental;
• Evitar a exposição ao sol nos horários
críticos (das 10h às 16h);
• Uso de protetor solar;
• Hidratação frequente;
• Manter uma alimentação saudável, com
frutas, hortaliças, legumes e evitar o consumo de alimentos industrializados;
• Evitar atividades ao ar livre,
especialmente em dias de maior concentração de fumaça proveniente das
queimadas.
"As
mudanças climáticas já estão alterando profundamente as condições de vida e
saúde das crianças brasileiras. Cada região do país revela, de forma singular,
os desafios e urgências desse cenário. Em todas essas realidades, a saúde
infantil emerge como um termômetro da crise climática e um chamado à
ação", avalia o pediatra Daniel Becker, embaixador do Médicos pelo Clima,
na cartilha.
"Cuidar
das crianças é cuidar do mundo em que elas irão crescer — e que esse
compromisso una profissionais de saúde, famílias, educadores e gestores em uma
jornada guiada pela urgência, pela responsabilidade e pela esperança",
finaliza.
Fonte:
CNN Brasil

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