terça-feira, 8 de julho de 2025

Bullying e dificuldade de fazer amigos afetam saúde mental de adolescentes

Um estudo internacional publicado no Journal of Child Psychology and Psychiatry investigou o impacto de fatores de conexão social na saúde mental de adolescentes no Brasil e no Reino Unido e constatou que viver em um arranjo familiar “não convencional” ("non-intact family structures") – convivência com meios-irmãos ou pais separados –, mudar de endereço, ter dificuldades para fazer amigos ou ser vítima de (ou praticar) bullying estão consistentemente associados a problemas de saúde mental em ambos os países.

Bullying é o termo em inglês que se popularizou para indicar intimidação sistemática, com violência física ou psicológica, envolvendo atos de humilhação ou discriminação por meio de insultos, ameaças ou comentários/apelidos pejorativos.

Acompanhados por três anos, 11.756 jovens foram avaliados (2.010 do Brasil e 9.746 do Reino Unido) para verificar associações entre potenciais fatores geradores e sintomas internalizantes (emocionais) e externalizantes (comportamentais) de adoecimento mental. Os internalizantes são reações que se expressam em relação ao próprio indivíduo, como ansiedade e depressão. Os externalizantes manifestam-se em direção a outras pessoas, como agredir, mentir ou roubar.

“Foram feitas reuniões com jovens para examinar quais fatores sociais eles acreditavam ser importantes e que poderiam impactar na sua saúde mental. Em seguida, os pesquisadores identificaram variáveis semelhantes entre os dois grupos [de adolescentes do Brasil e do Reino Unido]. Após essa harmonização de dados, foram utilizadas técnicas para garantir que eram comparáveis e a partir daí foram feitas as análises”, explica Maurício Scopel Hoffmann, chefe do Departamento de Neuropsiquiatria da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), um dos autores da pesquisa e integrante do Centro Nacional de Ciência e Inovação em Saúde Mental (CISM), que é apoiado pela Fapesp.

Ao longo da investigação, foram observadas algumas diferenças entre os grupos de adolescentes estudados nos dois países. Enquanto os jovens do Reino Unido apresentaram maiores impactos na saúde mental associados ao bullying, no Brasil o tamanho da família pareceu ser um fator de risco para problemas internalizantes.

Os fatores analisados foram:

>>> Conexão social estrutural

•        Tamanho da família/domicílio;

•        Número de irmãos ou meios-irmãos no domicílio;

•        Estado civil da mãe: casada ou vivendo com o pai biológico; separada vivendo com outra pessoa; separada; mãe solteira; viúva e outros;

•        Autorrelato de “ter um bom amigo” (sim/não);

•        Morte de pai / mãe ou cuidador (não/sim);

•        Mudança de endereço desde a última entrevista (não/sim);

>>>> Conexão social funcional

•        Bullying sofrido relatado pelo próprio (nunca/alguma vez);

•        Bullying praticado relatado pelo próprio (nunca/alguma vez);

>>>> Conexão social de qualidade

•        Relatado pelos pais que “se dá bem com os amigos” (sem dificuldades/com dificuldades);

•        Relacionamento cuidador principal-criança (próximo/não próximo);

“Os resultados indicam que existem fatores sociais gerais e específicos que impactam a saúde mental de jovens de diferentes países”, diz Hoffmann. “E também reforçam a importância de se levar em consideração esses fatores para o desenho de políticas públicas que promovam ambientes sociais saudáveis para os jovens, adaptadas às necessidades de diferentes populações.”

Entre os autores do paper estão outros membros do CISM: Eurípedes Constantino Miguel, chefe do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP) e coordenador-geral do centro, Luis Augusto Rohde, vice-coordenador, e Giovanni Abrahão Salum, pesquisador.

•        Como disputa por guarda de uma criança afeta a saúde mental? Entenda

De acordo com a psicóloga clínica Tatiane Paula, a disputa pela guarda de uma criança ultrapassa a questão jurídica e toca em pontos importantes e sensíveis do emocional do adulto, principalmente dentro do papel parental.

"Quando os responsáveis entram em conflito sobre quem vai ficar com uma criança, o que está em jogo, muitas vezes, não é apenas a questão da guarda física, mas também sentimentos profundos de pertencimento, sensação de culpa, medo do afastamento e, até mesmo, a sensação de perda de identidade como pai e mãe", afirma Tatiane à CNN.

A psicóloga explica, ainda, que a perda da guarda -- em casos de disputa por guarda unilateral -- pode acarretar um sentimento de luto. "É um tipo de luto invisível, mas bastante real, já que a pessoa perde a relação com o filho no cotidiano e a rotina afetiva", analisa.

Além disso, segundo a especialista, a disputa pela guarda pode gerar distorções cognitivas de pensamento. "A pessoa pode pensar: 'Se eu não tiver a guarda, eu sou um fracasso. Meu filho pode me esquecer'. Esse é um exemplo de distorção cognitiva que intensifica esse sofrimento emocional, podendo evoluir para quadros de ansiedade, depressão, exaustão emocional e até prejuízo no desempenho profissional", afirma.

<><> Impactos também são sentidos pelas crianças

Os impactos na saúde mental gerados pela disputa judicial pela guarda de uma criança não afetam apenas os responsáveis envolvidos, mas também os filhos, podendo levar ao desencadeamento de quadros como o Transtorno de Estresse Pós-Traumático, de acordo com a psicóloga Sirlene Ferreira.

"Todo estresse afeta a criança e o ambiente ao redor dela. Mesmo que os adultos tentem poupá-la dos detalhes, a criança percebe que algo está errado. Ela sente que os adultos estão chateados e, pior, entende que o motivo do conflito está relacionado a ela", explica à CNN.

Os prejuízos à saúde mental da criança podem ser observados, principalmente, em casos de guarda compartilhada quando uma das partes não cumpre com as suas responsabilidades, sejam elas afetivas, emocionais ou práticas.

"A guarda compartilhada exige comprometimento de ambos os responsáveis. Quando há ausência de afeto, desorganização ou falta de presença real, a criança sente e pode ser prejudicada", afirma Sirlene.

<><> Como reduzir os impactos?

A comunicação e o diálogo aberto são fundamentais para reduzir os impactos emocionais durante uma disputa pela guarda de um filho. Quando necessário, é válido contar com a ajuda de um profissional capacitado para fazer a mediação familiar.

"A terapia cognitivo-comportamental ajuda o adulto envolvido nesse processo não só a reconhecer a situação problemática, mas a reestruturar pensamentos disfuncionais, ressignificando esse papel parental", sugere Tatiane. "Outro ponto essencial é garantir que o vínculo com a criança continue sendo nutrido mesmo à distância", completa.

Já para as crianças, é importante buscar estratégias para realizar a transição da guarda, se ocorrer, utilizando linguagem acessível para ela e contando, sempre que possível, com o apoio de uma psicóloga para acompanhar o processo.

"Se houver planejamento e acolhimento adequados, não necessariamente haverá sequelas. Mas, quando a transição ocorre sem preparo, as chances de a criança desenvolver transtornos psicológicos aumentam — como ansiedade, baixa autoestima e até mesmo o Transtorno de Estresse Pós-Traumático. Nesses casos, a ajuda profissional é fundamental", afirma Sirlene.

•        Ansiedade e infecções: como mudanças climáticas afetam as crianças?

Eventos climáticos extremos, como secas, enchentes, queimadas e ondas de calor, têm sido cada vez mais frequentes no Brasil e no mundo. Entre as populações em maior risco de ter problemas de saúde relacionados às mudanças climáticas estão as crianças. Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), cerca de 40 milhões de crianças e adolescentes brasileiros estão expostos a um ou mais riscos climáticos.

Para alertar sobre o assunto, a organização Médicos pelo Clima lançou uma cartilha voltada para pais e cuidadores, abordando os impactos físicos e mentais na infância de eventos extremos relacionados às mudanças climáticas. O documento foi desenvolvido com revisão técnica da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).

"As mudanças climáticas afetam diretamente a saúde das crianças: comprometem a saúde respiratória, influenciam a nutrição pela privação de alimentos e impactam a segurança alimentar. Também favorecem a proliferação de mosquitos transmissores de doenças como febre amarela, dengue, chikungunya e outras arboviroses", afirma Renato Kfouri, infectologista pediatra e um dos colaboradores da cartilha.

"Informar a população sobre formas de cuidado e prevenção é fundamental. A comunidade médica tem um papel central nesse processo — o médico ainda é a principal fonte de informação confiável e de qualidade para as famílias no que diz respeito à prevenção e ao controle de doenças", completa.

<><> Principais riscos à saúde mental e física das crianças

Para o desenvolvimento da cartilha, os especialistas selecionaram cinco eventos climáticos que têm sido frequentes em cada uma das regiões do Brasil: inundações no Sul, chuvas intensas e altas temperaturas no Sudeste, ondas de calor intenso no Centro-Oeste, secas prolongadas no Nordeste e queimadas na Amazônia.

Segundo a cartilha, os impactos das inundações estão, principalmente, relacionados à saúde mental de crianças e adolescentes, como transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), além de sintomas como comportamentos agressivos, isolamento social, dependência excessiva, ansiedade e depressão.

Além dos efeitos mentais, as inundações favorecem o aumento dos riscos de infecções transmitidas pelo ar, por feridas na pele expostas e pela água contaminada, como a leptospirose. Ela é causada pela contaminação da água por urina de animais infectados, principalmente ratos.

As chuvas intensas também aumentam o risco de arboviroses, como a dengue. Em 2024, o Brasil atingiu o recorde de mais de 6 milhões de casos registrados e 5 mil mortes pela doença.

Já em relação às ondas de calor, o principal risco é a hipertermia, ou seja, o aumento da temperatura corporal, podendo levar a sintomas como pele quente e vermelha, confusão mental, vômitos e queda do nível de consciência. Em casos graves, as ondas de calor podem levar à sobrecarga do coração, cansaço e indisposição.

Por fim, as secas aumentam o risco de desnutrição infantil e de doenças infecciosas devido à falta de acesso à água tratada. Enquanto as queimadas podem desencadear ou agravar doenças respiratórias, como asma, rinite, conjuntivite alérgica e dermatite atópica.

<><> Como proteger as crianças?

A cartilha também elenca os principais cuidados para proteger as crianças dos riscos associados a eventos extremos. As dicas são divididas de acordo com o evento e a região brasileira. Em geral, os cuidados incluem:

•        Vacinação;

•        Medidas de controle ambiental;

•        Evitar a exposição ao sol nos horários críticos (das 10h às 16h);

•        Uso de protetor solar;

•        Hidratação frequente;

•        Manter uma alimentação saudável, com frutas, hortaliças, legumes e evitar o consumo de alimentos industrializados;

•        Evitar atividades ao ar livre, especialmente em dias de maior concentração de fumaça proveniente das queimadas.

"As mudanças climáticas já estão alterando profundamente as condições de vida e saúde das crianças brasileiras. Cada região do país revela, de forma singular, os desafios e urgências desse cenário. Em todas essas realidades, a saúde infantil emerge como um termômetro da crise climática e um chamado à ação", avalia o pediatra Daniel Becker, embaixador do Médicos pelo Clima, na cartilha.

"Cuidar das crianças é cuidar do mundo em que elas irão crescer — e que esse compromisso una profissionais de saúde, famílias, educadores e gestores em uma jornada guiada pela urgência, pela responsabilidade e pela esperança", finaliza.

 

Fonte: CNN Brasil

 

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